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Histeria O termo histeria foi usado para designar sintomas neurológicos e somáticos crónicos e

1.2. A histeria como insatisfação sexual

1.2.1. Início de uma tradição: falta de ar e outros sintomas

A civilização egípcia decaiu no milénio seguinte e os conhecimentos dos papiros seriam perdidos. Só por volta de 300 a.C. os conhecimentos egípcios seriam retomados, quando Hipócrates e os seus discípulos entram em cena (Ritner, 2002). A ideia egípcia de que o útero está ligado ao resto do corpo é retomada e mantida por mais de dois mil anos. A palavra histeria surge do grego hystera (υστερα) que significa útero (Machado, 1990) e, por seu turno, deriva da palavra sânscrita estômago ou abdómen (Micale, 1995 referido por Ng, 1999). Υστερα12 é ainda o nominativo singular feminino do adjectivo

υστερος, υστερα, υστερον13, que significa "que está atrás ou que vem

atrás" (Machado, 1990).

Em grego tinha o mesmo sentido que tem em português a expressão pudente "partes baixas". Em latim encontramos outra designação que se associa à histeria, referimo-nos a histriónico. O adjectivo histriõnĭcus relaciona-se com histrĭõ que significa histrião, comediante ou actor (Dicionário de Latim-Português, 2001). A etimologia grega do termo orienta-nos para a interpretação pioneira de Hipócrates que se refere às migrações uterinas. E aqui começa a segunda lenda: Hipócrates seria o pai da ideia da histeria fruto de um útero errante por motivo de abstenção sexual.

Na verdade, sob o termo histeria, Hipócrates (ou os textos sob o seu nome)referiu-se a manifestações diferentes, desde tuberculose, dores de cabeça, dores de estômago, dores de virilhas, dores de narinas, membros frios, enegrecimento da pele, falta de ar, tonturas a ataque histérico. A deslocação do útero, ou a presença de bílis no interior do útero, seria a responsável por estas enfermidades tão diversas (trad. 1841c, 1841g). As alterações das funções do útero (mais leve e seco) seriam causadas sobretudo pela abstenção da sua actividade, tal como sucedia nas virgens de certa idade ou nas jovens viúvas (trad. 1841b, 1841d). Um útero esfomeado, nem sequer seria fértil, pois o sémen seria perdido pelo desejo de comida (trad. 1841a). A abstenção sexual seria a

12 “Hystera”.

responsável pela secura do útero que teria de procurar outras regiões do corpo mais húmidas (trad. 1841d). Ao fixar-se nessas zonas indevidas surgiriam problemas: mutismo e convulsões (no fígado), sufoco (nas vísceras e canais para a respiração), ansiedade, tonturas e vómitos (no coração) e sonolência (na cabeça) (trad. 1841b, 1841d). Os espasmos sem febre seriam típicos das mulheres com sintomas histéricos e o sufoco

histérico — hysterike pnix — em doentes com febre (trad. 1841d).

Os ataques histéricos seriam semelhantes a convulsões e, para os distinguir, Hipócrates propôs que se beliscasse e se visse se a pessoa sentia (trad. 1841f). A sua descrição de um ataque histérico é elucidativa da lenda: “quando o útero está ao pé do fígado e do hipocôndrio e produz asfixia, a mulher revira o branco dos olhos para cima, fica fria, range os dentes, a saliva chega-lhe à boca” (trad. 1841d, p. 33). As mulheres mais predispostas seriam as que tinham mais fluido seminal (leucorreia), pelo que as mulheres linfáticas e brancas, mais húmidas, seriam mais predispostas que as morenas.

O tratamento prescrito para as mulheres com aqueles sintomas consistia na recomendação de relações sexuais (casamento e gravidez), no uso de pessários, fumigações vaginais agradáveis, fumigações nasais desagradáveis, ou de vinho com extracto de Papaver somniferum L.14 (trad. 1841b, 1841d, 1841e). Noutros casos, a cura

seria espontânea por descida de fleuma desde a cabeça até às vísceras (ainda que pudesse provocar asfixia), para depois o útero ficar húmido e voltar para o seu lugar (trad. 1841d, 1841i).

E a lenda acaba aqui, pois Hipócrates disse também que havia mulheres solteiras que não sofriam deste tipo de problemas. Hipócrates referia-se às mulheres citas. A Cítia era vista como um país representativo do frio extremo (corresponderá à actual Ucrânia) e as suas mulheres, descreveu Hipócrates (trad. 1978), eram guerreiras que só podiam casar depois de matar três inimigos!

