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2. CICLO DA POLÍTICA CONTEXTO DA INFLUÊNCIA: Privatização da educação

2.3 O Gerencialismo na Administração Pública

O avanço do pensamento neoliberal que propõe a redução do Estado e a economia de livre-mercado, a partir dos anos de 1980, por meio das reformas empreendidas no Reino Unido e nos Estados Unidos, pressupõe a maior eficiência do setor privado em relação ao setor público:

O gerencialismo nos Estados Unidos se manifestou pelo culto à excelência, que segue o mesmo padrão do empreendedorismo britânico. Esse movimento contribuiu para alimentar o ufanismo da era Reagan, pois abasteceu o imaginário social com fantasias e oportunidades de progresso baseados na iniciativa individual. (PAULA, 2005, p. 56)

Nos Estados Unidos criou-se a cultura do management, caracterizada pela criação de objetos de consumo do mundo do negócio, como livros e revistas, e por símbolos que permeiam as organizações e as mentes dos indivíduos, apresentando “fórmulas infalíveis” de gestão. Essa cultura apresenta um conjunto de pressupostos compartilhados pelas organizações, quais sejam: a crença numa sociedade de mercado livre; visão do homem como autoempreendedor; culto da excelência como desenvolvimento pessoal e coletivo; culto a símbolos, figuras emblemáticas e palavras de efeito (inovação, sucesso, excelência); crença em tecnologias gerenciais para racionalizar as atividades organizadas grupais (PAULA, 2005, p. 57):

Esses pressupostos também estão cada vez mais entrelaçados no tecido social, pois não é mais possível ignorar que as organizações empresariais exercem uma grande influência na sociedade: as posições de status estão sendo ocupadas por homens e mulheres de negócios e as empresas vêm desempenhando papel dominante no processo de socialização dos indivíduos, tanto no que se refere à educação, como a valores que estão sob a esfera de influência do mundo dos negócios, contribuindo para que os seus símbolos de linguagem e crenças invadam a cultura tanto do ponto de vista material quanto intelectual e espiritual.

O modelo gerencial apoia-se na crítica da burocracia presente na administração pública. Max Weber, em Economia e Sociedade, apresenta a questão da administração burocrática como indispensável para as necessidades de administração de massas.

Pois uma vez que a administração burocrática é por toda parte – ceteris

paribus – a mais racional do ponto de vista técnico-formal, ela é pura e

simplesmente inevitável para as necessidades da administração de massas (de pessoas ou objetos). Só existe escolha entre “burocratização” e “dilentatização” da administração, e o grande instrumento de superioridade da administração burocrática é o conhecimento profissional, cuja indispensabilidade absoluta está condicionada pela moderna técnica e economia da produção de bens, esteja organizada de modo capitalista ou socialista [...] Do mesmo modo que os dominados só podem defender-se normalmente contra uma dominação burocrática existente criando uma contra-organização própria, também sujeita à burocratização, o próprio aparelho burocrático é obrigado a continuar funcionando em virtude de interesses de natureza material ou puramente objetiva, isto é, ideal: sem ele, numa sociedade com separação dos funcionários, empregados e trabalhadores dos meios administrativos e com indispensabilidade de disciplina e qualificação, a possibilidade de existência moderna acabaria para todos, menos para aqueles que se encontrassem de posse dos meios de abastecimento

[...] Mas a questão é sempre: quem é que domina o aparelho burocrático existente. (WEBER, 1999, p. 146, grifo nosso)

Concordamos com Weber, ao apresentar a administração burocrática como imprescindível para administração das massas, do ponto de vista técnico-formal, tornando-se relevante considerar sob qual domínio se encontra o aparelho burocrático existente e quais interesses representa. A suposta eficiência técnica proposta pelo modelo gerencial propõe uma “burocracia flexível”, a desregulamentação de leis, privatizações e terceirizações que apontam para a dominação do sistema de livre-mercado no âmbito da administração do Estado.

2.3.1 A reforma gerencial no Brasil e a influência na Educação Pública

Na administração pública brasileira, especialmente a partir da década de 1990, tem-se a reestruturação do aparelho do Estado, por meio da reforma gerencial, inspirada nas reformas do Reino Unido e dos Estados Unidos. Nesse contexto, a nova administração pública apresenta características de descentralização administrativa, competição entre unidades administrativas, indicadores de desempenho transparentes, disciplina e parcimônia no uso de recursos, controle de resultados e ênfase no uso de práticas de gestão oriundas do setor privado. Tais características apontam uma transição para uma organização pós-burocrática, que na verdade é um mito, pois o que se tem é uma flexibilização da burocracia e uma manutenção da dominação (PAULA, 2005).

É interessante notar o antagonismo que ocorre no período em que se desloca do contexto de uma ditadura militar às lutas pela redemocratização do Brasil. A Campanha pelas Diretas Já, a promulgação da Constituição Federal de 1988 constituíram um momento histórico ímpar de ampliação e conquistas de direitos sociais há tanto almejados. Paradoxalmente, no contexto

dessa constituição cidadã, inicia-se a reforma do Estado, que passa a ser orientado por mecanismos de gestão neoliberais que avançam na perspectiva do Estado Mínimo.

No que se refere ao direito à educação, o artigo 206 da Constituição Federal de 1988, estabelece, entre outros, o princípio da gestão democrática do ensino público. No entanto, no âmbito da administração e organização escolar, a educação passa a ser influenciada pelas teorias de administração capitalista, por meio das quais mecanismos administrativos da empresa capitalista são vistos como algo natural e legítimo para a administração escolar (PARO, 2012a, p. 168):

Não é de estranhar, por isso, que os defensores dessa adoção das normas da administração capitalista pela escola vejam como absurdas, ou meramente sentimentais, as resistências que se opõem a esse propósito, já que a empresa se coloca para eles, em virtude dos altos índices de produtividade aí alcançados, como paradigma a ser seguido e como realidade com a qual a escola só tem a aprender em termos de eficiência e racionalidade. A partir dessa perspectiva, não conseguem perceber que a empresa capitalista é precisamente o local por excelência em que se concretizam as relações de exploração do trabalho pelo capital e que, aí, a administração tem o papel político de mediadora dessa exploração, fornecendo aos proprietários dos meios de produção, especialmente por meio da gerência, mecanismos que justifiquem e reforcem seu comando e controle sobre os proprietários da força de trabalho.

A teoria da Administração Escolar, ao ignorar essa realidade, ou melhor, ao ocultá-la sob a aparência da neutralidade técnica, favorecendo ao mesmo tempo a irradiação para a escola das mesmas regras que na empresa atendem aos interesses do capital,funciona, assim, como fator de homogeinização do comando exercido pela classe burguesa, em nossa sociedade.

A adoção de sistemas de ensino privado na rede de ensino pública, objeto de estudo desta pesquisa, é um dos exemplos concretos da irradiação do modelo de mercado na educação, que atende aos interesses do capital.

2.4 Parceria público-privado: implantação de sistema de ensino privado na rede