6 INTERAGINDO COM OS DADOS
6.3 O tratamento da heterogeneidade no ensino de
6.3.3 Heterogeneidades individuais
Essa macrocategoria agrupa dados relativos à diversidade entre as pessoas decorrente de fatores individuais. Foram, no âmbito da pesquisa anteriormente citada (Leal e Pessoa, 2019), elaboradas seis subcategorias: (1) Ritmos de aprendizagem e ritmo de realização das tarefas; (2) Comportamentos individuais e traços de personalidade; (3) Experiências e trajetórias individuais; (4) Contextos familiares (estrutura familiar); (5) Valores individuais e familiares; (6) Características físicas.
Dentre as subcategorias citadas, duas foram contempladas na prática da professora. Foram elas: comportamentos individuais e traços de personalidade ; e características físicas.
Na aula 01, uma das atividades da docente B foi iniciada com a leitura da história ‗O pavão e a águia‘, de autoria de Shefali Kaushik, da editora Mandala. Realizada a leitura e a retomada a história, a docente indagou os estudantes acerca do significado de algumas palavras, realizando a mediação como segue.
P: Então vejam mesmo, nós, cada um de nós, temos nosso jeito. Nem gêmeas são iguais. São iguais fisicamente, e olhe lá, tem coisas que a gente ainda sabe quem é um e quem é outro. Irmãos gêmeos mesmo, está... mesmo gêmeos, eles têm algumas coisas que são diferentes uma da outra. Ninguém é igual a ninguém. Por isso que devemos ser humildes. E o que é uma pessoa humilde? Es 1: Dizer bom tia.
P: Sabe o que é uma pessoa humilde? Es 2: Uma pessoa boazinha.
Es 3: Humilde uma pessoa pobre.
P: Quem sabe o que é uma pessoa hostil? Es 4: Amostrada!
P: Uma pessoa orgulhosa? Es 4: Amostrada.
P: E uma pessoa orgulhosa?
P: Vamos lá! Vamos procurar no dicionário. Vamos pesquisar no dicionário o que significa... o significado dessas palavras.
Es 1: Me dá o dicionário Júnior.
P: Nós vamos pesquisar o que é pessoa humilde. O que é uma pessoa hostil, invejosa...
Aula 01. Docente B.
O enredo da história mostra o pavão como alguém arrogante devido à beleza de suas penas. Já a águia mostra-se humilde e argumenta com o pavão que ele tem penas bonitas, mas que ela - a águia - pode voar. A partir desse contexto, a docente realiza a retomada da história falando que as pessoas têm características e comportamentos distintos.
Já na aula 02, após a leitura da história contida no livro didático, a docente chama a atenção para a violência sofrida pelo personagem devido a sua característica física.
P: Vamos lá minha gente! Quem é Beto?
Es: É o menino que está vendo os anúncios na televisão. Es 1: Esse é o Batata.
P: E quem é que vive comendo? ...
P: E Batata é o nome dele, é? E por que é Batata? Es: Porque ele come muito.
Es 1: Gordo.
P: E por que a pessoa é gordo chama ela de batata, é? Isso é o quê? Estudantes: Bullying.
Es: Racismo.
P: Racismo? E chamar a outra de batata é racismo, é? Isso é o quê? Estudantes: Bullying.
P: Vamos lá para a página 228.
P: Por que os amigos de Carlinhos apelidavam ele de Batata? P: Porque ele é gordinho come...
Estudantes: ... Muito!
P: Por que Carlinhos começou a reclamar do apelido? Es: Porque ele não gosta!
Es 1: Porque é um apelido. P: Porque ele se sentiu in... Estudantes: ...Incomodados.
[A professora então pede para que os estudantes voltem duas páginas e faz a retomada da passagem do texto em que diz que os amigos de Carlinhos estavam o chamando de várias coisas até se chegar ao apelido Batata].
Aula 02. Docente B.
