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Superação de crises

No documento Meditando a Vida (páginas 37-45)

A resolução de conflitos é um tema tradicional no budismo. Todos os ensinamentos tratam basicamente disso, da superação de obstáculos através da percepção da liberdade da mente. Os oitos passos do Nobre Caminho ensinado pelo Buda são o processo padrão para se resolver conflitos. Temos conflitos de várias ordens, e a única forma de realmente resolvê-los são os oito passos do Nobre Caminho.

A percepção da liberdade da mente pode se manifestar como resolução de conflitos, o que está ligado à mudança de paradigma. Na verdade o termo paradigma não é abrangente o bastante para dar conta do que acontece, mas tem sido usado neste sentido.

Em seu primeiro ensinamento – as Quatro Nobres Verdades –, o Buda menciona a roda da vida. A primeira nobre verdade é: “Estamos presos a uma experiência cíclica”, ou seja, estamos presos na roda da vida.

O Buda fala sobre duka, a experiência cíclica na qual alegria e sofrimento são inseparáveis. Seu objetivo não é nos fazer pensar que não existe saída. Pelo contrário! Se abordarmos a roda da vida de forma elevada, perceberemos que toda experiência é criada pela liberdade da mente. Se usarmos a liberdade da mente,

poderemos cruzar naturalmente por dentro da roda da vida. Ao falar da experiência cíclica, o Buda fala de um jogo mental que montamos e de nossa capacidade de criar jogos, circunstâncias, mundos.

No ensinamento básico sobre a roda da vida, vamos tratar apenas de coisas depressivas, difíceis. O objetivo é que acordemos para uma situação grave. Dentro da atual perspectiva que temos de nós mesmos, a experiência da roda da vida é catastrófica. Não importa em que ponto estejamos hoje, inevitavelmente tudo o que tentarmos sustentar irá desabar. O Buda nos alerta para isso. É como se tivéssemos entrado em um túnel inacabado, bloqueado. O Buda nos avisa que o túnel não tem saída.

Não foi o Buda quem criou a obstrução, ele é nosso aliado. Se nossa ação mental e nossa ação no mundo forem estreitas, inevitavelmente colheremos a impermanência. Este é o ensinamento do Buda, que diz: “Observe, veja se alguma coisa que você está fazendo tem alguma chance de não ser impermanente.” Se olharmos com atenção, perceberemos que tudo que vivenciamos é marcado pela impermanência. Apesar disso, a primeira nobre verdade tem um sentido libertador. Ela remove nossa culpa. É bom lembrarmos que todos os seres estão submetidos à impermanência. Quando a desgraça desaba sobre nós, sofremos dois impactos. No primeiro constatamos: “Isso realmente aconteceu.” No segundo concluímos: “Sou um fracasso.” No entanto, compreendendo a primeira nobre verdade, lembrando que todos os seres estão submetidos a estas circunstâncias e não têm como conter a impermanência e as dificuldades, nos damos conta de que não há por que desenvolver uma culpa pessoal; esta é uma situação que afeta todos os seres.

Desabamento

A cada dez anos, mais ou menos, nos defrontamos com determinadas perguntas: “Quem sou? Onde estou? Para onde devo ir?” De tempos em tempos nosso mundo desaba, e não sabemos o que fazer. Temos a sensação de que morremos, o universo desabou; ainda assim, após um tempo, ressurgimos naturalmente. Saímos do buraco e dizemos: “Certo, agora sou mais experiente, mais esperto. Aprendi.”

Depois de cada crise a pessoa se julga mais esperta, experiente e capaz de definir a direção correta, mas o processo de desabamento e recomeço segue se repetindo. Lá pelo quinto grau de esperteza, depois de 50 anos tentando acertar, a pessoa pergunta: “Quanto tempo ainda me resta?” Talvez nesta hora finalmente peça ajuda ao Buda.

Quanto antes pedirmos ajuda ao Buda, melhor. Cada vez que tentamos estabilizar algo não estabilizável, encontramos uma descontinuidade um pouco adiante. Quando a descontinuidade surge, nós a chamamos de crise.

No budismo, todas as crises são bem-vindas. São circunstâncias que a pessoa deve aproveitar. O budismo ensina como lidar com isso, como se comportar em meio às crises para que estas não sejam vistas como tal. Além disso, os ensinamentos indicam como agir para para diminuir as possibilidades de que as crises ocorram e a vida humana preciosa possa ser preservada.

