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Capítulo II – Turismo e hotelaria

2.3. Hotelaria

2.3.4. Hotelaria: uma indústria de serviços

A hotelaria é essencialmente uma indústria de serviços, apesar de ter alguma produção de bens. Na indústria a produção está voltada para o capital ou equipamento e dão prioridade às aptidões técnicas e a formação e o treino são decisivos para os resultados. Nos serviços a produção está direcionada para as pessoas, são mais valorizadas as aptidões/competências interpessoais, a orientação e a coordenação das pessoas é determinante e os resultados têm maior variação que na indústria (Mullins, 2009). Na Tabela 11 apresentámos as diferenças entre bens e serviços referidas por Stamatis (1996, citado em Mullins, 2009).

Tabela 11 - Diferenças entre a produção de bens e serviços

Operações de serviço centradas nos bens e na produção Operações de serviços centradas no consumidor

Consumidor é envolvido em poucos processos de produção. O consumidor é envolvido no processo de produção.

O processo de produção e entrega são separados. Os processos de produção e entrega sobrepõem-se em graus

variáveis e até podem ser até idênticos.

A produção é independente do consumo A produção é quase sempre simultânea com o consumo

O planeamento do produto está centrado no cliente e o do

processo no empregado. O planeamento do produto e do processo estão centrados no cliente.

Os resultados da produção demonstram menor variabilidade. Os resultados da produção apresentam maior variabilidade. Maior possibilidade de existirem padrões, inspeções, controle e

de ser mensurável. Menor possibilidade de ter padrões, inspeções, controle e de ser mensurável.

Tecnicamente mais complexas. Tecnicamente menos complexas.

AS relações entre o consumidor – empregado geralmente não

são complexas. As relações entre o consumidor – empregado geralmente são muito complexas.

As competências técnicas predominam nas operações. As habilidades interpessoais predominam nas operações.

A formação/treino é basicamente físico. A formação/treino é em grande parte psicológico.

A maior parte dos produtores não lida diretamente com o

cliente. A maior parte dos produtores lida diretamente com o cliente.

A produção/economia de escala é em geral possível. A produção/economia de escala não é possível.

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Enquanto um bem é tangível e palpável, um serviço é intangível e impalpável e não pode ser visto nem apreendido mentalmente antes de ser consumido (Tocquer & Zins, 2004). A intangibilidade, segundo João Rêgo (citado em Costa, 2012), é uma das maiores dificuldades na venda do produto hoteleiro porque, devido às suas caraterísticas, existe um conjunto de variáveis que não são controladas pelo gestor hoteleiro, tornando-se um verdadeiro desafio diário. Tocquer e Zins (2004) apresentam na Figura 17 uma equação do serviço hoteleiro global.

Figura 17 - Equação do serviço hoteleiro

Fonte: Adaptado de Tocquer e Zins (2004)

Numa perspetiva de gestão, Costa (2012) refere que o serviço hoteleiro é composto por um conjunto de serviços elementares, que podem ser comercializados per se ou em conjunto, e que podem ser sistematizados por quartos com diversas tipologias de habitação, aluguer de espaços, serviços de alimentos e bebidas e outros serviços. Marques (2003), salienta que as necessidades dos hóspedes são asseguradas pelos serviços hoteleiros de quartos, cozinha, restaurante e bar, portaria e telefones. No entanto, Castelli (1995) refere que a UH se apresenta ao cliente como um todo, onde se distingue a estrutura e o funcionamento. Neste sentido, atribui importância ao fluxo do serviço, desde a sua solicitação até à sua execução e ao processo de sincronização, entre o suporte estrutural e funcional, que compreende as áreas de alojamento, alimentação e bebidas, administração e vendas.

Num artigo de opinião, João Rêgo (Costa, 2012) refere que o serviço hoteleiro é cada vez mais vulnerável, devido à facilidade e rapidez de comunicar e informar através das redes sociais na internet. Por isso, o serviço hoteleiro deve ser cuidado, personalizado, onde o foco nos pormenores é um fator distintivo dos bons profissionais e das UH de sucesso. Daí que a atenção aos desejos dos hóspedes deva ser constante, para tornar a sua experiência única a fim de que se sinta tratado de forma carinhosa. Numa fase em que o progresso tecnológico predomina, a diferença está na qualidade dos RH (Costa, 2012). Neste aspeto é importante realçar as diferenças entre serviço e ‘Hospitality’, referidas por Hemmington (2007), na secção 2.3.2.. De seguida vamos abordar as caraterísticas do serviço hoteleiro.

