• Nenhum resultado encontrado

Glossário

No documento Meditando a Vida (páginas 55-60)

As definições apresentadas foram formuladas com base em aspectos particulares dos ensinamentos budistas e não seria adequado vê-las como definitivas ou completas. De fato o uso das palavras no budismo surge como um remédio para aliviar o sofrimento dos seres, não como uma explicação de como as coisas são ou deveriam ser; portanto, é nesse sentido que as definições são apresentadas.

Buda – título que se dá a um ser que despertou completamente para o potencial absoluto da realidade, em especial o exemplo histórico do Buda Sakiamuni – príncipe Sidarta, o Gautama, que alcançou este reconhecimento cerca de 2600 anos atrás. cinco venenos – raiva/medo, obtusidade mental, desejo/apego, inveja e orgulho. São chamados de venenos porque potencializam os impulsos para as dez ações não- virtuosas, e assim criam todo os sofrimentos da roda da vida.

Dakini – fonte da atividade iluminada do Lama, correspondente ao aspecto Sanga das

Três Jóias. O princípio feminino da sabedoria.

Darma – o ensinamento que surge na mente do Buda de acordo com as necessidades dos seres, de forma a produzir alívio com relação a duka e apontar o reconhecimento da liberdade não-causal.

Darmakaya – o "corpo de vacuidade" do Buda, sem inclinações, mas ainda assim prenhe de todos os fenômenos e possibilidades.

dez ações não-virtuosas – ações que produzem sofrimento. A moralidade no budismo não surge de uma fonte externa, mas da experiência. A lista de dez não-virtudes é um croqui através do qual nos guiamos para verificar se os ensinamentos do Buda realmente trazem alívio e contentamento. Assim, nos abstemos destas ações não porque o Buda pediu, mas porque verificamos por nós mesmos que não produzem felicidade estável. São três as ações de corpo que devemos evitar: tirar a vida, roubar e praticar conduta sexual indevida (adultério, estupro etc). São quatro ações de fala: falar rudemente, difamar (ou comentar atitudes que realmente parecem condenáveis), mentir e falar inutilmente (ou indulgir em distrações e emoções vãs). São três ações de mente: avareza, aversão ou má vontade para com os outros e visão herética (no sentido de aceitar e defender teorias de mundo e doutrinas que produzem sofrimento). Mais amplamente, a heresia suprema é a fixação do javali, que congela a separatividade e atribui significados automaticamente, ocultando a liberdade inata. A ação não-virtuosa de mente correspondente ao galo é avareza, e a correspondente à cobra é a má vontade.

duka – (em páli, dukkha) termo geralmente traduzido como "sofrimento", mas que mais amplamente é a própria complicação inerente à experiência cíclica da roda da

vida. Não é apenas algo desagradável, é também o sofrimento muitas vezes não

percebido, mas implícito na felicidade baseada em condições.

fixação – um evento separativo qualquer. Ela corresponde ao javali e é sustentada e defendida pelos outros dois animais, o galo e a cobra.

identidade – fixação em que há um processo de auto-referência embasado em outras fixações. Desta fixação surge um observador e um mundo que é observado.

Lama – numa primeira abordagem, o professor em carne e osso que manifesta no espaço e no tempo a intenção iluminada atemporal e não-local do Buda. "Lama" significa "insuperável" ou "compaixão materna". Corresponde ao aspecto Buda das

Três Jóias.

Nirmanakaya – o "corpo de compaixão" do Buda, que incessantemente surge para beneficiar os seres. Os mestres reconhecidos como emanações da intenção iluminada do Buda.

Nobre Caminho Óctuplo – o caminho gradual que o Buda ensinou para irmos da experiência de aprisionamento até a obtenção do reconhecimento incessante da liberdade. O primeiro passo é abandonar o refúgio nos três venenos e refugiar-se nas

