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Quando se aborda o tema da Gestão da Doença, é imprescindível enquadrá-lo na cadeia de cuidados de saúde, isto de forma a apreender a sua complexidade.

No contexto presente dos cuidados de saúde na doença crónica, Armstrong (1998), é referido por Ribeiro (2004), para contar que, enquanto os profissionais no século XIX, tinham como preocupação central as questões relacionadas com o meio ambiente enquanto principal factor no aparecimento de grandes epidemias, como a tuberculose por exemplo, a partir de meados do século XX, essa inquietação passou para as consequências que o comportamento das pessoas têm enquanto elemento activo e decisivo no processo de adoecer ou de ser saudável.

Os comportamentos prejudiciais para a saúde conduziram como consequência, a um aumento exponencial das doenças crónicas. Este aumento levou à necessidade de se alterarem as áreas de intervenção a nível dos sistemas de saúde. No entanto, verifica-se que os cuidados de saúde prestados actualmente, não estão a dar uma resposta adaptada às necessidades desencadeadas pelas doenças crónicas.

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De acordo com a WHO (2002), devido a uma má gestão das doenças crónicas, os encargos com a saúde são excessivos e o impacto dos problemas crónicos vão muito além dos gastos normais relacionados com os tratamentos médicos. Devemos ter em conta que:

- Doentes (e famílias) pagam os custos económicos mensuráveis, incluindo as despesas relacionadas com os serviços médicos, redução da actividade laboral e perda de emprego. Surgem ainda problemas decorrentes das incapacidades provocadas pela doença, redução do tempo e qualidade de vida, que tornam incalculáveis os custos financeiros;

- Organizações de assistência à saúde pagam a maior parte das obrigações referentes ao atendimento médico, além de cobrir diversas despesas embutidas no custo do tratamento; -Profissionais da saúde sentem-se frustrados em relação à sua actividade profissional e ao trabalho de gestão e orientação das doenças crónicas, e os administradores dos serviços de saúde estão insatisfeitos com os resultados dos serviços e o desperdício de recursos;

-Governos, empregadores e sociedades, padecem, em virtude da perda de mão-de-obra devido a óbitos, incapacidade e morbilidade relacionada com as doenças crónicas. Além disso, as doenças crónicas resultam em grandes perdas de produtividade.

O panorama apontado, requer uma intervenção concertada a nível da política da saúde. A este propósito, a WHO, a partir de 1997 (com a reunião de Barcelona), considerou que a defesa da saúde exige profissionais de saúde “expert`s”, possuindo como características essenciais: cuidador, decisor, comunicador, líder comunitário e gestor. Estes profissionais teriam como finalidade major, cuidar da saúde das populações (e não apenas das doenças), teriam a capacidade de tomar decisões capazes de produzir mudanças concretas, comunicando eficazmente (e não unilateralmente) com as pessoas e os grupos, onde se inclui os sectores da população com poder social. Oliveira (2004)

Assim, um dos desafios que se coloca actualmente aos profissionais de saúde, onde estão incluídos os médicos e os enfermeiros, é que reflictam sobre o seu papel de educadores e de promotores de saúde. Cada vez mais, esta deve ser uma preocupação da sua formação base, uma vez que é anormalmente aceite que qualquer pessoa que domine os aspectos científicos próprios da profissão que desempenha, estaria apto para ensinar aquilo que julga importante que a população saiba, (considerada ignorante nesse domínio) e decidir (por ela), quais as melhores opções a tomar em termos de saúde e de gestão das patologias crónicas. Navarro (2004)

De tudo o que já foi consultado parece, que este conceito, o conceito internacional de gestão da doença, já não é tão inovador e muito menos recente.

Tal como refere Gallego (2004, p. 72), “Desde 1990, que a descrição dos programas de “disease management” se tornou progressivamente habitual na literatura.”

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Não podemos, no entanto, e porque assim se tem testemunhado, deixar de fazer notar, que na realidade, e no campo profissional em que actuamos, não nos é familiar, nem tão pouco, dinamizado. Tendo em conta o seu propósito, terá necessariamente de ser incrementado e facilitado os primeiros passos.

Usa-se como ponto de partida a definição do conceito de Gestão da Doença, pela Disease Management American Association (DMAA), com a finalidade de traçar o enquadramento teórico da problemática desta doença crónica. Esta define Gestão da Doença como, um sistema de intervenções e de comunicações coordenadas de cuidados de saúde orientado para populações com patologias, nas quais os esforços de auto-cuidado são determinantes. É nesta filosofia de cuidados que se pretende obter ganhos evidentes em saúde, com repercussões positivas, ao nível dos custos.

