• Nenhum resultado encontrado

3. O século XIII: Henrique de Susa e a Summa

3.1 Henrique de Susa – uma breve biografia

Um dos expoentes do desenvolvimento do direito canônico a partir do Liber Extra é Henrique de Susa (1200?-1271), cardeal-bispo de Óstia a partir de 1262 (e, por isso, conhecido por Hostiensis) e renomado canonista. Henrique de Susa produziu suas obras sobre

direito canônico de 1230 até sua morte. 239 Como é comum para essa época, temos pouca ou

238

O debate sobre a associação entre Rolando Bandinelli – o papa Alexandre III – e o Rolando que escreveu essas duas obras canônicas no século XII foi proposto pela primeira vez por NOONAN, J. T. Who was Rolandus? In: PENNINGTON, K.; SOMMERVILLE, R. Law, Church, and Society – essays in honor of Stephan Kuttner. Philadelphia: University of Pennsylvania Press, 1977, p, 21-49 e por WEIGAND, R. Magister Rolandus und Papst Alexander III. In: Archiv für katolisches Kirchenrecht. p. 3-44, 1980. Eu propus um resumo dessa polêmica em dois artigos, SILVA, C. G. A invenção de um papa: a construção historiográfica de Alexandre III. In: Anais do XXVI Simpósio Nacional de História – ANPUH. São Paulo, julho de 2011, texto eletrônico disponível em http://www.snh2011.anpuh.org/site/anaiscomplementares#C; SILVA, C. G. Juridical formulas in papal decretals of the twelfth and thirteenth century. In: Atti Symposium “Verbum et Ius”. Preaching and the Legal Frameworks in the Medieval West. No prelo.

239 As informações sobre a vida de Henrique de Susa que apresentaremos aqui vêm principalmente de: DIDIER.

Henri de Suse, prieur d’Antibes, prêvot de Grasse (1235?-1245). In: Studia Gratiana. vol. 2, 1954, p. 595-617; Henri de Suse en Angleterre. In: LAURIA, M. (org). Studi Vicenzo Arangio Ruiz. Napoli, 1953, p. 333-351;

quase nenhuma informação sobre o início da vida de Henrique de Susa. Sabemos que ele nasceu em Susa, no Piemonte, pois ele próprio o informa em suas obras: “a Secusia unde

originem duxi” e “de Senisia oriundum”. 240 Alguns autores dos séculos XVII e XVIII atribuíram-lhe o nome de família “de’ Bartolomei”, mas essa denominação não é encontrada

nem nos escritos jurídicos nem nas cartas endereçadas a Henrique. 241 O ano do nascimento é

incerto, mas especula-se que seja por volta do ano 1200, talvez um pouco antes, pois sabemos que quando de sua morte em 1271 ele estava muito doente e era bastante idoso.

Além do conhecimento jurídico que suas obras comprovam, podemos supor que ele fora educado nos estudos clássicos, devido ao uso de Virgílio, Horácio, Ovídio, Sêneca e Cícero em suas obras. A crônica de Salimbene (ca.1287) relata que Henrique de Susa possuía

talento para música e o autor elogia suas habilidades para o canto e para a viola. 242 O cronista

Rolandino de Pádova (ca.1277) afirmava que Henrique havia estudado teologia, ciências naturais, o Antigo e o Novo Testamento, além dos direitos civil e canônico (“virum omni

discretione perspicuum, benignum et curialem, theologiae scientia plenum: doctum siquidem, immo doctissimum in scientia naturali, in Veteri et in Novo Testamento, peritum utique in iure canonico et civili.”). 243

Até onde sabemos, no entanto, Henrique de Susa limitou-se a escrever obras de cunho jurídico.

