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PARTE IV. ESTUDO ZOOARQUEOLÓGICO DE TORRE VELHA

7.2. Contexto da amostra e sua dispersão vertical e espacial

7.2.3. Idade do abate

Analisando o estado de desenvolvimento dos elementos dentários e da fusão

dos ossos longos (segundo Silver, 1969), foi possível estimar a idade à morte das espécies

domésticas. Porém, um grande volume de restos, nomeadamente os das espécies selvagens, não permitiu desenvolver esta análise, quer pela ausência de caracteres definidores na maioria das partes anatómicas encontradas, quer por se encontrarem bastante fragmentadas.

Não obstante, identificou-se, relativamente aos ossos longos, uma superioridade de diáfises e epífises não fundidas, representando 68% da amostra, em detrimento de ossos longos fundidos, que perfazem 25% da coleção, ou de ossos longos parcialmente fundidos, que se ilustram em apenas 5% na totalidade da amostra faunística (Figura 27).

Já a análise dos elementos dentários permitiu identificar a presença total de dentição definitiva, tanto nos dentes soltos, como em mandíbulas, revelando a presença de uma faixa etária mais adulta.

Figura 26. Frequência da lateralidade dos elementos anatómicos, por taxa, em Número total de restos, na coleção faunística calcolítica de Torre Velha 12.

0 2 4 6 8 10 12 Direito Esquerdo NTR

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Figura 27. Frequência de partes anatómicas fundidas (F), não fundidas (Un) e parcialmente fundidas (PF) nas fossas calcolíticas de Torre Velha 12.

Esta leitura, que à primeira vista apontaria para uma tendência de abate de animais juvenis e subadultos devido à presença maioritária de epífises não fundidas, deve também considerar o tempo de maturação dos elementos ósseos visto que difere consoante a parte anatómica e a respetiva espécie (Reitz and Wing, 1999).

O desenvolvimento desta análise veio demonstrar um perfil etário liderado por animais

muito jovens (abatidos entre a nascença até aos 24 meses de idade, em 69% dos casos), por

uma presença significativa de animais subadultos (com idade superior aos 24 até aos 48 meses, em 23% dos casos) e por uma tímida expressão de animais adultos (abatidos após os 48 meses de idade, apenas em 8% dos casos)(Figura 28). Tal padrão de abate parece demonstrar a preferência, por parte das comunidades do 3º milénio a.C. de Torre Velha 12, de explorar as espécies domésticas antes de atingirem os quatro anos de idade.

63% 5% 32% Un PF F 69% 23% 8% Infantis e Juvenis ( 0 - 24 meses) Subadultos (24 - 48 meses) Adultos (a partir dos 48 meses)

92 Se analisamos os dados por espécie verifica-se, no entanto, algumas particularidades. Os

caprinos (Ovis/Capra) apresentam, na sua maioria, epífises e diáfises não fundidas (NTR=4) e, em menor escala, restos ósseos fundidos (NTR=2) (Figura 29). Analisando o conjunto desta espécie, identifica-se uma tendência para o abate de caprinos ainda jovens, possivelmente entre os 0 e os 24 meses de idade (NTR=2; NMI=1), pela presença de epífises distais de omoplata e de metacarpo não fundidas que têm um período de fusão no primeiro ano e segundo ano de vida desta espécie, respetivamente (Silver, 1970; Schmid, 1972). O abate de jovens adultos ou adultos (NTR= 16; NMI=2)também está muito bem representado, tanto pela presença total de dentição definitiva como por um fragmento de diáfise distal de metatarso fundido e por um fragmento de calcâneo fundido, estimando-se que a morte dos indivíduos terá ocorrido após os 24 – 27 meses de idade (ibidem, 1970; 1972) (Figura 29 e Tabela 38).

Destaca-se, ainda, a presença de elementos anatómicos que não permitiram realizar uma estimativa da idade de abate, como é o caso de um fragmento de epífise distal de rádio não fundida que, pelo seu tempo de fusão mais longo poderá denunciar que a morte do animal ocorreu antes de atingir os 42 meses idade (NMI=1) (Silver, 1970; Schmid, 1972), bem como a análise de uma epífise distal de úmero fundida que aponta para uma idade à morte superior aos 12 meses de idade (Tabela 38).

Os suínos (Sus sp.) apresentam uma superioridade de animais abatidos em idade jovem (Figura 30 e Tabela 39), potencialmente explorados entre os 0 e os 24 meses. Tal evidencia-se pela presença de ossos longos não fundidos que, na sua maioria, se fundem no primeiro ano de vida (NTR=4) (Silver, 1970; Schmid, 1972) (Tabela 38). São exemplo as epífises distais de omoplata e de úmero não fundidas, a epífise proximal de rádio, parcialmente fundida, e a epífise proximal de metacarpo I, não fundida. Como evidências de abate no segundo ano de vida (NTR=1) (Tabela 38) pode destacar-se o caso de um metacarpo distal, não fundido.

Contudo, a presença de uma mandíbula com M2 e M3, bem como um fragmento de cúbito, fundida, evidenciam a presença de um suíno (Sus sp.) subadulto ou adulto, ou seja, abatidos após os 30 meses de idade (Figura 29).

O perfil etário dos bovinos domésticos (Bos taurus) distingue-se dos restantes supracitados visto que surgem representados, exclusivamente, por elementos anatómicos fundidos (NTR=3) (Figura 29) e por dentição definitiva, como é o caso do dente M3, muito desgastado (Figura 30). Contudo, as partes anatómicas fundidas não apresentam os mesmos estágios de fusão, sendo que dois fragmentos se reportam a ossos de maturação prematura, no

93 caso das partes distais de úmero e da epífise proximal da primeira e segunda falanges (Silver, 1970; Schmid, 1972), e um fragmento se reporta a um osso de maturação tardia. Trata-se de uma epífise e diáfise distal de rádio, fundida. Esta última indica que o animal morreu numa fase adulta, potencialmente ocorrida após os 42-48 meses de idade (Silver, 1970; Schmid, 1972)

(Tabela 38). Já os restos anatómicos que fundem numa fase inicial apenas estimam que os animais morreram após o primeiro ano de vida.

Em suma, a análise do perfil etário aponta para tendências distintas ao nível das

estratégias de exploração das espécies domésticas que poderão refletir diferentes “usos”

e “estatutos” entre as espécies. Os caprinos (Ovis/Capra) e os suínos (Sus sp.) são preferencialmente abatidos numa fase mais jovem da sua vida, por oposição a uma maior longevidade do gado bovino (Bos taurus).

Figura 29. Ocorrência de diáfises e epífises fundidas (F), parcialmente fundidas (PF) e não fundidas (Un), por taxa, nos contextos calcolíticos de Torre Velha 12.

Tabela 38. Estimativa da idade à morte das espécies, com base no estágio de fusão dos ossos longos, na coleção faunística do Calcolítico de Torre Velha 12, aplicando os parâmetros etários

estabelecidos por Silver (1970), Schmid (1972) e Reitz and Wing (1999)

Estimativa da idade / Ossos longos 0 - 12 meses > 12 meses < 24 - 30 meses > 24 - 30 meses > 36 - 42 meses < 42 meses > 42 - 48 meses Ovis/Capra 1 1 2 1 Bos taurus 2 1 Sus sp. 4 1 1 NTR 5 2 2 2 1 1 1 NTR 0 1 2 3 4 5 6 7

Bos sp. Ovis/Capra Sus sp.

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