Gallego (2004, p. 72), acrescenta que, “(…) a comprovação da sua efectividade está ainda pouco documentada e, os programas implementados inserem-se sobretudo em sistemas de saúde de cobertura parcelar da população ou numa organização de um serviço de saúde.” Pretende-se, com este modelo de gestão da doença, contribuir para o progresso da qualidade dos cuidados de saúde, para o incremento da satisfação dos doentes e dos profissionais, e para a rentabilização dos recursos disponíveis, assim como, para a redução de encargos.

Tal como refere, Diniz (2004, p. 68), “(…) a aplicação dos princípios que suportam o conceito de “gestão da doença” permitem a redução entre 15 e 20% dos custos resultantes da gestão tradicional dos sistemas de saúde, podendo, até, atingir os 50%”.

No caso da Diabetes, como estamos perante uma doença que consome uma parte substancial do orçamento da saúde, é determinante que se caminhe para este modelo de gestão. Pois, tal como descreve Lopes (2004, p. 270), “A filosofia subjacente, é a de que o doente deve ser fortemente envolvido e corresponsabilizado no processo de controlo da sua doença crónica.”

O mesmo autor advoga ainda, entende-se que a pessoa deve ser formada acerca da sua doença, porque sendo-o, tem maior conhecimento do que pode e deve ou não fazer, e do alcance dos resultados que obterá por seguir um determinado estilo de vida. Pressupõe-se portanto uma gestão do conhecimento centrada na pessoa, embora integradora também das equipes multiprofissionais que sobre ela intervenham.

Uma pessoa educada tenderá a aceitar um estilo de vida compatível com a sua doença, estará mais atento para primeiros sinais indiciadores de necessidade de intervenção clínica, controlando desta forma as crises em estádios de desenvolvimento bastante iniciais, e tenderá a ter uma muito menor taxa de abandono aos tratamentos de longa duração. Como

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se deduz facilmente, visa-se o aumento da qualidade de vida da pessoa e evitam-se situações agudas.

Resumidamente, são os seguintes, os objectivos da gestão da doença, materializados num programa de gestão da doença. Guerra (2003):

- Aumentar os cuidados prestados e diminuir os custos globais da saúde, através do reconhecimento de pessoas portadoras de doença crónica, que podem significar despesas elevadas, ligando-as atempadamente aos prestadores, e intervenções adequadas;

- Abordar as doenças crónicas com intervenções de máxima efectividade, assente na evidência e com recursos ajustados, e adequados no tempo ao percurso evolutivo da doença, (estratificação de risco), de modo a resultar um impacto positivo;

- Instruir a pessoa, os familiares e os prestadores de cuidados sobre os protocolos em vigor e sobre as linhas de orientação, baseadas nas melhores práticas para a gestão de uma doença particular.

- Fomentar o planeamento perfeito do diagnóstico e do tratamento da doença (desde os factores de risco e seu despiste, até aos estadios finais de evolução da doença);

- Excluir intervenções de efectividade nula ou desconhecida, ou cuidados supérfluos; - Suprimir a duplicação de empenhos e actividades;

- Melhoria contínua do processo de gestão e dos seus resultados – o registo sistemático destes é um factor crítico de sucesso, estando a sua falta, identificado e aceite como a principal causa de fracasso dos programas de gestão da doença;

- Garantir que todas as intervenções aconselhadas são, efectivamente, aplicadas às pessoas, e nos contextos adequados ao continuum de cuidados de saúde.

Contudo, para se aplicar um programa de gestão da doença, há necessidade de recursos e competências básicas. De acordo com este mesmo autor, este processo de gestão da doença, exige a existência de competências e de instrumentos operacionais, como condição para o êxito. São considerados elementos básicos do processo de gestão da doença, os seguintes:

- Conhecimento clínico adequado acerca da utilização dos meios complementares de diagnóstico e terapêutica disponíveis, e das intervenções terapêuticas e preventivas, de forma a tornar perceptível o mais correcto modo de gerir uma doença específica e apurar as melhores práticas clínicas;

- Tecnologia de informação - a gestão da doença é um processo baseado na informação, e o seu sucesso provém da capacidade de colher dados e analisá-las, monitorizando continuamente o resultado das intervenções na pessoa;

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- Prestação do serviço e prática da organização - a prestação eficiente de serviços é essencial, como por exemplo: fornecimento de fármacos, programas de rastreio, educação e reorganização comportamental para a saúde e estratégias preventivas.

- Avaliação da qualidade dos resultados, clínicos e económicos. Gerir os aspectos financeiros da prestação de cuidados é primordial no processo da gestão da doença. Nesta análise, ao contrário da lógica tradicional de avaliação por partes (custo dos fármacos, dos instrumentos, entre outros), a doença é, de facto, a unidade central da validação dos custos, o que torna a gestão da doença favorável aos sistemas de reembolso por capitação.