• Nenhum resultado encontrado

Tem gente que não acredita não. Eu acredito, eu tenho esperança. Quando a barragem encher, Deus quiser não demora, vai dá para produzir, a gente vai ter acesso a essa água e eles já vão ter dado nossas terras. Por enquanto eu pego bicos, e planto ali perto do açude, a área é pequena e a terra meio difícil, mas a gente faz tudo que pode. Eu acredito, a barragem vai ser para gente, ela vai encher que vai chegar aqui nesse nosso açude, na beirinha. E a gente vai usar, vai poder fazer irrigação, pescar, criar peixe mesmo. Não acho que vão empatar tanto nós não, tem quem diga que nem pescar no açude para sobreviver, pra vender mesmo, vai poder, tem que pedir autorização, mas eu acho que vai poder, não é tudo isso não; vai ter para quem quiser trabalhar. (Seu Marcos – nome fictício – morador da comunidade, sobre as perspectivas para o futuro).

Em 2017, quase dois anos após a pesquisa de campo, a vida em Boa Esperança/Iracema não se alterou significativamente. Embora as chuvas de 2017 tenham reposto a água do pequeno açude, o que a comunidade comemora como uma grande conquista, as ações que dependem do poder público seguem sem andamento. Mesmo após a energia elétrica ter sido ligada para as casas, não o foi para a adutora, como também o poço não foi perfurado: o açude e carros pipas ainda são as formas de abastecimento possível, na única cisterna disponível. As estradas de terra não tiveram obras que melhorasse a locomoção, que ficou bem difícil e impossibilitou as crianças de irem para aula alguns dias. As terras para produção tampouco foram demarcadas e devolvidas. Agrava essa situação de apatia do poder público as crises financeira e política instauradas no País nos últimos dois anos, provocando paralisação/regressão de programas sociais e maiores dificuldades de subsistência para a classe trabalhadora.

Para além, no contexto cearense, ainda há a seca que perdura desde 2011 e tem gerado a constante possibilidade de desabastecimento hídrico para o estado. Segundo dados do portal hidrológico do Ceará, mesmo após as chuvas de 2016/2017 que foram consideradas melhores que nos anos anteriores, o açude Castanhão está, em junho de 2017, com um volume de cerca de 5,56% da sua capacidade, e o açude Figueiredo com cerca 0,04%, estando em volume morto. Não há boas previsões para a próxima estação chuvosa.

Dentro dessa realidade de incertezas econômicas, políticas e sociais a partir do cenário traçado, sabe-se que as camadas mais pobres da população são as primeiras a sentir o impacto. Cita-se como exemplo a situação de Jaguaretama – área de influência do açude Castanhão que teve algumas de suas comunidades desapropriadas para construção da barragem – como uma das primeiras cidades a sofrer a consequência da seca e ter que fazer racionamento, sofrendo mesmo assim posterior desabastecimento entre 2015 e 2016. Essa realidade da cidade é decorrente da priorização de uso das águas para os projetos de irrigação e para o canal da

integração, que leva água à cidade de Fortaleza e às indústrias do Porto do Pecém, não permitindo que a água chegue até o local onde a CAGECE faz a captação para distribuir para a cidade.

Em 2015, durante a segunda visita a campo na comunidade de Boa Esperança/Iracema, presenciou-se uma reunião na Câmara Municipal de Iracema que versava sobre desabastecimento de água em diversas comunidades rurais e cidades, buscando-se saídas por meio de distribuição em caminhões pipa, tentando-se estabelecer locais possíveis para captação. Explicitaram-se diversos conflitos de interesse entre usuários e consumidores, entre cidades, caracterizando uma verdadeira disputa pela água.

