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3.1 Funcionalismo

3.1.3 Funcionalismo da Costa Oeste dos Estados Unidos (WCF)

Neste trabalho, entende-se que o contexto de uso motiva as diversas estruturas sintáticas e que a língua não se configura como um conhecimento autônomo. Conforme Givón (1995, p. xv),

Todos os funcionalistas aceitam pelo menos um pressuposto fundamental sine qua non, o postulado da não autonomia: que língua (e gramática) não pode ser nem descrita, nem explicada adequadamente como um sistema autônomo. Para entender o que é gramática e como e por que ela é dessa maneira, deve-se fazer referência aos parâmetros naturais que formam a língua e a gramática: cognição e comunicação, o cérebro e processamento da linguagem, interação social e cultura, mudança e variação, aquisição e evolução.24

Como se considera fundamental o estudo da língua em uso, a relação entre texto, contexto e cotexto é de grande valia para este trabalho. Desse modo, destaca-se o estudo do texto pautado em uma dada situação comunicativa, demonstrando “[...] que o contexto não é apenas um aspecto a ser considerado na análise textual: ele é inerente ao texto” (FUCHS, 2009, p. 70).

Na perspectiva funcionalista, o enfoque é no Funcionalismo da Costa Oeste dos EUA (West Coast Functionalism, doravante WCF), que não se configura como uma corrente unificada, mas como um agrupamento de trabalhos de vários linguistas, que compartilham características comuns. Apresenta-se, a seguir, um esboço geral dessa corrente.

24 “All functionalists subscribe to at least one fundamental assumption sine qua non, the non-autonomy

postulate: that language (and grammar) can be neither described nor explained adequately as an autonomous system. To understand what grammar is, and how and why it comes to be this way, one must make reference to the natural parameters that shape language and grammar: cognition and communication, the brain and language processing, social interaction and culture, change and variation, acquisition and evolution” (GIVÓN, 1995, p. xv).

Para os linguistas da WCF, a linguagem é, principalmente, um instrumento de comunicação. Conforme afirma Antonio (2009, p. 61),

Quando se diz que os funcionalistas consideram que a língua tem função primordialmente comunicativa, deve-se ressaltar que, para o funcionalismo, o conceito de comunicação não se restringe à codificação e à transmissão de informação, mas compreende todos os fatores envolvidos no evento de fala.

Ademais, os funcionalistas não concordam com a afirmação chomskiana de que a linguagem é autônoma. Nesse sentido, Givón (1979, p. 31) afirma que, partindo do pressuposto de que

a linguagem é um instrumento de comunicação, é estranho tentar entender sua estrutura sem referência a um conjunto comunicativo e a uma função comunicativa. Além disso, restrições gramaticais, regras sintáticas, transformações estilísticas e outras não estão lá ‘porque estão previamente no código genético do organismo’. […] Mas, estão lá por servirem a funções comunicativas altamente específicas.25

Os funcionalistas da Costa Oeste não constituem um grupo homogêneo, já que há diferenças em suas definições teóricas. Butler (2003) estabelece um paralelo entre Givón (1979, 1984a, 1984b, 1989, 1993a, 1993b, 1995, 2001a, 2001 b), de um lado, e Hopper (1987, 1992) e Hopper e Thompson (1980, 1984), de outro, para mostrar essas diferenças. Conforme Butler (2003), de modo geral, Givón considera a motivação funcional da gramática, mas não exclui a existência de uma estrutura formal que também constitui a linguagem. Já Hopper e Thompson entendem que a gramática surge em consequência das necessidades discursivas, ou seja, ela seria proveniente do discurso.

Apesar das diferenças, o que sobressai nesse grupo de funcionalistas é a visão de uma linguagem como instrumento de comunicação em que há uma centralidade dos aspectos semântico-pragmático-discursivos, além de uma ênfase na dimensão cognitiva da linguagem.

