• Nenhum resultado encontrado

Nos terrenos metamórficos de alto grau do sul da Bahia predominam rochas granulíticas, as quais estão integradas ao embasamento do Cráton do São Francisco (ALMEIDA 1977), também, nomeado de Província São Franciscana (MASCARENHAS et al. 1984) ou Antepaís do São Francisco por Alkmin et al. (1993). O Cráton São Francisco situa-se na parte leste-central da América do Sul, e representa uma unidade tectônica de mais fácil acesso do escudo pré-cambriano brasileiro. Este Cráton constitui uma unidade geotectônica cuja evolução orogênica cessou no final do paleoproterozoico, durante o denominado Ciclo Geotectônico Transamazônico (BRITO NEVES 1975; MASCARENHAS & GARCIA 1989), atualmente denominado de Ciclo Geotectônico Paleoproterozoico, que ocorreu entre 1,8 a 2,4 Ga. (Figura II.1).

De acordo com os dados isotópicos e geocronológicos três episódios geotectônicos importantes atuaram neste Cráton, mostrando idades distintas: (i) o primeiro em torno de 2,0 Ga, o anteriormente denominado de Ciclo Geotectônico Transamazônico (HURLEY et al. 1967; CORDANI 1973); (ii) o segundo em cerca de 1,1 Ga, o Ciclo Espinhaço (PEDREIRA & MASCARENHAS 1975) e, (iii) o terceiro em torno de 0,7 Ga, o Ciclo Brasiliano (ALMEIDA 1971; BRITO NEVES & CORDANI 1973).

35

Figura II.1 Mapa esquemático mostrando os limites e as unidades tectônicas do Cráton do São Francisco (ALMEIDA 1971, CRUZ & ALKMIM 2006), com a localização da área de pesquisa. Adaptado de Alkmim et. al (1993).

36 Em relação à atuação do Ciclo Espinhaço no embasamento do Cráton do São Francisco, existem divergências, pois alguns autores defendem que a deformação observada na "Cordilheira do Espinhaço" teria ocorrido no evento Brasiliano, e não no evento Espinhaço (ALKMIN et al. 1993).

No neoproterozoico, o Cráton do São Francisco atuou como antepaís em relação às faixas de dobramentos Brasilianas (MASCARENHAS & GARCIA 1989), cujos limites com relação ao Cráton foram definidos segundo estudos geofísicos (USSAMI 1993). Estes cinturões dobrados são denominados de: (i) Faixa Riacho do Pontal (FRPT) e Faixa Sergipana (FS) (BRITO NEVES 1975), limitando o Cráton a norte e a nordeste, respectivamente; (ii) Faixa Araçuaí (FA) (ALMEIDA 1977), situado ao sul; (iii) Faixa Brasília (FB) (ALMEIDA 1969), que bordeja a margem oeste e, (iv) Rio Preto (FRP) (INDA & BARBOSA 1978), que representa uma pequena faixa de rochas dobradas localizadas mais ao noroeste do Cráton, respectivamente (TEIXEIRA et al. 2000) (Figura II.1).

Os terrenos arqueanos e paleoproterozoicos que constituem o embasamento do Cráton do São Francisco afloram em duas partes distintas: (i) a primeira, de maior extensão, ocorre no norte e nordeste da Bahia e (ii) a segunda, de menor extensão, situa-se no sul, em Minas Gerais, na região do Quadrilátero Ferrífero (Figura II.1).

No norte e nordeste da Bahia, os seguimentos crustais foram recentemente reagrupados em quatro macro-unidades geotectônicas, baseando-se em suas características geológicas e isotópicas. Elas foram denominadas de Blocos Gavião (BG), Serrinha (BS), Jequié (BJ) e Itabuna-Salvador-Curaçá, (BARBOSA 1986; BARBOSA et al. 2001, 2003 e BARBOSA & SABATÉ 2002, 2004) (Figuras II.1 e II.2).