Com a seca, multiplicaram-se os conflitos pelo controle e uso da água dentro do Comitê da Sub-bacia do Médio Jaguaribe que é o maior reservatório hídrico do Ceará. O referido comitê é subdividido em seis comissões, cada uma responsável por um corpo hídrico específico. Segundo Almeida (2015), foram contabilizados desde o início do período de seca mais de 40 conflitos, figurando entre eles a situação de desabastecimento de Jaguaretama; a situação de conflito em relação à barragem Figueiredo entre os municípios de Iracema e Alto Santo, com aquele município exigindo a diminuição da vazão da água, por estar no lado mais alto, e este exigindo o aumento, por estar no lado mais baixo, que recebe as águas, e exigir a liberação para recarga dos poços ao longo do rio Figueiredo; destaca-se por último a preocupação insistente desde 2012 de levar para o governo estadual a pauta de uma necessária campanha de redução do consumo na Região Metropolitana de Fortaleza, o que de fato só veio a ocorrer em 2016.

Nota-se uma constância de conflitos sobre o uso da água, principalmente entre o uso para irrigação e para consumo humano, com diversas situações nas quais esta não chega ao trecho de captação da CAGECE por ser utilizada antes na irrigação (ALMEIDA, 2015). Chama-se atenção ainda, a partir das observações de Almeida (2015) sobre os conflitos dentro da sub-bacia do Médio Jaguaribe, para as formas como as decisões são tomadas nos Comitês: o “lobby”, o poder de determinados setores sociais, com destaque dos setores ligados ao agrohidronegócio para influenciar as decisões do Comitê, priorizar determinados usos, termina por não permitir uma efetiva governança hídrica (SACANTIMBURGO, 2016).

Nessa situação, imputar o racionamento da água para consumo humano nas áreas rurais e, após, nas áreas urbanas, como vem sendo a proposta do governo do estado, vai de encontro com alguns dos principais argumentos utilizados pelo poder público para construção das barragens, qual seja, a melhoria da qualidade de vida da população cearense a partir da garantia do acesso à água para consumo e produção agrícola familiar. Perdura assim o

questionamento: quem recebe as benesses desse modelo produtivo do agrohidronegócio? Anota-se, então, a face perversa e excludente da modernização agrícola em questão, que desloca para um ambiente de inconstância hídrica um modelo de produção que gasta sobremaneira esse recurso (ELIAS, 2002), – para essa conclusão basta observar os índices de volume do açude Castanhão, que em menos de dez anos foi de seu volume máximo a 5% de sua capacidade (Portal Hidrológico do Ceará, 2017), colocando uma ampla parcela da população local sob risco de desabastecimento, configurando-se uma injustiça ambiental e uma violação do direito humano fundamental à água (ACSELRED, 2003; CORTE, 2015).

O futuro da comunidade Boa esperança/Iracema segue incerto diante do contexto traçado. Muitos moradores são conscientes disso e temem, não só em períodos de seca que tem dificultado a vida, mas mesmo em situações de abundância hídrica decorrente de períodos de cheia: há insegurança quanto ao interesse que vai despertar as áreas produtivas próximas ao assentamento como regiões apropriadas para o agrohidronegócio, pela dificuldade que os ribeirinhos terão no acesso aos corpos de água para a picinicultura ao concorrer com empresas; pela dificuldade dos irrigantes familiares em manter seu lote irrigado e produtivo, diante do valor da energia que bombeia a água; todas essas realidades relatadas em outras comunidades atingidas que hoje se organizam no MAB.

Não sei se tenho mais medo dessa seca ou dessa barragem cheia, fico lembrando da realidade do Castanhão e de outras comunidades que a gente acaba tendo conhecimento nos encontros do MAB, né? A situação não melhorou foi nada, fez foi piorar. A situação das comunidades em cima da Chapada do Apodi ali em Limoeiro, também, não melhoraram não, né? É o que chega aqui, tem agrotóxico, não produzem, a água sai caro por causa da energia, aí tem que trabalhar para as empresas, e os empregos ganham uma miséria e ainda deixa o povo doente. Às vezes nem durmo pensando nessas coisas, então penso que é melhor não pensar se não a gente desiste de viver. (fala de dona Helena – nome fictício – em entrevista individual)

