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□Julgam ento procedente ■ Julgamento procedente em parte □Julgam ento improcedente

Ao passo largo da submissão dos poderes da República, os órgãos e entidades do Poder Executivo, agora reformulados e até renomeados, sublevar-se-iam. A independência e harmonia

entre os poderes daria lugar à dependência e confusão entre suas tarefas e a subordinação hierárquica dos burocratas dos ministérios e da Presidência da República cederia espaço ao poder

indiscriminado dos dirigentes dos órgãos e entidades da área econômica do governo. 185 Competências do Poder Legislativo e mesmo do Poder Executivo, implícita ou explicitamente

delegadas ou transferidas para os burocratas dos altos escalões executivos, fariam dos cargos nos ministérios, secretarias, diretorias, departamentos, conselhos, comitês, juntas e entidades

executivos, especialmente da área econômica, os verdadeiros centros de decisão sobre os destinos da sociedade brasileira. 186

185 FOLHA DE SÃO PAULO. BC propõe diretoria exclusiva para o Real. 8 de abril de 1994, Caderno Brasil, n.° 1, p. 12. BATISTA JÚNIOR, Paulo Nogueira. Subdesenvolvimento não se improvisa. Folha de São Paulo, 7 de dezembro de 1995, Caderno Dinheiro, n.° 2, p. 2. FOLHA DE SÃO PAULO. Aiuda a bancos recebe criticas. 11 de junho de 1997, Cademo Brasil, n.° 1, p. 13. PEREIRA, Luiz Carlos Bresser. Da administração pública burocrática à gerencial, in Revista do Serviço Público, ano 47, volume 120, n.° 1, ENAP, Brasília, janeiro-abril de 1996. VELASCO JÚNIOR, Licínio. A economia política das políticas públicas: fatores que favoreceram as privatizações no período 1985-1994. Rio de Janeiro: BNDES, abril de 1997. Textos para discussão n.° 54, Área de Planejamento, Departamento Econômico, p. 10, 11, 12, 18. CORREA, Paulo Guilherme. Abertura comercial e reestruturação industrial no Brasil: deve o Estado intervir? Rio de Janeiro: BNDES, julho de 1996. Textos para discussão n.° 45, Área de Planejamento, Departamento Econômico, p. 32-33. Há muito a burocracia pedia o poder que obteve com Cardoso. Em abril de 1994, Pedro Malan, à época presidente do BC, ao lado dos demais diretores do Banco, brigava por independência do Banco e diretoria própria para atuar junto ao Real. Com as medidas provisórias de novembro de 1995 o poder dos burocratas, notadamente do BCB, seria elevado brutalmente, possibilitando tomar medidas favoráveis aos banqueiros e não prestar contas a ninguém. O BCB destinaria R$ 14,9 bilhões em 1996 para socorrer bancos e não forneceria dados sobre os impactos desses empréstimos a ninguém, nem mesmo ao TCU, sob a alegação de sigilo bancário. A separação entre administração burocrática, patrimonial e gerencial não é, no Brasil, como se vê, da maneira estanque visualizada por Bresser. De fato, o “espirito público e competência da burocracia brasileira”, mostram-se todos os dias na satisfação dos interesses de poucos mas não para as grandes massas. Os burocratas sabem do grau de importância que possuem para as elites. Velasco considera que o fator principal de sucesso das privatizações entre 1989 e 1994 foi a expansão da burocracia do BNDES. Não por acaso, Corrêa propõe que a condução do processo de estabilização econômica deveria ficar a cargo de uma Comissão de alto nível com grande poder político.

