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2 TECNOLOGIA E TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA O presente capítulo discute a tecnologia e a transferência de

3 AS EMPRESAS TRANSNACIONAIS E O COMÉRCIO INTRAFIRMA.

3.1 EMPRESAS TRANSNACIONAIS

3.1.4 IED e internacionalização da P&D

A medida da participação das ETNs nos mercados se dá pelas estatísticas de investimento estrangeiro direto (IED), conceituado no Brasil pelo Regulamento Anexo I à Resolução CMN nº 3.844, de 23 de março de 2010, como sendo “a participação de investidor não residente no capital social de empresa receptora, integralizada ou adquirida na forma da legislação em vigor, e o capital destacado de empresa estrangeira autorizada a operar no Brasil” (BRASIL, 2010). A interpretação da Receita Federal do Brasil (banco de dados) acerca da norma transcrita acima é a de que há investimento estrangeiro direto quando “o investidor detém 10% ou mais das ações ordinárias ou do direito a voto numa empresa”.

A OCDE (2008, p. 7) define o investimento estrangeiro direto como aquele que reflete o interesse do investidor estrangeiro em estabelecer uma relação duradoura em empresa estabelecida em país diferente de sua residência. A Organização Internacional esclarece que a propriedade de 10% (dez por cento) de capital com direito a voto sugere a exigência do relacionamento duradouro, mas aponta a possibilidade da

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Tradução livre para: “the term ‘permanent establishment’ means a fixed place of business through which the business of an enterprise is wholly or partly carried on”.

ocorrência da situação em que o investidor, com propriedade inferior à mencionada, detém poder de gerência.

De acordo com as estatísticas divulgadas pela OCDE em outubro de 2012, a China ultrapassou os Estados Unidos e é, atualmente, o primeiro destino de IED do mundo, registrando US$ 64.000.000.000,00 (sessenta e quatro bilhões de dólares) de entradas no primeiro trimestre de 2012. A terceira posição é ocupada pela França, seguida pelos Países Baixos e Inglaterra. O Brasil manteve fluxo estável de IED, com entrada de US$ 14.800.000.000,00 (quatorze bilhões e oitocentos milhões de dólares) no primeiro e segundo trimestres de 2012.

O IED pode ser categorizado em IED greenfield, consistente no investimento em novas plantas produtivas, e IED brownfield, utilizado para fusões e aquisições de empresas domésticas (BARRA, 2011, p. 14). As ETNs possuem poder e dinheiro suficientes para determinar a trajetória e a estratégia da produção das indústrias no mundo, fato que também ocorre com o desenvolvimento de tecnologia. Segundo Barra (2011, p. 21), as ETNs “são responsáveis por 70% (setenta por cento) dos esforços privados em P&D”.

A regra ainda é a das ETNs produzirem P&D em seu país sede, porém, aos poucos, as empresas começam a estabelecer centros no exterior, “motivado por uma combinação de fatores de oferta e demanda, assim como pela ambição dos gestores de subsidiárias” (BARRA, 2011, p. 23). O papel da subsidiária parece fundamental na decisão da ETN em descentralizar a P&D, conforme ressalta Gomes (2003, p. 23), “uma subsidiária pode se mover vertical e horizontalmente, transitar entre os vários níveis hierárquicos da corporação multinacional, podendo até mesmo alcançar posições extremas como a de liderança em determinadas áreas de negócios”. Essa posição corrobora a teoria de que a tecnologia é endógena à empresa, constituindo-se em uma capacidade interna. Somente a filial capaz, de fato, de desenvolver tecnologia, poderá ter centro de pesquisa ou ser sede de projeto.

