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- O meio rural fratura-se em duas realidades: o rural moderno e o rural tradicional

- Distinção entre áreas rurais centrais e áreas rurais profundas - Surge um novo conceito de rural: o rural não agrícola

- Meio rural deixa de ter como principal função a produção de bens - Assume um novo papel: multifuncional e alternativo ao meio urbano

Nesta evolução, percebe-se fundamentalmente que até à pouco tempo atrás, a ruralidade era vista como sinónimo de pobreza, atraso, exclusão social e analfabetismo, contudo, nos dias de hoje, esse conceito foi revisto, sendo agora conotado de turismo, preservação ambiental, lazer, desporto e com uma economia alternativa à agricultura de subsistência (Pereira, 2000).

Outro caráter das áreas rurais nos dias de hoje, é a sua multifuncionalidade, ou seja, aliado ao desenvolvimento da sua função de produção de bens, têm-se outras funções como a conservação do património e proteção do ambiente, o lazer e o turismo.

Com os pressupostos do passado, o espaço rural era visto como um espécie de reserva que fornecia mão-de-obra e bens para os centros urbanos e industrializados, que possuía um sistema de “natureza político-ideológica”, caraterístico de sociedade tradicional, onde a família camponesa de cariz agrícola, que se rege de valores rurais e tradicionais tem a função de estabilização política e social (Alves, 2002).

Porém, com as transformações que têm vindo a acontecer neste meio, foram acompanhadas de outras novas funções, criando espaços de caráter multifuncional e que visam a conservação da paisagem e do ambiente rural, a manutenção das áreas rurais e a produção de bens de forma eficiente, complementando as funções tradicionais e estabelecendo uma relação com o lazer, o turismo, a residência e o desenvolvimento de atividades industriais(Butler, Hall e Jenkins, 1998; Pereira, 2002).

Esta multifuncionalidade do uso e funções do espaço rural vai resultando na própria apropriação do espaço rural por parte das populações e lógicas urbanas sendo considerado um modelo alternativo à sociedade urbana (Santos, 2000).

Verifica-se desta forma, uma nova abordagem das áreas rurais fundamentada em funções sociais não produtivas, de lazer e reserva natural tendo por base a ideia de invenção social de uma nova realidade e consequentemente uma nova ruralidade (Hobsbawm e Ranger, 1983). Assim, a relação como meio urbano, que antes era uma relação de dependência, passa agora a ser uma relação complementar que se prende à valorização do património histórico-cultural e da natureza (Santos, 2000; Alves, 2002). Assim, nos dias de hoje, a ruralidade é compreendida “como um princípio de organização e um sistema de valores que, a par com a visibilidade social das questões ambientais, se reforça na componente do que podemos designar por reserva de qualificação ambiental” (Alves, 2000:43), onde os principais intervenientes são grupos sociais vindo das cidades cujo imaginário os reporta “para uma valorização do passado, centrada no mundo rural, daí que os citadinos prefiram cada vez mais a aldeia urbanizada à cidade turística” (Joaquim, 1994:45).

3.4.2 Áreas rurais como lugares de lazer

Por muito tempo, a ideia de lazer em espaço rural, esteve associada a três pontos essenciais: a igreja, o café e o mercado. Desta forma percebe-se que o espaço rural estava apenas preparado para a realização de determinados eventos sociais e religiosos como batizados, casamentos, funerais, festividades anuais associadas ao calendário religioso e feiras populares, que mobilizavam uma minoria da população urbana com raízes nesses mesmos espaços rurais (Butler, Hall e Jenkins, 1998).

Contudo, esta tendência foi-se alterando, verificando-se uma alteração de comportamentos, sendo que agora as práticas de atividades de lazer no espaço rural se prendem à ideia atual de ruralidade, relacionada com o tradicional, a nostalgia, a calma, o genuíno, o autêntico e a contemplação da natureza (Dewailly, 1998), centrando-se na visita do património histórico, cultural e natural, na participação em festivais, e também na prática de desportos de aventura e natureza ou pesca desportiva (Burnay, 1997; Butler, Hall e Jenkins, 1998; Cavaco, 1999).

É importante reter-se que lazer tem uma conotação diferente de turismo, sendo que para a prática de atividades de lazer, mesmo no contexto rural, não implica a necessidade de uma estadia turística, contudo, é possível que decorram atividades de lazer na prática turística (Malta, 1996). Com esse efeito, têm-se verificado atividades de lazer associadas ao turismo que surgiram como complemento à agricultura, e consequentemente proporcionaram o melhoramento do turismo no meio rural, isto é, as áreas rurais procuraram a autopromoção de modo a tornarem-se mais atrativas, apoiadas na imagem simbólica que representam (Butler e Hall, 1998), sendo esta imagem associada à simplicidade do modo de vida rural e ao próprio exotismo das paisagens, da gastronomia, da cultura e das tradições(Sirgado, 1996).

Este esforço por parte do meio rural, traz consigo uma ideia de ruralidade recreada, onde as tradicionais áreas rurais relacionadas com sinónimos de “miséria”, passam agora para “símbolo de exotismo” associado ao museu do meio rural, possuindo uma imagem fabricada e higienizada, visando corresponder aos anseios de uma sociedade maioritariamente urbana(Moreno, 1999).

Esta questão tem sido alvo de discussão, na medida em que o turismo é dessa forma visto como um “remédio” para a solução dos principais problemas detetados em área rurais, incentivado pelo próprio Estado através de medidas e programas específicos, como por exemplo o Programa das Aldeias Históricas onde algumas aldeias beneficiaram de um conjunto de apoios com o objetivo de viabilizar funções ligadas sobretudo ao turismo (Joaquim, 1994; Cavaco, 1999; Figueiredo, 2003). Contudo, têm-se verificado efeitos perversos consequentes da atividade turística em áreas rurais, que puseram em causa a conceção do turismo como veículo do desenvolvimento rural. Isto porque os contributos do turismo ficam aquém da espectativa na revitalização económica e social

das áreas rurais, isto porque para além de difíceis de avaliar, são pouco significativos (Cavaco, 1999).

O turismo em espaços rurais tem-se revelado como um importante fator de diversificação da oferta, porém, não tem cumprido o seu papel na plenitude, no sentido de tentar encontrar novas potencialidades para o espaço rural, isto porque ainda se considera que o turismo em espaço rural é uma atividade elitizada promovida por pessoas externas a esses espaços e protagonizada maioritariamente por agentes não rurais (Joaquim, 1999). Desta forma os fundos relativos a esta prática não ficam nos próprios espaços rurais e consequentemente não são utilizados no seu desenvolvimento. Segundo Moreira (1994:163) “o turismo rural é uma atividadecuja difusão começou pelo topo da pirâmide social e que está longe ainda de se estender a estratos mais próximos da base”, isto é, devido ao elevado padrão socioeconómico dos promotores da atividade turística em espaço rural, com uma vida definida pelo aspeto familiar e profissional, o turismo praticado hoje no meio rural é uma pretensão do privado trazendo por efeito, algumas consequências ao espaço rural (Ribeiro, 2003).