51 2.3.4.1. Características do serviço hoteleiro

Cada UH tem as suas caraterísticas relacionadas com a infraestrutura física, os serviços disponíveis, a qualidade, as competências dos colaboradores e a sua localização (Costa, 2012). Vários autores (Clarke & Chen, 2008; Costa, Rita, & Águas, 2001; Costa, 2012; Kotler, Bowen, & Makens, 2010; Mullins, 2001, 2008) apontam algumas caraterísticas do serviço hoteleiro, que o gestor hoteleiro deverá considerar no âmbito da gestão de uma UH. Uma das caraterísticas da hospitalidade mais relevante, é o papel desempenhado pelos colaboradores, através do contacto direto e pelas interações entre si e os hóspedes, que exige um elevado nível de comprometimento com o serviço e dar o melhor de si (Mullins, 2009).

Na perspetiva do gestor hoteleiro, Costa (2012) refere que o serviço hoteleiro tem um elevado grau de intangibilidade, porque é observado e testado no ato do consumo; a produção e o consumo verificam-se em simultâneo; é heterogéneo devido às caraterísticas dos hóspedes e dos colaboradores; e é perecível porque é difícil armazenar um quarto que não é vendido hoje para o vender amanhã. As empresas hoteleiras fazem um elevado investimento na compra do terreno, na construção e no equipamento, mas o tipo de edifício e de equipamentos dificulta a sua reconversão ou deslocalização. Salienta, também, que utiliza uma mão-de-obra intensiva, que é agravada pela sazonalidade e influenciada por fatores externos, como: o baixo nível de fidelização de hóspedes; a variação e a inconstância da duração da estada dos hóspedes; possíveis condicionalismos políticos e sociais; e um forte crescimento da oferta. Devido à heterogeneidade das UH, Mullins (2001) aponta várias caraterísticas da hotelaria (Tabela 12).

Tabela 12 - Caraterísticas da hotelaria, segundo Mullins

As UH variam de dimensão e categoria e de classificação.

A maior parte das UH funcionam 24h por dia, sete dias por semana e 365 dias do ano. Têm elevados custos fixos de funcionamento, mas estão dependentes da sazonalidade. Vários tipos de hóspedes procuram satisfazer uma variedade de necessidades e de expectativas.

O serviço é produzido e consumido no momento da entrega, logo não é tangível nem é possível ser armazená-lo. Os serviços são articulados e são executados em simultâneo.

Os gestores hoteleiros devem coordenar os serviços, demonstrando várias competências técnicas e de gestão. Alguns colaboradores vivem na UH.

São necessários colaboradores com várias e diferentes competências e outros com poucas competências. A maioria dos colaboradores recebe baixos salários.

Os colaboradores trabalham muitas horas à noite, ao fim de semana e nos feriados. Existem muitos colaboradores, especialmente do sexo feminino, em regime de part-time. Existem colaboradores de várias nacionalidades nas UH.

Existem vários sindicatos hoteleiros.

É possível a mobilidade dos colaboradores entre UH da mesma empresa. Existe um elevado turnover na hotelaria.

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Ao comparar a indústria do turismo com os restantes serviços, Costa, Rita e Águas (2001) identificam algumas caraterísticas comuns (intangibilidade, produção no local de consumo e não-armazenamento), mas salientam outras ainda mais específicas, tais como: a exposição aos serviços ser reduzida mas intensa; a existência de um maior grau de emoção e de irracionalidade no ato da compra; o local de consumo ser distante; a importância dos canais de distribuição; e a existência de uma maior dependência de serviços complementares.

Kotler et al. (2010) referem três caraterísticas dos serviços (intangibilidade, inseparabilidade e perecibilidade) comuns a outros autores já referidos e acrescentam a variabilidade, onde a qualidade do serviço depende de quem, quando e onde é executado. A sua consistência depende das competências dos colaboradores e do seu desempenho na execução. Contudo, mencionam que um hóspede pode receber um excelente serviço num dia, e, no dia seguinte, ter um serviço medíocre, executado pelo mesmo colaborador. Como esta característica pode contribuir para a insatisfação do hóspede, sugerem, por isso, a fim de reduzir e criar maior consistência no serviço, investir em bons processos de contratação e de formação, padronizar o serviço e ter um sistema de monitorização da satisfação do hóspede, conforme se pode ver na Figura 18.

Figura 18 - Exemplo de um guia de procedimentos de serviço num hotel

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Os GH estão presentes em vários países, empregam pessoas e recebem hóspedes de diferentes nacionalidades e culturas. Clarke e Chen (2008) abordam as questões da cultura na gestão hoteleira, no âmbito da hotelaria internacional, e destacam o facto do serviço hoteleiro ser multicultural, ou seja, ser prestado num ambiente multicultural e internacional.

Verificamos que o serviço hoteleiro tem um conjunto de caraterísticas muito específicas, que o seu nível de qualidade e consistência exigem colaboradores com compromisso, capacidade de oferecer o melhor de si aos hóspedes, e, possuir, para além das competências técnicas, as relacionadas com o saber ser e estar, que são bastante valorizadas. De seguida, abordam-se as principais tendências emergentes no turismo e na hotelaria.