O Bloco Gavião (BG) (MARINHO & SABATÉ 1982), corresponde a um segmento crustal situado na parte oeste do embasamento do Cráton São Francisco, no Estado da Bahia, estando encoberto, na sua parte norte, por sedimentos do meso e neoproterozoico (Figuras II.1 e II.2). Ele é constituído por sequências supracrustais da fácies xisto-verde e anfibolito (Sequência Metavulcânica-Sedimentar Contendas- Mirante, Greenstone Belts Umburanas e Mundo Novo) (MARINHO 1991, 1978; MASCARENHAS et al. 1998), além de associações granulíticas-granodioríticas e associações tonalíticas, trondhjemíticas e granodioríticas da fácies anfibolito, incluindo os núcleos TTGs (MARTIN et al. 1991).

37

Figura II.2 Mapa esquemático do Cráton São Francisco na parte sul do Estado da Bahia, mostrando as unidades geotectônicas arqueanas/paleoproterozoicas mais importantes, além da área de pesquisa. Adaptado de Sabaté et al. (1990) e Teixeira et al. (2000).

38 Estudos mais recentes mostram que as sequências vulcano-sedimentares arqueanas (Greenstone Belts) se formaram em bacias intracratônicas (BARBOSA & SABATÉ 2002, 2004), sobre a crosta TTG, com a produção inicial de rochas vulcânicas continentais com idades de 3,3 Ga (sub-vulcânicas ácidas do Contendas- Mirante e basaltos toleíticos da Formação Jurema-Travessão). Estas rochas estão associadas com komatiítos basais, basaltos toleíticos com pillow lavas, rochas piroclásticas e sedimentos químicos-exalativos com idades próximas a 3,2 Ga. Estas litologias de caráter essencialmente vulcânico foram soterradas por sedimentos detríticos com idades mínimas de 3,0-2,8 Ga (MARINHO 1991). Quanto aos TTGs, dois grupos foram identificados, ambos metamorfisados na fácies anfibolito e constituindo a crosta continental mais antiga da Bahia (BARBOSA & SABATÉ 2001, 2002, 2003, 2004). O primeiro grupo (TTG Sete Voltas/Boa Vista/Mata Verde e Tonalito Bernarda) possui idades de 3,4-3,2 Ga e o segundo grupo (Granitoides Serra do Eixo/Mariana/Piripá), com idades de 3.2-3.1 Ga, No Bloco Gavião ocorrem também, rochas vulcânicas cálcio-alcalinas, além de intrusões graníticas metaluminosas (Granito Pé de Serra) e intrusões máficas–ultramáficas (Sill do Rio Jacaré), ao lado de filitos e grauvacas, todas associadas a Greenstone Belts e com idades em torno de 2,4 Ga. (MARINHO 1991). Possui também, rochas de composição granítica/granodiorítica e migmatitos, equilibrados no fácies anfibolito, com idades de 2,8-2,7 Ga.

O Bloco Serrinha (BS) está situado no extremo nordeste do Cráton do São Francisco, (Figuras II.1 e II.2) com aproximadamente 21.000 km2. Foi mapeado a partir da década de 70, como marco inicial dos levantamentos geológicos regionais na Bahia (SEIXAS et al. 1975; INDA et al. 1976; PEREIRA 1992; MELO et al. 1995). Ele é composto por: (i) ortognaisses tonalíticos, granodioríticos e anfibolíticos migmatizados com idades entre 3,1 e 2,8 Ga (GAÁL et al. 1987; OLIVEIRA et al. 1999; MELO et al. 2000; RIOS 2002), e (ii) sequências vulcano-sedimentares do fácies xisto-verde (greenstones belts do Rio Itapicuru e Capim) que apresentam idades variando entre 2,2 e 2,0 Ga (SILVA 1996), essas últimas intrudidas por corpos de granitóides (ALVES DA SILVA 1994) com idades variando entre 2,20 e 2,07 Ga (RIOS 2002).