25 “[…] language is an instrument of communication, then it is bizarre to try and understand its structure

without reference to communicative setting and communicative function. Therefore, grammatical constraints, rules of syntax, stylistic transformations, and the like are not there ‘because they are prewired into the genetic code of the organism’. […]. Rather, they are there to serve highly specific

Outro aspecto a destacar nesse grupo de funcionalistas, de acordo com Butler (2003), é o papel central destinado à semântica e à pragmática, além do fato de a sintaxe ser vista de forma motivada. Essa centralidade da semântica e da pragmática pode ser vista de forma clara tanto nos trabalhos de Givón quanto nos de Hopper e Thompson. Por exemplo, Givón (1984a), em sua obra de dois volumes sobre sintaxe, organiza os conteúdos em três campos funcionais codificados pela sintaxe: semântica lexical, semântica proposicional e pragmática discursiva. Já a Gramática Emergente de Hopper e Thompson está profundamente enraizada no fenômeno pragmático-discursivo.

Destaca-se também que os linguistas da WCF, ainda conforme Butler (2003), têm destinado atenção à dimensão cognitiva da linguagem, como se verifica na seguinte afirmação de Givón (1984a, p. 11): “continuaremos a adotar, aqui, que a linguagem e sua organização nocional/funcional e estrutural está intimamente relacionada e motivada pela estrutura da cognição humana, percepção e neuropsicologia”.26

No que concerne ao texto, ele é visto em uma estreita relação com o contexto; logo, há enfoque para o fenômeno do texto/discurso. A Gramática Emergente de Hopper e Thompson, por exemplo, considera o discurso como central ao explicar o porquê de certas formas se tornarem gramaticalizadas.

Estabelecendo um paralelo entre o WCF, a Gramática Funcional (Functional Grammar, doravante FG), a Gramática de Papel e Referência (Role and Reference Grammar, doravante RRG) e a Gramática Sistêmico Funcional (Systemic Functional Grammar, doravante SFG), apesar das diferenças inerentes a cada perspectiva, Butler (2003) destaca as seguintes características:

 a visão da linguagem como comunicação;

 a rejeição da afirmação de que o sistema linguístico é autônomo em relação às funções externas da língua;

 a aceitação da importância da gramática da forma, ou seja, apresentam, em seus estudos, uma abordagem estrutural-funcional;

 a centralidade dos fenômenos semântico-pragmáticos e da motivação;

26 “We will continue to assume here that language and its notional/functional and structural organization

is intimately bound up with and motivated by the structure of human cognition, perception and neuro- psychology” (GIVÓN,1984a, p. 11).

 a aproximação construcionista da aquisição da linguagem.

Ainda estabelecendo um paralelo entre essas vertentes funcionalistas, mas, agora, ressaltando as diferenças, Butler (2003) procura mostrar que:

 as quatro abordagens (FG, RRG, WCF e SFG) apresentam diferenças consideráveis quanto ao compromisso com uma orientação cognitiva;  a abordagem da WCF tal como Givón tem um compromisso mais forte

com uma orientação cognitiva. A FG tem buscado estudar as questões relacionadas à cognição mais seriamente. A RRG demonstra mais um compromisso teórico para a adequação cognitiva, o qual não se torna expressivo na prática. Por fim, a SFG explica a cognição em termos de linguagem, e não a linguagem em termos de cognição;

 essas abordagens diferem também no seu modo de analisar a estrutura do texto e as relações texto/contexto;

 na SFG, o compromisso com a relação texto/contexto destaca-se, assim como na WCF. Já na FG, os trabalhos são mais recentes e procuram construir modelos da estrutura do discurso. A respeito da RRG, embora essa abordagem se preocupe com essa questão, ela não possui um modelo do discurso e nem um sobre as relações entre texto e contexto social.

No que se refere às principais características citadas do Funcionalismo da Costa Oeste dos EUA, segundo Butler (2003), elas podem ser sintetizadas da seguinte forma:

 uma forte preocupação com o estudo da linguagem como comunicação;  a rejeição à autonomia do sistema linguístico;

 a centralidade da noção de texto e discurso;  a importância do fenômeno cognitivo;

Depois de demonstrar as características gerais do Funcionalismo, com enfoque no Funcionalismo da Costa Oeste, na próxima seção são apresentados os principais aspectos da Teoria da Estrutura Retórica.