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3 HISTÓRICO DO DESENVOLVIMENTO URBANO DE SÃO LUÍS

3.1 Histórico das transformações urbanas de São Luís

São Luís foi fundada pelos franceses em possessões lusitanas e retomada pelos portugueses, invadida por holandeses, colonizada por ibéricos com caráter estratégico-militar, como expressam os fortes construídos no século XVII. Nesse momento, a presença portuguesa, “não revelou a perspectiva de povoamento imediato; ele foi sempre muito lento. Assim é que, em 1616, de uma população de aproximadamente 500 habitantes, 313 é de soldados, estes últimos em número superior à Bahia (140) e Pernambuco (100)” (BOTELHO, 2007, p. 27).

Apesar da referida fundação francesa, “a configuração urbana de São Luís foi moldada a partir do traçado enxadrezado ou ortogonal, tipicamente português” (SELBACH, 2009, p. 22). No primeiro século de colonização, o Maranhão apresentava uma incipiente estrutura urbana. Os núcleos de população estavam fixados na orla próxima aos rios Itapecuru e Mearim. E, como diz Lefebvre (2009, p. 13) ao tratar da constituição social de uma rede de cidades, “o que se levanta sobre essa base [de sistema urbano] é o Estado, o poder centralizado. Causa e efeito dessa centralização particular, a centralização do poder, uma cidade predomina sobre as outras: a capital”. São Luís – maior núcleo de povoamento da região – em 1621 torna-se Vila e, em 1677, passa a ser considerada cidade. Conforme narra Botelho (2007, p. 31),

[...] a cidade estava circunscrita ao eixo Praia Grande e Desterro. Desenho urbano desordenado, ruas sem calçamento e casas de palha e pau-a-pique. Desde os franceses, conheciam-se pontos da ilha como São Francisco, Turu, Vinhais, Timbuba e, posteriormente, Araçagi e Cutim. Além de São Luís existiam vilas e freguesias, tais como: Tapuytapera (Alcântara), Cumã (Guimarães), Icatu. Em seguida, a partir do século XVIII, surgiram novas vilas e cidades.

Nesse sentido, ao fazer um estudo sobre a construção do espaço urbano a partir das cartas-de-datas e sesmarias7, afirmam Mota e Mantovani (1998, p. 18) que

7 Para viabilizar a exploração do território, a Coroa Portuguesa distribuía terras a colonos interessados em usá-las para a produção de alimentos, assegurando também assim o povoamento. Esse instituto jurídico de origem portuguesa vigeu no Brasil de 1532 a 1822.

[...] a leitura das cartas nos permite acompanhar o processo de construção da cidade. Inicialmente, a malha urbana expressa as relações familiais que a articulam: os colonos vão se estabelecendo ao redor de parentes e de amigos.

Destacam ainda Mota e Mantovani (1998, p. 18) que

[...] pequenos núcleos tendem a se constituir em torno de pontos vitais para a coletividade: inúmeros são os pedidos de terrenos no caminho das fontes, próximo aos conventos [...] vemos a ocupação se iniciar na área do porto [...], próxima do Forte, das igrejas, das fontes (devido à indisponibilidade de canalização de água).

Ao pesquisar a racionalidade do espaço urbano de São Luís, tratando do processo de construção social do traçado da cidade, acrescenta Carvalho que,

[...] desde o século XVII a cidade de São Luís contava com alinhamento primário, pois o engenheiro fortificador Francisco Frias de Mesquita, sob ordem do capitão- mor Jerônimo de Albuquerque, desenhou a planta da cidade, definindo o traçado regular das ruas, além de construir uma casa para servir de modelo para as que seriam construídas posteriormente. (CARVALHO, 2005, p. 111).

