• Nenhum resultado encontrado

Homicídio culposo no Código de Trânsito Brasileiro

1.1.1. Homicídio

1.1.1.2. Homicídio culposo

1.1.1.2.7. Homicídio culposo no Código de Trânsito Brasileiro

Antes do advento da Lei n. 9.503/97, conhecida como Código de Trânsito Bra- sileiro, a provocação de morte culposa por parte de condutor de veículo caracterizava crime de homicídio comum, previsto no art. 121, § 3º, do Código Penal. A divulga- ção de estatísticas que reconheceram o Brasil como recordista mundial em mortes no trânsito fez com que o legislador, ao aprovar referido Código de Trânsito, nele intro- duzisse crimes especiais de homicídio e lesão culposa na direção de veículo auto- motor, mais gravemente apenados. Atualmente, portanto, existem duas modalidades de homicídio culposo. A modalidade prevista no art. 302 da Lei n. 9.503/97 está as- sim definida:

Art. 302. Praticar homicídio culposo na direção de veículo automotor.

Pena — detenção, de dois a quatro anos, e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou habilitação para dirigir veículo automotor.

Note-se que o tipo penal continua aberto, devendo o juiz, no caso concreto, por meio de um juízo de valor, concluir se o agente atuou ou não com imprudência, ne- gligência ou imperícia.

A caracterização da culpa nos delitos de trânsito provém, normalmente, do des- respeito às normas disciplinares contidas no próprio Código de Trânsito (excesso de velocidade, embriaguez, dirigir na contramão de direção, desrespeito à sinalização, conversão em local proibido, ultrapassagem em local proibido, falar ao telefone ce- lular enquanto dirige, manobra de marcha à ré sem os cuidados necessários, desres- peito à faixa de pedestres, levar passageiros na carroceria de caminhão ou caminho- nete, deixar aberta a porta de coletivo etc.). Estas, entretanto, não constituem as únicas hipóteses de reconhecimento do crime culposo, pois o agente, ainda que não desrespeite as normas disciplinares do Código, pode agir com inobservância do cui- dado necessário e, assim, responder pelo crime. A ultrapassagem, por exemplo, se feita em local permitido, não configura infração administrativa, mas, se for efetuada sem a necessária atenção, pode dar causa a acidente e implicar crime culposo.

Entretanto, já se reconheceu que a culpa é exclusiva da vítima e que o agente não responde pelo delito quando ela cruzou repentinamente a rua ou saiu de trás de carros parados em congestionamento.

• Causas de aumento de pena

Nos termos do art. 302, parágrafo único, do CTB, a pena do homicídio culposo na direção de veículo automotor será aumentada de um terço até metade, se o agente não possui Permissão para Dirigir ou Carteira de Habilitação, se o crime é praticado em faixa de pedestre ou sobre a calçada, se o agente deixa de prestar imediato socor- ro à vítima quando possível fazê-lo sem risco pessoal, ou, ainda, se ele está, no exer- cício de sua profissão ou atividade, dirigindo veículo de transporte de passageiros.

A Lei n. 11.705/2008 revogou o inc. V do art. 302, parágrafo único, do CTB, que estabelecia aumento de pena se o autor do homicídio culposo na direção de

veículo estivesse sob influência de álcool ou substância tóxica ou entorpecente de efeitos análogos.

• O âmbito de abrangência do CTB

O art. 1º da Lei n. 9.503/97 dispõe que “o trânsito de qualquer natureza nas vias

terrestres do território nacional, abertas à circulação, rege-se por este Código”.

Assim, embora aviões, helicópteros, lanchas, barcos e jet-skis sejam veículos motorizados, a conduta culposa em sua condução não é capaz de configurar crime da lei especial, mas apenas aquele do art. 121, § 3º, do Código Penal.

Por outro lado, apesar de o art. 2º da Lei n. 9.503/97 definir via terrestre de for- ma a excluir as vias particulares (estacionamentos privados, pátios de postos de ga- solina, vias internas de fazendas etc.), entende-se que devem ser aplicados os crimes de homicídio e lesão culposa do Código de Trânsito ainda que o fato não ocorra em via pública. Com efeito, quando o legislador quis exigir que o fato delituoso fosse caracterizado apenas quando ocorresse em via pública, o fez de forma expressa no tipo penal, como nos crimes de embriaguez ao volante (art. 306), participação em competição não autorizada (art. 308) e direção sem habilitação (art. 309). Assim, fica evidente a intenção da lei em excepcionar a regra para permitir a aplicação de seus crimes de homicídio e lesão culposa, qualquer que seja o local do delito, desde que o agente esteja na direção de veículo automotor.

• Conceito de veículo automotor

O anexo I, do CTB, define veículo automotor como “todo veículo a motor de propulsão que circule por seus próprios meios, e que serve normalmente para o trans- porte viário de pessoas e coisas, ou para a tração viária de veículo utilizados para o transporte de pessoas e coisas. O termo compreende os veículos conectados a uma linha elétrica e que não circulam sobre trilhos (ônibus elétrico)”.

Estão inseridos no conceito os automóveis, os utilitários, as vans, as motocicle- tas, motonetas e ciclomotores, os quadriciclos, os ônibus que não circulam em tri- lhos, tratores, caminhões etc.

Já a conduta culposa na condução de charrete, carroça ou bicicleta só pode dar origem ao crime culposo comum.

• A expressão “na direção de veículo automotor”

O crime da lei especial não se configura pelo simples fato de a conduta culposa ocorrer no trânsito. Exige expressamente o tipo penal que o agente esteja dirigindo veículo automotor, isto é, que esteja no comando dos mecanismos de controle e ve- locidade do veículo. Por essa razão, existem várias hipóteses que parecem tipificar o crime em análise, por ocorrerem no trânsito ou serem a este relacionadas, mas que configuram crime comum. Vejam-se os seguintes casos:

a) Pedestre que atravessa pista de rolamento em momento e local inadequa- dos, causando a queda e morte de um motociclista. A imprudência ocorreu

no trânsito, mas por pessoa que não estava conduzindo o veículo, devendo responder pelo crime do Código Penal (art. 121, § 3º).

b) Passageiro de automóvel ou de ônibus que atira garrafa de refrigerante

pela janela provocando acidente na estrada. Igualmente incorre em crime comum.

c) Garupa de motocicleta que balança o veículo e provoca a queda e morte

do condutor.

d) Pessoa que mata motociclista por abrir a porta de um carro sem olhar para trás, provocando colisão.

e) Pessoa que está empurrando um carro desligado, perde o controle sobre o veículo e atropela alguém.

f) Responsável por empresa de ônibus que não providência a manutenção

dos freios da frota, hipótese em que a conduta culposa não é do condutor do veículo.

g) Pessoa que amarra grandes pedaços de madeira em um caminhão sem

os cuidados devidos, vindo uma delas a cair do veículo em movimento e matar alguém, situação em que a imprudência também não é do condutor do veículo.

• Perdão judicial

O art. 300 do Código de Trânsito expressamente permitia o perdão judicial nos crimes culposos nele elencados. Esse dispositivo, todavia, foi vetado com o argu- mento de que o perdão judicial previsto no art. 121, § 5º, do CP, já trata do tema de forma mais abrangente. Conclui-se, portanto, que o perdão judicial, com as regras previstas no Código Penal, aplica-se aos crimes de trânsito.

Documentos relacionados