180 As delegações ou transferências de competências estão distribuídas por várias leis, medidas provisórias e decretos. Os decretos que expressamente delegam ou transferem competências para os altos funcionários do Poder Executivo são treze. Decreto n.° 1.362, de 1 ° de janeiro de 1995. Decreto n.° 1.786, de 11 de janeiro de 1996. Decreto (sem número), de 17 de janeiro de 1995. Decreto n.° 1.849, de 29 de março de 1996. Decreto n.° 1.845, de 28 de março de 1996. Decreto n.° 2.014, de 26 de setembro de 1996. Decreto n.° 1.822, de 29 de fevereiro de 1996. Decreto n.° 1.823, de 29 de fevereiro de 1996. Decreto (sem número), de 7 de fevereiro de 1996. Decreto n.° 2.029, de 11 de outubro de 1996. Decreto n.° 1.561, de 19 de julho de 1995. Decreto (sem número), de 3 de dezembro de 1996. Decreto n.° 1.603, de 24 de agosto de 1995. A estrutura dos principais ministérios seria definida pelos seguintes decretos: Decreto n.° 1.756, de 22 de dezembro de 1995. Decreto n.° 1.825, de 29 de fevereiro de 1996. Decreto n.° 1.642, de 25 de setembro de 1995. Decreto n.° 1.643, de 25 de setembro de 1995. Decreto n.° 1.644, de 25 de setembro de 1995.Decreto n.° 1.673, de 11 de outubro de 1995. Decreto n.° 1.745, de 13 de dezembro de 1995. Decreto n.° 1.753, de 20 de dezembro de 1995. Decreto n.° 1.757, de 22 de dezembro de 1995. Decreto n.° 1.784, de 11 de janeiro de 1996.Decreto n.° 1.792, de 15 de janeiro de 1996. Decreto n.° 1.796, de 24 de janeiro de 1996. Decreto n.° 1.917, de 27 de maio de 1996.

O Gráfico 20 informa que a expedição de decretos pelo Poder Executivo, sob a chefia de

Cardoso, manter-se-ia bem acima de Franco, de Collor e de Samey; e a razão é óbvia. 187 Com as reformulações institucionais, as competências exercidas pelo chefe do Poder Executivo seriam

ampliadas enormemente e passariam a ser exercidas por decreto. No entanto, estas mesmas

competências subtraídas pelo chefe do Poder Executivo seriam, progressivamente, repassadas aos burocratas dos altos escalões ministeriais, especialmente da área econômica, para serem exercidas através de meros atos administrativos como portarias, resoluções, instruções, avisos,

recomendações, circulares, ofícios, e, até mesmo, de convênios e contratos; enfim, um emaranhado de atos e negócios que só mesmo os altos burocratas teriam chances de conhecer. 188 Sob o manto da

manutenção da “autoridade monetária”, proclamada em verso e prosa pela intelectualidade técnica, os altos burocratas ministeriais apropriar-se-iam da decisão sobre o que realmente interessa às

elites: o dinheiro do povo, gerido pelo Estado.189 Aclamados como administradores, esses altos

187 José Samey, entre 1.° de janeiro de 1987 e 14 de março de 1990, expediu 4943 decretos. Fernando Collor, entre 15 de março de 1990 e 1.° de outubro de 1992, expediu 2542 decretos. Itamar Franco, entre 2 de outubro de 1992 e 31 de dezembro de 1994, expediu 2671 decretos. Fernando Henrique Cardoso, entre 1.° de janeiro de 1995e31 de dezembro de 1996, expediu 3110 decretos.

188 PATÚ, Gustavo. BC cria caixa-preta para manter decisões em sigilo. Folha de São Paulo, 24 de setembro de 1995, Caderno Dinheiro, n.° 2, p. 3. VAZ, Lúcio. Políticos disputam vagas com tecnocratas. Folha de São Paulo, 21 de março de 1995, Cademo Brasil, n.° 1, p. 5. FOLHA DE SÃO PAULO. FHC aiuda a aumentar a desinformação. 24 de fevereiro de 1994, Cademo Brasil, n.° 1, p. 6. O BCB, expediria no dia oito de setembro de 1995, a Portaria n.° 266, pela qual se permitiria manter em sigilo decisões suas e do CMN (Conselho Monetário Nacional). “Foram centralizadas na cúpula do BC todas as informações relativas ao conteúdo de votos da diretoria ou do CMN. Entre medidas que podem ser tomadas apenas com um voto do CMN, sem necessidade de serem convertidas em resoluções públicas, há dois exemplos recentes: o uso de dinheiro público na cobertura de saques de correntistas de bancos liquidados e o reajuste salarial de até 38% acima da inflação para funcionários do BC. No caso do pagamento a clientes de bancos liquidados, a existência do voto foi anunciada pelo BC em agosto, mas sem que o documento fosse conhecido. Já o reajuste salarial do funcionalismo foi mantido em segredo pelo BC até que acabasse vazando à imprensa, antes da aprovação pelo CMN. Até agora, porém, a proposta exata de reajuste salarial continua sendo um mistério”. A Portaria n.° 266 é apenas mais um exemplo do poder das sombras exercido pelos burocratas. Muitas vezes, nem mesmo resumos dos atos do BCB ou do CMN são publicados no Diário Oficial da União. “Há restrições até ao fornecimento dos votos ao resto do governo”. Com as modificações institucionais promovidas por Cardoso já nos tempos de Ministro da Fazenda, os políticos perderiam capacidade para influenciar nas nomeações de cargos de segundo e terceiro escalões. Os burocratas tomariam conta do BB, do BCB, do BNDES, da CEF, enfim, do caixa do governo. Os pedidos de políticos nesse sentido seriam arquivados. E nem mesmo reivindicações de bancadas inteiras de um mesmo Estado, de vários partidos, seriam atendidas. Quando Ministro da Fazenda, Cardoso fazia questão de passar informações contraditórias sobre as atividades da equipe econômica e chegou a declarar: “Não sei direito e não tenho a pretensão de ser o dono da verdade”. Referia-se á conversão dos salários para a URV que, assim, se caracterizava como “matéria técnica”. Esse é o Presidente da República que, sob a máscara da humildade, esconde a submissão às decisões dos burocratas.