Assim, desde o final do século XVII, era possível constatar medidas que visavam organizar a estrutura da cidade, na qual as praças representavam o mais importante espaço urbano. No século seguinte, a cidade começa a esboçar mudanças em sua configuração citadina. Um interesse pela elegância urbanística se vai tornando mais pronunciado no final do século XVIII, quando se pode averiguar a definição de critérios para a construção de residências como a cobertura feita de telhas. De certa forma diferente do período anterior, para Mota e Mantovani (1998, p. 19), “percebe-se [...] a preocupação da administração municipal com o traçado da cidade, alinhamento das ruas, manutenção de quadras delineadas, feitura de calçadas, limpeza das estradas etc.”. De acordo ainda com Mota e Mantovani (1998, p. 20), “a cidade se expande segundo dois movimentos distintos: abertura de novos espaços e consolidação, em que beneficiários tardios ocupam os terrenos vazios”. Mota e Mantovani (1998, p. 21) descrevem as etapas de ocupação de novas áreas e crescimento da cidade, considerando que

[...] até a década de sessenta do século XVIII a área urbana se projeta, a partir do núcleo inicial localizado próximo ao Forte e ao Cais, em direção ao Largo do Carmo. A seguir, o povoamento se dá no sentido Carmo-Desterro, atraídos pelo Convento das Mercês e pela Fonte das Pedras. Mais tarde, a ocupação se orienta para o bairro do Egito, Rua do Ribeirão e cercanias da Casa de Recolhimento das Irmãs e da Igreja do Rosário dos Pretos, e algumas famílias também se dirigem para as proximidades da Igreja de São João. Já no final do século [XVIII], o povoamento se expande em diversas direções: ganha o rumo do Convento de Santo Antônio e Remédios e também o da Igreja de São Pantaleão e outras áreas já razoavelmente afastadas da que abrigava os primeiros prédios.

Notam também Mota e Mantovani (1998, p. 22) que

[...] no sistema colonial, centrado nas atividades agro-exportadoras, a função das cidades consistia apenas em entreposto de mercadorias, pois a dinâmica estava situada no campo, em que se desenvolviam as atividades que interessavam à metrópole.

Pensar, deste modo, as interações, ações e relações sociais em São Luís no século XVIII, demanda tratar a vida social na qual prevalece um ethos mais rural que urbano.

A respeito da população residente em São Luís em 1720, Viveiros afirma que “[o povoamento] se desenvolveu tão morosamente que não atingia a 1.400 moradores em 1720” (VIVEIROS apud MOTA; MANTOVANI, 1998, p. 22). Observam Mota e Mantovani (1998, p. 22) que “São Luís, até bem avançado o século XVIII [...] não passava de uma vila. A média de 5,1 cartas-de-datas anuais emitidas pelo Senado da Câmara entre os anos de 1723 a 1760 constitui uma forte evidência da lentidão com que se deu o povoamento inicial”.

Até a primeira metade do século XVIII, as atividades econômicas no Maranhão eram rudimentares, o comércio estava baseado no trabalho indígena, na subsistência e na coleta de drogas do sertão. Explica Botelho (2007, p. 56) que,

[...] em meados do século XVIII, o Maranhão passará por transformações, que [...] determinarão novas projeções sociopolíticas e econômicas [...]. Tudo isso é consequência [...] da política efetivada pelo Marquês de Pombal, que retirou o Maranhão da situação de pobreza e o colocou como província importante no século seguinte, a partir de uma nova reorientação mercantilista, cujo eixo central gravitava em torno da oferta de escravos para dinamizar a lavoura de exportação.

Confirmam esse entendimento as considerações de Mota e Mantovani acerca do período. Mostram eles, com o trabalho de pesquisa, como a emissão das cartas-de-datas evidencia períodos distintos na vida da cidade, como

[...] no momento inicial, até mais ou menos 1760, temos ainda uma cidade-enclave, marcada pelas preocupações com índios e com a invasão estrangeira. Levando em consideração a profissão dos primeiros povoadores – soldados, capitães etc. – pode- se dizer que a cidade era pouco mais que um acampamento militar. Das cento e quatorze cartas emitidas na primeira fase estudada, quinze o foram em favor de soldados, cinco de capitães – um dos quais capitão-mor – duas para alferes e uma a sargento-mor. (MOTA; MANTOVANI, 1998, p. 23).