De acordo com Salerno et al. (2004, p. 74), “ser sede de projeto significa ser a unidade gestora do projeto, em relação ao controle da gestão da engenharia, da definição e modificações de peças e componentes”. Gomes (2003, p. 151) aponta alguns casos de sucesso no Brasil em ser sede de projeto, como “projetos realizados pelas montadoras: os modelos Polo Sedan e Tupi (Volkswagen), Celta (GM), Siena (Fiat) e um dos derivativos do projeto Amazon (Ford)”. Os autores acima citados sustentam a posição de que a internacionalização da P&D é importante para o país hospedeiro, pois pode gerar,

diretamente, empregos e contratação de fornecedores locais e, indiretamente, uma eventual cultura da inovação.

Porém, para que a filial seja capaz de se transformar em sede de projeto e para que as vantagens da instalação da ETN sejam sentidas pelo país hospedeiro, parece ser preciso políticas públicas voltadas para essas questões. Conforme lembra Salerno et al. (2004, p. 68):

As políticas industriais vigentes no Brasil da década de 1950 e meados da década de 1980, ainda que apresentassem diferenças entre si, tiveram, como característica o foco na fábrica, ou melhor, na produção física, sem maior atenção a outros aspectos fundamentais – e hoje em dia determinantes para o sucesso de negócios com maior dinâmica no mundo capitalista -, quais sejam, pesquisa, desenvolvimento e engenharia (P&D&E), internacionalização das empresas brasileiras, fortalecimento de marcas, integração entre as políticas industrial, tecnológica, de inovação de comércio exterior.

O despreparo brasileiro na temática de inovação, pesquisa e desenvolvimento, pode ser facilmente verificado ao analisar as estatísticas do INPI de depósito de patentes no ano de 2011: foram no total 31.765 (trinta e um mil, setecentos e sessenta e cinco), sendo 7.764 (sete mil setecentos e sessenta e quatro) pedidos feitos por residentes e 24.001 (vinte e quatro mil e um) pedidos feitos por não residentes. As estatísticas da OMC são ainda mais alarmantes, pois levam em consideração apenas os pedidos de patentes concedidos. De acordo com tal Organização Internacional, os pedidos de patente deferidos no ano de 2011 por Brasil, Índia, África do Sul, China, Rússia e Estados Unidos foram:

Tabela II: Pedidos de patentes deferidos no ano de 2011 País Depósito por

residente

Depósito por

não residente TOTAL

Brasil 314 2.937 3.251 Índia 1.725 4.443 6.168 África do Sul 822 4.509 5.331 China 79.767 55.343 135.110 Russia 21.627 8.695 30.322 EUA 107.792 111.822 219.614

A disparidade é muito grande, não só do Brasil com os Estados Unidos, mas também com os países emergentes, em semelhantes condições econômicas. A pequena expressão brasileira em P&D também é sentida na estatística apresentada pela Comissão Econômica para América Latina e Caribe (CEPAL, 2010, p. 60), a qual demonstra que nos anos entre 2008-2010, o Brasil recebeu apenas 2,2% (dois inteiros e dois décimos por cento) do total de investimento estrangeiro direto associado à P&D no mundo, enquanto os países da Ásia e Pacífico receberam 49% (quarenta e nove por cento) e os países da Europa Ocidente 24% (vinte e quatro por cento).

Sergio Queiroz (2005, p. 58-59) aponta quatro soluções para a atração de IED em P&D no Brasil: a) o direcionamento da política pública no nível da empresa, que significa “identificar os alvos e definir ações sob medida”; b) desenvolvimento de “indicadores apropriados para cada fator relevante de atração”; c) “acompanhar de perto o trabalho dos ‘concorrentes’. Quais políticas de promoção de atividades tecnológicas ou de atração de IDE que os países – particularmente aqueles mais parecidos com o Brasil – estão adotando?”; e d) “avaliações periódicas e conclusivas sobre a eficácia” das políticas públicas. O mesmo autor conclui de forma bastante lúcida: “o que se argumenta é que as EMNs podem fazer mais do que já fazem. Políticas adequadas permitiriam que o país aproveitasse melhor uma série de oportunidades surgidas em função do contexto internacional” (QUEIROZ, 2005, p. 58).