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A gestão integrada de resíduos sólidos e o ciclo de vida dos produtos na

PARTE II – GESTÃO DE RESÍDUOS SÓLIDOS 32 

2. A GESTÃO DOS RESÍDUOS SÓLIDOS NA POLÍTICA NACIONAL DE

2.1 Gestão integrada de resíduos sólidos na Lei da PNRS 40

2.1.1   A gestão integrada de resíduos sólidos e o ciclo de vida dos produtos na

A Agenda 21, documento elaborado pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas – ONU, durante a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente no Rio de Janeiro, em 1992, trouxe o ciclo de vida dos produtos como essencial para a gestão dos resíduos:

o manejo ambientalmente saudável dos resíduos deve ir além da simples disposição ou aproveitamento de métodos seguros dos resíduos gerados e buscar desenvolver a causa fundamental do problema, procurando mudar padrões não sustentáveis de produção e consumo. Isto implica na utilização do ciclo vital, o qual apresenta a oportunidade única de conciliar o desenvolvimento com a proteção do meio ambiente.71

Nesse mesmo sentido, Alexandra Aragão declara em nota prévia no Código de Resíduos:

o Direito de Resíduos (em sentido amplo), começará a aplicar-se num momento anterior ao próprio nascimento dos resíduos, ou seja, quando os futuros resíduos ainda são produtos destinados a ser transaccionados no mercado e a ser usados pelo consumidor final, e continuará a aplicar- se até ao momento em que, idealmente, o produto em fim de vida se

70 LEMOS, Patrícia Faga Iglecias. Resíduos sólidos e responsabilidade pós-consumo. 2. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: RT, 2012. p. 50.

transforma em um novo produto, através do processo de reemprego, reutilização ou reciclagem.72

A definição de ciclo de vida do produto, estipulada pela Lei da PNRS, contempla a análise do ciclo de vida, em um momento anterior ao nascimento do produto, ou seja, no momento do planejamento do produto na etapa de desenvolvimento do produto, ampliando a usual análise do ciclo de vida “do berço ao túmulo”,73 que considera o produto apenas depois do seu nascimento, para “da concepção ao túmulo”, pois considera o

desenvolvimento do produto como etapa integrante do seu ciclo de vida. In verbis: “série de etapas que envolvem o desenvolvimento do produto, a obtenção de matérias-primas e insumos, o processo produtivo, o consumo e a disposição final” (art. 3.º, IV).

A perspectiva adotada pela lei é a da gestão de todas as etapas do ciclo de vida dos produtos.

Na etapa do desenvolvimento do produto quando o produto está na fase de projeto, será analisado o seu futuro processo produtivo, sua durabilidade, assim como sua destinação final ambientalmente adequada. De acordo com a Lei da PNRS, os produtos, a partir de agora concebidos, devem ter: processo produtivo sustentável, produto com durabilidade, sem obsolescência programada74e resíduo com viabilidade de reutilização ou reciclável.

Na etapa de obtenção de matérias primas e insumos deve-se buscar reaproveitar os resíduos sólidos no processo produtivo.

72 ARAGÃO, Maria Alexandra Sousa. Código dos resíduos. Coimbra: Almedina, 2004. p. 9.

73 Na linguagem usual dos engenheiros ciclo de vida do produto é chamado de “do berço ao túmulo”. 74 Obsolescência programada significa reduzir a vida útil de um produto para aumentar o consumo. O

Na etapa da produção a Lei da PNRS determinou vários objetivos (art. 7.º):

III – estímulo à adoção de padrões sustentáveis de produção e consumo de bens e serviços;75

IV – adoção, desenvolvimento e aprimoramento de tecnologias limpas76 como forma de minimizar os impactos ambientais;

V – redução do volume e da periculosidade dos resíduos sólidos;

XIII – estímulo a implementação da avaliação do ciclo de vida do produto;

XIV – incentivo ao desenvolvimento de sistemas de gestão ambiental e empresarial voltados para a melhoria dos processos produtivos e ao reaproveitamento de resíduos sólidos, incluídos a recuperação energética.

O art. 3.º da Lei da PNRS define padrões sustentáveis de produção e consumo como produção de bens de forma a atender as necessidades das atuais gerações e permitir melhores condições de vida, sem comprometer a qualidade ambiental e o atendimento das necessidades das gerações futuras.

Na etapa do consumo foram estipulados os seguintes objetivos (art. 7.º):

III – estímulo à adoção de padrões sustentáveis de produção e consumo de bens e serviços

XV – estímulo à rotulagem ambiental e ao consumo sustentável;

75 “Nos termos do Processo de Marrakecch, ‘produção sustentável’ pode ser entendida como sendo a incorporação, ao longo de todo o ciclo de vida de bens e serviços, das melhores alternativas possíveis para minimizar impactos ambientais e sociais. Acredita-se que esta abordagem reduz, prevenindo mais do que mitigando, impactos ambientais e sociais à saúde pública, gerando efeitos econômicos e sociais positivos. Vista numa perspectiva planetária, a produção sustentável deve incorporar a noção de limites na oferta de recursos naturais e na capacidade do meio ambiente para absorver os impactos da ação humana. Uma produção sustentável será necessariamente menos intensive em emissões de gases do efeito estufa e em energia e demais recursos. Disponível em: <http//www.mma.gov.br/responsabilidade-socioambiental/produção-e-consumo-sustentavel/

conceitos/produção-sustentável>. Acesso em: 10 dez. 2013.