O Bloco Jequié, onde a área de pesquisa está localizada, situa-se a oeste do Bloco Itabuna-Salvador-Curaçá, e em contato tectônico com o Bloco Gavião. As

39 rochas do Bloco Jequié eram da fácies anfibolito, antes da colisão paleoproterozoica que formou o Orógeno Itabuna-Salvador-Curaçá, entretanto foram intensamente deformadas e transformadas em granulitos durante o processo orogênico (BARBOSA & SABATÉ 2002, 2004). Ficou preservada dessa deformação, a denominada Banda de Ipiaú (BARBOSA 1986) da fácies anfibolito, encravada entre terrenos da fácies granulito, (Figuras II.3). Esse Bloco pode ser subdividido em dois conjuntos de rochas: o primeiro é formado por granulitos charnockíticos heterogêneos com mega enclaves tectônicos de rochas supracrustais granulitizadas, as quais constituem o segundo conjunto. Esses enclaves são metabasaltos, metabasaltos ou dioríticos, bandas quartzo-feldspáticas, chertz, quartzitos granadíferos portadores de ortopiroxênio, kinzigitos, grafititos e formações ferríferas bandadas (BARBOSA 1986, 1990). Essas rochas supracrustais parecem representar a parte mais antiga do Bloco Jequié, as quais possui idades U-Pb em zircão de 2,9 Ga e idades Sm-Nd de 3,0-2,9 Ga (WILSON 1987; MARINHO 1991; MARINHO et al. 1994). O primeiro conjunto é caracterizado por intrusões múltiplas, graníticas-granodioríticas, que devido à granulitização, foram transformadas em enderbitos, charno-enderbitos e charnockitos com alto e baixo teores de titânio (FORNARI 1992; FORNARI & BARBOSA 1994). Os métodos de Rb-Sr e Pb-Pb, rocha total, além do método U-Pb SHRIMP mostram que essas últimas rochas possuem idades de 2,7-2,8 Ga (WILSON 1987; ALIBERT & BARBOSA 1992), (Figura II.3). Observa-se ainda, no Bloco Jequié, a presença de corpos de gabro- anortositos, de ocorrência restrita, considerados como derivados de magma toleítico (CRUZ 1989). Mais recentemente, estudos realizados no Bloco Jequié, revelaram a presença de granulitos augen-charnoenderbíticos-charnockíticos (CH4) e intrusões charnockíticas em estruturas dômicas (CH6), fonte de calor para originar nos granulitos alumino-magnesianos a paragênese hercinita + quartzo, que expressam condições de altas a muito altas temperaturas metamórficas (900-1000ºC) (MACEDO 2006).

O Bloco Itabuna-Salvador-Curaçá, que no sul do Estado se sobrepôs tectonicamente ao Bloco Jequié, exibe foliações/bandamentos dispostos numa direção aproximada N-S, desde o paralelo da cidade de Itabuna, ao sul, até as proximidades da cidade de Curaçá, ao norte (BARBOSA & SABATÉ 2002, 2004). Ele é limitado a leste, pelo Bloco Serrinha e a oeste, pelos Blocos Gavião e Jequié

40 (Figuras II.1, II.2 e II.3). Este Bloco corresponde a uma faixa móvel configurada no paleoproterozoico, sendo formada por rochas metamórficas de alto grau, da fácies granulito/anfibolito alto, a maioria de idade arqueana (BARBOSA & SABATÉ 2002, 2004). As rochas mais importantes do Bloco Itabuna-Salvador-Curaçá são tonalitos- trondhjemitos 2,6 Ga (SILVA et al. 1997), contendo corpos de rochas máficas, e de monzonitos com afinidade shoshonítica 2,4 Ga (LEDRU et al. 1993), além de faixas de rochas supracrustais (quartzitos com granada, gnaisses alumino-magnesianos com safirina, grafititos e formações manganesíferas), além de gabros/basaltos de fundo oceânico e/ou de bacias back-arc de fonte mantélica, também metamorfisados no fácies granulito.

