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O fundo Almada e Lencastre Bastos – breve (e necessária) história custodial.

No documento ESPAÇOS E PODERES NA EUROPA URBANA MEDIEVAL (páginas 103-105)

Multiform signs of identity: the medieval urban elites family archives.

2. O fundo Almada e Lencastre Bastos – breve (e necessária) história custodial.

O fundo Almada e Lencastre Bastos, depositado na Biblioteca Nacional de Portugal desde 1974, abarca cronologicamente os séculos XIV a XX, deve a sua denominação ao apelido do último proprietário, João de Almada de Lencastre Bastos, que o vendeu ao Estado português. Este fundo integra dois cartórios: o dos Viscondes de Vila Nova de Souto del Rei2 e o dos Condes da Feira, da sua segunda titulação3. Após

ter falecido sem descendência, em 1827, Miguel Pereira Forjaz Coutinho4, Conde da

Feira desde 18205, transmitiu a sua irmã, Maria Joana da Câmara Forjaz Coutinho,

todos os bens e arquivo, o qual foi reunido no cartório de Souto del Rei por via do casamento desta com o terceiro visconde, João José de Almada Velho e Lencastre.

O ALB manteve-se na família até que, em 1957, João Almada de Lencastre Bastos pretendeu vender o arquivo de que era proprietário6. Por ordem das

entidades competentes na área, foi criada uma comissão para o avaliar e propor um valor de compra, a qual apenas se veio a concretizar em 1974, pela Biblioteca Nacional, já após a morte do proponente. Pela consulta do processo de aquisição do ALB sabemos que este se encontrava desorganizado e espalhado por três locais: Avenida de Roma7, Encarnação8 e Palacete de Santo Amaro9.

2 Cujo primeiro titular foi Francisco de Almada e Mendonça, e posteriormente reconhecido no

seu sobrinho, António José de Almada e Melo e nos descendentes deste, até ao quarto titular. SILVA, José Martins da – “Vila Nova de Souto de El Rey (Francisco de Almada e Mendonça, Visconde de)”. Revista de Ex-Libris Portugueses. Porto. Vol. 10, (1917), pp. 146-152; PINTO, Pedro – “O Arquivo da Família Almada Lencastre Basto (Casa de Souto de El-Rei e Casa da Feira) na Biblioteca Nacional: propostas de exploração no âmbito da elaboração de um catálogo”. In ROSA, Maria de Lurdes (Org.) – Arquivos de Família, séculos XIII-XX: Que presente, que futuro? Lisboa: Instituto de Estudos Medievais, Centro de História de Além-Mar, Caminhos Romanos, 2012, p. 309; ZÚQUETE, Afonso Eduardo Martins – Nobreza de Portugal e Brasil, bibliografia, biografia, cronologia, filatelia, genealogia, heráldica, história, nobiliarquia, numismática. 2ª ed. Vol. 3. Lisboa-Rio de Janeiro: Editorial Enciclopédia, 1989, pp. 516-517.

3 A primeira representação do título de Conde da Feira havia terminado com o falecimento, em 1700,

sem descendência, de Fernando Forjaz Pereira Pimentel de Meneses e Silva, pelo que a tentativa de recuperação do título pelos seus parentes originou um longo processo, que incluiu, entre outras diligências, a forja de vários documentos, numa tentativa de justificar a pretensão ao título. PINTO, Pedro – “O Arquivo da Família Almada Lencastre Basto...”, pp. 310-311; CONCEIÇÃO, Pedro da – Allegaçam practica, & juridica sobre a posse, e successam do titulo, e Casa da Feira, contra os senhores procuradores da coroa, & infantado, a favor de D. Alvaro Pereyra Forjaz Coutinho. Lisboa Occidental: na Officina de Mathias Pereyra da Sylva & Joam Antunes Pedrozo, 1720.

4 FUENTE, Francisco de la – D. Miguel Pereira Forjaz, O organizador da luta contra Napoleão.

Lisboa: Tribuna da História, 2011.

5 13 de Maio de 1820. PINTO, Pedro – “O Arquivo da Família Almada Lencastre Basto...”, p. 310. 6 ANTT, Instituto Superior das Bibliotecas e Arquivos, cx. 329, proc. 274; Arquivo do Arquivo, n.º 331,

cx. 146, proc. 91 – Aquisição do Arquivo Lencastre Bastos.

7 Casa de João de Almada e Lencastre Bastos: 190 maços, entre caixas e livros, deu origem à série

“Avenida de Roma”, daqui em diante Roma.

8 Recolhimento da Encarnação, onde residia Maria José de Almada e Lencastre de Sousa Teles, prima

de João de Almada e Lencastre Bastos: 10 maços com 19 pacotes e livros, deu origem à série ANTT, devido ao facto desta documentação ter estado na Torre do Tombo entre 1961 e o ano da venda, a pedido da proprietária.

