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Capítulo V – Estrutura tributária Brasileira

V.1 Considerações sobre a Tributação no Mercado Brasileiro de Combustíveis

V.1.3 Impacto da Diferenciação dos Tributos Estaduais

V.1.3.2 Impacto da Mudança de Tributos

Através desses dados podem-se gerar modelos simplificados que mostram a escolha do consumidor, conforme observado no capítulo III deste trabalho. Um exemplo ilustrativo é a análise do impacto dos tributos nas escolhas do consumidor no Estado de São Paulo.

A Figura 14, Figura 15 e Figura 16 ilustram este impacto: com a redução do ICMS do álcool, em 2004, houve uma redução do preço que resultou no incremento da demanda. O ponto A representa a escolha ótima no instante inicial. Com a mudança do nível tributário do álcool, surgem dois efeitos, explicados no capítulo III. No primeiro instante, há um efeito substituição, onde a modificação dos patamares de concorrência entre o álcool e a gasolina gera uma alteração da inclinação da reta orçamentária. Posteriormente, o mesmo fato gera um efeito renda (uma vez que, em uma cesta de bens formada por álcool e gasolina, a redução de preço de um desses bens reflete ao consumidor como aumento da renda – medida como somatório do poder aquisitivo dos consumidores destes combustíveis). Assim, a escolha ótima do consumidor passa para o ponto B.

559,12 Gasolina (Mil m3) Álcool (Mil m3) Dotação Orçamentária

A

B

119,34

Figura 14: 1º Passo da Modificação nos Preços Relativos do Álcool e da Gasolina entre 2003 e 2005

Fonte: Elaboração Própria a partir de Varian (2000).

Segundo o Quadro 9 e o Quadro 10, houve uma redução tributária na gasolina em menor intensidade que a redução do álcool, mas que também deve ser inserida no modelo, conforme mostra a Figura 15. Nota-se, utilizando os mesmos mecanismos referido acima (efeitos renda e substituição), a mudança da escolha ótima do consumidor para o ponto C.

C

Gasolina (Mil m3) Álcool (Mil m3) Dotação Orçamentária

B

Figura 15: 2º Passo da Modificação nos Preços Relativos do Álcool e da Gasolina entre 2003 e 2005

Fonte: Elaboração Própria a partir de Varian (2000).

Ao longo desses dois anos houve um incremento na renda, gerando um deslocamento paralelo da reta orçamentária, até o ponto ótimo D (destacado na Figura 16), que expressa a situação atual no mercado de combustíveis automotivos (sintetizados a gasolina e álcool).

559,12 571,49

C

D

Gasolina (Mil m3) Álcool (Mil m3) Dotação Orçamentária

A

119,34 190,34

Figura 16: 3º Passo da Modificação nos Preços Relativos do Álcool e da Gasolina entre 2003 e 2005

Fonte: Elaboração Própria a partir de Varian (2000).

A Figura 16 mostra, também, o ponto inicial, permitindo uma comparação da evolução do consumo destes combustíveis, ao longo de dois anos, com as mudanças tributárias sugeridas.

Porém, podem-se observar estas mudanças pela ótica do estado que as implementa, observando os impactos locais. Dado que a dotação orçamentária é uma função dos preços desses bens multiplicados pelas respectivas quantidades, tem-se que:

Y = Cg x Pg + Ca x Pa

Onde: Y = renda em agosto de 2003; Cg = consumo da gasolina C; Ca = consumo de álcool hidratado; Pg = preço final da gasolina C; Pa = preço final de álcool hidratado.

Colocando os valores de São Paulo, em 2003, tem-se:

Y = (R$ 1062,328 + R$ 114,566) x 106 Y = R$ 1176,894 x 106

Y = R$ 1.176,894 x 106

Se o preço do bem é uma função de duas variáveis (custo83 e tributos), pode-se desagregar esta expressão da seguinte maneira:

Y = Cg x (Ug + Tg) Pg + Ca x (Ua + Ta) Pa

Onde: Ug = Participação do custo no preço final da gasolina C;

Ua = Participação do custo no preço final custo do álcool hidratado;

Tg = Participação dos tributos no preço final da gasolina C;

Ta = Participação dos tributos no preço final do álcool hidratado;

U +T = 1;

As demais variáveis são definidas acima.

