I. NOÇÕES TEÓRICAS PERTINENTES
1.3 Gênero e suporte
Como já salientamos, os gêneros digitais surgem, via de regra, ancorados a
outros gêneros ou bases que já circulam regularmente em determinadas esferas
discursivas. Todavia, o estudo do suporte apresenta-se como fundamental para a
consideração dos gêneros digitais, principalmente pelo fato de que até mesmo a forma
de leitura muda a depender do suporte em que determinado gênero é construído.
Roncarati (2010, p.18), a respeito dessa mudança de foco, afirma que:
As opções de leitura oferecidas pela mídia eletrônica estão criando novas práticas, exigindo-nos crescente capacidade de integrar as informações de modo não linear. Nas redes sociais conectadas pelas tecnologias digitais acopladas cada vez mais à Internet, à telefonia e à televisão, em que os conteúdos nos chegam on line, em tempo síncrono, pressionando-nos a nos manter antenados com eventos e notícias de última hora, estamos remodelando a figura do leitor e os modos de processamento da leitura.
Não lemos mais somente na superfície de uma página impressa estática, temos a opção de selecionar e ordenar, a nosso modo e ao nosso ritmo, comunicações provenientes de diferentes fontes e links. Somos cotidianamente expostos a uma enorme massa de mensagens, não raro, temos dificuldade de integrá-la e, mais ainda, de mantê-la em nossa memória de longo prazo. (RONCARATI, 2010, p.18)
Por seu turno, Bezerra (2009, p.472) considera haver a premissa de que a leitura
de gêneros digitais (hipertextuais, nas palavras do autor) envolve dois modos distintos,
alternáveis e não-excludentes: o modo de leitura e o modo de navegação, conforme já se
viu em Roncarati (2010, p.18).
O suporte, portanto, parece suficiente para justificar novos gêneros textuais,
p.2), o suporte é imprescindível para a circulação do gênero na sociedade e deve ter
alguma influência na natureza do gênero a que ele dá suporte. Todavia, o autor afirma
que o suporte não determina, necessariamente, o gênero, mas que o gênero exige um
suporte especial. Ainda assim, tal afirmação pode ser questionada se considerarmos
alguns casos específicos. O exemplo dado pelo linguista é:
“Paulo, te amo, me ligue o mais rápido que puder. Te espero no fone 55 44 33 22.
Verônica”
Vejamos o comentário feito por Marcuschi acerca desse exemplo:
Se isto estiver escrito num papel colocado sobre a mesa da pessoa indicada (Paulo), pode ser um bilhete; se for passado pela secretária eletrônica é um recado; remetido pelos correios num formulário próprio, pode ser um telegrama; exposto num outdoor pode ser uma declaração de amor. O certo é que o conteúdo não muda, mas o gênero é sempre identificado na relação com o suporte. Portanto, há que se considerar este aspecto como um caso de emergência, já que o gênero ocorre (surge e se concretiza) numa relação de fatores combinados no contexto emergente. (MARCUSCHI, 2003, p. 2).
Além disso, Ribeiro (2007, p.134), por exemplo, afirma que os gêneros textuais existem “em consonância com os seus suportes.”. A autora ainda advoga que “à medida
que o homem passou a ter a opção de produzir impressos, novas organizações textuais com novas funções surgiram no universo dos objetos de ler”. Se pensarmos em um
poema concreto, sem o suporte, não o seria. Devido a características e exigências do
próprio gênero textual que surge, o suporte se faz essencial para que o gênero “aconteça”, ou seja, venha a existir. Um poema concreto é, essencialmente, um gênero
reconhecido como gênero textual e decifrado semanticamente – o que parece, por hora,
responder a nossa pergunta.
Todavia, isso não quer dizer que a mera digitalização de um gênero o torna
digital, pois gêneros digitais salientam-se como aqueles apenas acessíveis no suporte
eletrônico e dele depende para serem produzidos. Exatamente por isso, refiro-me ao fato
do fórum de discussão ser acessível por determinado suporte, mas não tem sua gênese
nele, uma vez que temos sua contraparte oral tanto nos antigos fóruns da antiguidade
clássica como, hodiernamente, num programa de debates/entrevistas com as
caracterísitvas do programa Estúdio I aqui analisado.
Contudo, ainda que não haja muitos estudos acerca dos suportes, principalmente
no que concerne aos gêneros digitais, Marcuschi advoga que essa discussão leva-nos a
perceber como se dá a circulação social dos gêneros. Para os fóruns de discussão, meu
foco de interesse neste trabalho, o suporte eletrônico avulta-se como fundamental para
determinar estruturas linguísticas e sociodiscursivas desse gênero, o que será analisado
nesta tese.
O que podemos, por hora, afirmar é que todo texto ancora-se em algum suporte.
Para Marcuschi (2003, p.10), o suporte é “um lócus físico ou virtual com formato
específico que serve de base ou ambiente de fixação do gênero materializado como texto.”. Em outras palavras, o suporte é algo tangível – ainda que virtual - , é específico
por ter sido produzido para portar textos de determinada comunidade discursiva, o que
não faz do suporte um portador eventual, mas definido sociodiscursivamente, sendo
De posse dessas considerações, podemos começar a traçar linhas mais precisas
acerca dos nossos fóruns de discussão selecionados como objeto de estudo para esta
tese. Historicamente, os dicionários, de modo geral, definem fórum como local de
debates, ou seja, os debates, as discussões seriam algo intrínseco ao fórum. Em outras
palavras, trata-se de um lugar onde a interação é condição sine qua nom para que o
gênero exista. Então, em sua origem, os fóruns seriam ambientes destinados a
promoverem debates orais. Por isso, reitero que os fóruns de discussão selecionados
para esta pesquisa ancoram-se em um gênero oral, mas agora, escrito, por conta da
exigência do suporte: a internet ou o próprio ambiente virtual de aprendizagem, ou seja,
a virtualidade, nesse contexto dos fóruns de discussão educacionais via internet, exige o
texto escrito para que haja interação com outros participantes. Por ser um espaço de
discussão público, a publicidade justifica a constante interatividade de seus
participantes, algo bastante peculiar ao EAD.