Depois de sua formação inicial, sabemos que Henrique de Susa estudou em Bolonha com grandes mestres tanto do direito canônico quanto do direito romano. Na mesma época, Sinibaldo Fieschi, o futuro papa Inocêncio IV, também foi aluno em Bolonha. Entre seus mestres é provável que tenha tido Jacó Balduino e Homobono como professores de direito romano e Jacó de Albenga em direito canônico, de acordo com Johannes Andreae, um

Henri de Suse, évêque de Sisteron. In : Revue Historique de Droit Français et Étranger. Serie 4, vol. 31, 1953b, p. 244-270, 409-429; PENNINGTON, K. Henricus Segusio (Hostiensis). In: Popes, Canonists, and Texts 1150-1550 (Collected Studies Series 412). Aldershot: Variorum, 1993, artigo XVI; LEFEBVRE, C. Hostiensis. In: Dictionnaire de Droit Canonique. Paris: 1923, vol. 4, cols. 1211-12, citando M.G.H. SS.. XIX, 132; GALLAGHER, C. Canon Law and the Christian Community. Roma: Università Gregoriana Editrice, 1978.

240

HENRIQUE DE SUSA, Lectura in Decretalium libros commentaria. Veneza, 1581, t. I, fol. 22 v; HENRIQUE DE SUSA, De rescriptis 23, Summa Aurea. Veneza: 1574, col. 59.

241 Ver a nota explicativa em DIDIER, N. Henri de Suse, prieur d’Antibes, prêvot de Grasse (1235?-1245). In:

Studia Gratiana. vol. 2, 1954, p. 600.

242

SALIMBENE, The Chronicle of Salimbene de Adam. Binghamton: Medieval and Renaissance Studies, 1986, p. 322-323 apud PENNINGTON, K. Henricus Segusio (Hostiensis). In: Popes, Canonists, and Texts 1150-1550 (Collected Studies Series 412). Aldershot: Variorum, 1993, artigo XVI.

243 LEFEBVRE, C. Hostiensis. In: Dictionnaire de Droit Canonique. Paris: 1923, vol. 4, cols. 1211-12, citando

canonista da época. O próprio Henrique de Susa, entretanto, nunca os nomeou explicitamente.

244

Hostiensis também teve uma breve carreira como professor em Paris,

provavelmente entre 1235-1240, 245 mas o único de seus alunos cujo nome conhecemos é um

certo Hispanus, mencionado na sua Summa. 246 Embora não haja evidências de que tenha

ensinado em Bolonha, manteve contatos assíduos com os mestres da cidade italiana, que lhe enviaram uma quaestio para ser resolvida quando já era cardeal-bispo de Óstia, o que indica

que continuava bastante ativo na produção canônica. 247 Apesar de seu extenso conhecimento

e sua escrita prolífica, Henrique de Susa não seguiu uma carreira nas universidades e acabou escalando a hierarquia eclesiástica.

A ascensão de Henrique está intimamente ligada à família de Savóia e aos condes da Provença. Não se sabe ao certo quando Henrique de Susa deixou a Itália rumo à Provença, mas é possível que sua ligação com a família Savóia tenha começado ainda em Susa, onde esta mantinha uma residência. Ao longo de toda a sua vida, Henrique foi um amigo próximo e conselheiro de Beatriz de Savóia, que se casou com Raimundo Berenger, conde de Provença, em 1220. É possível que ela tenha sido a responsável por introduzir Henrique de Susa na Provença, participando ativamente de seus avanços dentro da Igreja e na política. A importância de ser próximo de Beatriz de Savóia não deve ser subestimada: além de esposa de Raimundo Berenger, suas filhas mais velhas tornaram-se rainhas da França e da Inglaterra, a filha do meio casou-se com o irmão mais novo de Henrique III da Inglaterra e a mais nova foi esposa de Carlos de Anjou.

Os primeiros passos da carreira eclesiástica de Henrique de Susa na Provença são difíceis de datar com precisão, mas o historiador francês Noel Didier estima que ele tenha sido nomeado prior de Antibes um pouco antes de 1234-1235. Na época havia uma disputa no capítulo catedral de Antibes entre os cônegos e o bispo Bertrand sobre as propriedades da diocese que estavam sob o controle de ambas as partes que compartilhavam a posse simultaneamente. Henrique esteve envolvido na disputa que só foi resolvida com um acordo

244 Segundo PENNIGTON, K. Henricus Segusio (Hostiensis). In: Popes, Canonists, and Texts 1150-1550

(Collected Studies Series 412). Aldershot: Variorum, 1993, artigo XVI.

