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4. FORMAÇÃO HUMANA E CURRÍCULO INTEGRADO: IMPERATIVOS

4.2. A gênese da formação integrada

É interessante evidenciar as mudanças e os avanços do desenvolvimento das forças produtivas, alicerçados na ciência e na tecnologia que demandam uma nova concepção de educação, e, consequentemente, do sistema de ensino, forjando o reconhecimento da necessidade de renovar e inovar o princípio educativo, na forma de organizar o sistema escolar e de ensino-aprendizagem para a democratização das relações

sociais unificando trabalho, ciência, tecnologia e formação humana. Essas relações devem articular-se na educação para o desenvolvimento da formação humana integral, como diz Tonet (2008, p. 89-90).

Costuma-se dizer que a educação deve formar o homem integral, vale dizer, indivíduos capazes de pensar com lógica, de ter autonomia moral; indivíduos que se tornem cidadãos capazes de contribuir para as transformações sociais, culturais, científicas e tecnológicas que garantam a paz, o progresso, uma vida saudável e a preservação do planeta. Portanto, pessoas criativas, participativas e críticas.

Esse é um ideal a ser perseguido no processo educacional, dentro e fora da escola, porém, na sociedade atual, dificilmente atingirá a efetividade, devido a contradição entre o discurso e a realidade objetiva sob a égide do capitalismo que serve para a reprodução dos interesses das classes dominantes.

O conceito de formação integrada, segundo Ciavata (2005), origina-se na educação socialista que almejava formar o ser humano omnilateral, através de um desenvolvimento total, completo, multilateral, em todos os sentidos, das faculdades e das forças produtivas, das necessidades e da capacidade de sua satisfação, dentro de sua integralidade física, mental, cultural, política, científico-tecnológica. Este era o grande sonho de regeneração social dos utopistas do Renascimento até metade do século XIX. Karl Marx registrou essa necessidade assim como Gramsci a despeito da escola unitária. Nesta época, influenciados por correntes de pensamentos de várias vertentes individualistas, o sistema educacional, assim como outras instituições, começam a reconhecer as potencialidades humanas e os direitos da criança. Surgem as correntes pedagógicas progressistas que avançam no processo de inovações educacionais motivadas pelo ideal de liberdade e de criatividade de cada ser humano. Conforme Santomé,

As soluções mais progressistas, no melhor dos casos, optavam por falar de metodologias ou modelos interdisciplinares de organização dos conteúdos, sendo que a linha de argumentação derivava para a peculiaridade de problemas de conhecimento organizado em disciplinas e, o que é mais importante, despreocupando-se com o sujeito que aprende (1998, p. 38).

Essa nova modalidade centrava-se no sujeito, respeitando as capacidades e ritmo de desenvolvimento de cada um. Assim, a ideia sobre unificação do saber (integração) ou interdisciplinaridade, não é nova, mas sua conceitualização vem se consagrando em nosso tempo, apesar de várias tentativas passadas.

Lopes (2008) comprova esta afirmação quando diz que, este não é um discurso inédito, e que, diferentes propostas vêm afluindo no percurso histórico do currículo. Santomé (1998, p. 66-67) relatou há mais de uma década, que, a integração pressupõe a interdisciplinaridade, e que era preciso assumir a complexidade da realidade ressaltando que,

a interdisciplinaridade é um objetivo nunca completamente alcançado e por isso deve ser permanentemente buscado. Não é apenas uma proposta teórica, mas sobretudo uma prática. Sua perfectibilidade é realizada na prática; na medida em que são feitas experiências reais de trabalho em equipe, exercitam-se suas possibilidades, problemas e limitações. É uma condição necessária para a pesquisa e a criação de modelos mais explicativos desta realidade tão complexa e difícil de abranger.

Se a realidade existente é uma totalidade integrada, então, o ensino integrado pressupõe, também, um currículo integrado. Talvez, por isso tem sido muito difícil instituir a interdisciplinaridade nos currículos escolares.

Machado (2006, p. 61) concorda com Santomé (1998) ao dizer que: ―o convite à construção de currículos integrados é também uma convocação à interdisciplinaridade, à busca das mediações que possibilitem planejar e desenvolver planos comuns de trabalho, que harmonizem distintas experiências e pontos de vista‖.

Quanto à origem recente de integração entre educação geral e profissional, é a tentativa de superar esse dualismo da educação brasileira para a formação do cidadão integral. A construção de uma nação tem como fundamento estratégico a educação básica que abrange o âmbito cultural, social, político e econômico como direito subjetivo de todos, por intermédio da apropriação, organização e produção dos conhecimentos mais avançados para a consolidação da cidadania ativa e de uma consciência clara de responsabilidade social, política, ideológica e cultural, conforme esclarece Ciavatta (2005). A escola ainda é o local mais apropriado para se aprender e apreender valores de base de conhecimentos para se comunicar e viver socialmente. Sousa Jr., (1999, p.15) reforça essa ideia quando relata que ―a escola é um local privilegiado onde as camadas sociais exploradas devem se apropriar de um determinado tipo de saber acumulado historicamente para a caminhada emancipatória‖.

Historicamente, a escolarização, o conhecimento estava em poder da classe dominante. Somente na metade do século XX que o analfabetismo no Brasil, destaca-se como uma preocupação educacional. A elite intelectualizada aproveitou desse momento frágil de demanda de capacitação para a produtividade, tornando-o um objeto de políticas

de Estado. A criação de escolas com extensão aos trabalhadores foi marcada por um grande diferencial entre a formação dos dirigentes ou da classe elitizada e a instrução para o povo baseada no trabalho produtivo.

A sociedade brasileira letrada, juntamente com a sociedade civil, tem lutado pela democracia em defesa da escola pública e da superação do dualismo que tem marcado a trajetória educacional. Há uma investida ideológica fundamentada em análises de propostas curriculares de formação integrada à ciência, trabalho e cultura, enfocando o trabalho como princípio educativo, em que se trata a educação como uma totalidade social e inseparável de seus processos formativos, como anota Ciavatta (2005, p. 85),

A idéia de formação integrada sugere superar o ser humano dividido historicamente pela divisão social do trabalho entre a ação de executar e a ação de pensar, dirigir ou planejar. Trata-se de superar redução de preparação para o trabalho ao seu aspecto operacional, simplificado, escoimado dos conhecimentos que estão na sua gênese científico- tecnológica e na sua apropriação histórico-social.

Esta articulação tem a perspectiva de sinalizar a nova política educacional na construção de um projeto de desenvolvimento de formação humana com justiça social, democracia, cidadania, articulando cultura, conhecimento, tecnologia e trabalho como direito de todos, com preparação integrada para o enfrentamento das novas bases técnico- produtivas. Frigotto (2005) ressalta ainda que um projeto com essas características de ensino integrado, politécnico ou tecnológico deve facultar os jovens de capacidade analítica tanto dos processos técnicos quanto das relações sociais que regulam o sistema.

Este autor assinala vários desafios que precisam ser enfrentados e mudanças que precisam acontecer no campo educacional, para que esse projeto ―que tem em seu ideário a mudança das estruturas que geram a desigualdade e a construção de um projeto societário de base popular‖ (FRIGOTTO, p.78) seja viabilizado através de condições objetivas e subjetivas político e economicamente de toda sociedade civil e política.

Nesta ótica, a questão crucial para a nova política educacional é a concepção de integração para além da formação tecnicista e dualista engendrada numa formação humanizadora, não restrita ao mercado de trabalho, mas para a vida.