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7 ASSUNTOS ABORDADOS NA FORMAÇÃO

7.1 HISTÓRICO DA DISCIPLINA FILOSOFIA NO BRASIL

Se lançarmos um olhar sobre o histórico do ensino da filosofia no Brasil, veremos que desde o período colonial, Filosofia é matéria do currículo brasileiro, ora como privilégio das elites dominante político e economicamente ou de forma doutrinadora das religiões e nunca como o diálogo característico do filosofar. E desta maneira:

“Resumidamente pode-se afirmar que o ensino institucional e formal da filosofia sempre serviu ao estabelecimento e manutenção de forças hegemônicas que buscavam neutralizar ou mesmo anular qualquer possibilidade de formação humana, crítica e autônoma”. (Balduíno, 2000:17)¹

Esta declaração do professor Balduíno² nos intriga, pois, a princípio nos parece contraditória, haja vista que a filosofia, se tem alguma utilidade deve ser justamente contrária e nos instiga a lançar um olhar fenomenológico no histórico do ensino da filosofia na escola secundária desde o Brasil colônia até a época atual analisando seus discursos e suas práticas para que possamos corrigir seus erros e melhor aproveitar seus acertos neste momento.

A filosofia veio para o Brasil com os jesuítas e desde então nunca teve um lugar definido no currículo escolar, sendo que, somente em 1930, passou a ser reconhecida e a disputar espaço com outras disciplinas e somente entre 1930 e 1970 fez parte do programa oficial, obrigatoriamente. O ensino secundário no Brasil inicia-se com catequese que julgavam os jesuítas ser a introdução ao processo civilizatório, “... em 1553 ou 1556 com a a fundação de um colégio dos jesuítas em Salvador...”, católica, formando professores que educavam através da fé. O primeiro curso de filosofia no Brasil, segundo Sônia Maria Souza,

¹ - Do texto A Presença da Filosofia no Currículo do Ensino Médio Brasileiro. Uma Perspectiva Histórica, Coleção Filosofia na Escola, Vol. VI Filosofia no Ensino Médio que tem como organizadores Silvio Gallo e Walter Omar Kohan.

² - Geraldo Balduíno Horn é professor de Metodologia e Prática de Ensino de Filosofia e Metodologia de Pesquisa na Universidade Federal do Paraná.

ocorreu em 1572. No final do curso era conferido ao estudante o grau de Bacharel e de Mestre em Artes e Filosofia.

As obras usadas neste curso eram basicamente as moralistas de Cícero, Quinto Cúrcio e Sêneca, Aristóteles e Santo Tomás de Aquino que eram adequadas à doutrina católica.

... os jesuítas indiferentes a toda controvérsia do pensamento moderno, à disputa entre racionalista e empiristas, se recusaram a tratar das descobertas científicas de Galileu e Kepler e ignoraram e condenaram Descartes, um de seus ex-alunos. Davam pouca importância à História, à Geografia e à Matemática, Ciência vã, estudada apenas nas classes mais adiantadas. No curso de Artes limitavam-se ao ensino da filosofia escolástica, a partir do estudo de textos de Santo Tomás de Aquino e Aristóteles. Desta forma, acabavam por reduzir o ensino de filosofia e ciências a exercícios de mera erudição e retórica. (SOUZA, 1992:14)

Além disto, era proibida a leitura de Locke, Hobbes, Rousseau, Espinosa e Voltaire, por medo das influências que este tipo de pensamento poderia exercer, tais como ateísmo ou materialismo.

Neste período a Filosofia prestou um grande serviço às classes dirigentes, tanto da Colônia (Brasil) como da Metrópole (Portugal), porque:

1. era contra ao espírito crítico que, na época, nascia na Europa; 2. reafirmava a autoridade da Igreja;

3. reproduzia no Brasil por parte da classe dominante os hábitos da corte e, desta forma, “a novidade supria ao espírito de análise, a curiosidade supria a crítica” (Souza, 1992:15)

Este monopólio “teocrático-jesuítico” acabou por afastar Portugal do movimento científico europeu do Século XVII e, conseqüentemente, o Brasil.

O iluminismo e a filosofia moderna chegam ao Brasil após a reforma do ensino de Pombal que, no entanto, pouco mudou, considerando que:

... a influência mais marcante foi, sem dúvida, na formação da burguesia e de suas classes dirigentes. A estrutura do ensino, predominantemente clássica que valorizava a literatura e a retórica e desprezava o estudo das

ciências e a atividade manual, em uma sociedade exclusivamente agrária, que não exigia nenhuma especialização profissional e cujo trabalho manual se achava a cargo de escravos, permitiu a formação desse tipo de elite intelectual, cujo saber universal e abstrato se achava mais voltado para o bacharelismo, a burocracia e as profissões liberais. (Souza, 1992:19)

Os franciscanos, em 1776, com base nos estatutos da Universidade de Coimbra, inauguravam uma “aula régia” de Filosofia no Rio de Janeiro, com 5 (cinco) cadeiras para Filosofia.

Em 1827, a Filosofia era ministrada nos cursos das Faculdades de Direito de São Paulo e Recife voltada para o humanismo e o pensamento pedagógico.