Assim, podem-se estimar os impactos de políticas tributárias sobre as escolhas dos consumidores. Dada a mesma renda encontrada acima, se o Estado de São Paulo reduz o ICMS desses bens, ocorre um aparente aumento da renda que, segundo o modelo, deve ser gasta entre álcool e gasolina (aumentando o consumo). O exemplo a ser desenvolvido é a redução do ICMS sobre o álcool hidratado no início de 200484.

Y’ = Cg x Pg + Ca x Pa [1 – (0,25 – 0,12)]

Y’ = 559,12 L x 106 x R$ 1,90/L + 119,34 L x 106 x R$ 0,960/L * (0,87) Y’ = (R$ 1062,328 + R$ 99,672) x 106

Y’ = R$ 1.162,001 x 106

83 Inclui-se neste item o custo de oportunidade, que remunera o capital investido, as margens, fretes, os custos de produção e comercialização, etc.

84 A alíquota de ICMS era de 25% para o álcool e passou para 12% (em janeiro de 2004) no Estado de São Paulo.

Tem-se, então, (ceteris Paribus) que o aparente aumento da renda foi de Y – Y’ = R$ 14,893 x 106. Conforme mencionado anteriormente, este valor é reinserido no consumo destes bens através de, por exemplo, um aumento do número de viagens dos agentes consumidores de álcool ou gasolina.

Ao repetir os cálculos com os valores atuais do mercado de combustíveis automotivos de São Paulo, ter-se-ia:

Onde: Ya = renda em agosto de 2005.

Ya = 571,49 L x 106 x R$ 2,145/L + 190,34 L x 106 x R$ 1,05/L Ya = (R$ 1.225,846 + R$ 199,666) x 106

Ya = R$ 1.425,512 x 106

Nota-se, então, que após dois anos houve um incremento de cerca de 250 milhões de Reais, ou aproximadamente 21%, envolvendo o mercado de gasolina e álcool de São Paulo. Como mostrado na Figura 14, este aumento deveu-se, em grande medida, às reduções tributárias ocorridas no período (especialmente a do ICMS do álcool).

Para efeitos comparativos, o mesmo cálculo para o Estado do Rio de Janeiro fica assim (as variáveis utilizadas no modelo são as mesmas referidas acima, ressalvando-se que neste momento referem-se ao Estado do Rio de Janeiro):

Ya – Y = [(R$ 2,03/L x 147,05 L + R$ 1,25/L x 8,18 L) – (R$ 2,23/L x 143,67 L + R$ 1,42/L x 13,99 L)] x 106

Ya – Y = R$ 30,807 x 106

A diferença entre a receita deste mercado em 2003 e 2005 ficou em 30 milhões de Reais no Rio de Janeiro, ou seja, cerca de 10% de acréscimo. A diferença entre este percentual e o de São Paulo deve-se, principalmente, às diferentes políticas adotadas, onde um dos estados dá prioridade tributária ao Álcool, enquanto o outro busca incentivar o desenvolvimento prioritário do GNV85 como substituto da gasolina. Observa-se que esta política de redução tributária do Estado de São Paulo é claramente uma opção por

85 Ressalva-se que os valores se referem ao álcool hidratado e à gasolina C, não entrando o GNV (opção incentivada pelo Estado do Rio de Janeiro).

desenvolver um determinado energético (o álcool), sendo, essencialmente, uma política energética (segundo os números acima, bem sucedida).

Dessa forma pode-se observar na prática o efeito de uma mudança de política tributária de um ente federativo86. Há, ainda, no caso do álcool uma especificidade: como o ICMS é retido na origem (e não no destino) a redução deste imposto se reflete nos demais Estados, principalmente nos vizinhos. O Rio de Janeiro, conforme os números do Quadro 13, foi o estado mais afetado com a redução desse tributo em São Paulo. Observa-se um incremento de mais de 70% no consumo de álcool hidratado no Rio de Janeiro, colaborando para a redução do consumo de gasolina no período analisado, comprometendo tanto a receita de ICMS do álcool quanto a da gasolina (que teve redução de consumo).

Nota-se, assim, que os incentivos geraram perdas significativas na arrecadação, estabelecendo um trade off com que os estados e a União, cada vez mais, se depararão. Este trade off se dá entre incentivos tributários e arrecadação, afetada pela tributação diferenciada. Seus impactos serão analisados na próxima subseção.