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CAPÍTULO II: ALIENAÇÃO PARENTAL, DE QUE TRATA?

3.1 História

Para abordar a temática Alienação Parental (AP) é importante situá-la historicamente no contexto em que tal fenômeno surgiu, o ambiente da separação. Assim, entende-se que é de grande relevância compreender como o aumento do número de divórcios por todo o mundo pode ter contribuído para o surgimento da alienação parental.

Nas décadas de 1960 e 1970 o divórcio foi associado a uma série de eventos e mudanças na vida de filhos de pais separados, uma vez que o número de crianças envolvidas em ambiente conflituoso de divórcio aumentava drasticamente (Hetherington, 1979). Ainda na década de 1970, pesquisas apontavam uma ocorrência, cada vez mais frequente, do fenômeno clínico de rejeição a um ente querido (pai ou mãe) por parte da criança (Wallerstein & Kelly, 1976, 1979). A princípio, isso se associou a uma resistência à visita por parte da criança, descrita como um alinhamento patológico entre um pai irritado com um filho (Wallerstein & Kelly, 1979).

Assim, houve uma ascendência nas pesquisas relacionadas ao divórcio, com trabalhos associados principalmente às consequências proporcionadas aos filhos (Anderson, 1977; Benjamin, 1966; Rohrlich, Ranier, Berg-Cross, & Berg-Cross, 1977; Wallerstein & Kelly, 1976). Isso, possivelmente, colaborou para o surgimento de uma revista especializada na temática: “Divorce and effects on children” nos Estados Unidos.

O interesse nesta temática provavelmente se deve ao grande número de divórcios que aconteceram em países como os Estudos Unidos, durante os anos 1950 e 1960 (Baumrind, 1966; Behrman & Quinn, 1994). Diante disto, foi dedicada uma especial atenção aos distúrbios físicos e psicológicos associados à separação e ao divórcio (Bloom, Asher, Branca, & Stephen, 1978).

Já na década de 1980, algo que reforçou o interesse dos estudos sobre o divórcio foi o surgimento de uma revista científica especializada nesta temática, Journal of Divorce. Diante disto, dedicou-se uma especial atenção aos distúrbios físicos e psicológicos associados a separação e ao divórcio (Bloom, Asher, Branca, & Stephen, 1978).

Assim, concomitante ao crescente número de divórcios, há um aumento de pesquisas que abordam a temática, dentre elas, a pesquisa de Blush e Ross (1987) Sexual Allegations in Divorce: The SAID syndrome (Alegações Sexuais no Divórcio: A síndrome da SAID). Os estudos sobre esta suposta síndrome tiveram início a partir de falsas acusações de abuso sexual aos filhos durante o período do divórcio, isso se transformou em um problema para os profissionais que investigavam se, nesses casos, o abuso realmente ocorrera (Blush & Ross, 1987).

Outra estudo que avalia a relação entre filhos e pais no processo de separação foi a pesquisa de Jacobs (1988), que aborda o que ele denomina de Síndrome de Medeia (Medea Syndrome), este termo faz referência à história de Eurípedes e sua esposa Medeia, da mitologia grega, que após o divórcio mata os filhos para se vingar do esposo. Jacobs (1988) define como uma ferida narcísica, reflexo da perda de um objeto desejado. Assim, a mulher faz da criança uma ferramenta de vingança utilizada para ferir o pai. A hipótese de Jacobs é a de que quando há a precipitação do divórcio, a mulher tem uma reação patológica de fúria que termina por ocasionar conflitos de conduta.

Dentre as supostas síndromes, ainda pode-se citar o Divorce related malicious mother syndrome (Síndrome da mãe maliciosa no divórcio; Turkat, 1994), esta síndrome é deflagrada quando a mãe demonstra habilidade em manipular o companheiro e a criança. Para tanto, essa mãe faz uso de artifícios maliciosos para punir

o ex-cônjuge que supostamente a abandonou (Turkat, 1994). A tentativa de punir injustificadamente o ex-marido é realizada por meio da interferência materna às visitas do pai à criança, além de uma variedade de atos maliciosos para com o marido, incluindo mentiras e violação da lei (Turkat, 1994).

Contudo, embora se conheçam outras perspectivas teóricas acerca do processo de alienação de crianças e adolescentes, o termo mais largamente utilizado é o de Richard A. Gardner (1985): Síndrome de Alienação Parental (SAP). O teórico identificou a existência desta síndrome a partir de longa experiência em tribunais da vara de família. Gardner acompanhou dezenas de casos de separação, baseando seus escritos em mais de 40 anos de trabalho como psiquiatra forense (Gardner, 1998; 1999; 2001a; 2002). Ele observou que um número constante de crianças passava a rejeitar um dos genitores após o processo de separação, muito embora as crianças admitissem que, antes da separação, mantinham uma relação afetiva com esse genitor. Gardner (1985) aponta, então, a existência da SAP, ocasionada quase que exclusivamente pelo processo de difamação por um dos genitores (Gardner, 2002).

Posteriormente à descrição da SAP proposta por Gardner, outros autores dedicaram-se ao estudo do fenômeno (Johnston, 2003; Johnston & Kelly, 2004; Hand & Warshak, 2011) e concluíram ser mais adequado o uso do termo alienação parental (AP) em vez de síndrome de alienação parental (SAP). De tal modo, a expressão alienação parental passa a representar o comportamento negativo realizado por um genitor, o que independe da reação da criança (Johnston, 2003).

Entende-se oportuno ressaltar que Gardner (2003) defende a utilização do termo síndrome, mesmo que esta ainda não seja reconhecida nos manuais diagnósticos, DSM- V e CID-10, apontando que o termo alienação parental é mais geral, e que não pressupõe propriamente uma causa específica como a SAP, que é causada por uma

combinação entre a programação cerebral associada às contribuições da criança. Para Gardner (2003), o problema com a utilização do termo AP é que existem muitas razões pelas quais uma criança pode ser alienada por um dos pais, razões estas que podem não ter nenhuma relação com a programação. Assim, para Gardner, a síndrome de alienação parental seria basicamente um subtipo da alienação parental (Gardner, 2003). Tendo esta perspectiva da divergência dos termos faz-se necessário conhecer o que de fato é alienação parental.