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Associado ao conceito de a¸c˜ao de grupo est´a o conceito de espa¸co homogˆeneo. Defini¸c˜ao 3.4. Se G ´e um grupo de Lie, um G-espa¸co homogˆeneo ´e uma variedade suave munida de uma a¸c˜ao diferenci´avel e transitiva de G.

Quando G est´a impl´ıcito ou n˜ao ´e importante destac´a-lo, chamamos um G- espa¸co homogˆeneo apenas de espa¸co homogˆeneo.

Podemos construir uma vasta gama de espa¸cos homogˆeneos com o aux´ılio das classes laterais de um subgrupo fechado H de um grupo de Lie G. Lembramos que, se H ´e um subgrupo de G, uma classe lateral `a esquerda de G m´odulo H ´e um subconjunto de G da forma {gh, h ∈ H}, para algum g ∈ G. Denotamos o conjunto das classes laterais `

a esquerda de G m´odulo H por G/H. O pr´oximo teorema elucida essa constru¸c˜ao. Teorema 3.4. Seja G um grupo de Lie e H um subgrupo fechado dele. O espa¸co de classes laterais `a esquerda G/H ´e uma variedade topol´ogica de dimens˜ao dim G - dim H, e tem uma ´unica estrutura diferenci´avel tal que a aplica¸c˜ao quociente π : G → G/H ´e uma submers˜ao. A a¸c˜ao `a esquerda de G em G/H dada por

g· (g0H) = (gg0)H torna G/H um G-espa¸co homogˆeneo.

Demonstra¸c˜ao. Veja o Teorema 21.17 de (LEE, 2013).

Al´em disso, qualquer espa¸co homogˆeneo ´e equivalente aos obtidos a a partir da constru¸c˜ao acima, como esclarece o teorema abaixo.

Teorema 3.5. Sejam G um grupo de Lie, M um G-espa¸co homogˆeneo e p algum ponto de M . O grupo de isotropia Gp ´e um subgrupo fechado de G, e a aplica¸c˜ao F : G/Gp → M definida por F (gGp) = g· p ´e um difeomorfismo equivariante.

Demonstra¸c˜ao. Tomando θp a aplica¸c˜ao de ´orbita como feito anteriormente, segue que Gp = (θp)−1(p) ´e fechado. Claramente, F est´a bem definida, pois se gGp = g0Gp, ent˜ao g0 = gh, com h ∈ Gp. Portanto, F (gGp) = g· p = g· (h· p) = gh· p = F (g0Gp). Ademais, F pode ser obtida pela passagem ao quociente da aplica¸c˜ao θp, conforme descreve o Teorema 4.30 de (LEE, 2013), por conseguinte, satisfaz F ◦ π = θp. Como a a¸c˜ao ´e transitiva, θp ´e sobrejetiva, logo F tamb´em ser´a. Ainda, se F (gGp) = F (g0Gp), ent˜ao

g0· p = g· p ↔ g−1g0· p = p ↔ g−1g0 ∈ G

p ↔ gGp = g0Gp,

donde segue que F ´e injetiva. Por fim, note que F (g· g0Gp) = F ((gg0)Gp) = gg0· p = g· g0· p = g· F (g0G

p), logo F ´e equivariante, e pelo Teorema da Aplica¸c˜ao Equivariante, tem posto constante e ´e difeomorfismo, encerrando a demonstra¸c˜ao.

No pr´oximo exemplo, usaremos livremente a identifica¸c˜ao entre pontos e ve- tores em espa¸cos vetoriais, bem como a identifica¸c˜ao entre matrizes e transforma¸c˜oes lineares, assim como fizemos em algumas outras ocasi˜oes.

Exemplo 3.10. Considere a a¸c˜ao de SO(n) em Sn−1 como descrita no exemplo 3.8. Nesse caso, a esfera ´e certamente um espa¸co homogˆeneo. Se considerarmos o ponto p = (0, . . . , 0, 1) em Sn−1, temos que o seu grupo de isotropia ´e isomorfo a SO(n − 1). De fato, se p⊥ = {v ∈ Rn, hp, vi}, dado A ∈ Gp, a restri¸c˜ao ˜A := A|p⊥ : p⊥→ p⊥est´a bem definida,

pois 0 = hp, vi = hAp, Avi = hp, Avi, ∀v ∈ p⊥. Claramente, podemos identificar p⊥ com Rn−1. Ademais, ˜A ´e ortogonal, pois preserva o produto interno canˆonico e tomando a representa¸c˜ao matricial de ˜A, notamos que det( ˜A) = 1. Com isso, ´e simples de ver que a associa¸c˜ao A 7→ ˜A ´e um homomorfismo de grupos de Lie entre Gp e SO(n − 1) (para esclarecer, ˜A ´e a matriz obtida a partir da elimina¸c˜ao da ´ultima linha e da ´ultima coluna de A). Se ˜A = Idp⊥, ent˜ao A|p⊥ = Idp⊥, e como Ap = p, por linearidade,

