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Identidade e lugar/ Hayastan e diáspora/ Ethos de guerra e a pós-castrófica região de Nagorno-Karabakh

PARTE DOIS No relógio 19:15, passados mais de 100 anos em guerra

IV) Identidade e lugar/ Hayastan e diáspora/ Ethos de guerra e a pós-castrófica região de Nagorno-Karabakh

Artur: Podes falar um poquinho mais sobre o que querem os “jovens coloridos” e, por exemplo, a representação muito marcada de Genocidio na diáspora...o que elegem os jovens, o que está sempre sendo repetido na diáspora Genocídio... “Remember and Demand”...

Lilit: Bom, esse “Remember and Demand” a ninguém na Armênia, Hayastan, não nos gostou a ideia nem como fizeram algo tão comercial como isso aqui, mas como vejo em diáspora isso era algo como “nossa flor” e tal qual. Aqui não era assim, mas eu creio que outra coisa que começa a diferença da mentalidade dos jovens em diáspora e em Armênia é o caso de Nagorno-Karabakh porque agora para nós é o que vemos cada dia, que há disparos na fronteira, que a gente morre. Assim que, para nós é algo mais importante que o Genocídio, bom, não mais importante mas que vivemos. Presente, sim, mas presente e que são nossos amigos e tudo e que o Genocídio que passou a não sei, um século. Por isso eu creio que é uma coisa que distrai nossa atenção o Genocídio enquanto que a gente de diáspora, eu creio, que ainda não entendem a realidade, o que está passando aqui, o conflito, e por isso para eles ainda o Genocídio. Além disso, claro que foram eles, sues antepassados que tinham que mudar o lugar, mas para nós, os armênios do leste, que dizemos aqui nunca tivemos este problema de mudar o país, perderam as casas e tudo. Assim que eu creio que é logico mas é diferente, diferença de mentalidades que temos. Como é dito: aqui não temos medo de perder a identidade porque todos sabemos, vivemos em Armênia, somos armênios, temos o passaporte armênio, enquanto que na diáspora tu vais a uma escola, e eu creio que a língua é a coisa mais importante para a identidade137, tu vais a uma escola não falam em sua língua, em que

os pais dos antepassados haviam falado, assim que medo é mais não é o perigo de perder a

137 Akçam (2010) mostra, no capítulo sobre “nacionalismo turco”, que alguns estudiosos da língua turca que tinham um raciocínio semelhante a esse estavam entre os mais radicais dentro do Comitê União e Progresso.

identidade. Por isso aqui em Armênia estamos mais tranquilos e podemos concentrar-nos em coisas que são, que creemos que são mais importantes como o governo e as coisas internas, enquanto que para diáspora não sei, não conheço a muitos que falem o que queram falar sobre as coisas que estão passando aqui no governo porque creem que não é algo bom falar sobre isso ou do dinheiro que há...ontem foi o dia do telemarathon, não? E os armênios...

Artur: Para onde foi esse dinheiro?

Lilit: A Karabakh deve ir todo o dinheiro 15 milhões de dólares ou euros não sei, a Nagorno- Karabakh e hoje já notei meus amigos por Facebook todos diziam em inglês “por favor que não enviem mais dinheiro ao governo” enquanto que os diásporas que vejo e leio seus status todos estão tão orgulhosos de haver podido ajudar ao menos um pouco ao país, enquanto que aquí dizemos que não, não há...

Artur: Não se sabe onde vai ficar?

Lilit: Sim, exato. Eu creio que é uma das diferenças também ou o que passou em julho com o protesto. Não sei, todos aqui sabemos o que queremos, mas não houve nenhum tipo de nem anúncios nem nada de diáspora, mas estou segura que se houve algo sobre Genocìdio todos haviam ido pelas ruas de Los Angeles, de não sei que com a bandera mais larga de Armênia e aí enquanto quando é algo de aqui...não quero dizer não lhes importa, mas creio que não entendem que está passando.