... as idéias que se infiltravam na cultura brasileira vinham da Universidade de Coimbra, reformada por Pombal e influenciada pelas idéias iluministas da época; da universidade, esse novo espírito europeu conseguiu penetrar os redutos tradicionalistas e, rompendo teias conservadoristas, libertar o ensino e a cultura da “autoridade” e do aristotelismo medieval. Com esse espírito foram criadas as faculdades de filosofia e matemática. (CARTOLANO,1985:27)

Naquela época, além do Colégio Pedro II, fundado em 1837 e mantido pelo Governo por toda a província, a filosofia era obrigatória nos currículos dos Liceus.

O prestígio da filosofia no ensino médio e superior no tempo das “aulas régias” era tão grande que passaram a ser assistidas pelas elites, o que gerou o conselho do General D. Fernando Antônio de Noronha ao Rei.

“... lembrando a conveniência da extinção da cadeira de filosofia nos conventos, diz que não convinha abusar nos estudos superiores, que só servem para nutrir o orgulho próprio aos habitantes do meio-dia e destruir os laços de subordinação política e civil que devem ligar os habitantes das colônias à metrópole” (CARTOLANO, 1985, 28).

Em 1879, inspirada na Revolução Francesa e a filosofia de Rousseau, uma reforma torna autônomo, ou melhor, livre o ensino primário, secundário e superior em todo o Império. Esta reforma, promovida por Carlos Leôncio de Carvalho, além de manter a cadeira de filosofia nos locais já existentes, incluía-a nos colégios normais.

Porém, a liberdade da reforma veio a comprometer a freqüência da disciplina filosofia nos programas entre 1850 e 1951. Outro fato curioso deste período em que o homem buscava a certeza científica e a revolução industrial valorizava a técnica foi priorização do estudo do positivismo e a primazia da lógica nos programas de filosofia, convergindo, assim, para formação da burguesia em profissões com saberes calcados nas ciências positivas.

E, desta forma, a filosofia que nasceu no Brasil da moral e religião, após reforma positivista passa a ser político social para se consolidar no regime com “ordem e progresso” pois, com a república Benjamim Constant, Ministro da Instrução Pública, compõe os currículos com ênfase nas ciências, além de declarar a gratuidade da escola primária.

Na reforma de Carlos Maximiliano, de 1915, fica claro o utilitarismo do ensino primário e secundário, quando a Filosofia passa a ser facultativa em detrimento da obrigatoriedade das disciplinas ditas científicas.

Em 1925, a Filosofia foi incluída nas duas últimas das seis séries do ensino secundário, na reforma promovida por Rocha Vaz, que visava uma formação para a “cultura geral”.

Com a revolução de 1930, Francisco Campos e Gustavo Capanema promovem o retorno efetivo de Filosofia ao currículo do ensino médio como disciplina obrigatória do científico e do curso clássico.

Já em 1960, com a Lei 4.024/61, o Conselho Fiscal de Educação, em relação às disciplinas obrigatórias do ensino médio, colocou Filosofia entre as disciplinas complementares que poderiam ou não estar entre as obrigatórias, perdendo, assim, sua obrigatoriedade.

E, em 1964, com o golpe militar a disciplina passou a ser optativa, dependendo da direção do estabelecimento de ensino. E com a Lei 5.692/71 do Ensino Médio que promovia a inclusão das disciplinas técnicas, segundo acordo de Cooperação EUA e Brasil, a exclusão de

Filosofia e outras disciplinas de cunho humano foi total. E, desta forma, o estudante do 2º grau perdeu todas as matérias que podiam instigar sua formação cidadã e crítica para voltar-se totalmente e automaticamente para a produção industrial.

Com o surgimento da nova LDB (Lei de Diretrizes Curriculares), 9.394/96 de 20 de dezembro de 1996, Filosofia, através de uma menção dúbia, retorna ao currículo como disciplina optativa, que pode ser ofertada ou não, dependendo da direção da escola, que é quem decide o preenchimento dos 25% do currículo destinado, às disciplinas optativas.

“Os conteúdos, as metodologias e as formas de avaliação serão organizadas de tal forma que no final do ensino médio o educando demonstre (... ) domínio dos conhecimentos de filosofia e sociologia necessários ao exercício da cidadania” (LDB. Art. 36, cap. II, título V, § 1º , inciso III)

No histórico que levantamos na introdução desta dissertação podemos notar que a história do ensino da filosofia no Brasil confunde-se com a própria história da educação, o que não é mera coincidência, pois foi também um filósofo que fundou a primeira escola (Platão, a Academia), a filosofia depois de quase quinhentos anos no Brasil e de passar pelas mais diversas classificações e configurações, tais como: “matéria optativa”, “cursos livres”, “caráter complementar”, “obrigatória”, etc. até hoje não achou, ou melhor, não lhe deram o seu devido lugar no currículo do ensino formal, além de não ter ainda encontrado um método próprio pois sempre foi usada para transmitir uma ideologia , descrever um fato histórico e até mesmo reforçar uma religião, situações estas que não permitem o princípio dialógico. Segundo Balduíno (2000, 29) “os discursos legais que a enaltecem, mas não alocam pari passu aos conhecimentos obrigatórios, indicam que, na prática pedagógica brasileira, a filosofia ainda não superou a condição de um humanismo formalista, retórico, fundado no gramaticismo e na erudição livresca”.

7.2 O PROBLEMA DO NASCIMENTO DA FILOSOFIA