Com a água, a terra, a energia e o trabalho enquanto mercadorias sujeitas à disponibilidade da ampliação do capital, não há possibilidade real de desenvolvimento pleno das comunidades mais pobres nem o respeito aos seus direitos. É preciso avançar e superar o paradigma econômico neoliberal privatista que segrega, que promove e se desenvolve a partir da desigualdade social (THOMAZ JR, 2012). Essa transformação exige, sobretudo, uma movimentação social de cunho popular forte, consistente, que se organize em torno de pautas

agregadoras, imediatas e concretas, mas que tenha em vista um projeto político maior de nação. Compreende-se neste trabalho que os movimentos sociais populares, com destaque para o MAB, vêm buscando se tornar essa força política, reunindo-se em torno de pautas concretas das comunidades que compõem o movimento e também de um projeto popular e democrático de nação. Como afirmado anteriormente, o MAB enseja construir um projeto energético democrático e popular, como também de gestão de recursos hídricos, superando a visão mercadológica da água.

Assim, a organização da comunidade Boa Esperança/Iracema no MAB contribui para o avanço na luta pelas pautas concretas, a exemplo da ocupação do canteiro de obras em 2010, o que se tornaria ainda mais difícil se fosse travada individualmente pela comunidade; contribui ainda, e principalmente, para o avanço e a mudança de consciência da comunidade, o que é perceptível nas reuniões e na fala em entrevistas individuais. Forja-se, muito lentamente, uma consciência coletiva da realidade desigual e opressora em comum entre as comunidades do movimento, permitindo à comunidade resistir à opressão cotidiana a partir do ideal de transformação social da qual se vê sujeito.

Esse processo de conscientização, de organização, de inserção no movimento e mobilização para a luta não é uma tarefa fácil, nem um processo linear. Os militantes do MAB que atuam na região buscam realizar esta tarefa, mas constantemente são limitados por fatores contingenciais e do cotidiano – a realidade de trabalho dos moradores, as tentativas de agentes locais de deslegitimar o movimento, como também as esparsas conquistas que saem do papel dificultam a organização e mobilização da comunidade.

A comunidade Boa Esperança/Iracema é um exemplo particular do estudo em questão, todavia, por meio de uma análise crítica das violações lá presentes, principalmente as ligadas ao controle, uso e acesso à água, desvelam-se elementos que são universais na lógica pela qual essa sociedade mundializada se organiza e reproduz. Reconhecer a resistência ali presente a estas violações implica em assimilar o direito não na sua perspectiva individual, mas sim em consonância com um novo paradigma transindividual que identifica àquela coletividade quantos sujeitos de direitos.

Apesar dessas dificuldades cotidianas que permeiam a organização dos movimentos sociais populares, este trabalho parte da compreensão de que o trabalho de base, a mobilização popular e a organização coletiva são a forma possível de se avançar na materialização dos direitos fundamentais, que tendem a permanecer dentro do sistema capitalista como mera formalidade no que não acumulam para a reprodução do capital.

cotidiana dos movimentos sociais. À primeira vista, diante dos relatos deste trabalho acerca das violações reiteradas ao direito humano fundamental à água, muitas realizadas a partir da efetivação de outras normas, o direito assume um papel de legitimador das relações de poder que imperam na sociedade. Todavia, essa é uma perspectiva reducionista. O direito, sob a égide de um Estado Democrático (Social) de Direito “é sempre um instrumento de transformação, porque regula a intervenção do Estado na economia, estabelece a obrigação da realização de políticas públicas, além do imenso catálogo e direitos fundamentais-sociais” (STRECK, 2012, p 59-60).

A partir da realidade de uma sociedade civil forte e atuante, onde haja diversos setores organizados e pautando politicamente os rumos do país, o direito assume esse caráter transformador no Estado Democrático de Direito. No Brasil, essa não é ainda a realidade: os únicos setores organizados e com força política para influir nos rumos do país são os ligados a burguesia interna, genuflexa a interesses internacionais, violentos e autocráticos no que tange a repressão a qualquer movimento interno democrático, ou com tendências a democratização (FERNANDES, 2014).