Outras categorias do mesmo modo beneficiadas foram os artífices (pedreiros, ferreiros, carpinteiro, calafetador, alfaiate) e indivíduos ligados a algum ofício religioso (padres, clérigos presbíteros, procurador de igreja e sacristão da Sé) (MOTA; MANTOVANI, 1998). Percebe-se, então, que no século XVIII os usos sociais da cidade realizados por seus moradores provinham principalmente de militares, artífices e religiosos, que compunham a maioria da população de São Luís.

Assim, nota-se que, até meados do século XVIII, a sociedade maranhense apresenta-se pouco diferenciada, verificando-se o predomínio de funcionários e militares nos precários centros urbanos da época. Conforme Botelho (2007, p. 106), “a partir da segunda metade do século XVIII, a sociedade maranhense passará por transformações com a chegada crescente de portugueses e de escravos africanos, o que incrementou a agroexportação, surgindo daí famílias abastadas”. É o tempo da fundação em 1755 da Companhia de Comércio do Grão-Pará e Maranhão, que dinamizou a economia regional. Para Botelho (2007, p. 58), essa Companhia permitiu “aos lavradores a possibilidade de crescimento econômico ao introduzir na região escravos, ferramentas, mantimentos e capital de custeio. Nos vinte anos de sua existência retirou o Maranhão da inexpressividade, tornando este Estado o mais próspero do final do século XVIII”. Confirma a lição de Prado Jr. (1980, p. 115), ao assegurar que

[...] coincidirem os portos de exportação com as maiores cidades da colônia. É à qualidade de entrepostos do comércio exportador que devem sua importância centros como o Rio de Janeiro, Bahia, Recife (Pernambuco), São Luís (Maranhão) e Belém (Pará): é nas proximidades e alcance deles que se concentram as maiores atividades da colônia.

Esclarece ainda Prado Jr. (1980, p. 82) que

[...] a primeira remessa de algodão brasileiro para o exterior [...], data, ao que parece, de 1760, e provém do Maranhão que neste ano exporta 651 arrobas. [...] é no Maranhão que o progresso da cultura algodoeira é mais interessante, porque ela parte aí do nada, de uma região pobre e inexpressiva no conjunto da colônia. O algodão dar-lhe-á vida e transformá-la-á, em poucos decênios, numa das mais ricas e destacadas capitanias. Deveu-se isto em particular à Companhia geral do comércio do Grão-Pará e do Maranhão, concessionária desde 1756 do monopólio desse comércio. [...] A Companhia não colherá os melhores frutos do seu trabalho: extingue-se em 1777 com a cessação do seu privilégio que não é renovado. Mas o impulso estava dado, e o Maranhão continuará em sua marcha ascendente. Será ultrapassado mais tarde por Pernambuco e Bahia, que contavam ao se lançarem na empresa com recursos de gente e capitais muito mais amplos. Mas o Maranhão terá, pelo menos num momento, seu lugar no grande cenário da economia brasileira.

Antes da implantação da Companhia de Comércio do Grão-Pará e Maranhão, o Maranhão enfrentava sérias dificuldades econômicas, mas, ao final do século XVIII, é uma das mais dinâmicas províncias da colônia. O forte impulso econômico é atribuído à Grã- Bretanha, que vem comprar nessa região o algodão que faltava para abastecer sua indústria têxtil, matéria-prima cuja oferta fora interrompida em razão do processo de independência de suas colônias na América do Norte. Dessa forma, “é no Maranhão que se dá a grande inserção do algodão no fim do século XVIII” (BOTELHO, 2007, p. 64).

