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HIERARQUIZAÇÃO DOS ELEMENTOS VISUAIS COMO FORMAÇÃO DE UMA

Em todo o presente capítulo, estudamos alguns dos elementos visuais compreendidos pela Teoria da Imagem (cor, forma, tensão e dimensão) como forma de aprofundar nossos conhecimentos acerca da sua hierarquização própria na composição visual.

A hierarquia visual que aqui tratamos está de acordo com o proposto por Arnheim (2005), quando afirma que a hierarquização é “[...] uma distinção entre unidades dominantes e unidades subservientes. Uma escala de importância leva, por meio de dois ou mais graus, do primeiro plano ao fundo” (ARNHEIM, 2005, p. 115).

Dado o corpus obtido - e que será analisado logo adiante - buscamos observar os aspectos visuais que predominavam nas composições das fachadas, destacando-se em detrimento dos demais. Consideramos, então, que por sua repetição e predominância nos campos visuais analisados, esses elementos visuais hierarquizados compõem uma estética das fachadas populares - ou seja, um conjunto de elementos considerados adequados para esse fim e que seguem padrões determinados pelo todo.

Para chegarmos a essa conclusão, nos baseamos em Cordiolli (2005), que acredita nos padrões estéticos como “[...] julgamentos de valor que definem referenciais de certo ou errado, [...] belo ou feio” (CORDIOLLI, 2005, p. 2). Essa definição da estética como modelizadora de padrões foi idealizada pelos estudos filosóficos da estética, que aproximam-na da ética e da moral - devido ao caráter de julgamento presente em todas.

Mas, nem sempre ética e estética foram tão próximas: no início dos estudos sobre essa temática, ética e estética eram tratadas como opostas. Segundo Hermann (2005), a estética até o século XIX era relacionada apenas à aparência, ao superficial, ao supérfluo. E dois teóricos tornaram essa mudança de pensamento possível, Kant e Schiller, que aproximaram a estética da subjetividade e da sensibilidade, atraindo-a para o universo da moral.

Podemos considerar que até em termos conceituais essa aproximação está adequada: “estético é derivado do grego aisthesis, aistheton (sensação, sensível) e significa sensação, sensibilidade, percepção pelos sentidos ou conhecimento sensível-sensorial” (HERMANN, 2005, p. 25). Segundo a autora, o desenvolvimento desse conceito deu-se em um processo histórico, tornando-se uma disciplina filosófica - assim como a ética, lógica, metafísica - ligada à beleza. Após, essa conceituação desenvolveu-se no século XVIII, mais conectada com a natureza, à sensibilidade, contrariando o que ocorria no âmbito dos estudos filosóficos em geral.

A estética associa-se, desde seu surgimento, com a totalidade da vida sensível, de como o mundo atinge nossas sensações. O surgimento da estética como uma disciplina filosófica vincula-se também a um momento em que havia desacordo sobre o que é arte, o que é gosto, o que é criação artística, o que é belo (HERMANN, 2005, p. 25).

Hermann (2005) analisa também que condicionamos nossa visão estética às vivências que temos. O contexto vivido por cada indivíduo é capaz de moldar sua visão em relação a imagens, padrões e elementos visuais, atribuindo-lhes valores como belo, feio, sublime, etc. “A estética modifica quem a vivencia e permite ver o mundo sob uma nova luz” (HERMANN, 2005, p. 30). Assim, pessoas que têm experiências semelhantes, transitam pelos mesmos espaços, consomem os mesmos conteúdos, possuem hábitos semelhantes, estão condicionadas a possuírem uma concepção estética semelhante.

Reis (2012) afirma que a estética é um dos fatores que proporciona coesão social para determinados grupos, sendo elemento de socialização e identificação, como pertencente ao grupo. Esse reconhecimento gera sentidos para o grupo - e que, não necessariamente, são partilhados por outros conjuntos de indivíduos. “O caldo efervescente que se pode chamar de cultura está em constante mutação, gerando novos saberes. A estética é o elemento catalisador da cultura” (REIS, 2012, p. 88).

A estética com que as classes populares se identificam vive uma dualidade: Reis (2012) acredita que, ao mesmo tempo em que se “inspira” no que é consumido pela elite - principalmente pela força que a sociedade de consumo exerce, e o desejo por estar nesse mesmo patamar -, o popular ressignifica os objetos de consumo elitizados, transferindo a eles elementos visuais adaptados ao seu gosto.

Reforçando o sentido de conjunto, Reis (2012) demonstra que as classes populares encontram no varejo um ambiente de socialização: “a loja, ou ponto de venda do varejo, é o local em que se processa a contemplação não apenas do estético, mas também o ver-se no local, o participar da comunhão do espaço com dignidade” (REIS, 2012, p. 75-76). No comércio a estética e o sentimento de pertencimento são reforçados pelas estratégias visuais e de venda, para que o consumidor se sinta à vontade e adquira os produtos ali comercializados.

Sobre a estética popular em si, Reis (2012) enumera alguns aspectos como, por exemplo, a “fartura”. Estabelecendo novamente um paralelo com a elite, a autora afirma que enquanto os ricos optam pelo minimalismo e elegância, a classe popular exagera, acentua a fartura - e passa isso para os vários aspectos da vida: comemorações, refeições, compras e, inclusive, no consumo.

