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O final do século XIX também teve sua palavra de moda: Imperialismo. Hobsbawn (1997) trata do surgimento e do uso da expressão Imperialismo.

Imperadores e impérios eram antigos, mas imperialismo era bastante novo. A palavra (que não ocorre nos escritos de Karl Marx, que morreu em 1883) entrou primeiramente na política na Grã Bretanha nos anos 80 do século XIX, e permaneceu como um neologismo até o final daquela década. Ela explodiu no uso geral na década seguinte. Por volta de 1900, quando os intelectuais começaram a escrever livros sobre o tema, era, para citar um dos primeiros deles, o liberal britânico J. A. Hobson, ―nos lábios de todos... e usado para denotar o movimento mais potente na política atual do mundo ocidental‖. Tratava-se resumidamente de um novo termo dedicado a descrever um

novo fenômeno. (HOBSBAWN, 1997, p. 60)

Lenin (1996) inicia o seu ―Imperialismo: a etapa suprema do capitalismo‖ com a seguinte afirmação:

Durante os últimos 15 ou 20 anos, sobretudo depois da guerra hispano- americana (1899-1902), as publicações econômicas e também políticas do ocidente e do oriente empregam cada vez mais o termo ‗imperialismo‘ para definir a época atual. (LENIN, 1996, p. 9) Da mesma forma pode ser tratada a palavra globalização. As palavras globo, global e globalização não são novas, mas o sentido de um novo termo dedicado a descrever um novo fenômeno é a principal ideia que carrega a expressão globalização nos tempos atuais. Críticos e entusiastas, pessimistas e otimistas escreveram sobre imperialismo e sobre globalização, utilizando-se dos dois termos com expressões de época. As similaridades entre imperialismo e globalização são mais profundas do que apenas entre dois termos usados para designar duas épocas; as descrições sobre os dois períodos são, também, bastante similares12.

As possíveis diferenças entre os dois termos são ideológicas. Imperialismo pressupõe a existência do império enquanto sujeito comandante (imperialista) da economia mundial e de laços de dependência, dominação e subordinação. Globalização pressupõe que o mercado mundial seja sujeito soberano sobre qualquer estado nacional. Hobsbawn (1997, p. 60) afirma que a palavra imperialismo ―foi adquirindo

12 HIRST e THOMPSON (1996, p. 2) pontuam o seguinte: ―A atual economia

fortemente internacionalizada não é sem precedentes: trata-se de uma entre um número de distintas conjunturas ou estados da economia internacional, que existe desde que uma economia baseada na moderna tecnologia industrial começou a ser generalizada desde a década de sessenta do século XIX. Em alguns aspectos a atual economia internacional é menos aberta e integrada do que era no regime que prevaleceu de 1870 a 1914‖.

gradativamente, e parece que não perderá mais, uma conotação pejorativa‖. O autor conclui:

Diferentemente de democracia, que até mesmo seus inimigos gostam de aclamá-la devido às suas conotações favoráveis, ‗imperialismo‘ é comumente algo a ser desaprovado e, portanto, feito por outros. Em 1914, muitos políticos

chamavam-se orgulhosamente de

imperialistas, mas no curso de nosso século, eles sumiram virtualmente de cena.

(HOBSBAWN, 1997, p. 60)

A palavra globalização tornou-se o termo mais útil para o desaparecimento virtual do imperialismo e dos imperialistas no mundo contemporâneo. Não haveria mais imperialismo, mas globalização. O aspecto ideológico aqui pontuado é o de que num mundo globalizado, todos os países seriam independentes e participantes do mercado mundial em igualdade de condições, eles seriam tão somente competidores sob as supremas forças do mercado mundial – eles não seriam mais opressores ou oprimidos. Ao perderem o controle sobre o mercado, suas cidades emergem também como supostas competidoras livres.

Muito mudou em um século de história, mas o imperialismo permanece vivo a despeito de todos os esforços para escondê-lo. Podemos adotar o termo globalização, mas entendemos que esse termo deve ser compreendido como uma expressão camuflada do imperialismo, uma nova roupagem para velhas práticas. Portanto, as análises sobre imperialismo não são obsoletas. Ao contrário, elas podem ser úteis para os estudos do presente período do capitalismo e para a desmistificação de diversos supostos aspectos da globalização.

