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5 A RELAÇÃO ARQUITETURA E ARTE NO INHOTIM

5.2 PAVILHÕES DE INTEGRAÇÃO

5.2.6 GALERIA PSICOATIVA (TUNGA)

A Galeria Psicoativa é o segundo pavilhão dedicado à obra de Tunga no Inhotim. Localizado em um dos pontos extremos do parque, o acesso ao pavilhão é feito por um estreito caminho acidentado, de solo de pissaro, aberto em área de densa vegetação reflorestada.

A edificação (data do início do projeto: 2011 – data do término da obra: 2012) com cerca de 2.194 m² (Fig. 117) abriga um panorama da obra artística de Tunga, como foi o desejo do artista, expresso ao museu, por ocasião do convite feito por Bernardo Paz.

De acordo com os autores do projeto, arquitetos Thomaz Regatos e Maria Paz (Rizoma Arquitetura, Belo Horizonte, MG):

A Galeria Tunga foi projetada como um espaço extremamente flexível para abrigar diversas obras, de caráter temporário e permanente, de diversas escalas e tipos, sem recorrer ao cubo branco. O terreno natural em aclive foi respeitado, e o edifício foi ligeiramente suspenso. A diferença da cota topográfica gerou dois níveis principais, conectados por escadas e rampas que extrapolam a área interna, criando uma grande varanda aberta. A galeria é aberta para o contexto, com diversos acessos, infinitas maneiras de percorrer o espaço, circulações que funcionam também como locais de exposição, e múltiplas visadas possíveis da mesma obra de arte (Fonte: http://cargocollective.com/rizomaarq/Galeria-Tunga).

O artista Antônio José de Barros de Carvalho e Mello Mourão, conhecido como Tunga, nasceu em Palmares, Pernambuco, 1952 e vive no Rio de Janeiro. Tunga desenvolve uma obra artística na qual se misturam várias linguagens da arte contemporânea, como a instalação, o vídeo e a performance:

Figura 117 – Vista do pavilhão em maquete eletrônica

Tranças, tacapes e pentes são elementos recorrentes na obra do escultor Tunga — um escultor que se vale da narrativa assim como se vale de elementos formais. Elementos ligados a uma mitologia pessoal são aqueles mesmos usados para fazer uma crítica formal do espaço e da escultura clássica. Em várias de suas obras, Tunga se vale do campo magnético como fator que expande o espaço da obra (Fonte: www.inhotim.org.br).

Segundo Lagnado (2011) “a obra de Tunga exerce um fascínio pela sua competência de articular formalmente elementos originados por diversos campos do saber”. Em nossa opinião, quando nos defrontamos com as suas instalações e esculturas, estamos diante das obras de um artista capaz de elaborar uma poética das mais intrigantes do cenário contemporâneo brasileiro e que vem construindo uma trajetória de legitimidade e aberta para agregar as mais diversas possibilidades de ficção, ciência e arte.

Neste pavilhão estão expostos os seguintes trabalhos:

1. A bela e a fera, 2001, bronze e aço

Figura 118 – A bela e a fera, 2001.

2. Lézart, 1989. Cobre, aço e ímã.15

3. Palíndromo Incesto, 1990–1992. Fio de cobre, imã, folhas de cobre e limalha de ferro.16

15 Em Lézart (lagarto em francês) não há solda entre as chapas de ferro e o arame: suas partes são conectadas pela atração dos ímãs e por nós; são estruturas que se sustentam por si mesmas, negociando entre as forças da gravidade e magnética. Num conto escrito pelo artista, de alguma maneira parte deste mesmo trabalho, ele diz estar deitado numa rede, em momento de suspensão onde descansa entre leituras e elucubrações filosóficas, e presencia a fusão entre duas lagartixas (Fonte: http://www.inhotim.org.br/inhotim/arte-contemporanea/obras/lezart/).

16 Nesta obra, o nome determinado por Tunga aponta direções para sua apreensão: um palíndromo é uma frase ou expressão que quando lido da direita para esquerda ou de forma contrária, possui o mesmo significado. Ao termo incesto, pode-se acrescentar ao seu sentido imediato de ser um ato sexual com parentes, o jogo com a língua e a palavra -in cesto. Os elementos agigantados da instalação, que aludem aos instrumentos de tecelagem como agulha, dedal, linha e cesto, confluem diante da trama de significados, para um conjunto comum,uma alegoria contígua de uma relação consanguínea entre os objetos e significados (http://www.inhotim.org.br/inhotim/arte-contemporanea/obras/palindromo-incesto/

Figura 119 – Lézart, 1989.