Absoluto e relativo

As crises podem ser vistas de modo absoluto e relativo.

nenhuma crise será possível. Nossa natureza encontra a liberdade frente às circunstâncias, a liberdade natural que não manifesta rigidez nem no próprio ideal de liberdade. Se reconhecermos isto, estaremos livres de crises.

Nossa natureza essencial simplesmente não entra em crise. As crises só se dão no âmbito das identidades, no âmbito das percepções relativas. Nossa natureza essencial nunca entra em crise, isto acontece com as identidades impermanentes que montamos. São identidades separativas, vivendo em meio a paisagens mentais ou materiais também impermanentes. Não temos como conter o processo de mobilidade que leva inevitavelmente ao desabamento.

Se nossa natureza reconhece que estamos além das circunstâncias, se ela se reconhece livre das circunstâncias – como a natureza divina, luminosa, a natureza de espacialidade, de Buda –, estamos livres de qualquer crise. Este é o aspecto absoluto que nos impede de entrar em crise.

Existem métodos relativos, duais, para reduzir as crises. São métodos que usamos com nossas identidades separativas. Como a dualidade permanece, não é possível erradicar as crises, mas elas podem ser reduzidas. Tanto na abordagem absoluta como na relativa, temos de entender como as crises são montadas e evitar os fatores que as desencadeiam, seja pela visão transcendente, absoluta, ou pela visão dual, relativa.

Complicações

Os problemas começam quando fixamos identidades, aspectos que não queremos de modo algum que se movam. Podemos criar fixações através de seis motivações básicas: orgulho, inveja, desejo/apego, obtusidade mental, carência e raiva/medo. São as seis motivações mentais através das quais estruturamos identidades.

Usamos estas motivações em diversas combinações, e isto produz impulsos. Logo depois surgem as complicações, porque os impulsos geram as dez ações não- virtuosas. Temos impulsos para matar, roubar, manter conduta sexual imprópria, mentir, agredir os outros verbalmente, criar intrigas, falar inutilmente, ensinar coisas indevidas, sentir aversão a outros seres e manifestar avareza. Se praticamos estas dez ações, nossa vida se complica, ficamos cercados de inimigos e circunstâncias difíceis.

Se temos a percepção última, absoluta, naturalmente não vamos praticar as dez ações não-virtuosas, nem manifestar as emoções perturbadoras. Estamos liberados. Não haverá mais crises. Se não temos a percepção absoluta, se não atingimos a liberação, inevitavelmente vamos trabalhar com as emoções perturbadoras e cometer ações não-virtuosas.

Neste caso, devemos utillizar um método relativo para evitar as crises. Este método consiste em evitar ao máximo a prática das dez ações não-virtuosas. Não se trata de uma regra externa imposta sobre nós. Trata-se de um compromisso conosco mesmo, de evitar as dez ações por saber que trazem sofrimento e complicam nossa vida e a dos demais. Assim, mesmo que nossa mente opere apenas de forma limitada e as circunstâncias do mundo desabem sobre nós, lidamos com as crises direcionando positivamente nossas emoções e ações.

Mestre irado

Na roda da vida, existe um ser terrível, cheio de dentes, unhas enormes, enrolado numa pele de tigre, de aparência horrível, chamado Senhor da Roda da Vida, Yama,

ou Maharaja, ou ainda Mara. Ele personifica todas as nossas complicações. De tempos em tempos, Maharaja aparece como o vizinho do andar de cima, o chefe, o guarda de trânsito, o ex-marido. Nós o personificamos, nós criamos esta noção.

O que significa a personificação das dificuldades? Vemos as dificuldades na pessoa que está à nossa frente, não lembramos que aquela mesma pessoa era um amigo inseparável há um tempo.

No budismo é essencial que nos demos conta do papel de Maharaja. Ele tem uma especialidade: pôr o dedo em cima de nossas fixações. Se temos uma fixação, temos um dedo de Maharaja; duas fixações, dois dedos; três fixações, três dedos; e assim por diante. Maharaja é melhor que computador, tudo está gravado em sua memória, e não acontece pane, o sistema sempre funciona. Ele nos dá um tempo, mas, cedo ou tarde, vai em cima de cada uma das fixações.