Na realidade não se pode dizer que os escritos hipocráticos falem claramente de uma síndrome histérica. Aliás, a palavra histeria nunca aparece: o que surge nos textos hipocráticos é o adjectivo υστερος (King, 1993).

Na nossa revisão recorremos principalmente à tradução de Littré, uma das mais respeitadas, mas não isenta de problemas. Por exemplo, a sufocação do útero pode ser uma tradução inferior do hysterike pnix que pode ser traduzido por abafamento do útero, no sentido de ter calor e dificuldade de respirar (King, 1993). Em jeito de conclusão, nos escritos hipocráticos, histeria significa sofrer do útero, sem referência a sofrimento psicológico. Os sintomas são variados e dispersos, clinicamente incoerentes, e não

encontramos ainda as ideias legendárias que chegaram ao século XX (King, 1993; Micale, 1990b).

No mesmo contexto cultural, a descrição de Platão no Timeu aproxima-se mais da lenda:

O útero é um animal que vive nelas com o desejo de fazer filhos. Quando fica muito tempo estéril, demasiado tempo após o período da puberdade, tem dificuldade em suportá-lo, indigna-se, erra por todo o corpo, bloqueia os condutos do hálito, impede a respiração, impedindo a ventilação, causa um mal estar extremo e ocasiona doenças de todas as espécies, até que, quando o desejo e o amor unem os dois sexos, eles possam colher um fruto … e semear na matriz ... tal é a origem das mulheres e de todo o sexo feminino. (trad. 1999, p. 308)

Também Plínio, o Velho, dizia que quando o útero se deslocava produzia efeitos fatais ao causar sufocação (77/1855).

Areteus da Capadócia (trad. 1972a), médico grego, seguiu estas ideias. Deste autor pouco se sabe, mesmo a época em que viveu é um mistério, ficaram somente os seus escritos (Renaud, 1854). Na tradução de Francis Adams podemos ler:

In the middle of the flanks of women lies the womb, a female viscus, closely resembling an animal; for it is moved of itself hither and thither in the flanks, also upwards in a direct line to below the cartilage of the thorax, and also obliquely to the right or to the left, either to the liver or spleen; and it likewise is subject to prolapsus downwards, and, in a word, it is altogether erratic ... when, therefore, it is suddenly carried upwards, and remains above for a considerable time, and violently compresses the intestines, the woman experiences a choking, after the form of epilepsy, but without convulsions. For the liver, diaphragm, lungs and heart, are quickly squeezed within a narrow space; and therefore loss of breathing and of speech seems to be present. And, moreover, the carotids are compressed from sympathy with the heart, and hence there is heaviness of head, loss of sensibility, and deep sleep.15 (trad. 1972a, pp. 285-286)

Areteus agregou as ideias de Hipócrates e de Platão, mas foi inovador ao supor que haveria uma forma de histeria apartada do útero e que poderia afectar os homens (trad. 1972a). Esta ideia aparece também em Galeno16. Para Areteus, as mulheres jovens de

compleição pálida pertenciam ao género nervoso sensível e seriam, por conseguinte,

15 “No meio do ventre da mulher fica o útero, uma víscera feminina, muito parecida com um animal; pois

move-se por si mesma de cá para lá no ventre, também para cima em linha directa sob a cartilagem do tórax e também obliquamente para a direita ou para a esquerda, ou para o fígado ou para o baço; é também sujeito ao prolapso para baixo e, numa palavra, ele é totalmente errático ... quando, é então dirigido subitamente para cima e aí se mantém durante um tempo considerável e comprime violentamente os intestinos, a mulher experimenta uma sufocação, à maneira da epilepsia mas sem convulsões. O fígado, diafragma, pulmões e coração são rapidamente comprimidos num espaço apertado e por isso parece ocorrer a falta de ar e da fala. E ainda, as carótidas são comprimidas por simpatia com o coração, por isso há um peso na cabeça, perda de sensibilidade e sono profundo”.

mais vulneráveis à histeria. A descrição que Areteus fez da satiríase é também muito semelhante às descrições que vamos encontrar mais tarde sobre a histeria:

Spasms of all the nerves, and tension of all the tendons, groins, and perineum, inflammation and pain of the genital parts ... but neither, also, has woman the parts necessary for erection, like those of a Satyr, whence the affections derives its name; and neither also are men subject to suffocation from the womb, because men have not an uterus.17 (trad. 1972a, p. 294)