Assim, esse impulso econômico é perceptível ao final do século XVIII pela observação do crescente povoamento, “comprovado pelo aumento significativo do volume das cartas-de-datas: de uma média de 5,1 concessões anuais registrada no primeiro período analisado vê-se que nas últimas décadas já se altera significativamente o ritmo de emissão” (MOTA; MANTOVANI, 1998, p. 25). Neste contexto, observa Márcia Marques que

Entre 1761 e 1779, período correspondente ao governo de Melo e Póvoas, ocorreram as principais intervenções urbanas em São Luís. Período marcado pelas demolições/construções, entre as quais a que construiu um jardim pertencente ao Largo do Palácio, que hoje equivale à atual Praça Pedro II. Houve também a duplicação da área suburbana de São Luís, com a abertura da estrada [Rua Rio Branco] que interligava a Rua Larga (atual Rua Grande) e o Largo dos Quartéis (atual Praça Deodoro), com a Ponta do Romeu (atual Praça dos Remédios ou Largo dos Amores). Em 1784, no governo de José Teles da Silva, iniciam-se as obras do aterro da Praia Grande. Nesse período, São Luís contava com aproximadamente 16.580 habitantes, distribuídos em 1482 fogos [residências de famílias], segundo registros do Vigário da freguesia. (MARQUES, 2002, p. 38).

Ainda no final do século XVIII, atraídos pelo dinamismo econômico, agregam-se negociantes e escravos à população de São Luís, composta à época principalmente por militares, artífices e religiosos. A propósito, é possível identificar medidas conduzidas pela Coroa Portuguesa no sentido de estimular o povoamento. Conforme Viveiros (apud MOTA; MANTOVANI, 1998, p. 26),

[...] não tardaria o futuro Marquês de Pombal a encaminhar para o Estado do Grão- Pará e Maranhão uma intensa corrente imigratória, tendo como origem o Arquipélago dos Açores [...] a Coroa de Portugal assinou, em abril de 1751, com Joseph Álvares Torres um contrato para o transporte de mil pessoas das Ilhas dos Açores para o Estado do Grão-Pará. [...] Não há notícia de leva maior que esta.

Nesse sentido, no século XVIII, como Belém, São Luís também é beneficiada pelas políticas e ações de incremento produtivo e populacional decorrentes da instalação da Companhia Geral de Comércio do Grão-Pará e Maranhão (MOTA; MANTOVANI, 1998, p. 32). No mesmo estudo a respeito do desenvolvimento urbano de São Luís sob a Lei das Sesmarias, Mota e Mantovani (1998, p. 33) dividiram dois momentos, nomeando o primeiro como “período de estabelecimento”, que compreende a fase histórica entre 1723 e 1760; neste passo,

[...] as providências das autoridades municipais manifestam o sentido de fixar a escassa população, assim como o de elevá-la. Através das cartas-de-datas e sesmarias percebe-se que a prática dos primeiros colonos com relação à moradia consistia em se apropriar de um pedaço de chão e construir sua vivenda, sem qualquer legitimação que não fosse o trabalho de fazê-lo. (MOTA; MANTOVANI, 1998, p. 33).

Com relação ao impacto das reformas pombalinas, Mota e Mantovani destacam o período que vai de 1760 a 1824. Para eles,

[...] saindo do abandono em que se encontrava, São Luís, devido às suas atividades portuárias, passou a constituir-se em um espaço estratégico para o desenvolvimento então conhecido pela região. O espaço urbano inevitavelmente irá se alterar com as políticas de incentivo. Neste momento, as atividades urbanas se intensificam e a população se eleva e diversifica etnicamente. Uma das primeiras consequências deste fenômeno é a valorização dos chãos urbanos, pelo menos nas áreas sob a influência das atividades produtivas. (MOTA; MANTOVANI, 1998, p. 37).

Ao final do século XVIII, em razão da ampliação das atividades econômicas voltadas para a exportação, com reflexos no aumento da população, passa interessar às autoridades controlar de modo mais seletivo a ocupação de espaço. De maneira diferente da adotada anteriormente, com a cessão sine causa de terrenos, são estabelecidos vários requisitos de cumprimento complexo e oneroso aos que solicitam lotes (MOTA; MANTOVANI, 1998). “Se antes, a orientação da Câmara era fixar moradores, as últimas décadas do século [XVIII] já manifestam um esforço no sentido de articular relações sociais, criar privilégios e – em suma – instaurar uma classe dominante entre os homens livres” (MOTA; MANTOVANI, 1998, p. 49).