Entre os modelos geotectônicos pesquisados o mais aceito para a região granulítica do sul da Bahia é aquele de Barbosa & Sabaté (2002, 2004). Segundo esses autores, no paleoproterozoico, a cerca de 2,0 Ga (WILSON 1987; BARBOSA, 1990; LEDRU et al. 1994), houve a colisão dos Blocos Itabuna-Salvador-Curaçá e Jequié, tendo sido ambos empurrados sobre o Bloco Gavião. Com isso houve a formação de importante cadeia de montanhas, o Orógeno-Itabuna-Salvador-Curaçá (BARBOSA & SABATÉ 2002). Este orógeno, após a erosão, fez aflorar rochas representantes de suas raízes, metamorfisadas em alto grau. As rochas supracrustais kinzigíticas ou alumino-magnesianas contêm importantes paragêneses metamórficas indicadoras de condições de temperatura de 800- 850°C e pressão de 5-7 kbar (BARBOSA et al. 2002c). No Bloco Jequié, as litologias orto e paraderivadas da fácies anfibolito, juntamente com as intrusões múltiplas de granitos/granodioritos, foram todas deformadas e transformadas, durante a colisão, em granulitos heterogêneos e enderbitos-charnoenderbitos charnockitos. Na parte sul do orógeno Itabuna-Salvador-Curaçá, rampas frontais com tectônica tangencial resultaram na sobreposição do Bloco Itabuna-Salvador-Curaçá sobre o Bloco Jequié (Figuras II.4 e II.5). O metamorfismo regional de alto grau, considerado como originário dessa superposição tectônica, alcançou a fácies granulito na parte central do orógeno e os fácies anfibolito e xisto-verde nas suas bordas, fazendo com que terrenos de mais alto grau metamórfico ficassem posicionados sobre aqueles de mais baixo grau (BARBOSA 1990). Intrusões charnockíticas e tonalíticas tardias penetraram esses dois segmentos crustais, a maioria delas associadas à fase de levantamento e retrometamorfismo do referido orógeno.

41

Figura II.3 Mapa simplificado da região granulítica do sul/sudeste da Bahia. Modificado de Barbosa et al. 2002.

42

Figura II.4 Seção Geológica na região sul da Bahia, no início da formação do Orógeno Itabuna- Salvador-Curaçá, com o Bloco Jequié sendo superposto pelo Bloco Itabuna-Salvador-Curaçá e esses montando sobre o Bloco Gavião. Foram coloridas somente as rochas paleoproterozoicas, ficando em branco as arqueanas, que são predominantes (Modificado de BARBOSA & SABATÉ 2002, 2004).

Figura II.5 Seção Geológica na região sul da Bahia, após a colisão dos Blocos Itabuna-Salvador- Curaçá, Jequié e Gavião. Destaca-se o corpo de Mirabela, introduzido, sob a forma de ―tubo‖ no final da colisão paleoproterozoica, quando as deformações dúcteis estavam em declínio. (Modificado de BARBOSA & SABATÉ 2002, 2004).

43 Uma particularidade da interface entre os terrenos metamórficos de alto grau entre o Bloco Jequié e o Bloco Itabuna-Salvador-Curaçá, é a presença de corpos intrusivos portadores de litologias de natureza máfica-ultramáfica e gabro- anortosítica, associados a anomalias magnéticas significativas, a exemplo do Rio Piau (CRUZ 1989), Samaritana/Carapussê (JESUS 1997; MACÊDO 2000; BURGOS 2005), Mirabela (ABRAM 1993) e Palestina (FRÓES & SOARES 1998).

A Banda de Ipiaú (Figura II.3), que se situa na interface dos dois Blocos anteriores (BARBOSA 1986) é uma faixa alongada de direção NNE-SSW, com cerca de 150 km de extensão e 10 km de largura média. As rochas que constituem essa Banda são orto e paragnaisses onde, embora predominem intercalações de anfibolitos e material quartzo-feldspático, também ocorrem quartzitos, kinzigitos e formações ferríferas. Estas rochas são semelhantes aos granulitos heterogêneos do Bloco Jequié, anteriormente descritos, com a diferença que nesse bloco as rochas encontram-se metamorfisadas no fácies granulito e, na Banda de Ipiaú, no fácies anfibolito (BARBOSA 1990). Os granitos, que também ocorrem na região, são restritos somente a essa Banda, a qual parece não ter sido jamais submetida à fácies granulito. Tudo indica que essa banda fazia parte do Bloco Jequié, antes da granulitização (BARBOSA et. al. 2003).

44

CAPÍTULO III

Documentos relacionados