As lojas voltadas para esse público se utilizam desse padrão para criar o sentimento de pertencimento, enchendo vitrines, araras, exagerando nos elementos visuais. “A demonstração de quantidade é uma constante tanto nos anúncios de varejo popular, quanto no cotidiano” (REIS, 2012, p. 78).

Porém, ao reforçar esses aspectos, algumas marcas acabam tornando-se literais demais e desvalorizando a diversidade da cultura popular - e, principalmente, seus indivíduos. Desqualificando-os, empresas consideram o consumidor das classes mais baixas sem capacidade de discernimento, infantil, e seguem repetindo uma estética repetitiva e pobre em elementos visuais (Reis, 2012).

Nesse sentido, Reis (2012) afirma que não podemos nos esquecer que, mesmo esse consumidor tendo um nível de escolaridade (e, muitas vezes de compreensão) inferior ao de classes elitizadas, o popular exerce sua capacidade de ler o mundo - seguindo, é claro, o seu “código de ética” comunicacional. É necessário ir além da superficialidade e dos elementos já “manjados” para comunicar-se efetivamente com as classes populares.

3 O COMÉRCIO POPULAR PELA TEORIA DA IMAGEM

Neste momento, examinaremos, sob a luz da Teoria da Imagem e dos estudos sobre a estética, as fachadas do comércio popular santa-mariense que compõem o corpus desta pesquisa. A escolha dos estabelecimentos analisados se deu por três critérios: estar localizado nas principais ruas comerciais do centro de Santa Maria - RS; comercializar artigos de vestuário; e possuir em sua fachada alguma referência numeral aos preços ali praticados.

É relevante para nosso estudo analisar o comércio da área central da cidade, local de maior circulação de pessoas diariamente em Santa Maria e onde estão concentrados estabelecimentos de todos os tipos e públicos-alvo - incluindo os populares. A escolha pelos artigos de vestuário foi pela sua grande presença entre as lojas populares e também por possuírem uma média de preços mais baixa que os demais artigos comercializados por outros tipos de negócios.

Para caracterizarmos os estabelecimentos escolhidos, buscamos um ponto em comum entre todos eles: o uso ou referência a algum numeral presentes em sua fachada. Isso porque essa é uma forma do comércio demonstrar instantaneamente a faixa de preços ali praticada e atrair o público por ela interessado. Dessa forma, sendo um artefato comunicacional presente em muitas lojas populares em Santa Maria e fator de diferenciação desse mercado, se tornou requisito para a inclusão em nosso corpus.

Seguindo os critérios acima, analisaremos as fachadas de dez estabelecimentos comerciais populares do centro de Santa Maria: A Legítima Super 10, Alternativa Econômica, Atacado 10, Big 10, Econômica 10, Econômica Baby, Lojas 12, Nova Era 10, Roze Modas e Shopping 10. Entendemos que essa é uma amostra pequena diante da dimensão do comércio popular em Santa Maria, porém é fruto de um recorte realizado para preservar o caráter qualitativo da análise, além de garantir que a pesquisa seja coerente com complexidade da Teoria da Imagem.

As fachadas serão analisadas em seus elementos visuais e de acordo com os estudos realizados com a Teoria da Imagem. Observaremos, num primeiro momento, a quantidade de anúncios identificadores presentes na fachada, incluindo os anúncios de identificação propriamente ditos - que podem estar localizados tanto na parte superior da fachada, quanto nas laterais e centro. É após esse momento de identificação e análise dos aspectos visuais que poderemos concluir se existe um padrão estético das fachadas do comércio popular de Santa Maria.

É nesse momento que a Teoria da Imagem, a partir dos estudos de Arnheim (2005), Kandinsky (1996) e Villafañe (2006), será a base para análise dos anúncios de identificação, a partir dos quatro elementos visuais por nós já estudados: cor, forma, tensão e dimensão. Como explicado no capítulo anterior - e próprio à metodologia -, optamos pela análise de alguns elementos em detrimento de outros devido à sua maior relevância no aspecto visual das fachadas e na sua hierarquização.

Como já nos atentamos anteriormente, a investigação de cada um dos elementos visuais de uma imagem é de suma importância para entendermos a composição total e sua hierarquização - o modo pelo qual observaremos a formação dessa estética popular em Santa Maria.

Após, visualizaremos também a presença de elementos comunicadores “extra”, como banners, faixas, adesivos, manequins, balões, cartazes - que, mesmo não compondo os anúncios de identificação, fazem parte da fachada do estabelecimento e também são forma de caracterização e interação da loja com seu público.

Para a melhor organização da análise, detalharemos uma fachada por vez, seguindo a ordem alfabética, em três momentos:

1) Indicação da localização do comércio e qual o foco dos produtos comercializados;

2) Quantidade de anúncios de identificação e análise dos elementos visuais presentes neles;

3) Presença de elementos extra identificação.

As fotos que fazem parte desse estudo foram tiradas pela autora da pesquisa no dia 27 de outubro de 2016, com uma câmera Cannon T5 Rebel, utilizando lente 18-55mm. Os ângulos das fotos foram variáveis e escolhidos por proporcionarem uma visão mais completa da fachada dos estabelecimentos - pois, em muitos casos,

encontram-se postes, árvores e até mesmos contêineres de lixo em frente a eles, obstruindo a sua visão completa.

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