César Marques (apud MOTA; MANTOVANI, 1998, p. 40), ao discutir o aformoseamento da cidade naquele período, menciona um ofício que permite confirmar a observação de maior atenção e rigor por parte das autoridades para a concessão de lotes a pretendentes moradores, ao informar que

[...] o Governador D. Antonio de Sales Noronha, em 17 de dezembro de 1779, oficiou ao Senado da Câmara dizendo “ter presenciado no corpo da cidade muitas casas cobertas de pindoba e assim ordenava que não se concedessem chãos a pessoas sem possibilidade para fazerem edifícios nobres, e que quando fossem concedidos devia ser debaixo dessas condições (MARQUES apud MOTA; MANTOVANI, 1998, p. 40).

Como diz Lefebvre (2009, p. 66), “a cidade contém assim a projeção dessas relações [sociais dominantes]”. A regulação das autoridades expressa a eficácia e a presença social dessas relações. Naquele momento, passa-se a verificar “um intenso processo de concentração de terrenos em mãos de particulares, e o núcleo urbano inicial se expande em vários bairros com vocações diferenciadas” (MOTA; MANTOVANI, 1998, p. 42). Afirmam estes autores que

[...] desde as primeiras décadas do século [XVIII] as ordens religiosas eram o grande agente monopolizador de terras na colônia. [...] Nas terras recebidas construíram templos, conventos, colégios, sítios etc., feitorias que utilizavam mão de obra e, assim, fixavam população. Ao que parece, a vida da cidade girava ao seu redor nos primeiros tempos. (MOTA; MANTOVANI, 1998, p. 42).

Nas duas últimas décadas do século XVIII, a situação modifica-se e a acumulação de propriedade urbana passa a ser realizada por outros agentes. Informam Mota e Mantovani (1998, p. 43) que, “até este período os Anais da Câmara não registram acúmulo de terra por particulares; a partir de então, isto se torna uma prática comum e constante”. Naquele período da história da cidade e do Brasil, o algodão era um dos produtos de exportação que permitia a geração e a acumulação de riqueza. Para Botelho (2007, p. 65),

[...] o algodão desenvolveu-se no Estado do Maranhão tendo um aumento das exportações e, consequentemente, um crescimento acelerado. O progresso do Maranhão continuou até o segundo decênio do século XIX, quando as exportações de algodão variaram, chegando ao ápice em 1818, produzindo-se um total de 402.793 arrobas. Nesta época, o Maranhão era o segundo maior produtor de algodão do Brasil, perdendo apenas para a Bahia, e figurava como a quarta província mais exitosa do Brasil, ficando abaixo apenas da Bahia, do Rio de Janeiro e de Pernambuco.

Outro acontecimento importante para a configuração da cidade e feição de seus moradores foi a entrada, na segunda metade do século XVIII, de grande contingente de escravos negros oriundos da África para trabalhar nas plantações de algodão e arroz. Ilustra Botelho (2007, p. 68) que, “pelos idos de 1779, o Maranhão possuía 31.722 pretos e 18.573 mulatos, sendo 12.000 peças introduzidas pela Companhia [do Comércio do Estado do Maranhão8] e cerca de 5.000 até o final do século XVIII. Em 1800, a população escrava era de 35.000 e 48.000 entre 1801 e 1820”. Observa, ainda, que “em percentuais, no ano de 1798, os escravos negros representavam 47% da população colonial e, em 1822, alcançavam 55%, excluindo-se os índios” (BOTELHO, 2007, p. 69). E “a população branca representava somente 16%” (BOTELHO, 2007, p. 107).