Essa forma de se organizar politicamente da sociedade brasileira reverberou nas estruturas do direito brasileiro e desfigurou o Estado Democrático de Direito fundado com a CFRB/88, como observa Streck (2014, p 64) ao apresentar o dilema brasileiro:

[...] não sufragamos a tese substancialista, porque o Judiciário, preparado para lidar com conflitos interindividuais, próprios de um modelo liberal-individualista, não está preparado para o enfrentamento dos problemas decorrentes da transindividualidade, própria do (novo) modelo advindo do Estado Democrático de Direito previsto na Constituição promulgada em 1988; por outro lado, em face da democracia delegativa que vivemos, de cunho hobbesiano (O´Donnell), no interior do qual o Legislativo é atropelado pelo decretismo do Poder Executivo, também não temos garantido o acesso à produção democrática das leis e dos procedimentos que apontam para o exercício dos direitos previsto na Constituição (STRECK, 2014, p.64).

Em outras palavras, nossas instituições jurídicas – o Poder Judiciário e o próprio direito –, ao invés de promover a democratização do Estado, terminam por fazer o contrário. Nesse contexto, as lutas organizadas por movimento sociais se fazem mais prementes, pois sociedades periféricas de modernização tardia só poderão superar as mazelas sociais caso assumam o protagonismo das transformações institucionais (FERNANDES, 2014).

Analisa-se, então, o provável caminho jurídico-político do Brasil a partir da não assimilação das pautas dos múltiplos movimentos sociais na ordem constitucional e da não materialização dos direitos fundamentais fundados nesta mesma ordem constitucional. Essa

realidade gera uma tensão entre as necessidades objetivas da enorme classe trabalhadora explorada brasileira e os setores das classes dominantes, que, levada ao máximo, se configurará no declínio do Estado Democrático de Direito fundado pós CRFB/88. Nesse estado de coisas, restará então duas possíveis alternativas: seguir os países latinos e reconstruir uma Constituição sob o signo do novo constitucionalismo, assimilando novos direitos fundamentais e fundando um direito numa perspectiva mais humana, com o reconhecimento das demandas populares, o que só é possível a partir de uma sólida organização popular; ou sucumbir a retirada massiva de direitos que ocorrerá sob domínio autocrático da burguesia interna, levando a uma constituição centrada em conceder mais benesses às classes abastardas.

Diante da atual conjuntura política do país, pode-se dizer que a segunda alternativa está posta. A diferença será feita pela capacidade dos movimentos sociais de organização e articulação, de influir nas instituições políticas que formam o Estado, quebrando os traços/laços de patrimonialismo-estamental que exercessem uma dominação social não só física, mas simbólica (POSTONE, 2014). Nesse quadro, os direitos humanos fundamentais configuram-se enquanto potencial transformador do direito dentro do Estado Democrático de Direito, ao legitimar perante a sociedade as postulações/reivindicações/luta dos movimentos por transformações institucionais que possibilitem, em última análise, a transformação do próprio Estado, quando então se abre as condições de possibilidade para a materialização dos direitos fundamentais de maneira a alcançar todas as classes sociais.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A água vem ganhando cada vez mais destaque no contexto mundial em razão de ser um recurso em franca escassez, causada pela crise hídrica, que possui três facetas: a limitação da disponibilidade do recurso para utilização em razão da poluição/degradação, o aumento populacional e a falta de acesso de ampla parcela da população mundial a ele. Dentre essas facetas, destaca-se a poluição/degradação e a falta de acesso enquanto decorrências diretas de sua utilização intensa como insumo na produção capitalista, com a consequente mercantilização do recurso, predominando a visão economicista sobre as demais percepções historicamente construídas sobre a água.

A água enquanto mercadoria vem sendo vendida no mercado mundial e isso tem reflexo no acesso da população mais pobre à água: são quase 1 bilhão de pessoas que não tem acesso permanente e adequado ao recurso e o número de pessoas tende a crescer nas próximas décadas. A mercantilização também torna a água um bem econômico como qualquer outro, retirando seu caráter de essencialidade para a vida, reduzindo o acesso de pessoas carentes e aumentando os conflitos em torno do controle e uso.

