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PARTE I – REVISÃO DA LITERATURA E ESTADO DA ARTE 33

2.   CONTEXTUALIZAÇÃO 33

2.6  Influência Organizacional no Erro de Manutenção 89 

2.6.1   Gestão do Risco de Erros de Manutenção 90

Dentro da área de manutenção de avião, existe uma crescente ênfase na gestão do erro como uma parte integrante para composição e organização do Sistema de Gestão da Segurança (SGS). Um SGS é uma abordagem coordenada para a gestão da segurança que vai além de regulamentar o aspecto de minimizar os problemas causados por erros de manutenção. Segundo Hobbs (2008), de acordo com a ICAO - International Civil Aviation Organization, um SGS eficaz requer um compromisso forte da gestão e atenção para as preocupações, que

‘ vão desde a cultura corporativa para a investigação de eventos, até os fatores humanos referentes a treinamento.

Um problema importante que enfrentam as organizações que trabalham diretamente com a manutenção é a forma de incentivar a divulgação dos

incidentes de manutenção. A falta de divulgação destes eventos deixam de gerar informações que alimentam e servem de referencia em um banco de dados de um sistema de gerenciamento. Apesar da extensa documentação que acompanha a manutenção, o dia-a-dia de mantenedores podem ser menos visíveis do que a gestão trabalho dos pilotos ou controladores. Durante o trabalho dos pilotos, suas ações e atitudes podem ser apuradas de uma forma relativamente rápida através dos gravadores de acesso, gravadores de voz da cabine de pilotagem e

gravadores de dados de voo, para não mencionar a tripulação e os passageiros. O desempenho dos controladores de tráfego aéreo é cuidadosamente

monitorado, e os seus erros tendem a se tornar imediatamente evidentes para qualquer colega de trabalho, outros controladores ou mesmo dos pilotos. Em contrapartida, se um engenheiro de manutenção tem uma dificuldade com um procedimento de manutenção às 03:00 da manhã em um hangar remoto, o problema pode permanecer desconhecido para a organização a menos que o engenheiro decida por divulgar o problema. Quando ocorre um erro de

manutenção, podem se passar anos antes até que este erro se torne aparente, e pelo tempo que ele ocorreu pode ser difícil estabelecer a forma como o problema aconteceu e quais as consequências que estes de fato pode gerar.

Os relatórios de incidentes são um dos poucos canais para as organizações identificarem os problemas de organização na manutenção, mas a cultura da manutenção de todo o mundo tende a desencorajar os relatórios de incidentes de manutenção, porque a resposta aos erros tem sido frequentemente punitiva. Em algumas empresas, erros comuns, tais como tampas de óleo de motores deixadas bambas, irá resultar em vários dias sem remuneração, ou mesmo a demissão imediata. Não é surpreendente que muitos incidentes menores de manutenção nunca são notificados oficialmente. Segundo o Relatório da National

Transportation Safety Board (1998), quando alguns engenheiros de manutenção da Austrália foram pesquisados em 1992, mais de 60 por cento relataram ter corrigido um erro cometido por outro engenheiro, sem documentar a sua ação, para evitar potencial de ação disciplinar contra o colega.

Embora todos os envolvidos na segurança da aviação devessem estar preparados para assumir as responsabilidades por suas ações, uma resposta punitiva genuína a erros é em última análise contraproducente. Alguns membros de comitês de análise de acidentes têm tentado propor a cultura na indústria da

‘ aviação que a 'culpa livre' é necessária para incentivar a denúncia. Isto poderia implicar que ninguém jamais seria punido e responsabilizado por suas ações. Mais recentemente, o conceito da cultura de relatar os pequenos incidentes tem sido promovida, no qual algumas violações extremas resultarão em punições disciplinares, porém a maioria tende a não punir os mecânicos quando estes errarem. Programas de informação de incidente ocorridos em manutenção têm sido amplamente divulgados para que estes possam colaborar com um banco de dados, a fim de reduzir os erros humanos.

O progresso está sendo lento no sentido da elaboração de relatórios de erros de sistemas de manutenção que permitam que engenheiros desta área revelem erros ocorridos, sem medo de punição. A regulamentação européia da European Aviation Safety Agency (EASA) Part 145, exige que as organizações de

manutenção tenham um sistema de comunicação interna de ocorrências que permite que estas organizações relacionadas ao erro humano, devem ser

relatadas e analisadas. Em 2001, antes da liberação dos requisitos da EASA , a Autoridade de Aviação Civil do Reino Unido (United Kingdom Civil Aviation Authority) (UKCAA), havia lançado um aviso de número 71 sobre Aero Navegabilidade, mostrando as melhores práticas de gestão de erro de

manutenção. Estes incluíam o compromisso das empresas, com uma política de disciplina clara e um processo de investigação dos eventos relatados. A Transport Canada também tem promulgado regulamentações que exigem sistemas de gestão da segurança das companhias aéreas, onde este requisito inclui os relatórios de erros e outros problemas, e as investigações internas e análise de tais eventos.