Artur: Eu vi a diáspora do Brasil, de São Paulo, tem uma cobertura bastante, creio relativamente ampla e que passou também notícias dos protestos de julho agora, mas há notícias mas não muito detalhadas e se podes dizer que passou, quem eram as forças políticas que estavam pelejando...? Lilit: Antes de começar isto quero acrescentar algo, não é que a cobertura é má. Agora estou orgulhosa de dizer-lo que temos alguns periódicos aqui em Armênia que são muito livres que sempre falam o “hetq”, a “libertad”, “civilnet138” que dizem o que está passando no país e mais

bem é algo eu creio que a gente de diáspora tem esta imagem idealizada do país, da Armênia, da pátria que muitas vezes lhes custa saber que coisas que não estão tão ideais, que não é tão boa, que há problemas também, tal e qual. Por isso não quero não querem escutar, não querem ouvir, não é que não há cobertura, mas muitas vezes, bom, eles não gostam de ouvir e entendo também, é lógico porque por muitas vezes sempre tem falado desta Armênia que querem, que é tão bonita, que tem o damasco (apricot) que é melhor do mundo e alguém vem e diz: sabes os direitos humanos, que tens prisioneiros no cárcer, prisioneiros políticos em cárceres tudo que não são coisas boas para querer ouvir. O que passou em julho nós ainda não entendemos o que era, mas era algo que

138 Os três sítios eletrônicos: http://hetq.am/eng/ ; https://www.azatutyun.am/; http://www.civilnet.am/ .

mostrou para a gente que assim não se pode continuar, que o governo, que estamos em uma situação que o governo não faz nada, mas tomar o dinheiro, só tomar dinheiro da gente pelos impostos e tudo realmente não funciona como um governo. O que fez isto claro, não teve resultados, ainda [resultados] tão marcados que podemos dizer como o Eletric Yerevan de Bagramian, mas creio que joga com a mentalidade da gente porque todavia estamos em maioria da gente estão no nível soviético, não? Assim que são coisas muito pequenas, mas eu creio que é o início de levantar algo na mentalidade da gente para dizer que algo mudou.

Artur: As pessoas que estavam no protesto tinham uma organização ou foi algo mais espontâneo? Lilit: Não, tinha sua organização e dizem que, bom, é bastante grande, tem gente de diáspora que lhes ajuda, mas são só rumores não posso dizer nada concreto, mas eles que estavam aqui era o grupo, os veteranos que estavam na guerra de Nagorno-Karabakh faz vinte e mais anos, então, são gente inteligente, são gente que tem estado em posições também, depois da independência de Armênia, em posicões muito altas como o ministério de Defesa, Varujan?, não me lembro seu nome, mas depois se necessitas posso marcar. Varujan Avetisian, sim. Assim que é inteligentíssimo, ele quando fala e sabes que tem meta, que é lógico o que esta dizendo era um dos veteranos em Nagorno-Karabakh, assim que são gente que não, que são gente especial. Não sei, o fizeram por seu amigo [o general Vardán] Eguiazarian139 que agora é um prisioneiro político e tudo isso,

queriam liberá-lo, bom, a ideia era liberá-lo, mas depois se converteu em algo mais que queriam também o renúncio do Presidente, o governo em geral, mas começou como algo para Eguizarian. Artur: Ao mesmo tempo o Presidente era combatente de Karabakh...

Lilit: Ah...não, quando perguntas à gente quem realmente, por exemplo, perdeu seus “legs or arms”140...quando lhes pergunta a eles dizen: “é diferente”. Temos agora generais em Armênia que

dizem que combateram na terra de Nagorno-Karabakh, mas quando lhes fala, eles já são gente que não, quiçá estavam aí, mas fizeram nada para este país, que são tontos, terríveis, terríveis e agora estão governando141.

Artur: Se utilizam da imagem de Karabakh...

139 Outro militar veterano de Karabakh e ativista opositor ao governo atual, Jirair Sefilian, foi preso em junho de 2016 por posse ilegal de armas. Em 17 de julho de 2016 manifestantes tomaram um posto policial de assalto e um policial foi morto e dezenas de manifestantes foram detidos na ocasião.

140 Pernas ou braços

141 Porto (2017) fala sobre essa passagem histórica: “em primeiro lugar, a independência da República do Karabakh foi declarada em 1994, mas a classe política que controlaria a região desenvolvera a sua trajetória precisamente na República da Armênia – o exemplo mais claro disso é o caso do primeiro presidente do Karabakh, Robert Khocharyan, que, imediatamente após o seu mandato, seria eleito para a presidência da Armênia. Esse tipo de trânsito dos homens políticos entre Estados independentes produz uma situação um tanto anômala e serve de fundamento para a argumentação de que os armênios não estariam sendo sinceros em sua luta por um Karabakh autônomo (Porto, 2007: 175-6).