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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.2 GESTÃO AMBIENTAL: GERENCIANDO A BUSCA PELA SUSTENTABILIDADE

2.2.1 Gestão ambiental

Philippi Jr., Romero e Bruna (2004) explicam que o processo de gestão ambiental inicia-se quando são promovidas adaptações ou modificações no ambiente natural, de forma a adequá-lo as necessidades individuais ou coletivas.

Sendo o homem o grande agente transformador do ambiente natural, a maneira de gerir a utilização desses recursos é o fator que pode acentuar ou minimizar os impactos. Processos de gestão ambiental

fundamentam-se em três variáveis: a diversidade dos recursos extraídos do ambiente natural; a velocidade de extração desses recursos, que permite ou não a sua reposição; e a forma de disposição e tratamento dos seus resíduos e efluentes. A somatória dessas três variáveis e a maneira de geri-las definem o grau de impacto das atividades antrópicas sobre o ambiente natural.

Derivado do latim gestione, gestão significa o ato de gerenciar, dirigir, regular, governar e administrar. Gestão ambiental refere-se, portanto, ao ato de gerir o ambiente, isto é, o ato de administrar, dirigir ou reger as partes constitutivas do meio ambiente, seja em entornos localizados, ampliados ou mesmo globais (PHILIPPI JR., BRUNA, 2004; PORTO; SCHÜTZ, 2012).

Neste sentido, é importante ressaltar que o ambiente é um bem comum, de modo que sua gestão incumbe à esfera social, na qual processos vitais dos indivíduos adquirem relevância pública (PORTO; SCHÜTZ, 2012).

Portanto, no escopo da gestão ambiental administram-se ecossistemas naturais e sociais, em que o homem se insere individual e socialmente, num processo de interação entre as atividades que exerce, com o objetivo último de estabelecer, recuperar ou manter o equilíbrio entre natureza e homem (PHILIPPI JR., BRUNA, 2004).

Desta forma, a gestão ambiental possui uma dimensão social que transcende a disciplinaridade, consistindo em uma prática social e uma intervenção real que caracterizam a necessária prática interdisciplinar (UEHARA et al, 2010).

A partir de uma visão empresarial, a gestão ambiental é definida como um conjunto de políticas, programas e práticas administrativas e operacionais que levam em conta a proteção do meio ambiente por meio da eliminação ou minimização de impactos e danos ambientais decorrentes do planejamento e operação de empreendimentos ou atividades, incluindo-se todas as fases do ciclo de vida de um produto (SHIGUNOV NETO; CAMPOS; SHIGUNOV, 2009).

A gestão ambiental, entretanto, vai além de um mero conjunto de atividades, constituindo um processo contínuo e adaptativo, por meio do qual uma organização define (e redefine) seus objetivos e metas relativas à proteção do ambiente e seleciona as estratégias e meios para atingir tais objetivos em determinado período de tempo, por meio da constante interação com o meio ambiente externo (ANDRADE, TACHIZAWA E CARVALHO, 2002, p. 113).

Assim, gestão ambiental consiste em um instrumento plural que regra a relação sociedade-natureza, com inúmeras possibilidades de ações

e resultados, dependendo da missão e dos valores propostos (UEHARA et al, 2010).

Para Philippi Jr. e Bruna (2004), a gestão ambiental se materializa por meio de políticas e planos decorrentes dos diversos temas relacionados com a qualidade ambiental. Já operacionalização da gestão é feita no dia a dia na execução de programas e projetos de ação. Neste sentido, para ser eficiente, a gestão ambiental deve estar atrelada a um conjunto de instrumentos. Só é eficaz, porém, quando esse conjunto se transforma em ações que se traduzem em problemas resolvidos (PHILIPPI JR., BRUNA, 2004).

As organizações produtoras de bens e serviços têm, portanto, a obrigação de colocar a criatividade a serviço da gestão, assumindo a responsabilidade que lhes cabe no controle dos aspectos ambientais decorrentes de suas atividades através do gerenciamento de seus processos (CERQUEIRA, 2006).