245

Lefebvre e Didier datam a passagem de Henrique de Susa por Paris por volta de 1239-40. Pennington, no entanto, com base em comparações entre os manuscritos prefere a data de 1235. De qualquer forma, sabe-se que sua passagem foi breve e que, após sua nomeação a bispo de Sisteron em 1244, ele não exerceu mais o papel de professor.

246

LEFEBVRE, C. Hostiensis. In: Dictionnaire de Droit Canonique. Paris: 1923, vol. 4, col. 1212.

247 Sobre essa Quaestio que foi inclusive inserida ao final de vários manuscritos da Summa e posteriormente

integrada ao texto no título “De sententia excommunicationes”, ver PENNINGTON, K. A ‘Quaestio’ of Henricus de Segusio and the textual tradition of his ‘Summa super Decretalibus’. In: Bulletin of Medieval Canon Law. n. 16, 1986, p. 91-96.

firmado em 1242. Pelo acordo, as propriedades foram divididas com uma parte ficando sob controle do bispo e outra sob controle dos cônegos. Simultaneamente, o arcebispo de Embrun, Aymar, reorganizou a diocese criando um novo ofício de preboste, confiado a Henrique de Susa. A reorganização da diocese completou-se em 1244 quando o papa Inocêncio IV transferiu a sede episcopal de Antibes para Grasse. Henrique passou, então, a ser preboste de Grasse.

Noel Didier indica que a bula papal endereçada ao arcebispo de Embrun tratando da transferência das sedes perdeu-se com o tempo, mas há registro de sua existência em obras

posteriores. 248 Em 6 de dezembro de 1244, Bertrand, bispo de Grasse, junto com seu preboste

(vel eius vicarii), Henrique de Susa, promulgou novos estatutos para a diocese. 249 Nesses

estatutos, o capítulo ganhou maior independência e o preboste passou a ter mais autoridade nos assuntos diocesanos. Posteriormente, em seus comentários legais, Hostiensis enfatizaria o direito dos capítulos catedrais e dos cardeais romanos de compartilharem a autoridade entre prelados, bispo e papa. Dessa forma, esses estatutos de Grasse parecem indicar “uma extensão

de seu pensamento para o mundo real do governo eclesiástico”. 250

Durante seu período em Antibes e Grasse, Henrique de Susa esteve por diversas vezes na Inglaterra. Sua primeira viagem pode ser datada, sem muita certeza, ao início de 1236, como parte da comitiva de Eleonor de Provença, segunda filha de Raimundo de Berenger, que partiu para a Inglaterra para se casar com Henrique III. Não há, entretanto, qualquer registro da presença de Henrique nessa comitiva. É apenas com a Chronica Majora de Mateus de Paris (1200-1259) que conhecemos com maior precisão as ações de Hostiensis na Inglaterra. O monge descreveu, por exemplo, um interrogatório que Henrique teria conduzido, na condição de legado papal, de um herético que afirmava que o papa Gregório IX estava poluindo o mundo. Ele também narra o envolvimento de Henrique de Susa nas disputas entre o rei Henrique III e os cônegos de Winchester pela eleição do bispo. Henrique teria sido enviado em legação a Roma para apoiar a escolha do rei, que desejava que Guilherme de Savóia fosse eleito para a sede episcopal.

Além de manter seu posto como prior de Antibes e depois preboste de Grasse, Henrique de Susa continuou a acumular benefícios na Inglaterra, recebendo um salário do erário público desde 1240. Além disso, foi nomeado prior do Hospital da Santa Cruz no país,

248

DIDIER, N. Henri de Suse, prieur d’Antibes, prêvot de Grasse (1235?-1245). In: Studia Gratiana. vol. 2, 1954, p. 613, nota 96.