A = IdRn. Al´em disso, se B ∈ SO(n − 1), podemos estender a aplica¸c˜ao linearmente

a Rn fixando p. Sendo ¯B essa extens˜ao, fica evidente que ˜B = B, logo a associa¸¯ c˜ao ´e sobrejetiva. Conforme observamos, homomorfismos de grupos de Lie tem posto constante, e por ser bijetiva, ´e um difeomorfismo. Pelo Teorema 3.5, obtemos que Sn−1 ´e isomorfo a SO(n)/SO(n − 1).

3.3.1 M´etricas em grupos de Lie e em espa¸cos homogˆeneos

Nessa se¸c˜ao, dedicar-nos-emos a definir m´etricas em grupos de Lie que se relacionam com a estrutura alg´ebrica do grupo.

Defini¸c˜ao 3.5. Dado um grupo de Lie G, uma m´etrica invariante `a esquerda em G ´e uma m´etrica Riemanniana tal que as transla¸c˜oes `a esquerda s˜ao isometrias. Analoga- mente, uma m´etrica invariante `a direita em G ´e uma m´etrica em que as aplica¸c˜oes Rg s˜ao isometrias. Uma m´etrica invariante `a esquerda e `a direita ´e dita bi-invariante. Um fato interessante ´e que, fixado um grupo de Lie G, as m´etricas invariantes `

a esquerda est˜ao em correspondˆencia biun´ıvoca com os produtos internos em Lie(G). De fato, se h· , · i ´e uma m´etrica invariante `a esquerda de G, considere a fun¸c˜ao hX, Y i, com X, Y ∈ Lie(G). Note que, se g ∈ G, ent˜ao hX, Y i(g) = hXg, Ygi = h(Lg)∗Xe, (Lg)∗Yei = hXe, Yei = hX, Y i(e), logo a aplica¸c˜ao (X, Y ) 7→ hX, Y i ´e, de fato, um produto interno. Reciprocamente, dado um produto interno em Lie(G), uma vez que qualquer base de Lie(G) ´e um referencial de Γ(T G), podemos escrever qualquer campo suave em G como combina¸c˜ao linear dos vetores de uma base fixa de Lie(G) com coeficientes diferenci´aveis, e dessa maneira conclu´ımos que podemos estender por bilinearidade o produto interno em Lie(G) a qualquer par de campos vetoriais, tendo como contradom´ınio o espa¸co das fun¸c˜oes reais diferenci´aveis, e com isso definimos uma m´etrica em G. O fato de que o produto interno entre dois campos invariantes `a esquerda ´e constante garante que a m´etrica definida ´e invariante `a esquerda.

Quando munimos G de uma m´etrica bi-invariante, alguns dos operadores geom´etricos definidos em G podem ser expressados em termos alg´ebricos. Exemplifcando

essa afirma¸c˜ao, temos a

Proposi¸c˜ao 3.5. Seja G um grupo de Lie conexo munido de uma m´etrica invariante `a esquerda. S˜ao equivalente as afirma¸c˜oes:

(a) h· , · i ´e invariante `a direita, portanto bi-invariante. (b) A invers˜ao g 7→ g−1 ´e uma isometria.

(c) (Identidade de Weyl) h[X, Y ], Zi = hX, [Y, Z]i, ∀X, Y, Z ∈ Lie(G). (d) ∇XY = [X,Y ]2 , ∀X, Y ∈ Lie(G).

(e) As geod´esicas iniciando em e s˜ao os subgrupos a um parˆametro de G. Demonstra¸c˜ao. Veja a Proposi¸c˜ao 9 do cap´ıtulo 11 de (O’NEILL, 1983).

Corol´ario 3.2. Se G ´e um grupo com m´etrica bi-invariante Riemanniana, ent˜ao (a) RXYZ =

[[X,Y ],Z]

4 , ∀X, Y, Z ∈ Lie(G)

(b) Se X e Y s˜ao vetores unit´arios e ortogonais de Lie(G), K(X, Y ) = h[X, Y ], [X, Y ]i

4 Demonstra¸c˜ao. (a) Como ∇XY = [X, Y ]/2,

RXYZ = [[X, Y ], Z] 2 − [X, [Y, Z]] 4 + [Y, [X, Z]] 4 .

Pela identidade de Jacobi, [X, [Y, Z]] + [Y, [Z, X]] + [Z, [X, Y ]] = 0, e com isso −[X,[Y,Z]]4 +[Y,[X,Z]]4 = [Z,[X,Y ]]4 . Portanto, RXYZ = [[X,Y ],Z]2 +[Z,[X,Y ]]4 = [X,[Y,Z]]4 , como quer´ıamos.