Podemos dizer que Maharaja é um grande mestre, um mestre benigno. Ele apaga todas as nossas complicações. Mas também dizemos que é um mestre irado. Maharaja nunca perdoa, põe o dedo em cima de qualquer imperfeição, aponta e cobra. Não adianta camuflar os defeitos, Maharaja sempre os descobre.

De modo geral, camuflamos as ações ruins no meio das boas, misturamos coisas boas com ruins. Fazemos com que as coisas boas sejam um pouquinho maiores, e as ruins – aquelas que não queremos mexer – vão junto. Envolvemos tudo num pacotão dourado e vamos puxando. Maharaja sempre dá um jeito e põe o dedo só naquilo que não serve, salvando as coisas boas. Ele é perfeitamente justo.

O que significa ação equivocada, o que significa erro? Fixação. O problema surge onde perdemos a liberdade. Se temos fixações, iremos nos defrontar com elas quando a impermanência se manifestar. Aquilo que não queremos que mude vai mudar, e a dor correspondente vai surgir. O que é flexível não produz dor, pois permitimos que se altere. Onde temos compreensão e lucidez, não existe dor. Onde temos fixação, o movimento produz dor. Este é o processo.

No meio disso temos a sensação de que Maharaja está presente, as desgraças estão presentes. Se percebermos que Maharaja está apontando as regiões de fixação e se formos capazes de olhar esse ensinamento, poderemos aprender. Ele precisa nos ensinar de alguma forma. Como ele vai parar nossa ação? Como vai frear nosso processo de loucura?

É como uma criança que não sabe o que fazer e a mãe diz: “Vá lá brincar com seu joguinho.” Quinze minutos depois a mãe diz: “Venha almoçar, depois escove os dentes e vá para o colégio.” Para a criança, a mãe é Maharaja quando acaba com a diversão. Se isto acontece com uma coisa completamente virtual, o que ocorre quando Maharaja chega e diz à mãe: “Este mês você não vai receber seu pagamento.” A mãe ouve aquilo, e a situação parece muito concreta. Como ela vai pagar as contas no final do mês?

As coisas para nós parecem todas muito concretas, da mesma forma que para as crianças. Os mundos são todos muito concretos. Essencialmente, Maharaja vai apontar o dedo sobre aquilo que não queremos nem pensar que, eventualmente, possa se modificar.

Saída

Você seria capaz de fazer uma lista do que não gostaria de pensar que eventualmente possa mudar? Todos nós temos pelo menos uma dúzia de coisas que não queremos que aconteçam de jeito algum. Estamos na mão de Maharaja. É provável que cada

uma das coisas que não queremos que se mova venha a se alterar um dia. É uma situação muito difícil. Chegamos a ficar um pouco tontos quando repassamos os itens de nossa lista de fixações. Procuramos uma saída, e ela aparentemente não existe. No mundo condicionado não temos como evitar a dissolução das coisas construídas. Esta é a primeira nobre verdade.

Mas nossa natureza está além dessas circunstâncias. O príncipe Sidarta percebeu isso. Na quarta vez que saiu de seu palácio, ele encontrou um monge. Então deu-se conta de que a liberação era possível, de que havia uma linhagem de seres que ensinava como alcançá-la. Sidarta percebeu que aquele era o único caminho a seguir. Existe o caminho monástico, mas existe também o caminho da prática na vida cotidiana. Em meio à nossa vida, podemos atuar de forma livre, reconhecendo a ação de Maharaja, mas reconhecendo que nossa natureza é maior do que as circunstâncias que ele possa produzir. O ensinamento do Buda afirma que existe uma saída e que nem sempre esta saída está no lugar onde esperamos. Como achamos que ela estará em uma determinada direção, não vemos as possibilidades das outras direções.

O Buda não trouxe uma mensagem pessimista, de tristeza, de incapacidade. Ele veio nos livrar disso. Não foi o Buda quem inventou a depressão. Ele apresentou a forma pela qual vamos superá-la.

Se formos capazes de olhar para nossas dificuldades e reconhecer a ação de Maharaja como a manifestação da impermanência naquilo que não queremos que se modifique, poderemos localizar nossa rigidez, nossas construções. Esta é a primeira forma de utilizar a adversidade – existem outras mais sutis.

