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1.1.1. Homicídio

1.1.1.1.2. Homicídio privilegiado

Art. 121, § 1º — Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante

valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço.

• Introdução

As hipóteses de privilégio têm natureza jurídica de causa de diminuição de pena, pois, quando presentes, fazem com que a pena seja reduzida de um sexto a um

terço. A denominação privilégio, embora amplamente consagrada, não consta do texto legal.

É pacífico o entendimento de que, apesar de a lei mencionar que o juiz pode dimi- nuir a pena se reconhecido o privilégio, tal redução é obrigatória, na medida em que o art. 483, inc. IV, do Código de Processo Penal, diz que as causas de diminuição de pena devem ser apreciadas pelos jurados na votação dos quesitos e, assim, se estes votarem favoravelmente ao reconhecimento do privilégio, a redução deverá ser aplicada pelo juiz em decorrência do princípio constitucional da soberania dos vereditos do júri (art. 5º, XXXVIII, c, da Constituição Federal). Por isso é que se diz que a redução da pena decorrente do privilégio — se reconhecido pelos jurados — é direito subjetivo do réu. Ao juiz cabe apenas escolher o índice de diminuição entre um sexto e um terço.

• Motivo de relevante valor social

Essa primeira hipótese de privilégio está ligada à motivação do agente, no sen- tido de imaginar que, com a morte da vítima, estará beneficiando a coletividade.

Fora das hipóteses em que o sujeito age acobertado por excludente de ilicitude, a morte de alguém é sempre ato considerado contrário aos interesses sociais. Daí por que ser o homicídio considerado crime. A lei, todavia, permite que os Jurados, repre- sentando a coletividade, condenem o réu, por considerar o ato criminoso, mas permi- tam a redução de sua pena porque ele, ao matar, imaginava estar beneficiando o corpo social. O exemplo clássico é o do homicídio do traidor da nação.

• Motivo de relevante valor moral

Diz respeito a sentimentos pessoais do agente aprovados pela moral média, co mo piedade, compaixão etc. No dizer de Heleno Cláudio Fragoso, são os motivos ti dos como nobres ou altruístas.3 A própria exposição de motivos do Código Penal ci ta a

A eutanásia se verifica quando o agente tira a vida da vítima para acabar com

o grave sofrimento decorrente de alguma enfermidade. Pode se dar por ação, como no caso de sufocação de pessoa com grave cirrose hepática, ou por omissão, ao não providenciar alimento, por exemplo, à pessoa tetraplégica. Alguns mencionam como exemplo de eutanásia omissiva desligar os aparelhos que mantêm viva uma pessoa que se encontra em estado vegetativo. Tal pessoa não consegue respirar sem a ajuda de aparelhos, mas não tem uma enfermidade (patologia) que a levará à morte, poden- do sobreviver por muitos anos. Nesse caso, desligar os aparelhos constitui eutanásia. Trata-se, entretanto, de uma ação e não de uma omissão.

A ortotanásia não constitui crime. Nesta o médico deixa de lançar mão de tra-

tamentos paliativos que só prolongariam por pouco tempo a vida de pessoa com doença irreversível e fatal, como em caso de grave câncer em que o médico desiste de tratamento quimioterápico, que só traria mais sofrimento à vítima em razões dos seus efeitos colaterais, quando já se sabe que o quadro não reverterá. Nesse caso, a morte da vítima decorre do câncer e não da ação ou omissão do médico.

Possível também o reconhecimento do relevante valor moral em casos de homi- cídio consentido para abreviar o sofrimento da vítima.

Pai que mata o estuprador da filha

Esse é um dos casos mais citados como exemplo de homicídio privilegiado em que o pai, algum tempo depois do fato, descobre quem foi o autor do crime sexual contra sua filha, e, então, comete homicídio. Alguns entendem que se trata de relevan- te valor moral, porque o motivo do pai é defender a honra da filha — sentimento in- dividual relevante. Para outros, se trata de relevante valor social, porque sua intenção é eliminar um marginal, beneficiando a coletividade. Embora existam duas corren tes quanto ao fundamento, é pacífico que se trata de caso de homicídio privilegiado.