Fonte: www.inhotim.org.br

Figura 120 – Palíndromo Incesto, 1990.

4. Ão, 1980 (projeção de filme P&B 16 mm em looping e instalação de som).17

5. Cooking Crystals Expanded, 2009. Vidros, redes e pratos de alumínio.

17Em Ão, a projeção registra o interior do túnel Dois Irmãos, no Rio de Janeiro, em que câmera percorre uma trajetória contínua, sem encontrar entrada ou saída. O vídeo em loop sugere uma estrutura curva no interior da montanha, destituída de acesso ao espaço externo. A ligeira sensação de vertigem provocada pela imagem infinita é potencializada pela repetição da trilha Night and Day na voz de Frank Sinatra colaborando nesta dilatação do espaço-tempo. Segundo Tunga o movimento sugere um “toro imaginário no interior de uma rocha” (http://www.inhotim.org.br/inhotim/arte- contemporanea/obras/ao/).

Figura 121 – Ão, 1980.

Fonte: www.inhotim.org.br

Figura 122 – Cooking Crystals Expanded, 2009.

6. À la lumière de deux mondes (2005).

7. Nosferatu, 1999 (vidro soprado, luz e seda).

Figura 124 – Nosferatu, 1999.

Foto: Isaias Ribeiro, 2015

Figura 123 – À la lumière de deux mondes (2005)

8. Laboratório Nosferatu, 1999–2012 (vidro laminado, espelho, ferro, vidro soprado, luz e papel).

Sobre a concepção do projeto, os arquitetos autores inicialmente analisaram que tipo de obra de arte seria exposta no pavilhão, de acordo com as características conceituais e as possibilidades de se integrar ao espaço arquitetônico. Os diagramas de concepção que foram utilizados por Thomaz Regatos e Maria Paz orientaram as pesquisas nesta fase do projeto (Fig. 126).

O diagrama de concepção projetual 1 explora formas de articulação espacial entre a pintura, a escultura e a instalação e o espaço arquitetônico. Este ponto de partida do projeto tem desdobramento em desenhos que orientam o posicionamento das obras de arte e as circulações dentro do pavilhão, assim como a relação com exterior, neste caso, a proposta de uma grande varanda que permite diversas entradas e saídas, a partir do centro da edificação (Fig. 127).

Figura 125 – Laboratório Nosferatu, 1999–2012.

Foto: Isaias Ribeiro, 2015

Figura 126 – Diagrama de concepção projetual 1.

O terreno escolhido pelo Instituto Inhotim está localizado nos limites do parque e faz parte das ações de reflorestamento da mata nativa, devastada pelas mineradoras que são suas vizinhas. O terreno plano não necessitou de movimentos de terra e a edificação foi construída suspensa do leito natural, sobre uma estrutura de concreto e vigas metálicas.

A partir do terreno, o acesso à entrada no pavilhão é feito por uma rampa ladeada pelo guarda-corpo metálico e pintado na cor cinza, que se une à grande varanda circundante da edificação (Fig. 128). O piso em lambri de madeira clara reveste tanto a rampa quanto a varanda (Fig. 129). A porta principal de entrada é mais uma, num total de nove esquadrias envidraçadas que permitem a circulação entre o interior e a grande varanda.

O projeto do pavilhão dividiu a exposição dos trabalhos em três espaços: uma sala semienterra (subsolo), o pavimento térreo e um mezanino. As instalações foram distribuídas

Figura 128 – Vista da rampa de entrada.

Fonte: http://cargocollective.com/rizomaarq

Figura 129 – Detalhe da rampa de entrada.

Foto: Isaias Ribeiro, 2015

Figura 127 – Diagrama de concepção projetual 2.

de maneira que o visitante pudesse transitar por entre elas e ao mesmo tempo desfrutar da paisagem do parque, neste caso, bem próxima da edificação.

Uma sala semienterrada (Nível 1), abaixo do mezanino, é considerada pelo artista o núcleo central do pavilhão. Neste espaço, dedicado à instalação Ão, o acesso é feito por uma rampa fechada nas laterais por uma parede revestida de madeira (Fig. 131). Na obra de 1981, a imagem de uma curva do Túnel Dois Irmãos, do Rio de Janeiro, é projetada em loop ao som do clássico de Cole Porter (Night and Day) na voz de Frank Sinatra, que “preenche” a sala escura.

O artista Tunga colaborou com os arquitetos na concepção do pavilhão e de acordo com seu relato:

O programa nasce de uma referência aos grandes templos ou monumentos contemporâneos, que são túneis aceleradores de partículas – são eles que levam o conhecimento adiante. Você é uma partícula que se acelera ao redor do centro. Por isso, Ão fica no centro e na terra. As outras salas ficam ao redor, fora do chão,

Figura 130 – Planta do subsolo.