As suas palavras finais levam a crer que Areteus considerava a satiríase e a histeria afecções equivalentes. Mais à frente admitiu a existência de uma doença semelhante nas mulheres que se caracterizava pela luxúria (μαχλοσύνη)18, não acarretando outras

alterações mentais, assim como pelo corrimento abundante de um líquido pela vulva. Areteus distinguiu claramente a histeria da hipocondria, da epilepsia, da mania/ melancolia, da loucura e da paralisia/anestesia. Esta distinção, como vamos mostrar, perdeu-se nos séculos seguintes (trad. 1972b). As terapias recomendadas, para além da hipocrática atracção/afastamento com substâncias agradáveis/desagradáveis, consistiam na abertura de uma veia do tornozelo, ligaduras apertadas nas mãos e pés e massagem vulvar com óleos fragrantes. Vamos assinalar ao longo desta revisão os poucos textos médicos que indicam a massagem da vulva como tratamento da histeria, facto que, calculamos, ficou no segredo do pudor.

O conceito de histeria continuou a evoluir e, com Sorano de Éfeso, ficou restrito a um quadro mais definido, ainda relacionado com o útero, mas não um útero vagabundo. Sorano (trad. 1991), ginecologista e obstetra, acreditava que a doença resultava da aceleração ou do atraso dos movimentos das partes do corpo. Quando se aceleravam, ocorriam constrições e estenoses com tensão e secura das vísceras (status strictus)19.

Quando se atrasavam, resultava um estado de relaxamento com excesso de humidade

(status laxus)20.

Na histeria ocorria o alastramento da constrição que emanava do útero para o corpo, sufocando a respiração, provocando a afonia e o abafamento — hysterike pnix. O tratamento, evidentemente, consistiu em diminuir os constrangimentos, quer com a

17 “Espasmos de todos os nervos e tensão de todos os tendões, virilhas e períneo, inflamação e dor das

partes genitais ... nem as mulheres têm as partes necessárias para a erecção, como as de um Sátiro, de onde a afecção deriva o seu nome, nem são os homens afectados pelo útero, porque os homens não têm um útero”.

18 Mais tarde a μαχλοσύνη (“lascívia ou lubricidade”, Mourcin, 1832) ganhou outras designações: “salacitas”,

“pruritus uteri”, “vulvœ”, “tentigo venerea” e “furor uterinus”, etc. [“lascívia”, “prurido do útero”, “vulvas”, “ardor amoroso” e “ furor uterino”] (Semelaigne, 1895).

19 “Estado apertado”. 20 “Estado relaxado”.

aplicação de óleos tépidos e massagens na região púbica, quer com regras de vida equilibrada. Era ainda desaconselhado o prolongamento da virgindade depois da puberdade para evitar estreitamentos no útero ou nos genitais masculinos. Os tratamentos hipocráticos de atracção-afastamento uterinos foram criticados e rejeitados. Sorano recomendou ainda, para a histeria crónica, “various passive exercises and promenades, reading aloud, vocal exercise, anointing, gymnastics, baths, and varied food” (trad. 1991, p. 149). Caso estes tratamentos mais suaves não resultassem, ele preconizava medidas mais enérgicas, tais como uso de vomitório seguido de heléboro para que a doente se engasgasse.

De acordo com Veith (1965), este foi um método por “similia similibus curantur”21,

processo pouco habitual para a época e que só viria a ser usado séculos depois. As ideias de Sorano tiveram repercussão até aos primeiros séculos da Idade Média (King, 1993). Nem Areteus, nem Sorano tiveram grande impacto através da história, pois não foram traduzidos para Árabe e sobreviveram poucos exemplares das suas obras.

Se pudéssemos resumir o período grego a algumas frases, diríamos que as descrições da histeria são reveladoras da perspectiva da mulher nesta altura. A mulher grega, tal como o homem, é representada como um animal dominado por outro animal, no seu caso o útero. Mas a mulher afigura-se como a pusilanimidade humana, a pouca coragem e ousadia, que são atributos masculinos. O corpo feminino é marcado pela pequenez, fragilidade e pela falta de calor vital (Sissa, 1990/1993).