O FAA - Advisory Circular AC 120-66B (2002), nos Estados Unidos, incentiva as companhias aéreas e centros de reparação a introduzir os Programas de Ação de Segurança da Aviação (ASAP) que permitem aos funcionários relatar

problemas de segurança com ênfase na ação corretiva em vez de disciplinar. Relatórios de incidentes são passados para um comitê de revisão de eventos composto por representantes da FAA, sobre gestão e a unificação destes relatos.

Apesar das vantagens que esses programas oferecem e que estes tenham sido aprovados de forma mais ampla para a tripulação de voo do que para o pessoal de manutenção, nem todos os incidentes são aceitos em programas ASAP. Existem algumas condições-chave para a aceitação de um relatório que são as seguintes:

‘ 1) O relatório deve ser apresentado de forma oportuna, geralmente dentro de 24 horas após o redator ter tomado conhecimento do problema;

2) O incidente não deve implicar uma atividade criminosa ou abuso de substâncias;

3) O incidente não deve envolver a falsificação intencional; e

4) O incidente não deve envolver violações intencionais ou ações que refletem “descaso intencional pela segurança".

Os primeiros três destes critérios não são susceptíveis de constituir um problema na maioria dos casos. No entanto, quando se trata de violações ou ações que envolvem uma "violação intencional de segurança”, a questão torna-se mais subjetiva. Muitas violações de rotina na manutenção poderiam se encaixar neste critério.

Segundo Hudson (2000), as questões da culpa e da justiça se aplicam mais do que apenas ao pessoal de manutenção no piso do hangar. Gerentes e

supervisores também são responsáveis pelo desempenho do pessoal que se reportam a eles. Foi proposto que quando ocorrem violações de trabalho, deverá haver consequências não só para as pessoas diretamente envolvidas, mas também para os gestores. Por exemplo, se um incidente envolveu uma violação da regra de rotina, os gestores devem ser responsabilizados pela sua

incapacidade de garantir o cumprimento, ou sua incapacidade de alterar a regra se fosse desnecessária.

b) Formação dos Fatores Humanos

A partir da década de 1970, as companhias aéreas ao redor do mundo

começaram a oferecer treinamento de conscientização de fatores humanos para a tripulação de voo. Até recentemente, a formação fatores humanos raramente estava previsto para o pessoal de manutenção.

Segundo Hobbs (2006), na década de 1990 uma onda inicial de cursos de formação de fatores humanos para o pessoal de manutenção iniciou-se nos Estados Unidos, inspirado no sucesso de formação em gestão de recursos dos pilotos. Esta formação inicial era tipicamente referida como Gestão de

‘ gestão do stress, tomada de decisão, a consciência das normas, habilidades de comunicação e resolução de conflitos. Os cursos normalmente são destinados não só a mudança de atitudes entre o pessoal de manutenção, mas também proporcionar-lhes competências práticas que poderiam ser aplicados no local de trabalho, tais como as competências de assertividade e técnicas de resolução de conflitos.

Ainda segundo Hobbs (2006), a segunda onda deste treinamento em fatores humanos para o pessoal de manutenção foi gerado por novos requisitos da International Civil Aviation Organization (ICAO), a European Aviation Safety Agency (AESA), e do Transport Canada que chamou os engenheiros de manutenção para ter conhecimento dos princípios de fatores humanos. O Regulamento AESA - European Aviation Safety Agency 66 contém uma lista de conhecimentos dos fatores humanos entre as exigências básicas de

conhecimento inicial para certificação de manutenção do pessoal em aeronaves comerciais de transporte aéreo. O programa recomendado inclui o trabalho em equipe, trabalho com pressão de tempo e de prazos, comunicação e gestão do erro humano. Embora esses itens constem no currículo anexado ao regulamento, como um meio de alternativas aceitáveis, a AESA não listou como uma não conformidade, de modo que este currículo efetivamente tenha a força de uma exigência regulamentar.

O Relatório 145 da AESA contém extensos requisitos de fatores humanos para as organizações de manutenção. Entre os requisitos nestes regulamentos e os documentos de suporte associados, são de que os funcionários recebam

treinamento em princípios de fatores humanos. Esta formação é necessária não só para o pessoal de certificação, os engenheiros e técnicos, mas também para gerentes, supervisores, agentes de controle de qualidade, agentes de loja de atendimento a clientes e outros. A formação contínua dos fatores humanos deve ocorrer a cada dois anos.

