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Paz no dia-a-dia

No documento Meditando a Vida (páginas 45-55)

A paz na vida cotidiana pode ser examinada em vários níveis. Num sentido absoluto, paz é iluminação, liberação completa. Enquanto não se obtem essa condição, a paz não é possível. Podemos trabalhar pela paz, avançar em sua direção, mas, enquanto não atingimos a liberação, estamos presos à experiência cíclica – e, por definição, perdemos a paz. Entretanto, mesmo dentro da experiência cíclica podemos ter momentos de paz. Existem ensinamentos que nos auxiliam a aumentar a paz e reduzir a ansiedade.

A primeira coisa que podemos analisar em relação à paz é que se trata de nossa experiência natural, é uma condição não-construída. Não podemos conquistar a paz, pois ela é nossa experiência básica. Podemos perdê-la se surgirem perturbações, mas ganhá-la não faz sentido. Se pensarmos que a paz surgirá por uma boa razão ou sob

condições externas, nunca a encontraremos. Uma vez perdida, a paz só retornará se removermos as perturbações que surgiram.

A paz não surge de um processo lógico sob condições; se nossa paz estiver baseada em argumentos lógicos, não será verdadeira, será uma condição construída e frágil. Por outro lado, todas as experiências de aflição são construídas e surgem sob condições específicas que podemos localizar analiticamente. A análise de nossa situação permitirá descobrir as condições sob as quais perdemos a paz, mas o processo para recuperá-la consiste apenas da remoção de obstáculos – não iremos agregar coisas, mas remover as artificialidades que impedem a experiência original.

Estabilidade condicionada

Quando praticamos meditação silenciosa, podemos entrar em estados de grande serenidade, tranqüilidade e paz. Diz-se que, quando os praticantes chegam a um certo nível, a experiência cíclica, a experiência do mundo, perde o apelo. Porque, quando as pessoas meditam, sentem tamanha paz, serenidade e estabilidade que têm vontade de não retornar a suas atividades. Esta experiência de grande felicidade não é definitiva porque, quando o praticante interrompe a meditação e retorna ao mundo das relações, a sensação acaba.

Pode surgir na mente a idéia de que o mundo está todo errado e de que o melhor seria ficar em meditação incessantemente, separado do mundo, das relações. Esta atitude é um obstáculo, uma interpretação equivocada. Na verdade, o objetivo da meditação é chegar a um equilíbrio que não cesse quando retornamos às atividades. O problema é que não meditamos de forma perfeita. A meditação imperfeita gera estabilidade a partir de estados mentais artificialmente produzidos, mas não há a verdadeira estabilidade, natural e livre de qualquer construção. Deste modo, vê-se que os estados meditativos, por serem construídos, não são a solução para se ter paz. Conseguir manter a meditação estável é muito raro e precioso. E, apesar de frágeis e transitórias, a felicidade e estabilidade condicionadas surgidas da meditação têm efeitos positivos, curativos. Apesar de artificiais, oferecem certa autonomia: até então a pessoa imaginava que a felicidade surgia na dependência de situações externas ligadas ao ganhar e perder, mas agora a vê surgir de uma condição interna, administrável por ela mesma.

Ainda que tenha apenas a experiência condicionada, limitada e impermanente da paz surgida de fatores internos durante a meditação, a pessoa reconhece que, no mundo das experiências cíclicas, no mundo das relações, no mundo em que se ganha e perde, ela nunca teve uma experiência de paz e felicidade com tal brilho e intensidade. Esta experiência, ainda que impura e imperfeita, produz um impulso importante para que o praticante aprofunde a compreensão de seu mundo interno. Seguindo este rumo, mais adiante ele reconhecerá que seu mundo interno é tão grande quanto o universo ilimitado. Não terá mais a experiência de que meditar é delimitar seu interesse ao mundo interno, mas reconhecerá que o mundo interno e o mundo externo são efetivamente inseparáveis e que a compreensão de um leva à direta compreensão do outro. Isto permitirá a ele reconhecer melhor sua condição natural de paz e o ajudará a remover os obstáculos aparentemente externos que justificam a perda da experiência natural de paz.