• Crime praticado sob o domínio de violenta emoção logo em seguida à injusta provocação da vítima

PRIVILÉGIO

injusta provocação da vítima Violenta emoção do agente Ato homicida logo em seguida ao

ato provocador

Injusta provocação

Por uma série de razões, é possível que uma pessoa provoque a outra, fazendo-o, por exemplo, por meio de xingamentos, de brincadeiras de mau gosto, riscando seu carro, jogando lixo ou pichando sua casa etc.

Basicamente o que diferencia o privilégio da legítima defesa é o fato de que, no primeiro, ocorre mera provocação da vítima, enquanto, na segunda, há ato de injus- ta agressão.

Não se pode, contudo, esquecer de que a legítima defesa possui vários outros re- quisitos. Ela exige, ainda, que o agente use moderadamente dos meios necessários

para repelir a injusta agressão. Esse requisito não se mostra presente, por exemplo, quando alguém empurra outra pessoa, ou lhe dá um tapa no rosto, ou, ainda lhe joga alguma bebida no rosto, e o agente, em contrapartida, efetua vários disparos contra ela. Não obstante tenha havido uma agressão por parte desta, a reação homicida foi despro- porcional, não sendo possível falar-se em legítima defesa. Não se pode negar, contudo, o caráter provocativo da vítima, o que permitirá o reconhecimento do privilégio.

Da mesma forma, exige a excludente da legítima defesa que a agressão seja

atual ou iminente. Na prática, contudo, se uma pessoa agrediu outra com socos e chutes e, cessada a agressão, foi até seu veículo para deixar o local, sendo, neste momento, alvejada pela vítima da agressão, que conseguira pegar um revólver com amigo que estava próximo, não estará configurada a legítima defesa porque a agressão inicial contra ela já havia cessado. Poderá, todavia, ser reconhecido o privilégio.

Conclui-se, portanto, que, se houver ato de provocação, só pode ser reconhecido o privilégio. Se, entretanto, houver injusta agressão por parte da vítima, poderá ser reconhecida a legítima defesa se presentes os demais requisitos do art. 25 do Código Penal, sendo o réu absolvido. Se ausente algum deles, abre-se a possibilidade do re- conhecimento do privilégio, pois o ato de agressão não deixa de ser uma provocação. O contrário, porém, não é verdadeiro.

Quando alguém mata em razão de ter flagrado cônjuge ou companheiro em ato de adultério, é possível o reconhecimento do privilégio, pois é inegável que a situa- ção do flagrante provoca violenta emoção e que o adultério é considerado ato de in- justa provocação. Não se trata aqui de morte baseada em mero ciúme, e sim de vio- lenta emoção decorrente do flagrante de adultério. No passado alguns homens que cometeram crimes em tal situação foram absolvidos por legítima defesa da honra. Os Tribunais, todavia, há muitos anos, rechaçaram tal possibilidade de absolvição, alegando que existe completa desproporção entre o homicídio e o ato de adultério, o que inviabiliza a absolvição por legítima defesa. O privilégio, porém, tem sido ple- namente aceito em tais casos.

Nota-se, por consequência, que, para o reconhecimento do privilégio, não é ne- cessário que a vítima tenha tido a específica intenção de provocar, bastando que o agente se sinta provocado. No caso do adultério, por exemplo, o cônjuge traidor se- quer pretendia que o outro tomasse conhecimento disso.

Domínio de violenta emoção

O texto legal é bastante exigente, já que, para o reconhecimento do benefício, não basta a violenta emoção, sendo necessário que o agente fique sob o domínio

desta. Exige-se, portanto, uma fortíssima alteração no ânimo do agente, isto é, que fique irado, revoltado, perturbado em decorrência do ato provocativo. Trata-se de situação em que o sujeito fica tão intensamente alterado que acaba fazendo uma bo- bagem, que não faria se estivesse calmo. Daí a razão da diminuição da pena, tendo em vista que tal estado emocional foi causado por provocação da vítima.