(b) Pela identidade de Weyl,

K(X, Y ) = hRXYX, Y i = h[X, [Y, X]], Y i 4 = h[[X, Y ], X], Y i 4 = h[X, Y ], [X, Y ]i 4 .

Feitas essas considera¸c˜oes a respeito de m´etricas em grupos de Lie, passemos agora `a constru¸c˜ao de m´etricas em espa¸cos homogˆeneos. Antes, consideremos o seguinte resultado:

Teorema 3.6. Seja M uma variedade Riemanniana, G um grupo de Lie e θ : G×M → M uma a¸c˜ao diferenci´avel, livre e pr´opria. Se θg : M → M for uma isometria de M para todo g ∈ G, ent˜ao M/G admite uma ´unica m´etrica Riemanniana em rela¸c˜ao `a qual a proje¸c˜ao canˆonica π : M → M/G ´e uma submers˜ao Riemanniana.

Demonstra¸c˜ao. Pelo Teorema 3.3, π : M → M/G ´e uma submers˜ao. Agora, definamos pontualmente uma m´etrica M/G da seguinte forma: dados X, Y ∈ Tπ(p)M/G, sejam

˜

Xp, ˜Yp ∈ TpM os ´unicos vetores horizontais tais que (π∗)p( ˜Xp) = X e (π∗)p( ˜Yp) = Y . Ent˜ao, defina

hX, Y iπ(p)= h ˜Xp, ˜Ypip,

de modo que h· , · ip ´e o produto interno em TpM dado pela m´etrica de M .

Provemos a boa defini¸c˜ao de h· , · iπ(p). De fato, se π(p) = π(q), existe g ∈ G tal que g· p = q. Com isso, temos que θg∗p : TpM → TqM ´e uma isometria linear. Se v ∈ TpM ´e um vetor vertical, existe uma curva α : (−, ) → M tal que α(0) = p, α0(0) = v e α(−, ) ⊂ π−1(π(p)). Portanto, temos que (θg ◦ α)(0) = q, (θg ◦ α)0(0) = θg

∗p(v) e, uma vez que π = π ◦ θg, π ◦ (θg◦ α) = π ◦ α = π(p), e ent˜ao (θg ◦ α)(−, ) ⊂ π−1(π(p)). Desses dados, conclu´ımos que θg

∗p(v) ´e vertical. Sabemos que a dimens˜ao do espa¸co de vetores verticais em cada ponto ´e constante e igual a dim(M ) − dim(G), assim temos que θg

∗p aplica isometricamente Vp em Vq e, consequentemente, Hp em Hq. Novamente pela igualdade π = π ◦ θg, temos que π

∗p = π∗q ◦ θg∗p, e tomando ˜Xp e ˜Yp como no par´agrafo acima, segue que π∗q(θg∗p( ˜Xp)) = π∗q◦ θg∗p( ˜X)p) = π∗pX˜p = X, e ent˜ao θg∗pX˜p ∈ TqM ´e o vetor horizontal de TqM que se projeta em X. Analogamente, θg∗pY˜p) ∈ TqM ´e o vetor horizontal que se projeta em Y . Com isso,

hX, Y iπ(p) = h ˜Xp, ˜Ypip = hθg∗pX˜p), θg∗pY˜piq = hX, Y iπ(q),

provando que h· , · iπ(p) est´a bem definida. Tal forma bilinear ´e trivialmente um produto interno, nos faltando apenas provar a diferenciabilidade. Para isso, tome V e W em Γ(T (M/G)) e seus respectivos levantamentos horizontais ˜V e ˜W . Ent˜ao a fun¸c˜ao p 7→ h ˜Vp, ˜Wpip e diferenci´´ avel, e pela defini¸c˜ao de h· , · iπ(p), a fun¸c˜ao p 7→ hV, W iπ(p) ´e suave. Como tal fun¸c˜ao ´e constante nas fibras de π, pelo Teorema 4.30 de (LEE, 2013), podemos pass´a-la ao quociente de modo suave, obtendo π(p) 7→ hV, W iπ(p), que ´e a m´etrica que definimos.

A unicidade da m´etrica ´e evidente pois, para que π seja uma submers˜ao Rie- manniana, π∗p|H

p : Hp → Tπ(p)(M/G) deve ser isometria linear, e isso determina o valor

da m´etrica em M/G.

A m´etrica definida como no teorema acima ´e chamada a m´etrica induzida por π, ou a m´etrica G-invariante, ou canˆonica em M/G. A menos de men¸c˜ao em contr´ario, suporemos, nas ocasi˜oes em que M/G aparecer, que esta variedade est´a munida com a m´etrica canˆonica.