Um aspecto comum, que é impressivo e atraiu os analistas, tanto do começo quanto do fim do século vinte, é a quantidade de capital disponível nos países industrializados para serem

exportados para outros países13. Tanto no início quanto no final do século XX, a disponibilidade de capital parecia ser sem fim, dando uma ideia de uma acumulação de riqueza ilimitada. Nos dois períodos, a acumulação de capital foi acelerada em comparação aos períodos imediatamente anteriores. Lenin (1996, p.129) afirma que ―no conjunto, o capitalismo está crescendo mais rapidamente do que antes‖. Para o autor, a decadência do capitalismo seria resultante exatamente daquele rápido crescimento. Lenin coloca crescimento e decadência na mesma frase: ―Seria um erro acreditar-se que essa tendência a decair impede a possibilidade do rápido crescimento do capitalismo, isso não acontece‖ (LENIN, 1996, p. 129). Crescimento e decadência para Lenin seriam faces da mesma moeda e um não poderia ser separado do outro e para ele, quanto mais acelerado o crescimento, mais profunda seria a decadência. Em outras palavras, a acumulação do capital é simultaneamente a força e a fraqueza do capitalismo.

Adotando-se a postulação acima enquanto método e não como fórmula, esta tese baseia-se na compreensão de que o principal problema em relação ao período de estudo, a década de 1990, é exatamente o fato de que a acumulação de capital jamais havia se dado tão acelerada e concentradamente e então, sua tendência decadente é mais profunda do que em qualquer período anterior, o que só veio a se expressar mais claramente no final da década seguinte.

Sendo o desenvolvimento relacionado à acumulação do capital, então se faz necessário levar em conta que a acumulação

13 A expressão países industrializados refere-se aos países centrais no capitalismo.

Poder-se-ia, como muitas análises o fazem, considerar que a mundialização da indústria e a desindustrialização de antigos centros industriais não seria mais apropriado fazer-se referência aos países centrais do sistema com tal expressão, que eles seriam pós-industriais. Ellin (1996: 123) rebate a ideia de pós-industrialismo com a postulação de que estaria em curso uma revolução hiper-industrial (hyper- industrial revolution). Detroit, por exemplo, pode não produzir mais automóveis e nem autopeças, mas continua sendo o centro da indústria automobilística das gigantes corporações do setor – o coração e o cérebro da hiper-indústria automobilística, o destino de mais-valia gerada em diferentes partes do globo, concentrando capital disponível para ser exportado.

assenta-se em um contínuo processo de sobre-produção e sobre- acumulação, sob a tendência declinante da taxa média de lucro. Neste sentido, trata-se do desenvolvimento histórico de como o capital, em sua relação com o trabalho, reproduz-se como um permanente e contínuo processo de centralização, concentração e expansão de suas formas produtivas e mercantis14.

A tendência histórica relativa à queda da taxa média de lucro é o que explica porque o capitalismo se desenvolve por expansões e contrações e porque a acumulação do capital encontra um crescente número de barreiras que são postas em seu caminho pela sempre crescente massa de capital, sua concentração e centralização, sua crescente composição orgânica, o que compromete sua lucratividade. A teoria de Marx sobre a acumulação do capital baseada no valor é, simultaneamente, uma teoria geral da acumulação e uma teoria especial de suas crises; elas não podem ser analisadas separadamente15.