189 Vide PINHEIRO, Flávio. Atrevido e franco, in Veja, 6 de agosto de 1997, p. 114-121. Gustavo Franco, que assumiu a presidência do Banco Central do Brasil depois de Loyola, é um neoliberal ferrenho, claramente disposto a satisfazer as exigências das elites transnacionais e de suas associadas independentemente dos interesses nacionais. Trata-se de uma personalidade tão difícil que mesmo dentre os aliados de Cardoso as opiniões a seu respeito são duras. O Deputado Federal Delfim Netto o considera alguém que quer fazer do Brasil um mero entreposto comercial como Hong Kong. O Senador José Serra o vê desconectado da realidade. O elevado poder da burocracia é demonstrado por sua nomeação. Os caciques da política só ficariam sabendo de sua escolha no dia de sua nomeação. Poder de tal ordem que virtualmente impediu a definição oficial da área econômica do governo pois os membros da equipe queriam mais controle na gerência do plano Real, o que incluía o controle dos empreendimentos estatais.

burocratas mostrar-se-iam, na verdade, financistas que, removidos os obstáculos à sua atuação,

ditariam o compasso dos negócios do Estado. Diriam quando e como os recursos públicos seriam privatizados.190

190 A Recomendação de 31 de maio de 1996 do Conselho de Refotma do Estado trataria de dar as linhas gerais para a reforma neoUberal do Estado. “O Conselho de Reforma do Estado (CRE), criado pelo Decreto n.° 1.738, de 8 de dezembro de 1996, em sessão realizada no dia 31 de maio de 1996, decidiu recomendar à Câmara de Reforma do Estado da Presidência da República a adoção de providências para a construção do marco legal dos Entes Reguladores. O projeto de reforma do Estado visa substituir o antigo estatismo pelo moderno estado regulador. O aparato regulatório existente é enorme, obsoleto, burocratizante e, em essência intervencionista, sendo necessário primeiro desregular para, a seguir, regular por novos critérios e formatos mais democráticos, menos intervencionistas e burocratizados. A formulação de uma política regulatória que dê consistência e coerência às propostas de governo requer a definição de um padrão de marco para a criação ou reforma de agências reguladoras, como princípios que disciplinem, inclusive, as iniciativas na compra legislativa. A regulação estatal, dentro de uma perspectiva moderna, deve responder a uma política explícita, coerente e integrada, com princípios e objetivos claros e seguir uma estratégia incremental que comece regulando o mínimo possível e componha o novo quadro regulatório à luz dos desenvolvimentos reais em cada mercado e setor de atividade. A regulação democrática é aquela que confere amplo acesso das partes interessadas ao ente regulador e plena transparência às suas decisões. Destarte, diagnostica-se a necessidade de estabelecimento de critérios gerais para a criação de entidades de fiscalização e regulação de serviços públicos, em regime de concorrência, no âmbito da administração federal. Recomenda-se a observação dos seguintes princípios na elaboração dos anteprojetos de lei de criação de entidades de fiscalização e regulação de serviços públicos portados, em regime de concorrência, no âmbito da administração federal: autonomia e independência decisória do ente

regulador; ampla publicidade das normas pertinentes ao ente regulador, de seus procedimentos e decisões e de seus relatórios de atividade, ressalvadas as hipóteses de sigilo previstas em lei; celeridade processual e simplificação das relações mantidas entre o ente regulador e os consumidores, usuários e investidores; participação de usuários, consumidores e investidores no processo de elaboração de normas regulamentares, em audiências públicas, na forma que vier a ser regulada em lei; limitação da intervenção do Estado, na prestação de serviços públicos, aos níveis indispensáveis à sua execução. Considera-se fundamental definir como os objetivos da função regulatória: promover e