Em organizações produtivas, a concepção de um Sistema de Gestão Ambiental (SGA) é uma das formas mais utilizadas para a estruturação da gestão ambiental, sendo pertinente buscar seu entendimento e recomendações. Para Barbieri (2007, p.153) um SGA trata-se de um “conjunto de atividades administrativas e operacionais inter-relacionadas para abordar os problemas ambientais atuais ou para evitar o seu surgimento”.

Sistemas de gestão podem ter a abrangência ou o escopo que se desejar, em função das características e necessidades da organização, sendo universalmente empregados e aplicáveis a qualquer tipo de atividade. As três funções básicas envolvidas, que podem ser desdobradas em outras, são planejamento, controle e melhoria (CERQUEIRA, 2006). O autor coloca, ainda, que a tomada de decisão dentro de um sistema de gestão deve forçosamente passar pela definição clara de políticas, objetivos e metas a serem atingidas. Todos estes elementos devem ser definidos em função das diretrizes superiores da organização, isto é, seus princípios, crenças e valores.

A norma ISO 14001 estabelece os requisitos para a implementação de um SGA certificável a partir de uma estrutura baseada na metodologia conhecida como PDCA (do inglês Plan, Do, Check, Act, que em português traduz-se como Planejar, Executar, Verificar, Agir), conforme Figura 1 (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, 2004).

Figura 1 – Modelo de sistema da gestão ambiental segundo a ISO 14001.

Fonte: Adaptado de ABNT (2004).

De acordo com Pojasek (2012) a adoção da estrutura do PDCA é a abordagem mais objetiva para a implementação de sistemas de gestão ambiental, sendo aplicável a praticamente qualquer organização.

O estabelecimento de uma política ambiental é uma atividade primária no contexto dos SGAs e da ISO 14.001, pois é em torno dela que todo o sistema de gestão ambiental é desenvolvido. De acordo com a norma, um SGA tem como objetivo o desenvolvimento e implementação de uma política ambiental e o gerenciamento de seus aspectos ambientais (ABNT, 2004).

Assim, a melhoria contínua preconizada pela norma refere-se ao aprimoramento do desempenho ambiental da organização, em coerência com sua política ambiental. O desempenho ambiental, por sua vez, trata de resultados mensuráveis da gestão de uma organização sobre seus aspectos ambientais, os quais podem ser medidos com base em objetivos e metas ambientais propostos pela organização – decorrentes da política ambiental.

A política ambiental da organização deve ser um desdobramento natural dos valores, visão e missão da empresa, e, sobretudo, deve refletir as intenções maiores da organização, expressar suas intenções e princípios em relação ao seu desempenho ambiental.

Deve, ainda, prover uma estrutura para definição e monitoramento de objetivos e metas ambientais e, portanto, devem expressar declarações passíveis de serem alcançadas e medidas por intermédio de indicadores, mesmo que sejam ambiciosas e inspiradoras (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, 2004; CERQUEIRA, 2006).

As características específicas de um SGA variam muito entre as organizações, todavia sempre incluem o estabelecimento de: uma política ambiental, a avaliação dos impactos ambientais, a determinação de

objetivos quantificáveis para a redução dos impactos, incluindo a previsão de recursos e treinamentos de funcionários, o acompanhamento do progresso do SGA para alcance dos objetivos e a correção de desvios identificados neste acompanhamento, além da realização da análise crítica acerca da implementação do Sistema (COGLIANESE; NASH, 2001 apud DARNALL; JOLLEY; HANDFIELD, 2008; BARBIERI, 2007).

De qualquer maneira, independente de particularidades e requisitos estabelecidos por normas, o grande objetivo da gestão ambiental deve ser a busca permanente pela melhoria contínua da qualidade ambiental dos serviços, produtos e ambiente de trabalho de organizações (ABNT, 2004; SHIGUNOV NETO, CAMPOS E SHIGUNOV, 2009).