Devemos seguir a sugestão de Sua Eminência Chagdud Tulku Rinpoche: aprender a nadar antes de cair no rio. Se cairmos no rio antes de saber nadar, será mais difícil aprender. Devemos aprender a reconhecer a natureza de liberdade mesmo em meio à adversidade. Quando tudo aparentemente desaba, o que fazemos? Como reconhecer no meio do desabamento a natureza que não desaba? Este é o ponto.

Se não percebemos a natureza da liberdade quando estamos numa situação mais ou menos confortável, é mais difícil ainda quando tudo desaba. Por isto é necessário reconhecer e treinar esta liberdade de tal maneira que, quando as circunstâncias mais difíceis acontecerem, haja lucidez para operar no meio delas. Este ensinamento se relaciona às quatro etapas finais do Nobre Caminho Óctuplo.

Delusão

Na quinta etapa do Nobre Caminho Óctuplo vamos perceber que nossa mente é mais ampla do que nossa identidade, e isso oferece outra perspectiva frente às ansiedades, circunstâncias negativas e crises. A crise pode simplesmente desaparecer quando se dá um “salto quântico”. Como isso acontece?

Vamos supor que exista uma locadora onde os filmes estão classificados de acordo com os seis reinos – deuses, semideuses, humanos, fantasmas famintos, infernos e animais. Tiramos uma fita do reino dos infernos. É sucesso garantido! Ao assistirmos o filme, teremos os impulsos correspondentes ao reino dos infernos – medo, aversão, raiva. Terminado o filme, retornamos às circunstâncias comuns de nossa vida.

O que aconteceu no filme que nos fez sentir aquela angústia? Sentimos angústia e raiva porque ficamos dentro de um tipo de operação mental. Não dá para culpar a televisão, as cores, riscos, imagens e sons que apareceram ali, porque a raiva não estava ali, o medo não estava ali. Não estávamos ligados a um cabo que nos trazia o medo através de uma polaridade elétrica. O filme apenas fez surgir o que já estava

dentro de nós. Aquelas emoções estavam latentes, tínhamos tudo preparado. Se examinarmos a tela depois do filme, veremos que ela continua igual, não tem nada lá. No filme havia fogo, mas a tela não está chamuscada. Havia tiros, mas a tela não está furada. Onde tudo aquilo ocorreu? Onde todas aquelas emoções ocorreram?

Aquilo tudo ocorreu dentro de uma paisagem, de um universo mental que validou aquelas circunstâncias. Achamos que isso só acontece num filme, mas não é verdade. Quando começamos a estudar, vemos que o universo onde nos movimentamos é um universo de delusão. Temos uma natureza cármica que escolhe as opções de marcas mentais de que dispomos e nos oferece uma experiência emocional e uma experiência cognitiva junto com a aparência que as coisas então adquirem. Isso não é um fenômeno que só acontece no cinema, é algo que acontece em nossa vida.

A arte talvez seja uma linguagem a ser explorada no Darma, porque proporciona experiência. A experiência não está dentro do objeto de arte; o objeto apenas permite que vejamos diretamente o que está dentro de nós, o nosso conteúdo. Toda forma de arte é um espelho que revela direta e palpavelmente o que temos de marcas e carmas.

Natureza liberta

Começamos a avançar sobre a sexta e a sétima etapa do Nobre Caminho quando reconhecemos que o mundo que estamos vendo é exatamente isso – o mundo como nós o vemos! O mundo surge inseparável da experiência de “eu”. Quando digo: “Eu surjo”, o mundo surge junto. Se a cada dez anos mudamos nossa identidade, a cada dez anos o mundo também muda. Se olharmos fotografias, elas serão diferentes agora. Se olharmos livros, eles serão diferentes. Lembramos das pessoas, e elas também são diferentes. Temos impulsos diferentes, compreensões diferentes, e tudo se torna efetivamente diferente.

Por que as coisas ficam diferentes? Porque são inseparáveis de nós; quando mudamos, as coisas mudam. Essa percepção é essencial no budismo, sem ela não há liberação.

Para haver uma crise, é necessário acreditarmos que as circunstâncias nas quais elas acontecem são completamente rígidas, fixas. É preciso acreditarmos que aquilo é como é. Não percebemos que as coisas são inseparáveis da forma como nós mesmos surgimos. Se surgimos dentro de nossa natureza ilimitada, a crise cessa instantaneamente, seja ela qual for. Mesmo a morte cessa, a experiência de morte cessa, ainda que o corpo morra.