14 Acumulação: A acumulação do Capital na obra de Marx adquire uma forma

superior de centralização e concentração. Seria impossível e absurdo tentar sintetizar suas reflexões sobre o processo de acumulação. As referências que são feitas neste capítulo são pontuais e referentes a algumas categorias e leis gerais, que estruturam o modo de produção. Marx, (Capital, livro 3) apresenta a tendência ao declínio da taxa média de lucro como lei: ―A tendência progressiva da taxa geral de lucro a cair é, portanto, apenas uma expressão peculiar do modo de produção capitalista para o desenvolvimento progressivo da força produtiva social do trabalho‖. Ele completa: ―Por maior que seja a simplicidade com que a lei se apresente, depois do desenvolvido até aqui, tampouco toda a Economia até hoje, como se verá a partir de uma seção posterior, conseguiu descobri-la. Ela via o fenômeno e se torturava com tentativas para interpretá-lo. Dada, porém, a grande importância que esta lei tem para a produção capitalista, pode-se dizer que constitui o mistério em torno de cuja solução toda a Economia Política gira desde Adam Smith e que a diferença entre as diversas escolas desde Adam Smith consiste nas diferentes tentativas de soluciona-la‖ (MARX, 1984, p. 164). Um século depois, os economistas continuam, sem sucesso, queimando seus cérebros na busca de uma solução e o processo histórico da política econômica tem sido expresso na luta constante contra essa tendência.

15

Marx, descrevendo as contradições inerentes à lei da tendência à queda da taxa média de lucro afirma o seguinte:

A produção capitalista procura constantemente superar essas barreiras que lhe são imanentes, mas só as supera por meios que lhe antepõem novamente essas barreiras e em escala mais poderosa.

A história do capitalismo, então, deu-se por ciclos de acumulação e crises, ondas expansionistas que atingem ápices, entrando o sistema em declínio até atingir a crise de efeitos recessivos, que é um momento de rearranjos, os quais possibilitam o surgimento de um novo ciclo16. Mas, a relação entre acumulação e crise dá-se não mais em temporalidades sucessivas, a expansão e a crise caminham juntas e, para Santos (2000, p. 33), que define as fases de expansão como sendo períodos, a fase atual seria um período que é uma crise.

Essa foi a evolução comum a toda história do capitalismo. O período atual escapa a essa característica porque ele é, ao mesmo tempo um período e uma crise, isto é, a presente fração do tempo histórico constitui uma verdadeira superposição entre período e crise, revelando características de ambas essas situações.

Para Santos (2000, p. 35), ―então, neste período histórico, a crise é estrutural‖ e as soluções sob o comando dos atores hegemônicos são geradoras de mais crise, que ele assim explica.

A verdadeira barreira da produção capitalista é o próprio capital, isto é: que o capital e sua alta valorização apareçam como ponto de partida e ponto de chegada, como motivo e finalidade da produção; que a produção seja apenas produção para o capital e não inversamente, que os meios de produção sejam meros meios para uma estruturação cada vez mais ampla do processo vital para a sociedade dos produtores. As barreiras entre as quais unicamente podem mover-se a manutenção e a valorização do valor-capital, que repousam sobre a expropriação e pauperização da grande massa dos produtores, essas entram portanto constantemente em contradição com os métodos de produção que o capital precisa empregar para seu objetivo e que se dirigem a um aumento ilimitado da produção, à produção como finalidade em si mesma, a um desenvolvimento incondicional das forças produtivas sociais do trabalho. O meio – desenvolvimento incondicional das forças sociais produtivas do trabalho – entra em conflito com o objetivo limitado, a valorização do capital existente. Se, por conseguinte, o modo produção capitalista é um meio histórico para desenvolver a força produtiva material e para criar o mercado mundial que lhe corresponde, ele é simultaneamente a contradição constante entre essa sua tarefa histórica e as relações sociais de produção que lhe correspondem. (MARX, 1984, p. 189)

16 A passagem da crise de um ciclo para outro ciclo dá-se não em condições ideais,

idílicas, mas convulsivas e, até mesmo muito convulsivas e destrutivas, a exemplo da Segunda Guerra.

Tirania do dinheiro e tirania da informação são os pilares da produção da história atual do capitalismo globalizado. Sem o controle dos espíritos seria impossível a regulação das finanças. Daí o papel avassalador do sistema financeiro e a permissividade dos atores hegemônicos, que agem sem contrapartida, levando ao aprofundamento da situação, isto é, da crise. (SANTOS, 2000, p. 35)

O pensamento relacional remete à conceituação de