249 Ibid., p. 613.

250 PENNIGTON, K. Henricus Segusio (Hostiensis). In: Popes, Canonists, and Texts 1150-1550 (Collected

o que lhe garantia uma renda anual substanciosa. A pedido de Henrique III, o papa Inocêncio IV concedeu ao bispo de Hereford, em 1243, “o direito de dispensar Hostiensis das limitações do cânone 29 (De multa) do quarto Concílio de Latrão, que proibia o acúmulo de benefício por clérigos”. 251

O cânone ordenava que quem recebesse qualquer benefício ligado à cura das almas, caso já tivesse posse de tal benefício em outro lugar, seria privado do primeiro benefício pela força da lei e se tentasse manter os dois, perderia ambos. Existia, porém, a possibilidade de dispensa pela Sé apostólica para o caso de pessoas de alto prestígio e muito

letradas. 252 Mais tarde, ao escrever seu comentário sobre o Liber Extra, a Lectura super titulo

decretalibus, Hostiensis iria defender o direito do bispo local de executar as dispensas

relativas ao cânone 29. 253

Em 1244, após uma missão fracassada a Roma para tentar convencer o papa Inocêncio IV a remover Guilherme de Raleigh do posto de bispo de Winchester, como queria

Henrique III, Hostiensis decidiu não mais voltar à Inglaterra. 254 O fracasso, no entanto, não

lhe causou maiores problemas junto ao papado e pouco tempo depois ele se tornou bispo de Sisteron. Em uma carta de Inocêncio IV a Henrique de Susa, em maio de 1244, o papa se refere a seu destinatário apenas como prior de Antibes, mas faz menção à sua designação para

o bispado de Sisteron, designação essa que Hostiensis não teria ainda aceitado. 255 Em 22 de

julho de 1244, Hostiensis era ainda prior de Antibes, mas portava também o título de capelão pontifical numa bula do papa Inocêncio IV,“dilectum filium magistrum Henricum de Secusia,

Antipolitanum prepositum, capelanum nostrum”. 256

É apenas em uma bula de 6 de dezembro

de 1244 que encontramos Hostiensis como bispo de Sisteron. 257

Sua chegada a Sisteron ocorreu após uma longa disputa entre os capítulos de Forcalquier e Sisteron pelo direito de eleger o novo bispo, depois da morte do bispo Rodolfo

251 PENNIGTON, K. Henricus Segusio (Hostiensis). In: Popes, Canonists, and Texts 1150-1550 (Collected

Studies Series 412). Aldershot: Variorum, 1993, artigo XVI.

252 “(…) praesentio decreto statuimus, ut quicumque receperit aliquod beneficium habens curam animarum

annexam, si prius tale beneficium obtinebat, eo sit iure ipso privatus, et si forte illud retinere contenderit, alio etiam spolietur. (…). Circa sublimes tamen et litteratas personas, quae maioribus sunt beneficiis honorandae, cum ratio postulaverit, per sedem apostolicam poterit dispensari.”. Cânone 29, Quarto Concílio de Latrão in: TANNER, N. T. (ed). Decrees of the Ecumenical Councils. Nicea I to Lateran V. Washington D.C.: Sheed and Ward/Georgetown University Press, 1990, p. 248-249.

253 PENNINGTON, K. Pope and Bishops: The Papal Monarchy in the Twelfth and Thirteenth Centuries.

Philadelphia: University of Pennsylvania Press, 1984, p. 146-149.

254 Para os detalhes dessa missão, narrados por Mateus de Paris, ver GALLAGHER, C. Canon Law and the

Christian Community. Roma: Università Gregoriana Editrice, 1978, pp. 31-33.

255 O papa autoriza Hostiensis a adquirir novos benefícios, mencionando o bispado de Sisteron: “et una cum eis

et episcopata Sistaricensi, ad quem vocatus canonice diceris, si eum recipere volueris.” Citado por DIDIER, N. Henri de Suse, évêque de Sisteron. In: Revue Historique de Droit Français et Étranger. Serie 4, vol. 31, 1953, p. 249.