Ainda que a intervenção seja tímida, consideramos importante estimular a reflexão sobre os jeitos de existir dos estudantes e paralelo a isso trabalhar o estímulo ao respeito às diferenças, sejam elas da natureza que forem. Temos como hipótese que a docente pode não ter se detido tanto ao trabalho sobre respeito às diferenças e à não violência, por a turma já ter certo conhecimento sobre o tema bullying e, talvez, pela turma não ter casos de violência verbal ou física entre os alunos, considerando o que vimos nas 10 jornadas de aula acompanhadas.
Enquanto a docente B tratou das heterogeneidades de comportamentos individuais e heterogeneidades de características físicas. A docente A tratou, de forma mais direta que a docente B, do respeito à heterogeneidade de características físicas, como pode ser observado no extrato que segue.
P: Já viu, uma bobeira dessas? Alunos: não!
P: Vocês acham que é bobeira quem pensa assim? Aluno4: o menino é mais grande que o monstro. P: Maior, né?
P:Por isso que esse monstro ridículo é chamado de bobo monstro, pois não existe coisa mais boba do que ficar julgando o outro pela aparência.
Aluno: Aparência é pessoa diferente.
P: Aparência é a forma como eu estou, meu físico, como eu nasci, como eu me visto, tá certo? Todas a pessoas são diferentes. Você é diferente de seus coleguinhas?
Aluno: Sim!
P: Olha um para o outro? Olha para o outro lado. Aluna4: Sou igual ao meu pai!
P: Tu é igual a teu pai? (Risos) Aluno: Eu sou igual a minha mãe.
P: A gente é parecido com alguém. Mas igual não é! (10:05) Alunos falam com quem parecem
P: Mas vocês são as mesmas pessoas? Alunos: Não!
P: Sim, é isso que eu quero saber.
Aluna: Eu digo que minha mãe é minha gêmea.
P: é? Olha, escuta. Isso não significa que alguém que seja diferente seja ruim. Significa? Alunos: Não!
P: Significa que essa pessoa é chata porque ela se veste diferente da gente? Do meu jeito...Porque do meu jeito só eu que gosto né?
Alunos: é!
P: Não é assim, a gente gosta de se vestir do jeito da gente. Alunos: Sim!
P: Gostam de ser como vocês são? Alunos: Sim!
P: Pois é, isso é importante, né? Alunos: é!
P: É importante a gente gostar da gente, né? Alunos: É!
P: É importante a gente gostar da gente, mas deixar os ser quem eles querem. Segura aí, segura o pensamento.
[...]
P: Olha, presta atenção... não faz isso não. Tá magoando. Respeitar é bom né? É bom ser respeitado?
Alunos: É!
P: É bom ser deixado do jeito que a gente quer? Livre? Alunos: É!
P: é bom, né? Alunos: É!
P: Pois é, né? (...) Pode ficar mangando? Alunos: Não!
P: Rindo dos amigos? Alunos: Não!
Aluno2: É para ajudar.
P: Pode deixar a pessoa separada porque não é igual? Alunos: Não!
P: Ninguém é igual mesmo.
Aluno2: Tia quando uma pessoa cair não é pra rir não, é pra ir lá ajudar. P: É, ne?
Aluna: É!
Aula 06. Docente A.
Como relatamos em oportunidade anterior, na aula 06 a docente trouxe como suporte para o estudo um livro sobre preconceito. Por isso, não podemos comparar as ações das docentes nesse aspecto, pois como o objetivo didático da docente B eram outros – a leitura e a interpretação – esse aspecto é definidor de sua maneira de mediar, o que pode ter levado ela a ―pincelar‖ a questão do respeito
à heterogeneidade. O foco da aula da docente A era o respeito e ela articulou esse objetivo com o trabalho de apropriação do SEA, como vimos anteriormente.
6.4 Estratégias de trato à heterogeneidade no ensino de produção de