Três venenos

Entre os ensinamentos do Buda sobre o caminho da iluminação, encontramos o Sutra do Diamante, que aborda os vários paramitas, ou seja, formas de prática espiritual

que podem conduzir à liberação final. O terceiro paramita trata especificamente da paz, tranqüilidade e paciência e dos obstáculos que se interpõem e nos fazem perder esta condição. O texto começa examinando nossas identidades e localiza nelas a origem dos obstáculos.

Quando nos entrincheiramos em nossas identidades, a paz começa a ser perdida. Seria a identidade realmente o problema? É necessário ter consciência de uma identidade para que o problema surja? A resposta talvez seja não. Mesmo seres que não pensam em si mesmos como identidade, ou que não têm consciência clara de seus propósitos, podem perder a paz. Ao examinar esta questão, veremos que existe um nível mais fundamental, onde atuam três componentes que são como venenos que sustentam nossa manifestação.

O primeiro destes venenos é a ignorância. É um veneno básico que toca todos os seres. Ignorância não é propriamente o desconhecer de algo. É uma experiência muito sutil, na qual desenvolvemos as mais variadas fixações sem perceber. Quando operamos numa fixação, todo o universo toma sentido a partir disto. Aplicamos este referencial para definir o que é vantajoso e o que não é.

O segundo veneno é a aversão, a raiva, a explosão, uma espécie de recurso que usamos quando nossa fixação é ameaçada. Quando sentimos a ameaça, entendemos que precisamos de uma energia extra. Esta energia extra gera uma violência, uma ação agressiva. Mas a agressão não acontece se não houver algo a ser defendido. Então deve haver uma definição prévia do aspecto a ser defendido, mesmo que não seja consciente.

O terceiro veneno é a atividade incessante, ligada à sensação de carência, urgência, desejo, apego. A partir de nossa fixação, consideramos que existem elementos que vão nos favorecer e tornar as condições ao nosso redor mais estáveis, de modo que aquilo a que nos fixamos possa ser sustentado mais facilmente e com mais segurança. Assim, estamos incessantemente preparando condições mais favoráveis e tentando remover o que nos traz perigo. A sensação de perigo ou de vantagem surge das próprias fixações.

Veremos exemplos destas manifestações em todas as direções que olharmos. Estes três aspectos são a microestrutura de nossa identidade, que só surge se houver fixações. Junto com as fixações temos a possibilidade de explosão e a atividade incessante que busca produzir estabilidade sem explosão. Com base nisto cada um de nós pode avaliar melhor o que anda fazendo em sua vida e quais as causas de suas dificuldades e instabilidades.

Fixações

As fixações podem ser mentais, emocionais e físicas. Curiosamente, nem sempre elas estão de acordo. Por exemplo: estamos numa palestra, e a mente está atenta. Mas para o corpo há um incômodo, um desconforto, uma impaciência crescente. O nível emocional não está definido. De repente a emoção pergunta ao corpo: “Você está interessado, ou está desistindo?" O corpo diz: “Isto não lá é muito interessante”, mas a mente retruca: “É interessante sim, vamos aguardar um pouco mais.” Aí o corpo reclama: “Mas sou eu que estou sofrendo, você está só ouvindo.” Temos diferentes fixações neste diálogo, é como se fossem diferentes identidades. Todos os seres passam por este processo incessantemente.

Quando analisamos nosso cotidiano, vemos que de modo geral estamos muito ocupados. E nossa ocupação está sempre ligada a alguma fixação. Podemos ter optado pela fixação ou não. Simplesmente vamos em frente, e a vida segue. Não

temos propriamente a decisão de andar numa determinada direção. Também pode acontecer o contrário: fizemos o vestibular e estamos cursando a faculdade; houve uma decisão em certo momento. Quando a decisão torna-se ação, sentimo-nos vivos, tudo faz sentido, temos a experiência de viver.

Ao olharmos para o passado, vemos que já tomamos várias decisões, seguimos objetivos quase que cegamente, mas em certo momento tudo se desfez. Quando isto aconteceu, tivemos uma experiência próxima da perda de identidade, um colapso, parecia que a vida não era mais possível. Então elegemos novos referenciais e recomeçamos a nos movimentar. Aí respiramos – parecia estarmos vivos de novo. E seguimos novamente. Lá pelas tantas, os novos objetivos também se dissolvem, nossa identidade entra em outra crise, passamos por um bardo, ou seja, um estado intermediário, não sabemos bem o que queremos, nem para onde vamos. Na seqüência, tudo se reestrutura, ganha novo sentido, e vamos andando.

