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H ISTÓRIA P OLÍTICA DE S OLEDADE : LOCAL , REGIONAL , NACIONAL

Quando da ocorrência da Revolução de 1930, a direção da Aliança Liberal de Soledade, composta pela união dos representantes locais do Partido Republicano Rio- grandense (PRR) e pelo Partido Libertador (PL), lançou um manifesto no dia 6 de outubro de 1930. O acesso a esse documento foi possível através da obra produzida por João dos Santos Almeida, intitulada Sonho, persistência e coragem (1999), na qual foi reproduzido o manifesto. O livro é composto pelas memórias do autor, que foi político e membro do PL no município de Soledade, inclusive tendo participado de alguns dos fatos analisados na presente pesquisa, como o Combate do Fão. Além das suas memórias, a obra fornece a transcrição de alguns documentos e nomes de políticos que compuseram o cenário soledadense da década de 1930 e das décadas seguintes.

Segundo o manifesto, “o povo cansado de ser espezinhado nos seus anseios, ultrajado nos seus brios, martirizado nas suas legítimas esperanças, foi obrigado a suportar tanta ignomínia até que esgotado a última amargura e desespero por verdadeira felicidade estalou em 03 de outubro a Revolução Redentora da Pátria.” (Apud. ALMEIDA, 1999, p. 56).

No final do documento, consta uma convocação à população, conclamando “todos a se alistarem nas brigadas em formação, uma republicana e outra libertadora.” O manifesto ainda continha a assinatura das lideranças políticas soledadenses dos dois partidos. Pelo Partido Republicano assinaram o manifesto os senhores Leonardo Seffrin, Timóteo Loureiro, Abelardo A. Campos, Álvaro R. Leitão, Euzébio S. Ortiz, Pedro C. Garcez, Rodolfo Tattin, Rosauro Tavares, Urbano B. dos Santos. Pelo Partido Libertador assinaram os senhores Henrique Boher Sobrinho, Cândido Carneiro Júnior, Vivaldino Camargo, Roldão A. Camargo, Edmundo Schmidt, Kurt Spalding, Pantaleão F. Prestes, Thomaz S. Vaz e Manoel Borges de Moraes. (Apud. ALMEIDA, 1999, p. 56).

Do manifesto apresentado podemos afirmar que Soledade estava alinhada em prol da candidatura de Getúlio Vargas e teve participação também na Revolução de 30. Nesse momento, portanto, podemos afirmar que o jogo político local estava em conformidade com o regional.

A liderança política soledadense apoiou, naquele momento, a candidatura de Getúlio Vargas e o posterior movimento político que o conduziu ao cargo máximo do poder executivo nacional. Dentre os nomes que assinaram o referido documento podemos destacar Cândido Carneiro Júnior e Kurt Spalding. Ambos eram lideranças políticas de Soledade, sendo membros do Partido Libertador.

Ainda conforme João dos Santos Almeida, também membro do Partido Libertador do município de Soledade, no mesmo dia, em 6 de outubro, foi-lhe enviado um ofício do Comando Interino da Brigada Libertadora, na localidade de Rincão de Santo Antônio, que naquela época se constituía no 8º distrito de Soledade. No referido documento, assinado por Euclides Mota, constava:

Ilustre correligionário e amigo. De ordem do dr. Vivaldino Camargo e Major Cândido Carneiro Júnior, comunico que em reunião dos partidos realizada ontem nesta Vila ficou deliberado a organização imediata neste município de uma Brigada Libertadora e de outra Republicana, a fim de integrarem na grande cruzada da nação, pela honra do Rio Grande e pela redenção da República. Apela assim, o dr. Vivaldino Camargo e Major Cândido Carneiro Júnior, para o ilustre correligionário que inicie a convocação dos nossos companheiros desse distrito, conduzindo-os para essa vila, onde será dada a organização à coluna. Esperam aqueles senhores, que o digno correligionário não negue o seu concurso neste momento decisivo para os destinos do Brasil e para a dignidade do Rio Grande do Sul. Viva a Revolução! Saúde e fraternidade. Euclides Mota. Tenente Secretário. (Comando Interino da Brigada Libertadora, 1930 apud. ALMEIDA, 1999, p. 57).

O documento corrobora a informação da organização militar ocorrida em Soledade em prol da causa da Revolução de 1930. Assim, demonstramos que Soledade estava identificada com a Aliança Liberal.

Entretanto, no período posterior à Revolução, podemos identificar a existência de rupturas na estrutura política e nos rumos do governo nacional. No Rio Grande do Sul, o panorama não foi diferente.