Assim, a gestão ambiental é apontada por muitos autores como a base para lidar com as preocupações ambientais da nossa atualidade (GEBLER; PALHARES, 2007; PORTO; SCHÜTZ, 2012).

Por outro lado, é importante considerar que existem também diversos questionamentos acerca da legitimidade dos SGAs e das certificações pela ISO 14.001, como apontam Darnall, Jolley e Handfield (2008).

Como é muito difícil para um membro externo verificar se está realmente acontecendo uma melhoria no desempenho ambiental de uma organização (e a norma também não estabelece requisitos absolutos para o desempenho ambiental), o foco de muitas empresas acaba se limitando à criação e documentação de políticas e procedimentos, representando esforços simbólicos que refletem apenas uma preocupação com a imagem da empresa, sem o empenho de fato na redução dos seus impactos (RONDINELLI; VASTAG, 2000).

Além disso, o processo de melhoria contínua, na prática, suscita as mesmas críticas e questionamentos que se verifica na discussão em torno da sustentabilidade e desenvolvimento sustentável – como não poderia deixar de ser já que a gestão ambiental surge justamente em função destes debates e preocupações.

Neste sentido, grande parte dos processos de gestão ambiental ocorre em consonância com o modelo de desenvolvimento hegemônico e não com os preceitos do desenvolvimento sustentável.

Porto e Schütz (2012) apontam que na gestão ambiental a orientação hegemônica é pautada pela ecoeficiência, que enfatiza ferramentas como tecnologias limpas e economia verde, sem, no entanto, questionar a raiz dos problemas, já que “frequentemente oculta o contexto histórico e social dos problemas ambientais despolitizando o debate sobre os sentidos do desenvolvimento e da sustentabilidade”. A concepção

hegemônica da gestão ambiental a torna, então, uma ferramenta de governança para “administrar a conflitividade social decorrente das contradições e fragilidades próprias do modelo de acumulação capitalista”.

A própria ciência possui suas hegemonias consolidadas que contribuem para esta superficialidade com que a gestão ambiental normalmente atua na busca pelas soluções ecoeficientes. Dentre as principais críticas tem-se a abordagem mecanicista que, com base na objetividade e na neutralidade, “sistematicamente desconsidera a complexidade, contextos, valores e incertezas, e dessa forma se integra mais facilmente às demandas regulatórias do mercado” (PORTO; SCHÜTZ, 2012). Dessa forma, projetos são tratados individualmente e os esforços se concentram na perfeição dos detalhes, escapando a análise das inter-relações inerentes a uma estrutura sistêmica (SEIFFERT; LOCH, 2004).

Para Andrade, Tachizawa e Carvalho (2002), gerenciamento ecológico deve envolver a passagem do pensamento mecanicista para o pensamento sistêmico, onde a percepção do mundo como máquina cede lugar à percepção do mundo como sistema vivo. Quando as empresas passam a serem vistas como organismos vivos, sua compreensão não pode mais depender apenas de seu desempenho econômico.

Kapoor (2001), fazendo referência a outros autores, coloca a gestão ambiental como um paradigma científico ortodoxo. Parte-se do princípio que a realidade objetiva pode ser decomposta em menores componentes por um observador imparcial e racional para, então, ser analisada e gerenciada. A natureza é vista como um ambiente a parte, que pode ser explorado de uma maneira passiva.

Ciente destas críticas e a fim de superar essa visão mecanicista, neste trabalho assume-se uma abordagem para o meio ambiente pautada na perspectiva da sustentabilidade, conforme colocado no item 2.1.1. O meio ambiente, portanto, representa mais do que a dimensão ambiental da sustentabilidade, pois abarca, também, as relações socioeconômicas estabelecidas entre o homem e o ambiente natural e construído.

Feita essa ressalva, o termo gestão ambiental passa a ser empregado neste estudo sob essa perspectiva, pressupondo a busca pela sustentabilidade e remetendo ao questionamento das relações que ocorrem no interior do processo produtivo, assim como do modelo hegemônico de desenvolvimento adotado pela sociedade no contexto local.