Quando em movimento, estamos sob domínio das emoções perturbadoras – orgulho, inveja, desejo/apego, obtusidade mental, carência e raiva/medo. Sem isto, não parece que estejamos vivos. Quando estamos em marcha, aparecem obstáculos. O próprio andar impede a paz. Quando interrompemos o andar por um obstáculo, ocorre a defesa explosiva e, com ela, a sensação de amargor, sofrimento, ansiedade, luta. Aí dizemos que há sofrimento ou que a paz desapareceu. Estas situações ocorrem ciclicamente.

Quando saímos de uma situação, quando os referenciais e os mundos deles surgidos se dissolvem, entramos num estado intermediário e depois renascemos em outra condição. Não temos a experiência de que o renascer seja uma perda de paz, de que a fixação em novos referenciais seja uma perda de estabilidade. Ao contrário, imaginamos que é isto que nos trará nova estabilidade. Usualmente só achamos que a paz se foi quando ocorre a explosão. Mas, quando fixamos novos referenciais e nos colocamos em marcha, a paz já está comprometida. Isto significa que estamos presos ao que chamamos de experiência cíclica, onde as coisas surgem, caminham por um certo tempo, se estabelecem e depois se dissolvem. Como não temos esta noção, pensamos que a fixação nos referenciais e na atividade incessante é algo favorável, perfeito. Não suspeitamos da impermanência.

Sob domínio da impermanência

Precisamos entender que, quando fixamos referenciais e nos colocamos em marcha, ficamos sob domínio da impermanência. Mais dia, menos dia, aquilo que construímos, aquilo em que nos fixamos, vai se mover. É o que o Buda chama de experiência cíclica. Ou seja, iniciamos num ponto, fazemos tudo crescer e num certo momento aquilo volta a se dissolver e a produzir uma experiência de sofrimento, ansiedade, dor.

Olhamos os seres ao nosso redor e as circunstâncias concretas em que estamos imersos a partir de nossas fixações. Quando surgem as dores, sentimos como se viessem de fora. Se estamos num jogo de futebol, não pensamos que a dor vem de estarmos fixados no campeonato. Pensamos que a dor vem porque o adversário fez um gol. Então temos alguém para culpar, temos um adversário. O fato de estarmos num campeonato pressupõe vitória e derrota. E é assim em tudo.

Se temos fixação por resultados e nos movemos incessantemente para produzir o que consideramos favorável, não entendemos que isto seja um problema. Achamos que as circunstâncias externas não foram suficientemente favoráveis para que tivéssemos êxito. Desejamos que as circunstâncias externas se transformem e fazemos um esforço incessante para que isto aconteça.

Os seres humanos estão sempre mudando alguma coisa em suas vidas. Tentamos mudar as coisas concretas ao nosso redor. Erguemos cidades, destruímos florestas, construímos estradas e unidades fabris, e acreditamos que precisamos de mais e mais circunstâncias favoráveis.

Também tentamos transformar a nós mesmos o tempo todo, buscamos outras aptidões e novas qualidades. Tentamos transformar os filhos, a esposa, o marido, todos que convivem conosco. Todas as coisas são vistas como favoráveis ou desfavoráveis. Sentimo-nos bem, sentimo-nos mal, sempre na dependência destes fatores.

Temos uma espécie de impermanência interna. É como se trocássemos de time de quando em quando. A pessoa torce pelo Atlético, de repente muda para o Coritiba. E aí tudo fica ao contrário: antes ela queria que todos torcessem pelo Atlético, agora pode até tornar-se inimiga dos antigos companheiros. Vivemos num incessante processo interno de transformação de referenciais. Na medida em que eles se transformam, olhamos ao redor com olhos diferentes, e isto produz sofrimentos correspondentes.

Referenciais

A perda da paz está intimamente relacionada aos referenciais que elegemos ou ao fato de elegermos referenciais. Quando os elegemos, surgimos como identidades. É um processo mental. Mas podemos também operar diretamente no nível da emoção. Podemos gerar apegos emocionais a circunstâncias, locais, atividades e pessoas.