Fonte: au.pini.com.br/

Figura 131 – Rampa e entrada da sala no subsolo.

recebendo, em cada nível, duas grandes instalações. Fizemos o povoamento das conexões (entre os níveis) com obras e performances para acelerar as partículas e criar um sentido de circularidade em toda a extensão (SIQUEIRA, 2012, p. 40).

A instalação de vídeo Ão, localizada em uma sala escura, ocupa parcialmente o espaço. Ao descer a rampa até o subsolo do pavilhão e encontrar um filme que repete incessantemente a entrada de um túnel, nos faz pensar que a ideia do artista é nos encaminhar para o mesmo túnel do filme, ou seja, esta sala seria o início desse percurso, de claro-escuro, noite-dia e vida-morte. Por outro lado, temos a opção de voltar e prosseguir o caminho que escolhermos.

- Pavimento térreo

Neste pavimento (Fig. 132) estão expostas vinte e oito obras. São registros finais de instalações (que o artista prefere chamar de “instaurações”) realizadas em vários museus do mundo e que tem seu abrigo final no Inhotim (Fig. 133). A música “Tereza”, do poeta e cantor Arnaldo Antunes, composição criada exclusivamente para a performance18 homônima, ecoa

repetidamente no pavilhão.

18 Vídeo da performance realizada em 06 de setembro de 2013, no Inhotim, disponível em https://vimeo.com/105042073. Figura 132 - Planta do pavimento térreo.

Fonte: http://au.pini.com.br/

Figura 133 – Vista do pavimento térreo.

Uma série de gravuras ocupa uma das paredes e são vistas à medida que o visitante sobe os a escada de largos pisos que leva a outro nível deste pavimento. Poucas obras se utilizam das paredes, pois ocupam o piso da edificação (Fig. 134).

O pavilhão é circundado por esquadrias de vidro de piso a teto (laje plana) e o pé- direito alcança oito metros de altura. O piso, de assoalho de madeira na cor avermelhada, estende-se à varanda, dando continuidade ao espaço expositivo. A iluminação das obras, além de receber a luz natural, é reforçada por luminárias (embutidas na laje de forro) que emitem focos direcionados às instalações e esculturas. Os trabalhos se encontram dispersos pelo ambiente, permitindo desta maneira, a circulação do público sem percursos determinados para a visitação.

Na tentativa de apresentar parte do conjunto de obras expostas neste pavimento e contribuir para o entendimento da solução museográfica adotada pelos arquitetos, nos valemos das fotografias realizadas no interior do pavilhão (Fig. 135).

Figura 134 – Vista do térreo.

- Mezanino

Localizado no centro do pavilhão, o mezanino tem acesso por meio de uma rampa, fechada por paredes e piso revestidos de madeira. Neste espaço, uma instalação por vidros soprados coloridos está exposta, e ao redor, percorrendo todo o perímetro, um cortinado de seda branca faz às vezes de vedação para separar outras duas instalações expostas neste mezanino (Fig. 136 e 137).

Figura 137 – Vista de obra exposta no piso do mezanino.

F Foto: Isaias Ribeiro, 2015 Figura 136 – Vista do mezanino desde o pavimento

térreo.

Foto: Isaias Ribeiro, 2015

Figura 135 – Vistas do interior pavilhão.

Os cortes apresentam uma visão do projeto que facilita o entendimento da sala semienterrada e de alguns detalhes estruturais da edificação.

Na varanda, o mobiliário consiste de várias cadeiras e um banco de madeira, locais de descanso, e apreciação pelo público de quase todas as obras expostas no interior do pavilhão. Apesar de ser o pavilhão mais distante da recepção, não existem equipamentos públicos como banheiros e lanchonete nesta edificação.

Finalmente, consideramos que neste pavilhão as obras de arte expostas, instalações na sua maioria, encontraram um espaço singular para seu abrigo. Livre de ambientes fechados e sem limites colocados pela arquitetura, o público visitante parece à vontade para circular por entre os trabalhos. A relação do interior (ocupado por muitas instalações) com o exterior (a varanda com suas redes vermelhas) proporciona a possibilidade de sair e à distância, contemplar o generoso espaço, sem perder a fruição das obras.

Uma arquitetura transparente, assim como muitas das “instaurações” criadas pelo artista, e que, pela resposta dos arquitetos aos problemas de concepção, apontamos como um dos pavilhões mais bem solucionados como abrigo para um conjunto tão expressivo no campo da arte contemporânea.

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