Assim, com o final do século XVIII, em momento que se pode chamar de pós- pombalino, o que passou a exercer atração sobre a população residente não eram mais as igrejas e as fontes como outrora, mas o porto e as fábricas, estas voltadas ao beneficiamento do couro e soque de arroz (MOTA; MANTOVANI, 1998). É um período da história em que São Luís se converte em importante cidade. A expansão das áreas edificadas é acompanhada

8Criada em 1682 com o objetivo principal de introduzir mão de obra africana no Estado do Maranhão, em razão da oposição dos jesuítas à escravização dos índios.

pelo aumento no número de praças na cidade. Prado Jr. (apud MOTA; MANTOVANI, 1998, p. 28) nota que,

[...] as cidades brasileiras, ainda em fins do regime colonial, eram insignificantes. Rio de Janeiro, então já a capital, não passava de 50.144 habitantes; Bahia, 45.600; Recife, 30.000; S. Luís do Maranhão, 22.000; S. Paulo, 16.000. Estas cinco cidades (as demais não passavam de aldeias) representam apenas 5,7% da população total do país, ou seja, 2.852.000 habitantes.

Ainda estabelecendo comparações, no início do século XIX, a colônia portuguesa na América tinha uma população estimada em 3 milhões de habitantes, com uma densidade demográfica de aproximadamente 0,3 habitante por quilômetro quadrado. O povoamento estava concentrado no litoral. Por todo o território a população era distribuída de modo disperso, não existia uma rede urbana com cidades interligadas. Muitas vezes o transporte de mercadorias e pessoas era feito por cabotagem, margeando o extenso litoral.

Nesse contexto, informa Prado Jr. (1980, p. 101) que “três daqueles núcleos são de grande importância: concentram-se em torno de Pernambuco, Bahia e Rio de Janeiro. Dois outros seguem num segundo plano: Pará e Maranhão”. Logo, é possível inferir-se a formação de uma incipiente estrutura urbana em São Luís que se destaca no conjunto do País. No que se refere às outras vilas mais populosas do Maranhão em 1820, além de São Luís, assegura Botelho (2007, p. 73), eram elas,

Alcântara com 3.000 habitantes, Caxias com 2.426 habitantes, Itapecuru que tinha 767 habitantes, Tutóia, com 760 moradores, Mearim com 680 moradores, Paço do Lumiar com 520 habitantes, Vinhais e Viana que possuíam 300 habitantes cada uma e Monção com 90 habitantes.

Explica Márcia Marques a respeito das transformações urbanas de São Luís, que

[...] no século XIX, as ruas se encontravam pavimentadas; havia uma preocupação com o espaço público, ajardinaram-se e arborizaram-se os largos, e as fontes receberam cuidados especiais. Durante o governo de Manoel Rodrigues de Oliveira, a cidade passou por uma grande expansão física e de marcante melhoria nas construções. Ainda no século XIX, houve a preocupação em relação às condições das edificações. [...] A cidade se encontrava em um período áureo, sendo a Praia Grande um foco para expansão comercial. Em 1805, concluíram-se as obras da margem direita da Foz do Bacanga e a construção da Casa das Tulhas [atual Feira da Praia Grande]. A cidade continuava a crescer e passava por inúmeras reformas, tais como reformas em edifícios públicos, calçamento das ruas e a transformação do Largo do

Carmo e Largo dos Leões em agradáveis passeios públicos (1822). (MARQUES, 2002, p. 39).

No século XIX a cidade vive um processo mais intenso de crescimento econômico, com reflexos em sua urbanização, caracterizando uma nova e complexa organização socioespacial. Os lotes residenciais urbanos, nas primeiras décadas do século, têm suas dimensões fixadas

[...] pelos favores recebidos por alguns e a ousadia de outros. A regularidade dos lotes verificada antes – de 5 braças de frente por 15 de fundo – deu lugar a lotes urbanos de até cinquenta braças ou mais, cercado por outros de quinze braças, e inúmeros de cinco, quatro e até duas braças e meia de testada. (MOTA; MANTOVANI, 1998, p. 51).

A respeito de uma estratificação social de então, esclarece Botelho (2007, p. 107)