256 Bula de Inocêncio IV a Henrique III, citada por Didier, ibid.. loc. cit. 257

em abril de 1241. Em 1243, finalmente as partes chegaram a um acordo no qual Zoen Tencararius, bispo de Avignon e legado papal, ficaria encarregado de escolher o novo bispo. Tencararius apontou Henrique de Susa para o ofício, provavelmente devido as suas ligações com os condes de Provença. Tencararius era homem de confiança de Raimundo de Berenger, que tinha interesse em assegurar que o bispado de Sisteron estaria na mão de um aliado, já que sua família possuía residência na cidade. Além disso, Tencararius e Henrique de Susa estudaram em Bolonha na mesma época e provavelmente se conheciam.

Em sua crônica, Mateus de Paris narra que a nomeação de Hostiensis para o bispado de Sisteron teria ocorrido através do suborno de oficiais papais com dinheiro desviado de Henrique III. Não há como comprovar tal acusação, embora fique claro, pelos acontecimentos na Inglaterra, que Henrique de Susa dava grande importância à renda e aos

cargos. 258 A longa disputa em Sisteron influenciou Henrique de Susa enormemente e a

necessidade de definir claramente a jurisdição do bispado acabou pautando tanto sua atuação em Sisteron, quanto boa parte de sua doutrina nas obras que escreveu.

Embora os documentos do primeiro Concílio de Lyon (1245) não mencionem a presença do bispo de Sisteron é provável que Henrique de Susa tenha comparecido ao concílio devido a sua posição de importância e sua relação próxima com o papa Inocêncio IV. Durante os seis anos em que o papado esteve refugiado em Lyon devido às disputas com o imperador Frederico II, Henrique de Susa deve ter passado bastante tempo nas cortes papais, pois em vários momentos tanto da Summa quanto da Lectura ele se refere a sua experiência

“in curia” e, com frequência, cita costumes da igreja em Lyon. 259

Os favores do papa também aparecem num indulto pessoal emitido por Inocêncio IV a pedido de Henrique de Susa, determinando que nenhum delegado da Santa Sé poderia pronunciar contra ele uma sentença de suspensão, de interdito ou de excomunhão sem ordem especial do pontífice. O papa deixava claro que tinha o bispo de Sisteron em grande estima,

que deveria ser honrado e agradecido pela sua sincera devoção à Igreja. 260

258 MATEUS DE PARIS, Chronica Maiora. Vol. IV, p. 352 apud GALLAGHER, C. Canon Law and the

Christian Community. Roma: Università Gregoriana Editrice, 1978, p. 34.

259 GALLAGHER, C. Canon Law and the Christian Community. Roma: Università Gregoriana Editrice,

1978, p. 35.

260 “Innocentius, episcopus, servus servorum Dei, venerabili fratri episcopo Sistaricensi, salutem et apostolicam

benedictionem. Personnam tuam speciali debemus honore prosequi, que a hoc intenta esse dignoscitur ut grata nobis et ecclesiae, per sincere devotionis studium, habeatur. Hinc est quod nos, fraternitatis tue precibus inclinati, authoritate tibi presentium indulgemus ut nullus delegatus Apostolice Sedis vel subdelegatus ab eo aut executor seu etiam conservator a Sede deputatus ab eadem, in personam tuam, suspensionis ver interdicti aut excommunicationis possit ferre sententias, absque speciali mandato nostro plenam faciente de indulto hujusmodi mentionem. Nulli igitur omnino hominum liceat hanc paginam nostre concessionis infringere vel ei ausu temerario contravenire. Si quis qutem hoc attentare presumpserit, indignationem omnipotentis Dei et beatorum