9 Residência de Isabel Teresa de Jesus e Melo, tia de João de Almada e Lencastre Bastos: 11 caixotes,

Na Biblioteca Nacional o arquivo foi recentemente organizado pelas técnicas, de forma a poder ser consultado pelos investigadores. No entanto, devido a contingência de recursos10, apenas foram desempacotados os maços originais e

colocados em capilhas (individuais apenas nas caixas com a cota ANTT) e caixas novas, com atribuição de “nova cota” aos maços que estão sumariamente descritos nas guias de remessa.

O ALB possui como instrumentos de descrição as listagens (muito genéricas) dos maços pertencentes a Maria José de Almada Teles, a Isabel de Melo11 e a João

Almada e Lencastre Bastos; um catálogo prévio, elaborado e publicado por Pedro Pinto12, que apenas cobre as primeiras seis caixas da série ANTT e que completámos

durante o ano de 2016 no âmbito da realização de tese de doutoramento em curso. No que se refere a outros instrumentos de descrição, de referir que fazem parte do arquivo vários inventários antigos, dos quais destacamos o de 183513 e

o de 183614, mandados fazer pelo quarto visconde de Vila Nova de Souto del Rei,

António José de Almada Melo Velho de Lencastre e referente ao seu cartório e outros dois (“original”15 e reformulado16), datados de cerca de 1825, pertencentes

ao cartório do Conde da Feira17. Pela análise da documentação compulsada,

podemos afirmar que os dois cartórios, apesar de reunidos na mesma família a partir de 1827, mantiveram cotas e sistemas de arrumação diferentes, uma vez que os inventários de 1835 e 1836 não incluem a documentação do cartório do Conde

recolhida posteriormente do Retiro da Encarnação. Pensamos que por morte de Isabel Teresa de Jesus, em 1970, sem descendentes directos (filhos), a documentação tenha sido herdada pela sua sobrinha Maria José de Almada e Lencastre Teles, falecida em 1992, que a vendeu com a outra parte que já possuía, uma vez que João de Almada e Lencastre Bastos também não teve filhos. Esta hipótese carece de ainda de confirmação, uma vez que a pasta do processo de aquisição do ALB não informa como terão começado os trâmites de compra do mesmo, e não nos foi possível consultar, até ao momento, no arquivo da BNP, eventuais trocas de correspondência anteriores ao processo de compra. BNP, Processo compra Almada Lencastre Basto, doc. n. n..

10 MARTINS, Lígia de Azevedo; SILVA, Ana Cristina de Santana; FERREIRA, Teresa Duarte – “O

Arquivo Pombal no âmbito dos arquivos de família da Biblioteca Nacional de Portugal: modelo arquivístico para o conhecimento de uma grande Casa nobiliárquica”. In ROSA, Maria de Lurdes (Org.) – Arquivos de Família, séculos XIII-XX..., p. 526. As autoras referem o desinvestimento na descrição documental de que foram alvo os arquivos de família.

11 ANTT, Arquivo do Arquivo, n.º 331, cx. 146, proc. 91 – Aquisição do Arquivo Lencastre Bastos. 12 PINTO, Pedro – “O Arquivo da Família Almada Lencastre Basto...”, pp. 307-341.

13 BNP, ALB, Roma, pac. 116, cx. 116, liv. 192. 14 BNP, ALB, Enc., pac. 40, cx. 40, liv. 21.

15 BNP, ALB, Enc., pac. 27, cx. 27I, liv. h (vol. 1) e liv. b (vol. 2), o terceiro volume não foi encontrado. 16 BNP, ALB, Roma, pac. 111, cx. 111A, n.º 178, Índice antigo da casa dos Condes da Feira. c. 1822. 17 Os inventários de 1835 e 1836, assim como o referente ao Morgadio de Freiriz e Penegate, datado

de 1821, foram estudados e presentes na exposição decorrente do projecto EXPL/EPH-HIS/0178/2013 – “Inventários de arquivos de família, séculos XV-XIX: de gestão e prova a memórias perdidas. Repensando o arquivo pré-moderno” cujo catálogo foi publicado em 2015. GAGO, Alice Borges – “Serving the Counts of Feira in the 19th’s: João Jerónimo do Couto de Castro e Sousa, archivist and judge”. In ROSA, Maria de Lurdes, HEAD, Randolph C. (Eds.) – Rethinking the archive in pre-Modern Europe: family archives and their inventories from the 15th to the 19th century. Lisboa: IEM, 2015, pp. 83-88, 150, 162-163.

da Feira. A produção de inventários decorrente da organização e reorganização de cartórios de numerosas famílias nobres18, teve o seu golpe final com a profunda

alteração política, económica e social que o fim do sistema vincular19 veio trazer

às famílias detentoras de bens vinculares, levando a que muitos deles deixassem de ter qualquer utilidade de prova de bens e mercês que lhes deu origem e que garantiu a sua integridade durante vários séculos.

No documento ESPAÇOS E PODERES NA EUROPA URBANA MEDIEVAL (páginas 103-105)

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