A histeria representa o domínio do soma sobre a mente e a fraqueza das mulheres que não conseguem fugir a esse destino. Apesar destes tolhimentos, as manifestações histéricas não caíam somente no foro médico, acontecia terem também elevado prestígio social, particularmente quando ocorriam entre as sacerdotisas do templo de Apolo em Delfos. Aquilo que as sacerdotisas diziam em estado crepuscular era tido como mensagens de deus e por isso mesmo era altamente valorizado (Veith, 1965). A

histeria, ainda como útero, parece ser a metáfora do desejo feminino não concretizado. 1.2.2. Continuação da tradição: convulsões e perda de consciência

Com os médicos romanos há, de facto, a retoma das ideias gregas, mas com algumas novidades. Primeira novidade, como nos mostram alguns textos, o conceito de mulher

histérica parece ser vulgar e aceite na sociedade romana. Outra novidade foi a descrição

de uma patologia no sexo masculino decorrente de causas semelhantes às da histeria. E o aspecto mais interessante foi o serem apresentadas causas psicológicas para a origem da histeria.

Nos Epigramas do poeta romano Marcial, conhecido pelos seus poemas satíricos, encontrámos a história seguinte:

Léda déclare à son vieux mari qu’elle est hystérique, et se plaint d’avoir absolument besoin de se faire besogner. Pleurant et gémissant, elle proteste qu’elle n’achètera pas aussi cher sa guérison, et jure qu’elle aime mieux mourir que d’en venir là. Son mari la conjure de vivre et de ne pas renoncer à ses belles années; il va même jusqu'à lui permettre de demander à d’autres ce qu’il ne peut plus faire lui-même. Soudain arrivent les médecins et disparaissent les matrones; elle entre en danse ... ô le fâcheux remède!22

(trad. 1864, 11. LXXI, p. 210).

O Epigrama sobre Leda dá-nos um vislumbre do que se pensaria nesta altura e que vamos encontrar quase mil e quinhentos anos depois23. As matronas, ou parteiras (em

inglês midwives ou sages-femmes em francês), eram as mulheres que aplicavam os tratamentos nas afecções ginecológicas. Leda, infeliz pelo incumprimento das responsabilidades dos seu velho marido, convenceu-o a substituir as parteiras pelos médicos que lhe ofereceram o mesmo tratamento, calcula-se que através de outras formas. Vamos voltar a encontrar este tipo de tratamento enterrado em vários textos médicos do século dezassete. Galeno de Pergamon referiu também o papel das matronas na histeria num dos seus livros, o De Locis Affectis:

L’affection appelée par les uns suffocation utérine (ύστεριχὴ πνίξ), par d’autres apnée utérine (ὰπνοία ύστεριχή); car on peut entendre les médecins deux dénominations pour une seule maladie. Ayant vu beaucoup de femmes hystériques (ύστεριχαί), car c’est ainsi qu’elles s’appellent elles-mêmes, et que les ont appelées d’abord les sages-femmes (ὶατρίναι), auprès de qui, vraisemblablement, elles ont appris ce nom.24 (trad. 1856, pp.

685-686)

A descrição da histeria por Galeno, semelhante a Hipócrates e Sorano, continua uma narrativa que vai perdurar séculos:

Unes privées en même temps de sentiment et de mouvement, offrant un pouls très-faible

22 “Leda diz ao seu marido que está histérica e queixa-se de ter uma necessidade absoluta de se ocupar.

Chorando e gemendo, ela promete que não comprará assim tão cara a sua cura e jura que prefere morrer a ver-se reduzida a esse estado. O seu marido suplica-lhe que viva e que não renuncie aos seus felizes anos; ele permite-se inclusivamente pedir a outros o que ele não pode fazer ele mesmo. Imediatamente chegam os médicos e desaparecem as matronas; ela começa a dançar ... Oh o triste remédio!”

23 Vide infra Ambroise Paré, p. 32.

24 “A afecção designada por uns de sufocação uterina (hysterike pnix), por outros de apneia uterina (apnoia

hysterike); pois podemos ouvir nos médicos duas denominações por uma só doença. Tendo visto bastantes mulheres histéricas (hysterikai), pois é assim que elas se designam a si mesmas, e que chamamos primeiramente as parteiras (iatrinai), junto de quem, verosivelmente, elas aprenderam esse nome.” Nota: segundo King (1993), hysterikai deveria ser traduzido por “sofrendo do útero”, pois nos textos de Galeno, à semelhança de Hipócrates, a histeria só aparece na forma adjectival.

et très-petit et paraissant même sans pouls, les autres sentant, se mouvant et saines de raison, mais tombant en faiblesse et respirant à peine, d’autres enfin dont les membres étaient contractés, je compris qu’il y avait de nombreuses variétés dans les affections utérines différant les unes des autres.25 (trad. 1856, p. 686)

Seriam assim três grupos de histerias resultantes de problemas uterinos. Um dos grupos caracterizava-se pela suspensão da respiração (ἄπνοιαι), outro, pela sufocação (πνίγεϛ) e o outro, pelas contracções (συνολχαί)26 (trad. 1856, p. 687). As mulheres mais

propensas à histeria seriam, ao contrário do que pensavam os médicos anteriores, fortes, cheias de sucos e sanguíneas.