O art. 28 do Código Penal dispõe que a emoção não exclui o crime, mas, na hi- pótese em análise, se acompanhada de outros requisitos, gera a redução da pena, em razão do disposto no art. 121, § 1º, do Código Penal.

Ato homicida logo em seguida à injusta provocação

Para a aplicação do benefício, mostra-se necessária a chamada reação imedia- ta, ou seja, que o ato homicida ocorra logo em seguida à provocação. Não existe uma

definição exata em torno da expressão “logo em seguida”, sendo ela normalmente reconhecida quando o homicídio ocorre no mesmo contexto fático da provocação ou minutos depois. Assim, se a vítima xinga o agente dentro de um bar e este ime- diatamente saca um revólver e a mata, não há dúvida de que o fato se deu logo após a provocação. Esse requisito, contudo, mostra-se ainda presente, se a pessoa xingada vai até seu carro ou até sua casa, que fica nas proximidades, retorna ao bar minutos depois e mata a vítima.

É possível que a provocação tenha ocorrido há muito tempo mas o agente só tenha tomado conhecimento pouco antes do homicídio e, nessa hipótese, há privilé- gio. Deve-se, pois, levar em conta o momento em que o sujeito ficou sabendo da injusta provocação e não aquele em que esta efetivamente ocorreu. Ex.: uma pessoa, em reunião de amigos, difama gravemente outra que não está presente. Alguns dias depois, uma das pessoas presentes à reunião encontra-se com aquele que foi difama- do e lhe conta sobre o ocorrido. Este, ao ouvir a narrativa, fica extremamente irritado e, de imediato, vai à casa do difamador e comete homicídio.

• Diferença entre o privilégio da violenta emoção e a atenuante genérica homônima (de mesmo nome)

Nota-se no próprio texto legal duas diferenças. No privilégio, exige-se que o agente esteja sob o domínio de violenta emoção porque o ato se dá logo em seguida

à injusta provocação. Na atenuante (art. 65, III, c), basta que ele esteja sob influência

de violenta emoção decorrente de ato injusto, sem a necessidade de que o ato homi- cida ocorra logo em seguida àquele. Por isso, se o agente matou a vítima em face de perturbadora emoção ao flagrar o adultério, aplica-se o privilégio. Se ele, todavia, flagra a relação extraconjugal, mas comete o homicídio somente alguns dias depois, mostra-se possível apenas a atenuante genérica.

O agente comete o crime sob a influê ncia de violenta emoção, provocada por ato injusto da vítima.

Privilégio Atenuante

O agente mata sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida à

Fácil concluir, portanto, que, como os requisitos são diversos, caso os jurados reconheçam o privilégio, que tem requisitos maiores, não poderá ser aplicada a ate- nuante. Caso, todavia, recusem o privilégio, o juiz poderá aplicar a atenuante, se presentes seus requisitos.

• Caráter subjetivo das hipóteses de privilégio

Todas as figuras de privilégio são de caráter subjetivo, porque ligadas à moti-

vação do agente (relevante valor social ou moral) ou à motivação somada à violenta emoção. Assim, nos termos do art. 30 do Código Penal, não se comunicam a coau- tores e partícipes do homicídio. Ex.: pai encontra o estuprador da filha e começa a desferir golpes para matá-lo. Nesse momento, um amigo chega ao local e, sem saber que se trata do estuprador, ajuda-o a matar o malfeitor. O pai responde por homicídio privilegiado, o amigo não. É evidente, contudo, que, se a motivação dos agentes for a mesma, será possível o reconhecimento do privilégio para ambos. Ex.: pai e mãe que matam o estuprador da filha.

1.1.1.1.3. Homicídio qualificado

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