76 O conceito de Produção Mais Limpa (P+L) foi definido pelo Programa de Meio Ambiente das Nações Unidas PNUMA, no início da década de 1990, como a aplicação contínua de uma estratégia ambiental preventiva integrada aos processos, produtos e serviços para aumentar a ecoeficiência e reduzir os riscos ao homem e ao meio ambiente. Aplica-se a: processos produtivos – inclui conservação de recursos naturais e energia, eliminação de matérias-primas tóxicas e redução da quantidade e da toxicidade dos resíduos e emissões; produtos: envolve a redução dos impactos negativos ao longo do ciclo de vida de um produto, desde a extração de matérias-primas até a sua disposição final, e serviços: estratégia para incorporação de considerações ambientais no planejamento e entrega dos serviços.

A rotulagem ambiental, de acordo com a Associação de Normas Técnicas (ABNT), é a certificação voluntária de serviços/produtos com qualidade ambiental, que atesta por meio de uma marca colocada no produto ou na embalagem, que determinado produto/serviço (adequado ao uso) apresenta menor impacto ambiental em relação a outros produtos “comparáveis” no mercado.77

O consumidor pode escolher entre um produto que considera o desempenho ambiental ou não. Quando o consumidor adquire um produto rotulado o seu consumo é considerado mais sustentável do que se ele tivesse adquirido um produto sem rotulagem.

De acordo com o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), entende-se por “consumo sustentável”:

Fornecimento de serviços e produtos que atendam às necessidades básicas, proporcionando uma melhor qualidade de vida enquanto minimizam o uso de recursos naturais e materiais tóxicos, como também a produção de resíduos e a emissão de poluentes no ciclo de vida do serviço ou do produto, tendo em vista não colocar em risco as necessidades das futuras gerações.

Incorpora-se o princípio do desenvolvimento sustentável à tutela das etapas de produção e consumo do ciclo de vida dos produtos.

Na etapa da disposição final, deve-se analisar todo o processo, incluindo a

destinação final dos resíduos sólidos, isto é, somente depois de esgotadas as possibilidades de reutilização, a reciclagem, a compostagem, a recuperação energética, entre outras admitidas por lei, a lei permite a disposição final ambientalmente adequada. Essa é a hierarquia imposta pela lei, o “objetivo síntese preconizado pela Lei da PNRS”78 que foi reafirmado como ordem de prioridade no art. 9.º da Lei de PNRS. Nessa etapa, a gestão

77 Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT. Disponível em: <http//www.abntonline.com.br/rotulo/Abnt.aspx> . Acesso em:10 dez. 2012.

78 HIPPLER, Vera Regina. Contornos jurídicos da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida

do produto prevista na Lei 12.305/2010 – Política Nacional de Resíduos Sólidos – repercussões na responsabilidade pós-consumo. Tese (Doutorado) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2013. Termo utilizado pela autora, p. 103.

dos resíduos sólidos objetiva minimizar a quantidade de rejeitos gerados, isto é, estimula a transição do que é rejeito para resíduo sólido.

Rejeitos são os resíduos sólidos que, depois de esgotadas todas as possibilidades de tratamento e recuperação por processos tecnológicos disponíveis e economicamente viáveis, não apresentem outra possibilidade que não a disposição ambientalmente adequada (art. 3.º, XV)

A ordem de prioridade, apesar de rígida e legalmente estabelecida, tem sua força diminuída pelo disposto na definição de rejeitos “esgotadas todas as possibilidades de tratamento e recuperação por processos tecnológicos disponíveis e economicamente viáveis”. O Poder Público pode não observar a ordem de prioridade na destinação final dos

resíduos sólidos e fundamentar na inviabilidade econômica.

Cumpre ressaltar, que a lei da PNRS diferenciou gestão integrada de gerenciamento de resíduos sólidos. A gestão integrada é ampla, contempla a busca de soluções para os resíduos, considerando todo o seu ciclo de vida, o gerenciamento consiste na operacionalização do que foi instituído nos planos de gestão integrada dos Municípios, refere-se às etapas depois que o resíduo sólido foi gerado. A Lei da PNRS define gerenciamento de resíduos sólidos como:

Gerenciamento de resíduos sólidos: conjunto de ações exercidas, direta ou indiretamente, nas etapas de coleta, transporte, transbordo, tratamento e destinação final ambientalmente adequada dos resíduos sólidos e disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos, de acordo com o plano municipal de gestão integrada dos resíduos sólidos ou com o plano de gerenciamento de resíduos sólidos, exigidos na forma desta Lei; (art. 3.º, X)

Antes da Lei da PNRS, o Poder Público limitava-se ao gerenciamento dos resíduos, isto é, serviços de coleta e destinação final dos resíduos sólidos.

Quadro 6. Etapas do ciclo de vida e os respectivos objetivos Etapas do ciclo de vida do produto Objetivos estabelecidos na lei da PNRS.

Desenvolvimento do produto Análise do ciclo de vida do produto que será produzido: produção sustentável, durabilidade do produto, tipo de resíduo gerado depois de consumido.

Obtenção de matérias primas e insumos Reaproveitamento de resíduos.

Processo produtivo Padrão sustentável de produção de bens e serviços, adoção de tecnologias limpas, redução do volume e da periculosidade dos resíduos sólidos.

Consumo Padrão sustentável de consumo de bens e serviços. Consumo sustentável e rotulagem ambiental.

Disposição final Ordem de prioridade: não geração, redução, reutilização, reciclagem, compostagem, recuperação energética, distribuição em aterros.