De posse do resultado anterior, podemos finalmente construir uma m´etrica em um espa¸co homogˆeneo G/H, da seguinte forma:

Teorema 3.7. Seja G um grupo de Lie munido de uma m´etrica bi-invariante h· , · i. Se H ´e um subgrupo de Lie fechado de G, ent˜ao:

(a) O G-espa¸co homogˆeneo G/H pode ser munido com uma m´etrica Riemanniana tal que a proje¸c˜ao canˆonica π : G → G/H ´e uma submers˜ao Riemanniana.

(b) A a¸c˜ao ψ : G × G/H → G/H dada por ψ(g, g0H) = gg0H ´e transitiva e tal que ψg ´

Demonstra¸c˜ao. (a) Considere a a¸c˜ao `a direita θ de H em G dada por θ(h, g) = gh. Para h ∈ H, temos que θh = R

h, logo θh ´e isometria para todo h em H, pois a m´etrica ´e bi-invariante. A conclus˜ao segue do Teorema 3.6.

(b) ´E evidente que vale ψg◦π = π◦Lg, ∀g ∈ G. Com isso, se ˜X ∈ Γ(G) ´e o levantamento horizontal de X ∈ Γ(G/H), temos que

ψg∗X = ψg∗π∗X = π˜ ∗(Lg)

Analogamente, se ˜Y ´e o levantamento horizontal de Y , ent˜ao ψg

∗Y = π∗(Lg)Y .˜ Mas como Lg ´e uma isometria de G, um argumento an´alogo ao da prova do teorema anterior garante que (Lg)∗X e (L˜ g)∗Y s˜˜ ao campos horizontais, e ent˜ao segue do fato de que π ´e uma submers˜ao Riemanniana e da constru¸c˜ao de G/H que

g ∗X, ψg ∗Y i = hπ∗(Lg)∗X, π˜ ∗(Lg)∗Y i = h(L˜ g)∗X, (L˜ g)∗Y i = h ˜˜ X, ˜Y i = hX, Y i, como quer´ıamos demonstrar.

Teorema 3.8. Nas condi¸c˜oes do teorema anterior, G/H ´e orient´avel.

Demonstra¸c˜ao. Podemos tomar uma base ortonormal S := {V1, . . . , Vk} de ^Lie(H), que podemos considerar como um subconjunto ortonormal de ^Lie(G) (note que, aqui, muni- mos H com a m´etrica induzida por G, e essa m´etrica ´e claramente bi-invariante em H). Ent˜ao, estendamos S a uma base ortonormal ¯S := {V1, . . . , Vk, Vk+1, . . . , Vn} de ^Lie(G) e tomemos ¯S S = {Vk+1, . . . , Vn}, que ´e uma base de ( ^Lie(H))⊥, e para cada x ∈ G, {lx(Vk+1x), . . . , lx(Vnx)} ´e uma base de Tπ(x)G/H. Um argumento an´alogo ao do Teorema 3.6 garante que lx(Vix) n˜ao depende de x ∈ π−1(π(x)), para todo i = k + 1, . . . , n. Al´em disso, pelo teorema do posto, podemos tomar sistemas de coordenadas (U, x1, . . . , xn) de G, com 0 ∈ U , e (V, xk+1, . . . , xn) de G/H tais que a representa¸c˜ao de π nessas coordena- das ´e dada pela associa¸c˜ao (x1, . . . , xn) 7→ (xk+1, . . . , xn). Ent˜ao, se Vj x =

n P i=1 aji(x)∂x∂ i|x, temos que lx(Vj x) = n P i=k+1

aji(x)∂xi|π(x). Agora, note que π|U : U → V ´e uma submers˜ao sobrejetiva e, como lx(Vix) n˜ao depende de x ∈ π−1(π(x)), as fun¸c˜oes aji(x) definidas em U s˜ao constantes nas fibras de π|U, logo essas descem aos quocientes, e obtemos aji : V → R, e ent˜ao lx(Vj x) =

n P

i=k+1

aji(π(x))∂x

i|π(x). Denotando por Wj a aplica¸c˜ao

x 7→ lx(Vj+k x) e η a se¸c˜ao de π|U cuja representa¸c˜ao nas coordenadas acima citadas ´e (x1, . . . , xn−k) 7→ (0, . . . , 0, x1, . . . , xn−k), segue que (Wj ◦ η)(y) =

n P

i=k+1

aji(y)∂x

i|y ´e um

campo vetorial diferenci´avel, logo (W1, . . . , Wn−k) ´e um referencial suave em todos os pontos de G/H, provando que essa variedade ´e orient´avel.

3.4 Aplica¸c˜ao de Gauss em espa¸cos homogˆeneos e o teorema de Ruh-Vilms

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