Quando estamos fixados, parece que aquilo é cósmico, que sempre foi assim. Se é em relação a uma pessoa, dizemos: “Certamente eu a encontrei em outra vida, ou em muitas vidas anteriores." Pode ser verdade, mas nem sempre esta conexão tão forte é favorável. Quando isto se estabelece, podemos passar a viver em função do outro. Podemos nem nos dar conta claramente do processo, mas, quando o outro se aproxima, nossos nervos detectam. Respiramos mais fácil, ficamos mais alegres. Quando o outro vai embora, respiramos pior, ficamos meio deprimidos.

Se o outro nos abandona, é uma grande tragédia, porque nossa experiência de energia interna está na dependência daquela presença. É como se não soubéssemos viver, experimentamos uma dor incessante por dentro, pode até surgir uma dor física. Ficamos tão deprimidos que nem conseguimos respirar. Isto porque a energia tomou como referencial um aspecto condicionado, então passa a funcionar desta maneira. De modo geral os namorados passam por esta síndrome. É uma situação grave. Não é um referencial lógico, é um referencial energético. Não é em nível de pele, mas em nível de energias, é interno. Quando aquele ser maravilhoso está próximo, temos uma condição de energia em que tudo parece fácil. Quando o ser se afasta, tudo parece difícil e penoso, e ficamos deprimidos. Não é uma depressão lógica, do tipo: estou com problemas; portanto, estou deprimido.

Os namorados vivem um dentro do outro. Exercem seu efeito num nível sutil. É outro tipo de referencial, outro tipo de fixação. Esta fixação dá origem a outras. Transcende o aspecto mental, lógico, e se manifesta como uma energia. Mas, quando não olhamos para isto de forma exata, podemos cair em algumas armadilhas. Entre estas está o fato de pensarmos que estamos namorando a outra pessoa. Na verdade estamos namorando nosso estado energético. Ficamos fixados a uma energia interna. Se a energia está presente, achamos ótimo. Se a energia não está presente, ficamos mal. Descobrimos que a energia está presente se o outro está próximo.

dentro de mim.” Na metade do namoro constatamos: “Às vezes aquilo está presente quando o outro está comigo, às vezes não.” No final do namoro, é o contrário: “Quando o outro está presente, a energia não está.” Como temos uma fixação pela energia, dizemos: “O outro passou.” Aí nossos radares vasculham em volta. De repente, localizamos algo, e a energia surge: “Agora sim!” Aquilo funciona por um tempo, depois tem um período médio e por fim há uma fase de sofrimento, e fica tudo ao contrário. O ser que antes tinha aquele poder hoje passa perto e nada acontece. Mas ele continua com uma aparência muito semelhante. E aquelas fotos que produziam efeito agora não produzem mais. Isto diz respeito à ingenuidade em relação aos referenciais internos.

Quando temos uma relação de proximidade, é bom que o referencial interno seja apenas um adorno. Porque, se for a base da proximidade, talvez esta não dure muito. Porque, do mesmo modo que não sabemos como isto começou, não sabemos por que irá terminar. Quando surge o magnetismo, a eletricidade, dizemos: “Por que eu quereria paz, se tenho esta eletricidade maravilhosa?” Quando ela se inverte, dizemos: “Eu gostaria de ter paz, mas é impossível.” O fato é que todo este processo começa quando geramos fixação por certo tipo de referencial – neste caso, um referencial ligado a uma eletricidade interna, a um estado de energia interna.

Referenciais de corpo

Além das fixações mentais e emocionais, existe um terceiro tipo, que se manifesta perto do meio-dia. A pessoa passa a mão pelo estômago e se pergunta: “O que teremos para o almoço hoje?” Aí pensa: “Batatas fritas!” E imediatamente ela saliva. Ela também pode lembrar: “No sábado vai ter churrasco. Vamos comer e beber do meio-dia à meia-noite.” Só de pensar naquilo surge um condicionamento no corpo: brota saliva, todas as glândulas cooperam automaticamente. A pessoa diz para o estômago: “Sim! Sim!” É ele que comanda. E aí surgem várias sensações. Podemos ser comandados pelo estômago ou por qualquer parte do corpo, sejam elas dignas ou não. Todas produzem fixações, referenciais que produzirão resultados.