Como seria esperado para alguém tão bem relacionado, Henrique de Susa logo alcançou ofícios maiores. Em 1250, deixou Sisteron para se tornar arcebispo de Embrun. Uma das primeiras medidas que tomou ao se instalar em Embrun foi possivelmente a convocação de um concílio provincial que ele menciona em sua Summa, embora as atas em si não tenham

sobrevivido. 261 O bispado de Henrique em Embrun parece ter sido um tanto turbulento, com

resistências da população local. Em 1256, após disputas com os comerciantes locais, ele

colocou a cidade sob interdito. 262

Durante seu episcopado em Embrun, Henrique continuou se envolvendo com uma série de assuntos eclesiásticos e políticos. Foi enviado como legado papal à Alemanha junto

com Hugo de Saint-Cher, teólogo dominicano influente, 263 entre 1251-1252. Por volta de

1258, Henrique III da Inglaterra novamente buscou seus serviços como seu representante numa missão à Cúria de Alexandre IV. Em 1259, Alexandre IV o enviou como legado ao norte da Itália. Durante essas viagens – provavelmente na Alemanha – Henrique de Susa conheceu Jacques de Troyes, que viria a ser eleito o papa Urbano IV (1261-1264) e que seria, então, o responsável pela promoção de Henrique ao posto de cardeal-bispo de Óstia em 1262.

O nome de Henrique de Susa aparece 25 vezes nos registros papais de Urbano IV e quatro vezes nos registros de Clemente IV (1265-1268), mas pouco se sabe sobre seu papel na Cúria durante esse período. Kenneth Pennington sugere que as referências a casos de corte

na segunda recensão da Lectura, possivelmente, dizem respeito a esses anos. 264 Hostiensis

participou do longo conclave papal em Viterbo após a morte de Clemente IV em 1268, mas acabou se retirando devido a sua saúde já muito fragilizada. A vacância durou dois anos e nove meses devido às divisões entre os cardeais franceses e italianos e só foi resolvida com a formação de um comitê de cardeais escolhidos para negociar um acordo numa Eleição por

Petri et Pauli, apostolorum ejus, se noverit incursurum. Datum Lugduni, septimo kalendas septembris, pontificatus nostri anno sexto.” Citado em: DIDIER, N. Henri de Suse, évêque de Sisteron. In: Revue Historique de Droit Français et Étranger. Serie 4, vol. 31, p.424.

261 Na Summa, Henrique de Susa enfatiza a importância do concílio provincial e argumenta que um estatuto

especial poderia ser feito nessas situações para unir várias igrejas a fim de contribuir com as despesas de uma visitação metropolitana (“sicut et fecimus in provinciali concilio quod nuper celebravimus apud Dignam”). HENRIQUE DE SUSA. I, De Officio Archidiaconi, n. 5 in: Summa Aurea. Veneza: 1574. Apud GALLAGHER, C. Canon Law and the Christian Community. Roma: Università Gregoriana Editrice, 1978, p. 38.

262 LEFEBVRE, C. Hostiensis. In: Dictionnaire de Droit Canonique. Paris: 1923, vol. 4, col. 1214.

263 Hugo de Saint-Cher, oriundo da França, teve papel importante na eleição de Raimundo de Peñafort para o

cargo de mestre geral dos dominicanos em 1238. Ele também teve particpação ativa no Concílio de Lyon de 1245 e foi um dos responsáveis pela nomeação de Henrique de Susa ao bispado de Sisteron. AUBERT, H. Hugues de Saint-Cher. In: Dictionnaire d'Histoire et de Géographie Ecclésiastique. T. XXV, fasc. 144-145, col. 287, Letouzey et Ané, Paris, 1994.

264 PENNIGTON, K. Henricus Segusio (Hostiensis). In: Popes, Canonists, and Texts 1150-1550 (Collected

Compromisso. Em setembro de 1271, mesmo sem estar presente à escolha do novo papa Gregório X, recebeu uma solicitação dos cardeais para que desse seu consentimento, um indicativo de seu envolvimento com os assuntos da Cúria e também, possivelmente do prestígio que o bispo de Óstia tinha entre seus pares. Em 29 de outubro de 1271, Hostiensis redigiu seu testamento em Viterbo sendo a data estimada de morte 6 ou 7 de novembro de 1271.

O local de seu túmulo não é conhecido, embora ele tenha deixado no testamento