Em relação à etiologia, Galeno fez notar o absurdo de pensar que o útero se movia como um animal. Essa ideia, escreveu, só podia ser partilhada por aqueles que não tivessem conhecimentos de dissecção (trad. 1856, p. 692). A causa da histeria feminina seria a supressão da menstruação ou a retenção de secreções tipo esperma no útero. Semelhante causa estava na origem da melancolia masculina. Estas retenções resultavam da ausência de relações sexuais, delas resultando o envenenamento sanguíneo, o arrefecimento do corpo e a irritação dos nervos que conduzia ao ataque histérico ou à melancolia. Segue-se a narração de Galeno:

Cette affection survient particulièrement chez les veuves, et surtout lorsque étant bien réglées avant le veuvage, fécondés, et usant volontiers des approches de l’homme, elles ont été privées de tout cela ... ces diathèses utérines surviennent aux femmes à cause de la suppression des règles ou de l’écoulement de la semence ... La semence a une grande puissance ... elle est plus humide et plus froide chez les femmes que chez les hommes, et ... comme chez les hommes aussi, les femmes qui ont beaucoup de sperme ont besoin de le répandre.27 (trad. 1856, p. 689)

O tratamento incluía os meios que “on a coutume de recourir en pareil cas”28 e que

envolviam a expulsão do esperma ou sangue menstrual retido — ou seja um orgasmo:

Partie par suite de la chaleur de ces remèdes, et partie par les attouchements que la

25 “Umas privadas simultaneamente do sentimento e do movimento, oferecendo um pulso muito fraco e

muito pequeno, parecendo mesmo sem pulso; as outras sentindo, movendo-se e sãs da razão mas tombando em fraqueza e respirando com dificuldade, finalmente outras com os membros contraídos; compreendi que há variedades numerosas nas afecções uterinas diferentes umas das outras”.

26 “Apnoiai”, “pniges” e “sinolcai”.

27“Esta afecção ocorre particularmente em viúvas, sobretudo naquelas que eram regularmente menstruadas

antes da viuvez, fecundadas e servindo-se com muito gosto das aproximações do homem; elas foram privadas de tudo isso ... estas diáteses uterinas ocorrem em mulheres devido à supressão das regras ou do corrimento do sémen ... o sémen tem um grande poder ... ele é mais húmido e mais frio nas mulheres do que nos homens e ... como nos homens, as mulheres que têm muito esperma têm necessidade de o derramar.”

médication nécessitait aux organes génitaux, il survint des tiraillements accompagnés à la fois de douleur et de plaisir, semblables aux sensations qu’on éprouve pendant le coït, et à la suite desquels elle rendit un sperme épais et abondant; elle fut dès lors délivrée des maux qu’elle ressentait.29 (trad. 1856, p. 689)

Se Galeno seguiu a tradição clássica, ele foi inovador ao ser o primeiro a escrever sobre causas psicológicas. Leia-se a esse propósito o excerto seguinte:

I was called in to see a woman who was stated to be sleepless at night and to lie tossing about from one position to another. Finding she had no fever, I made a detailed inquiry into everything that had happened to her, especially considering such factors as we know to cause insomnia ... I came to the conclusion that she was suffering from one of two things: either from a melancholy dependent on black bile, or else trouble about something she was unwilling to confess.30 (trad. 1929, p. 352)

Galeno observou também que a tristeza melancólica acompanhava a afecção hipocondríaca e que o baço estava habitualmente afectado. A histeria e a hipocondria eram doenças diferentes com etiologia distinta. A nova etiologia de Galeno foi a que mais importância teve na história da histeria. Para tal contribuiu a tradução dos seus textos para o Árabe e para o Latim, (King, 1993). De facto, encontrámos a sua referência em quase todos os autores até ao século dezoito.

Também Aulus Cornelius Celsus (trad. 1876), um sábio enciclopedista (Védrenes, 1876), escreveu sobre as doenças uterinas, dizendo que as mulheres eram susceptíveis a