Tomemos como exemplo o que poderia acontecer se um inseto pousasse em nossa pele enquanto meditamos. Estamos sentados em meditação, pensando: “O Buda tem razão, estou iluminado, que serenidade!” Aí o Buda se transforma num mosquito que voa ao redor, e a serenidade se evapora. O mosquito pousa bem perto do olho, e não podemos permitir tamanha invasão. No entanto, fizemos voto de não nos mexermos. Para o corpo, aquela microagulha que penetra a pele é intolerável. Sentimos o peso do mosquito, e depois o vôo pesado dele. Esta fixação surge no nível do corpo, não é um processo intelectual. A emoção pode vir, mas essencialmente é o corpo invadido que vai produzir a fixação.

Eventualmente podemos ter competição entre os vários referenciais. O corpo deseja uma coisa; a emoção, outra; e a mente, uma terceira coisa. Estes níveis operam quase que independentemente, às vezes em conjunto, às vezes em oposição. Quando as fixações são definidas, não temos a sensação de que estejamos entrando numa área de perigo. Achamos completamente normal. Pensamos: isto é viver, é assim mesmo.

Elegemos fixações de forma consciente ou não, e elas parecem o exercício de uma liberdade completamente natural. Mas são elas que geram condições que fazem nossa paz desaparecer. A partir daquele momento, a paz só será possível se as fixações não forem perturbadas, se permanecerem satisfeitas – e às vezes elas são contraditórias. A mente pode determinar: “Não coma açúcar”, mas o corpo pede: “Quero chocolate.” Aí a emoção diz: “Você não vai me deprimir, não é mesmo? Olha

que eu fico deprimido... Dê-me um pouco de açúcar.”

É muito difícil encontrarmos equilíbrio a partir dos referenciais, mesmo que sejam apenas internos. Por isso o Buda enunciou a primeira nobre verdade: todos os seres têm a experiência de duka. Ou seja, quando estão alegres, é uma preparação para o sofrimento; quando sofrem, é a condição de vida. É como se a harmonia não fosse realmente possível. Como a harmonia não é possível, existe um segundo tipo de sofrimento, que vive do próprio sofrimento. Sofremos por razões objetivas e também porque não queremos sofrer. Sofremos porque gostaríamos que a harmonia fosse possível. Elegemos a harmonia como fixação. E a perseguimos a vida inteira.

Oscilações

Quando perseguimos a harmonia, podemos viver seis experiências distintas. Na primeira, a harmonia parece possível. Na segunda, descobrimos que existem seres que têm mais harmonia que nós, e isto nos perturba. Na terceira, olhamos para os seres mais harmônicos e constatamos: “Certo, você tem mais do que eu, tem uma vida maravilhosa. Para ter isto eu precisaria de...” Aí vem uma lista de requisitos, de coisas que precisamos transformar ou adquirir. No quarto tipo de experiência, a pessoa desiste de ter harmonia. Ela afirma: “Vou esquecer esta situação, vou esquecer todos os problemas. Vou me defender esquecendo.” Então esquece tudo e gera uma mente obtusa, desconectada. No quinto tipo, a pessoa fica desesperada porque falta alguma coisa. No sexto tipo, ela desiste de vez e diz: “Ok, todos são terríveis comigo. Também serei terrível com eles.” Neste estágio a harmonia não é mais o objetivo; ao contrário, a pessoa quer provar que ela não é possível e, quando vê alguma coisa funcionando, vai lá e a sacode.

Oscilamos por estas seis formas de emoção. Inicialmente, gostaríamos que a harmonia fosse possível. Esta é a grande dificuldade. Fazemos esforço a vida inteira, por vidas incontáveis, tentando encontrar a felicidade estável. Mas, como o que chamamos de felicidade depende de fatores específicos, a felicidade é fugidia. Às vezes conseguimos, às vezes sofremos profunda decepção. Isto porque os fatores são impermanentes, flutuantes. E assim nossa felicidade nunca é possível. Logo, a paz não se torna possível. E vida após vida perseguimos isto.

Todas estas circunstâncias decorrem de elegermos referenciais específicos, a partir dos quais consideramos: “Só posso ser feliz se...” Temos referenciais de mente, emoção, corpo e de energias internas.

A noção de refúgio pode brotar quando entendemos esta situação cíclica, de impermanência interna e externa. Dizemos: “Eu gostaria de tomar por referencial

No documento Meditando a Vida (páginas 45-55)

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