Segundo Eliane Lucia Colussi, após a euforia revolucionária, houve no Rio Grande do Sul “um clima de frustração e de descontentamento em relação às políticas adotadas inicialmente pelo governo getulista, as quais atingiram a Frente Política Gaúcha, que sustentava a candidatura de Vargas e o posterior movimento revolucionário.” (COLUSSI, 1996, p. 55).

O retorno à constitucionalidade configurou-se na principal bandeira defendida pela Revolução de 1932, movimento político contestatório ao Governo Provisório liderado por Getúlio Vargas.10 Nessa ação contestatória, o município de Soledade tomaria parte ativa, pelo

menos uma significativa parcela da política municipal composta pelos partidos formadores da Frente Única soledadense.

Em âmbito nacional, ocorreram diferentes focos de resistência em prol da questão

10 Para um estudo mais aprofundado sobre a Revolução de 1932 indicamos: CAPELATO, 1981; HILTON, 1982;

constitucionalista no decorrer do ano de 1932. Muitos desses episódios ocorreram fora dos domínios geográficos do estado de São Paulo. Tais ocorrências foram esparsas e desarticuladas, não havendo uma comunicação direta entre esses focos de resistência ou uma liderança que as gerenciasse. Porém, essas ocorrências contribuem para demonstrar a existência de uma oposição mais ampla à permanência do Governo Provisório, não sendo restrita ao Estado de São Paulo. Assim, destacamos que, no Rio Grande do Sul, ocorreram oito focos de resistência contrários à manutenção do governo federal, dentre os quais estava inserido o município de Soledade. Como podemos perceber na tabela a seguir.

Tabela 1. Episódios da Revolução Constitucionalista fora de São Paulo (1932)

DATA MUPICÍPIO ESTADO

17/07/1932 Rio de Janeiro Rio de Janeiro*

19/07/1932 Bela Vista Mato Grosso **

20/07/1932 Pouso Alegre Minas Gerais**

21/07/1932 Cel. Joaquim Macedo Minas Gerais **

21/07/1932 Guaxupé Minas Gerais **

21/07/1932 Santana dos Tocos Rio Grande do Sul**

21/07/1932 Vacaria Rio Grande do Sul**

22/07/1932 Rio de Janeiro Rio de Janeiro*

29/07/1932 Rio de Janeiro Rio de Janeiro*

02/08/1932 Belém Pará*

18/08/1932 Itacoatiara Amazonas**

19/08/1932 Ipajim Mato Grosso**

19/08/1932 Ladário Mato Grosso**

20/08/1932 Perdido Mato Grosso**

20/08/1932 Porto Murtinho Mato Grosso**

22/08/1932 São João Rio Grande do Sul**

22/08/1932 Salvador Bahia*

29/08/1932 Coxim Mato Grosso**

03/09/1932 Porto Esperança Mato Grosso**

04/09/1932 Pelotas Rio Grande do Sul**

07/09/1932 Mandioca Assada Mato Grosso**

10/09/1932 Porto Murtinho Mato Grosso**

10/09/1932 São Gabriel Rio Grande do Sul**

10/09/1932 Santa Maria Rio Grande do Sul**

13/09/1932 Fão [Soledade] Rio Grande do Sul**

20/09/1932 Cerro Alegre Rio Grande do Sul**

25/09/1932 Porto Esperança Mato Grosso**

04/10/1932 Campo Grande Mato Grosso**

Legendas: * Escaramuças e tiroteios de tropas contra civis (com mortos e feridos); ** Combates entre tropas militares (com mortos e feridos). Fonte: PAULA, 1998, p. 249.

Analisando a tabela acima, confirmamos a ocorrência de inúmeros episódios relacionados com a Revolução Constitucionalista de 1932 ocorrida além das fronteiras do estado de São Paulo. Podemos indicar um número relativamente grande de localidades, nas quais a continuidade do Governo Provisório estaria sendo questionada, pelo menos por uma parcela das suas lideranças políticas.

Ainda segundo a tabela, no Rio Grande do Sul, foram oito municípios rebelados nos quais ocorreram combates militares, como mencionamos. Mesmo não sendo um número suficiente para fazer frente à decisão do interventor Flores da Cunha de manter seu apoio ao Governo Provisório, essa situação possibilita-nos demonstrar uma discordância política frente a esta decisão, evidenciando haver uma ruptura política também no estado gaúcho.

Entre os municípios gaúchos que se declararam a favor da causa da constitucionalização do Brasil estava Soledade, resultando na ocorrência do Combate do Fão, fato que analisaremos em seguida.