Este é o ponto essencial. O Buda aponta para o reconhecimento desta liberdade. Então, quando voltamos para nossa crise, ela parece estreita. Parece a crise de uma criança cujo doce caiu no chão.

O exemplo do Buda foi receber a ação de Mara e compreender a liberdade que havia dentro da circunstância que ele estava vivendo. O Buda sentou sob a árvore bodhi e disse a Mara, o Senhor da Roda da Vida: “Vou derrotá-lo!” Então surgiram exércitos e coisas completamente inauspiciosas, que se dirigiram ao Buda para atacá-lo. Isto corresponde a todas as possibilidades, incertezas e aflições que ele pôde localizar dentro de si. É como se olhássemos para nossa lista de coisas que nem queremos pensar que possam eventualmente desabar e ameaçássemos Mara, dizendo: “Vou derrotá-lo!” O que vai acontecer? É certo que ele vai atacar nossa listinha.

Quando Mara atacou a lista do Buda, ele já estava livre dela. O Buda transformou o ataque de Mara em flores e perfumes. Ele olhou aquelas coisas e pensou: “Estou livre disso! Minha natureza é mais ampla, minha identidade se dissolveu, as fixações se

dissolveram. A natureza ilimitada não pode ser alcançada por isso!” Não foram apenas pensamentos, foi a experiência da natureza ilimitada.

E assim, um por um dos ataques de Mara transformou-se no ornamento da experiência da natureza liberta. Este é o ensinamento do Buda – um ensinamento sobre como viver as crises. Ele atingiu a iluminação não por ter encontrado um mestre que dissesse: “Vou lhe ensinar um jeito de nunca ter problemas”, mas por ter evocado o mestre dos problemas, o terrível Mara.

Maharaja foi mal entendido. Ele é inseparável da natureza ilimitada de Buda. Como poderíamos nos livrar de nossas fixações se não passando pela prova final de nos libertarmos delas? Mas nem queremos pensar nisso porque estamos efetivamente presos a nossas fixações. Estamos presos a universos mentais. Nossa condição não é a oitava etapa do Nobre Caminho, que foi quando o Buda experimentou a libertação. Na sétima ele estava em treinamento, foi quando passou seis anos na floresta contemplando a natureza da realidade de uma forma profunda. Quando atingiu a maturidade desta compreensão, sentiu-se capaz de desafiar Mara.

Moralidade

Para reduzir as crises, praticamos a quinta etapa do Nobre Caminho, exercendo a amplidão de nossa natureza, que é maior do que nossa identidade. Nesse caso já estamos manifestando a liberdade natural da condição de Buda, estamos operando além de nossa identidade. Quando fazemos isso, surgem a felicidade e a alegria.

Quando examinamos as melhores coisas que fizemos, as coisas que mais nos deram satisfação, geralmente estão ligadas a algo generoso que fizemos para alguém, um momento no qual transcendemos nossa limitação e fizemos algo realmente bom para alguém. Este tipo de ação se torna permanente, a lembrança disso sempre produz energia e estabilidade para nós.

O que fizemos de bom para nós às custas dos outros torna-se cada vez mais amargo com o passar do tempo. O que fizemos de bom para nós já se foi. No entanto, o fato de termos causado mal a alguém para fazer bem a nós mesmos fica cada vez mais doloroso.

A base do budismo está em reduzirmos o sofrimento para nós e para os outros. Quando causamos sofrimento aos outros, com o tempo isto traz sofrimento também para nós. Por isso evitamos fazê-lo.

A moralidade não é uma regra externa a ser obedecida. Toda ação moral no budismo está ligada a lembrar que, quando nos movemos, podemos estar trazendo sofrimento para os outros ainda que sem querer. A conseqüência será sofrimento para nós mesmos mais adiante. Não é isto que queremos, queremos felicidade. Então, devemos cuidar nossas ações e agir de forma que a felicidade seja possível. Praticando as dez ações não-virtuosas, criaremos sofrimento para nós.

Temos três etapas para evitar o sofrimento. Na primeira, a mais simples e direta,

No documento Meditando a Vida (páginas 37-45)

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