As consequências ambientais e o avanço científico pós Segunda Guerra Mundial alertaram a sociedade para a preocupação ambiental e social, levando ao surgimento de movimentos sociais que denunciam e reivindicam o controle da situação uso dos recursos ambientais, dentre os quais figura a água, em torno da qual começa a se organizar movimentos de luta localizados que ganham força a partir da década de 1990, chegando a se globalizarem. No Brasil, o MAB ganha relevância enquanto movimento que luta pela justiça hídrica diante da construção de barragens que violam os direitos dos atingidos, frisando a necessidade de controle popular sobre a água e energia pela sua importância estratégica para desenvolvimento da nação e afirmando que esses bens não podem ser considerados mercadorias.

Tendo em vista a movimentação social em torno das questões ambientais e sociais, inicia-se em âmbito internacional a realização de encontros para planejar a gestão ambiental e a resolução de problemas. Referindo-se especificamente à água, nota-se no âmbito desses encontros, com destaque para os FMA, uma disputa quanto ao conteúdo dessa normatização: de um lado, o interesses dos organismos econômicos internacionais (BM, FMI, OMC), das grandes empresas e de países de economia central que querem repassar a gestão e controle para a iniciativa privada; de outro os movimentos sociais que se organizam em torno da água, com destaque para os estados latino-americanos do Equador e Bolívia que, após

revolucionarem suas constituições ao criar um paradigma ecocêntrico de direito à água, vêm atuando para o reconhecimento da água enquanto direito humano.

Esses conflitos de interesse gestaram, gradativamente, o conteúdo paradoxal do direito à água atual: um direito humano reconhecido no âmbito da ONU, normatizado a partir, principalmente, do Comentário Geral nº15/2002 sobre a Convenção Internacional sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais; da Resolução A/RES/64/292 de 2010 da Assembleia Geral da ONU e da Resolução A/HRC/RES/15/9 do Conselho dos Direitos Humanos, dentre outros documentos do qual decorre; ao mesmo tempo, um bem suscetível de gestão privada e privatização, possibilidades não só reconhecidas como incentivadas pela ONU como formas de controle do uso da água. Em que pese a afirmação da água enquanto direito humano, sua força normativa é contestada por diversos países por terem os documentos em questão caráter de soft law.

No âmbito brasileiro, o direito fundamental à água é garantido como direito fundamental implícito, deduzido de outros direitos, como o direito à saúde, ao meio-ambiente e ao desenvolvimento, bem como direito fundamental derivado dos princípios constitucionais. A mais importante lei infraconstitucional a disciplinar a gestão dos recursos hídricos é a Política Nacional de Recursos Hídricos, lei nº 9433/97.

Também no âmbito jurídico interno percebe-se a contradição na disciplina da água: não é um bem sujeito a apropriação privada, devendo ser gerida democraticamente, no entanto é reconhecidamente dotada de valor econômico e suas formas de concessões de uso permitem uma configuração em verdadeira apropriação privada, por exemplo, ao garantir direitos de uso de até 35 anos, o que leva a diversas situações de apropriação privada por parte de grupos poderosos política e economicamente, com a conseqüente violação do direito fundamental à água para as populações mais pobres em todo o país.

Nessa situação, ganha importância a busca pela concretização da governança democrática enquanto forma de controle popular sobre o bem, mecanismo garantido pela Política de Recursos Hídricos, mas que na realidade possui muitas dificuldades de se concretizar enquanto tal, principalmente pela influência dos poderes políticos e econômicos nas decisões sobre os usos prioritários e pela centralidade dos recursos em torno da Agência Nacional de Águas. Faz-se necessário a ocupação desse espaço institucional de forma articulada e organizada pela sociedade civil, destacadamente pelos movimentos sociais, para fazer frente e buscar constituir verdadeiramente uma governança hídrica.

Nesse bojo de mercantilização da água enquanto insumo indispensável à reprodução do capital, inicia-se a modernização agrícola brasileira e, mais especificamente, a

nordestina, como forma de buscar desenvolver a região e integrá-la ao país, a partir da primazia do modelo de irrigação. A modernização agroindustrial em curso caracteriza-se pela manutenção das estruturas fundiárias e sociais, pelo uso intenso de insumos químicos e