Três Jóias – ou seja, abandonar a motivação usual de perseguir objetivos que não são

capazes de produzir felicidade duradoura e colocar-se na direção daquilo que realmente pode produzir uma experiência estável de liberdade. Com esta motivação firmemente estabelecida, os três passos seguintes são alcançados naturalmente, já que uma pessoa com tal refúgio não pratica as dez não-virtudes em mente (segundo passo), fala (terceiro passo) e corpo (quarto passo). No quinto passo há uma ampliação desta motivação, que passa a incluir os outros seres. Neste passo o

desenvolvimento das quatro qualidades incomensuráveis e seis perfeições proporcionam destemor e uma inserção adequada no mundo, o que elimina a crise existencial. Os três últimos passos referem-se à prática de meditação: o sexto passo é o desenvolvimento de estabilidade; o sétimo passo é a prática da sabedoria transcendental que aponta em cada evento separativo uma natureza de liberdade; e o oitavo passo é a prática do reconhecimento incessante desta pureza inerente não- separativa, a liberdade não-causal que sempre esteve presente, mas que até então não havia sido reconhecida. O Nobre Caminho constitui a roda do darma. O praticante gira esta roda da melhor maneira que consegue, indo do primeiro ao oitavo passo várias vezes, a cada vez melhorando algum ponto até realizar completamente cada um deles.

Quatro Nobres Verdades – primeiro ensinamento dado pelo Buda, e que caracteriza o budismo como tal. A primeira verdade proclama que experimentamos complicação de tempos em tempos, e que em geral não temos controle sobre seu surgimento. A segunda verdade nos apresenta a origem causal destas complicações, ou seja, que elas são construídas, artificiais. Por serem construídas, e portanto não absolutas, podem ser dissolvidas, e esta é a terceira verdade. A quarta verdade é o Nobre

Caminho Óctuplo, ou seja, os meios de obter a dissolução da complicação.

quatro qualidades incomensuráveis – alegria, amor, compaixão e equanimidade. Elas surgem de uma ampliação da mente que passa a abarcar as necessidades dos outros seres. Alegria é reconhecer o mérito de outros e se regozijar com isto. Amor é fazer de tudo para ampliar estas boas qualidades. Compaixão é entender os obstáculos dos outros seres a partir do ponto de vista deles mesmos, gerando soluções adequadas e permitindo que sua natureza livre aflore naturalmente. Equanimidade é não sucumbir a flutuações, atendendo todos os seres em suas necessidades, independentemente de recompensas ou condições.

refúgio nas Três Jóias – tomar como ponto de referência ou eixo a experiência de liberdade manifestada como o exemplo histórico do Buda; o produto desta experiência na forma de ensinamentos que surgem de acordo com as necessidades dos seres a fim de produzir alívio de todas as formas possíveis, e a comunidade dos seres que se movem na mesma direção.

Rinpoche – "Precioso", título concedido a grandes mestres reconhecidos como

Nirmanakayas.

roda da vida – samsara. A experiência cíclica construída pelos três venenos. Esta roda é caracterizada pelas três marcas: duka, impermanência e a falta de um eixo (ou sentido) para esta experiência de existência. Os seres separativos dominados pelos

três venenos vagam indefinidamente por estas experiências de acordo com as seis emoções perturbadoras, e estas classificam as experiências da roda em seis reinos

correspondentes.

sadana – numa primeira abordagem, um texto que conduz uma prática de meditação específica. Amplamente, o processo pelo qual o praticante alcança o resultado, incluindo indistintamente meditação formal e vida cotidiana.

Sambogakaya – o "corpo de deleite" do Buda, a emanação contínua de formas puras que manifesta a liberdade do darmakaya.

samsara – ver roda da vida.

Sanga – a comunidade de praticantes que se aplicam na prática dos ensinamentos do

Buda.

seis emoções perturbadoras – raiva ou medo; aflição por carência; obtusidade mental e cansaço; desejo e apego; inveja e competitividade; e orgulho e falso contentamento. Elas correspondem aos seis reinos da roda da vida.

seis perfeições (em sânscrito paramita) – generosidade (dana), moralidade ou disciplina (sila), paciência ou paz (kshanti), perseverança ou esforço jubiloso (virya), concentração (dhyana), sabedoria (prajna). O Sutra do Diamante é um controle de qualidade para estas "perfeições", estabelecendo o critério que as define como transcendentes de fato. Por exemplo, o esforço jubiloso transcendente é o que se propõe a beneficiar os seres da forma mais ampla, o que seria divulgar e aplicar os ensinamentos que revelam a liberdade. Um esforço jubiloso pertencente à roda da vida, e que apenas ajude algum grupo de indivíduos de uma forma relativa, por exemplo, não seria considerado perfeição.

seis reinos da roda da vida – ambientes mentais correspondentes às seis emoções

perturbadoras. Eles são o reino dos infernos, reino dos pretas (seres famintos), reino

dos animais, reino humano, reino dos asuras (semideuses) e reino dos devas (deuses). Todas as emoções perturbadoras se manifestam no reino humano, mas a predominante seria desejo/apego, e isso caracteriza o reino humano como tal. Nenhum dos reinos tem existência sólida; porém, os seres que lá se encontram acreditam na solidez de seu reino da mesma forma que usualmente acreditamos neste reino humano.