Segundo Hobbs (2006), mais de 60 temas de fatores humanos estão listados no material de orientação associada com a AESA-145, incluindo violações, a pressão dos colegas, as limitações de memória, gerenciamento de carga de trabalho, trabalho em equipe, assertividade e as políticas disciplinares. A

Australian Civil Aviation Safety Authority indicou que no futuro a regulamentação semelhante será aplicável a organizações de manutenção e de pessoal na

Austrália, quando a Civil Aviation Safety Regulation (CASR) Part 145 for introduzida.

c) Aprendendo com os incidentes

Segundo Reason (1990), na maioria dos casos as circunstâncias imediatas de um acidente são sintomas de mais de um problema fundamental, e que

dificilmente um acidente ocorre devido a um fator isolado. Tratar os sintomas de um problema raramente levam a soluções adequadas, e alguns casos pode mascarar e agravar problemas de maiores magnitudes e de consequências indesejadas. Um exemplo a este respeito para reforçar tal situação, seria como um procedimento que é desnecessário ou mal concebido é rotineiramente ignorado pode causar mais mal do que bem, uma vez que os profissionais acabam se habituando a ignorar outros procedimentos quando eles os julgam desnecessários. Para fazer melhorias duradouras é preciso identificar e tratar as origens fundamentais subjacentes dos problemas e a origem destes problemas.

Ainda segundo Reason (1990), para chegar às causas de organização de um acidente envolvendo o desempenho humano, precisamos perguntar "Por quê?" das ocorrências buscando as respostas:

Por que o comportamento ocorre? Por que os controles de risco falham? Por que os fatores que contribuem existem?

As respostas a estas perguntas eventualmente leva-nos a aspectos fundamentais da organização, como a cultura, restrições financeiras e as

condições de trabalho que os funcionários são submetidos, que podem ter forte e ampla influência sobre a segurança e qualidade.

d) Investigação de Incidentes de Sistemas

Os relatórios de incidentes fornecem matérias-primas valiosas sobre lições de segurança a partir do qual lições podem ser extraídas. Nos últimos anos, diversas técnicas de investigação foram desenvolvidas especificamente para a

manutenção do transporte aéreo. A mais antiga delas, criada pela fabricante Boeing, chamada de Apoio de Decisão ao Erro de Manutenção - Maintenance

Error Decision Aid (MEDA) que apresenta uma lista exaustiva das descrições de

erros, como "painel de acesso não fechado" e, em seguida, orienta o pesquisador na identificação dos fatores que levaram ao erro. Segundo Rankin e Allen (1996), mais de 70 fatores que contribuem para os erros são listados no MEDA, incluindo

‘ fadiga, conhecimento inadequado, e restrições de tempo, no entanto este sistema não inclui a descrição psicológica de erros.

De acordo com as pesquisas de Russell, Bacchi, Perassi e Cromie (1998), o Boletim de Aeronaves e Manutenção de Sistema de Segurança - Aircraft Dispatch

and Maintenance Safety System (ADAMS) foi desenvolvido na Europa por uma

equipe sediada no Departamento de Psicologia do Trinity College de Dublin. Em comum com MEDA, o ADAMS inclui uma série de erros de manutenção, como também permite que o investigador descreva a forma psicológica do erro usando uma grande variedade de descrições de como a captura do hábito e falta de memória podem ter influenciado na causa do erro. Uma seleção de cerca de 100 fatores de influência que abrangem o desempenho da tarefa, o ambiente de trabalho, a organização e o tipo de erro do estado físico e mental, é fornecido ao investigador.

Segundo Schmidt, Schmorrow e Hardee (1998), o Human Factors Analysis and Classification System (HFACS) é baseado no modelo de Razão, e foi

originalmente desenvolvido para ajudar na investigação de acidentes nas forças armadas dos Estados Unidos. Uma extensão de manutenção desta metodologia HFACS-ME (Human Factors Analysis and Classification System - Maintenance Extension) foi desenvolvida pela Marinha para analisar os incidentes de aviação dos Estados Unidos. HFACS-ME auxilia o pesquisador na identificação de ações de manutenção usando uma taxonomia baseada na Razão, e fornece 25

potenciais condições latentes que contribuem a erros de manutenção. Talvez devido às suas origens militares, HFACS e HFACS-ME salientam os fatores de supervisão das tarefas que são executadas.

Há duas principais vantagens da utilização de um sistema de investigação estruturado e sistemático de erros como os descritos acima. Primeiro que os sistemas de investigação estruturados foram desenvolvidos para melhorar a eficácia das investigações. Os sistemas estruturados servem de avisos ou listas de verificação que ajudam o investigador a descobrir as questões relevantes durante o processo de investigação. Em segundo lugar, uma vez que o sistema tem sido usado ao longo do tempo, um banco de dados de incidentes torna-se disponível em formato padrão que é adequado para análise estatística. Ela então se torna possível em função da busca de tendências e associações nos dados que talvez não tenham sido identificadas.

Através destas investigações é possível avaliar as condições de trabalho destes profissionais de manutenção, uma vez que após a análise de vários fatores, a avalição do posto de trabalho referentes ao ambiente, condições de

‘ temperatura, iluminação, entre outros, passam a serem fatores que podem contribuir para o processo de investigação.