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A IDENTIDADE ORGANIZACIONAL

1.3 A IDENTIDADE ORGANIZACIONAL

O termo identidade sugere, num primeiro momento, a associação com indivíduos ou grupos, como “um modo de expressão do self do indivíduo, que lhe permite ser reconhecido como diferente dos demais e, ao mesmo tempo, como similar aos membros de uma categoria ou classe” (MACHADO-DA-SILVA;

NOGUEIRA, 2001, p. 40). É, pois, fator de aproximação e pertencimento, mas também de afastamento e distinção. Processo que não implica em contrários ou em posições excludentes, mas em posições em movimento, ligadas por fios cuja elasticidade permite um ir e vir, num trânsito permanente de constituição, dado o seu caráter inacabado e transitório. Portanto, são posições temporárias e flexíveis. É esta a dimensão que desejamos imprimir no debate sobre a identidade do Conselho Tutelar, embora não se trate das identidades dos indivíduos, mas de uma instituição por eles composta e forjada.

Neste sentido, recorremos aos estudos que versam sobre a identidade organizacional e, embora sejam relativos, com maior frequência, às empresas privadas, cremos que há elementos que podem ser deslocados para a análise de outras instituições, como as públicas. Tentativa de aproximação que nos interessa fazer nesse momento, com o cuidado de resguardar as particularidades do órgão que constitui o foco de nossa análise, o Conselho Tutelar.

Machado (2005, p. 3) define a identidade organizacional como o “conjunto de representações que seus integrantes formulam sobre o significado dessa organização, em um contexto social”, diferentemente da imagem institucional, que é a representação construída pelos observadores externos, embora esta também exerça influência sobre aquela. Destaca, ainda, a complementaridade entre a identidade organizacional e a cultura, que

abarca o repertório simbólico e de valores com os quais os indivíduos constroem as representações acerca dos fenômenos. Nesse sentido, o significado da organização é construído pelos seus integrantes a partir dos parâmetros culturais que eles dominam (MACHADO, 2005, p. 3).

Desse modo, há um processo de elaboração de significados sobre as organizações que se dá internamente – pelos seus componentes, e externamente – pelo público, embora estas duas imagens se interpenetrem e sejam construídas com base em contextos culturais.

Por conseguinte, considerando essa perspectiva, a identidade organizacional resulta da articulação de três dimensões: a imagem externa – ou a

“forma pela qual a organização é percebida por aqueles com quem ela interage”; a autoimagem – ou a “maneira como seus membros internos, especialmente seus dirigentes, a percebem de forma compartilhada”; e a sua finalidade, segundo apontam Machado-da-Silva e Nogueira (2001, p. 42).

Albert e Whetten (1985), citados por Machado-da-Silva e Nogueira (2001, p.

42) destacam três critérios a serem verificados na definição da identidade organizacional, os quais compreendem “o que é central, distintivo e duradouro na organização, com base nas crenças compartilhadas pelos seus membros”. O primeiro critério, ou seja, aquilo que é central a uma organização, refere-se às características que expressam a sua “essência”, representada por seus objetivos ou

missão, ao passo que o segundo critério, o distintivo, refere-se aos elementos que a distinguem de outras organizações em caso de comparação e, por fim, o critério de durabilidade diz respeito ao caráter de “continuidade temporal”. Além do fato de a identidade organizacional constituir-se por meio de permanentes interações, ressaltamos a indicação dos autores de que esta identidade pode ser híbrida, fruto de vários componentes identitários.

Como as organizações privadas, as públicas também são formações sociais resultantes da interação entre vários elementos, desde a sua definição com base jurídica; a delimitação de sua área de abrangência, no sentido do tipo de serviço a ser prestado e do público ao qual se destina; a apreensão de seu significado pelos sujeitos que com ela se relacionam, sejam estes os agentes que compõem internamente seus quadros funcionais ou de outras organizações com as quais está conectada ou, ainda, aqueles que fazem uso de seus serviços, acrescido da estrutura física e financeira disponível ao seu funcionamento e da sua vinculação a uma política pública e de seu grau de institucionalização.

Ao tomarmos como objeto de discussão a constituição da identidade do Conselho Tutelar, consideramos que é preciso ultrapassar a definição de que esta resulta da articulação das três dimensões propostas por Machado-da-Silva e Nogueira (2001), quais sejam: a imagem externa, a autoimagem e a sua finalidade.

Supomos que a imagem externa – ou o modo como o Conselho Tutelar é visto pelos atores com quem interage, bem como a autoimagem – ou o modo como os próprios conselheiros o veem, são construídas de forma articulada e em face de sua finalidade e das características distintivas, neste caso, apreendidas a partir da legislação, mas não só.

Para além de entender o conjunto de representações compartilhadas por seus integrantes e agentes externos, interessa-nos penetrar os elementos a partir dos quais está se constituindo a identidade do Conselho Tutelar, ou estas representações que se entrelaçam. Em decorrência, acrescentamos que a compreensão da referida identidade requer a consideração de outros critérios além daquilo que lhe é central, daquilo que lhe é distintivo e da sua durabilidade temporal, como propõem Machado-da-Silva e Nogueira (2001).

Entendemos que é preciso levar em conta os elementos estruturantes das imagens externa e interna do Conselho Tutelar, dados pelo contexto onde ele cumpre a sua finalidade e exerce as características que lhes são próprias – ou distintivas em relação aos demais componentes do Sistema de Garantia de Direitos, na perspectiva da interdependência funcional. Trata-se, pois, de uma identidade construída no processo de interação entre os elementos central e distintivos e a sua durabilidade temporal, as outras instituições do Sistema de Garantia de Direitos, os atores sociais que o compõem e os que demandam seus serviços, numa relação mútua de conformação e que se dá num determinado contexto.

Com base no Estatuto da Criança e do Adolescente e no referencial de Machado-da-Silva e Nogueira (2001), é possível vislumbrar um primeiro componente estruturante da identidade do Conselho Tutelar, ou seja, a sua definição jurídica.

Esta compreende o elemento essencial – ou a finalidade, e os elementos distintivos – o desenho institucional sob a forma colegiada, os mecanismos de escolha envolvendo diretamente o cidadão ou por meio de representação, a autonomia no exercício de suas atribuições, o caráter administrativo e atribuições específicas, e a durabilidade ou permanência. Questão que será tratada no capítulo que segue.

2 OS ELEMENTOS DISTINTIVOS DO CONSELHO TUTELAR E SEU CARÁTER