Três Corpos do Buda – Darmakaya, Sambogakaya e Nirmanakaya.

Três Jóias – Buda, Darma e Sanga, o Buda histórico como o professor ou médico insuperável, seus ensinamentos como um remédio que alivia o sofrimento dos seres, e a comunidade que coloca em prática estes ensinamentos.

Três Refúgios – refúgio nas três jóias.

três venenos – javali, cobra e galo. O javali é usualmente traduzido como "ignorância", mas de fato indica uma fixação que é defendida e sustentada pela cobra e pelo galo. A cobra é muitas vezes traduzida como "aversão", mas de forma mais ampla indica uma defesa enérgica desta fixação. O galo é traduzido como "desejo", mas é um equilibrismo constante, uma atividade incessante de sustentação da fixação na

separatividade. A natureza pura dos três venenos são os Três Corpos do Buda: o darmakaya é a ausência de fixações e ainda a vacuidade que é fonte de todas elas; o sambogakaya é a natureza de sabedoria correspondente aos cinco venenos, e portanto a energia vibrante que emana continuamente do darmakaya; o nirmanakaya é o corpo de compaixão que surge incessantemente para beneficiar os seres que agem sem liberdade perante os três venenos e que portanto não reconhecem sua pureza inerente na forma dos Corpos do Buda.

Yidam – As qualidades do Lama, que naturalmente beneficiam os seres, como inseparáveis das mentes dos praticantes e apresentadas na forma de uma "deidade meditativa". Corresponde ao aspecto Darma das Três Jóias.

Conclusão

Quando os ensinamentos parecem complicados, é importante relembrar o referencial e foco de nossa prática: a compaixão por todos os seres. Praticar compaixão é praticar a mente transcendente, a mente que vai além de nossa prisão do auto- interesse.

O problema da roda da vida não está na identidade virtual que os seres manifestam, mas na limitação da mente no autocentrismo, na prisão do auto-interesse. A compaixão é o antídoto e o exercício de liberdade frente a isto.

Se esquecermos a amplidão natural de nossa mente, nem a compaixão, nem o amor serão possíveis. São qualidades que não se pode praticar isoladamente, são qualidades de amplidão, impossíveis na estreiteza do auto-interesse. Sua Santidade, o XIV Dalai Lama, diz: "Não importa quanto poder ou recursos nos for possível reunir; nossa vida, na ausência do amor, parecerá miserável."

A origem do sofrimento está na estreiteza do foco da mente. A origem da felicidade está na amplidão que a mente possa praticar. Se você praticar apenas um bom coração, sua mente se ampliará rapidamente, e você e todos que o rodeiam sentirão o brilho e frescor da natureza de Buda. Você pode praticar isto a todo momento. Não perder este foco, eis o desafio maravilhoso, a incessante lucidez!

Use a meditação serena, o calmo e nobre sentar, para aprofundar a prática e remover os obstáculos que estiver encontrando. Alegre-se com todos os seres a sua volta, reconheça suas qualidades de liberdade transcendente e relacione-se com estas qualidades. Assim sua vida será prática incessante, e seus olhos se encherão do brilho de gratidão por todos os Budas.

Sempre que você ficar na dúvida frente a tradições, práticas, linhagens, formalidades, exigências, cores e roupas, pense que nenhum ensinamento pode oferecer mais do que reconectá-lo ao reconhecimento de sua própria natureza, da natureza ilimitada de todos os Budas. Reconheça que todas as linhagens budistas surgem do ensinamento do Buda e não vão além dele. E esta natureza ilimitada você já tem! Se estiver muito aflito e tudo parecer impossível, lembre que a própria experiência da roda da vida é construída e, portanto, não é imutável, está sujeita à impermanência. A liberação é possível. A cada momento e a cada brilho do giro da roda podemos,

meditando a vida, reconhecer o ilimitado. Além do mais, quando tudo está perdido, quando nenhum controle funciona mais, nada está perdido. Lembre-se: nossa natureza segue intacta.

No documento Meditando a Vida (páginas 55-60)

Documentos relacionados