garantir a competitividade do respectivo mercado; garantir os direitos dos consumidores e usuários dos serviços públicos; estimular o investimento privado, nacional e estrangeiro, nas empresas prestadoras de serviços públicos e atividades correlatas; buscar a qualidade e segurança dos serviços públicos, aos menores custos possíveis para os consumidores e usuários; garantir a adequada remuneração dos investimentos realizados nas empresas prestadoras de serviço e usuários; dirimir conflitos entre consumidores e usuários, de um lado, e empresas prestadoras de serviços públicos; prevenir o abuso do poder econômico por agentes prestadores de serviços públicos. Sugere-se que os anteprojetos de lei que tratem da regulamentação das disposições previstas nesta resolução sejam elaborados pelos ministérios setoriais competentes, devendo conter obrigatoriamente normas que disponham sobre: a autonomia gerencial, financeira e operacional do ente regulador, que será organizado sob forma de autarquia; a independência decisória do ente regulador, assegurada mediante: b.l) nomeação dos seus dirigentes pelo Presidente da República, após aprovação pelo Senado Federal, consoante o disposto no art. 52, UI, f, da Constituição, com mandato fixo não superior a quatro anos, facultada uma única recomendação; b.2) processo decisório colegiado; b.3) dedicação exclusiva dos ocupantes dos cargos de presidente e membros do colegiado, não sendo admitida qualquer acumulação, salvo as constitucionalmente permitidas; b.4) recrutamento dos dirigentes da autarquia mediante critérios que atendam exclusivamente ao mérito e à competência profissional, vedada a representação corporativa; b.5) perda de mandato do presidente ou de membros do colegiado somente em virtude da decisão do Senado Federal, por provocação do Presidente da República; b.6) perda automática de mandato de membro do colegiado que faltar a determinado número de reuniões ordinárias consecutivas, ou a percentual de reuniões intercaladas, ressalvados os afastamentos temporários autorizados pelo colegiado; as atribuições e competências privativas do ente regulador, exercidas em caráter definitivo, ressalvado o controle de legalidade; as atribuições e competências complementares do ente regulador sobre a matéria atinente a outorga de concessão ou autorização para exploração de serviços públicos, conforme o caso, definidas de acordo com a política do Govemo; o número de membros do colegiado do ente regulador, fixando-o sempre que possível em número não superior a cinco; a participação de usuários, consumidores e investidores na elaboração de normas específicas ou na solução amigável de controvérsia relativa à prestação do serviço, mediante audiências públicas; a faculdade do ente regulador acolher compromissos de cessação de práticas econômicas específicas e de compromissos de desempenho, como forma de solução de conflitos entre consumidores, agentes prestadores de serviços e investidores; a vedação de decisões fundadas exclusivamente em informações trazidas pelos interessados e a faculdade do ente regulador contratar de fontes independentes o fornecimento de informações técnicas no Brasil e no exterior, assim como de consultoria extema, a critério do colegiado; a previsão de recursos de tutela, restrito ao exame da legalidade de ato definitivo da autarquia; a fixação das regras de desregulamentação do setor de atividade específica, se for o caso”. A Lei n.° 9.427, de 26 de dezembro de 1996 criou a Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL e disciplinou o regime das concessões de serviços públicos de energia elétrica e a Lei n.° 9.472, de 16 de julho de 1997 criou a Agência Nacional de Telecomunicações - ANATEL e reorganizou os serviços de telecomunicações. A Resolução do CMN n.° 2.211, de 16 de novembro de 1995 regulamentou o Fundo Garantidor de Créditos cuja criação havia sido autorizada pela Resolução do CMN n.° 2.197 de 1995. Cf. RELATÓRIO RESERVADO n.° 676, de 26 de junho de 1997. “O exemplo do CADE estava no script, assim como a crescente desenvoltura da Receita Federal e a redução do poder dos ministérios respectivos sobre as agências do petróleo e das telecomunicações, mesmo contrariando pesos-pesados como o primeiro-trator Sérgio Motta. FHC, nunca é demais lembrar, levou a defesa do modelo novo ao limite da extinção de pastas como Minas e Energia, Comunicações e Transportes, ainda hoje os detentores dos maiores orçamentos de investimento”.