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Imagem do professor no jornalismo brasileiro: o que dizem as pesquisas acadêmicas

2. JORNALISMO OBJETIVO E IMAGEM DO PROFESSOR: PROCESSO DE DESQUALIFICAÇÃO DO MAGISTÉRIO

2.1. Imagem do professor no jornalismo brasileiro: o que dizem as pesquisas acadêmicas

A constatação de que a imagem do professor de educação básica no jornal é pejorativa não parece ser uma novidade em se tratando de estudos em educação que abordam os problemas midiáticos. Por estudos anteriores (CARMAGNANI, 2004; BARBARA e BEBER-SARDINHA, 2004; ROCHA; FERREIRA, 2002, ANJOS, 2008), podemos entender que a imagem do professor há algum tempo tem sido apresentada nos discursos jornalísticos, reportados em seus mais diversos suportes, associada a um sentido pejorativo, a partir do qual se depreende que os saberes e os modos de trabalho dessa categoria profissional são constantemente desqualificados e, muitas vezes, associados como causa da má qualidade da educação brasileira.

Segundo Carmagnani (2004) a chamada “desqualificação do professor” na mídia está atrelada a temas que divulgam os “problemas da educação” e que, de fato, buscam estabelecer novos parâmetros de verdade sobre a escola pública com a veiculação de notícias que apontam o professor como o verdadeiro culpado de toda a crise. Ao analisar matérias e artigos de opinião sobre educação, publicados durante cinco anos (1999 a 2004) no jornal Folha de São Paulo, a pesquisadora observou que há uma repetição no modo de construir sentidos sobre o professor e que esse sujeito está excluído de se colocar, em tal discurso, como um agente de mudança.

A pesquisa de Rocha (2007) estudou quarenta e oito exemplares da revista Nova Escola, publicados entre 2001 a 2004. Analisando os “relatos de experiência” (relatos em que um professor-leitor escreve para a revista Nova Escola) e “experiências relatadas” (relatos em uma experiência de ensino de língua materna realizadas em sala de aula), a pesquisadora identificou a divulgação ao leitor (professor) da importância de se copiar uma figura mítica: o professor ideal. Mostrou duas tendências na divulgação desse modelo: uma de proposição (2001-2002) e outra de imposição (2003- 2004). Assim, podemos entender que a existência e a divulgação de um “modelo de professor ideal” indiciam que o professor brasileiro precisa de um guia externo (como a revista estudada) para a realização de seu trabalho. A investigação aponta, ainda, como um dos possíveis

efeitos dessa divulgação, o favorecimento de uma postura de desresponsabilização por parte do professor em relação ao seu trabalho e a realização de atividades de ensino que não levam em conta a pluralidade de contextos educacionais no Brasil.

Anjos (2008), na dissertação de mestrado intitulada A educação infantil representada: uma análise da revista Nova Escola (2005-2007), analisa as matérias publicadas na revista Nova Escola buscando depreender as representações da educação infantil veiculadas nesse periódico. Uma das conclusões a que o pesquisador chegou é que se observa uma exclusão do professor, a qual Anjos nomeia de “processo de segregação”, enfrentado pelos docentes que não se enquadram no referencial proposto pela revista.

A pesquisa empreendida por Barbara e Beber-Sardinha (2004), que analisou o subcorpus do Banco de Português15, também colabora para confirmar a exclusão do professor de ensino básico. Com o objetivo de analisar a imagem projetada na imprensa sobre o professor, os pesquisadores trabalharam desde as perspectivas da Linguística de Corpus e da Linguística Sistêmico-funcional. Analisaram 223.731.280 palavras de textos de jornais e revistas utilizando o Software WordSmith Tools. Dessas palavras, estudaram as sete ocorrências mais frequentes para o “lema” professor e, posteriormente, as sequências fixas de palavras que ocorrem próximas das palavras de busca. Apesar de nossa perspectiva teórica não se aproximar do modelo da pesquisa citada, é interessante destacar as conclusões às quais os pesquisadores chegam a partir da análise dos dados:

Para Barbara & Beber-Sardinha (2004, p. 122), as ocorrências do lema professor e suas realizações mais frequentes que aparecem na imprensa são:

 Professor e professora: são pessoas específicas, qualificadas por um título, ligadas à universidade, que dão opinião à imprensa.

 Professores: o termo corresponde a uma classe de trabalhadores, genérica, ligada a escola pública, associada a reivindicações e movimentos trabalhistas.

 Professoras: são pessoas específicas, de colégio.

A pesquisa conclui que há uma distinção no tratamento dado para os professores de universidades e para aqueles ligados ao ensino básico. Enquanto os primeiros são valorizados em sua individualidade, possuem voz e nome, os segundos, por sua vez,

aparecem frequentemente sem nome, ligados à rede pública, salientando “pontos de sua formação que não são satisfatórios” (BARBARA & BEBER-SARDINHA, 2004, 125). O que se nota, portanto, como observam os pesquisadores, é a valorização dos professores pesquisadores da educação superior e o reforço do desprestígio da profissão docente enquanto categoria da educação básica.

Ferreira (2002), interessado em perceber como se desenrolou um processo de “profanação” do magistério na imprensa carioca, investigou como o professor foi representado no jornal durante cinco décadas, tendo como recorte os textos publicados nos dias próximos à data de comemoração do “dia do mestre”. O levantamento do pesquisador permite perceber que houve uma mudança significativa no modo como o professor veio sendo representado ao longo das décadas de 1940 a 1990, passando de uma imagem sagrada para uma imagem de desprestígio social.

As conclusões das pesquisas consultadas indicam que não é novidade a depreciação docente no discurso jornalístico. Elas permitem-nos recolocar nossa argumentação de que o que há de novo na imagem docente no jornalismo não é sua desqualificação, mas o modo como ela se dá. Percebemos, a partir desse levantamento bibliográfico16, que o elemento novo nas escolhas jornalísticas para retratar o professor da educação básica não é a desqualificação, mas, sim, o modo de desqualificar o professor. Esse professor, que na pesquisa de Ferreira (2002) foi considerado um profissional missionário, digno de uma valorização “sagrada”, passou por um longo período de difamação e desqualificação. Atualmente, a nosso ver, o discurso sobre essa categoria profissional se pauta numa perspectiva de “exclusão” dos professores que estão trabalhando e de substituição desses por outros, “melhores”.

Feito esse levantamento bibliográfico, passaremos, na próxima seção, a confrontar as conclusões dessas pesquisas com os dados que compõem parte do nosso corpus de pesquisa.

16 Apontamos aqui outros trabalhos que compõem o quadro deste levantamento que não apontamos no