• Nenhum resultado encontrado

2. REVISÃO DE LITERATURA

2.3. VIOLÊNCIA SEXUAL

2.3.2. Impactos da violência sexual na saúde

Todos os tipos de violência estão fortemente associados a consequências negativas à saúde. Nesta perspectiva, a violência sexual também traz suas sequelas à saúde. Vítimas de abusos sexuais correm mais risco de sofrer de doenças no geral que as outras pessoas (COKER, 2000). Contudo, dentre as sequelas mais comuns da violência sexual estão aquelas relacionadas à saúde reprodutiva e mental e ao bem estar. E em menor proporção observam-se as lesões corporais ocorridas naquelas situações em que a violência sexual está associada ao uso de força física.

A consequência mais comum da violência sexual é a gravidez indesejada. Contudo, a taxa de gravidez indesejada, como consequência de agressão sexual, varia bastante entre os países pois depende especialmente da medida em que é difundido o uso de anticonceptivos que não sejam de barreira. Segundo a OPAS (2003), em vários países as vítimas de agressões sexuais são obrigadas a não interromper a gravidez para não pôr em risco suas vidas por realizar um aborto em condições inadequadas. Adicionalmente, nota-se também que a iniciação sexual forçada e a violência sexual praticada pelo parceiro íntimo também aumentam o risco de gravidez durante os primeiros anos da adolescência. Pesquisas realizadas na África do Sul (JEWKES et al, 2001) e nos Estados Unidos (SILVERMAN, RAJ, CLEMENTS, 2004) revelam que as adolescentes grávidas eram duas vezes mais propensas a terem um histórico de iniciação sexual forçada que adolescentes não grávidas.

Quando sofrida em idade precoce, as relações sexuais forçadas podem levar as mulheres a acreditarem que não podem exercer controle sobre sua sexualidade. Assim, crianças e adolescentes vítimas de abusos sexuais tendem a usar menos preservativos ou outras formas de anticoncepcionais. Este fato não só aumenta a sua probabilidade de engravidar, como também de adquirir a infecção por HIV e outras infecções sexualmente transmissíveis (OPAS, 2003).

Pesquisas multipaíses observaram que as mulheres soropositivas relatam taxas mais altas de violência sexual pelo parceiro íntimo que as demais mulheres (DUNKLE et al., 2004; MAMAN et al., 2000). Neste sentido, acredita-se cada vez mais que o risco de contaminação pelo HIV está vinculado à exposição ao longo de toda a vida e de forma complexa à violência sexual (CAMPBELL et al., 2008). Apesar de o estupro ser uma causa potencial de infecção direta pelo HIV, sabe-se que há um baixo risco de transmissão deste vírus durante um único ato sexual. Assim, tem-se notado que a violência sexual por conhecido e a desigualdade de gênero são mais propensos a ampliar o risco de HIV através de vias indiretas, incluindo relações cronicamente abusivas em que as mulheres são constantemente expostas ao mesmo indivíduo e são incapazes de negociar o uso de preservativos para o sexo seguro (WHO, 2010). Jewkes & Morrell (2010) sugerem uma intersecção entre HIV/Aids, desigualdade de gênero e a violência sexual baseada em noções de masculinidade distorcidas. Estas se traduziriam em comportamentos sexualmente de risco, predação sexual e outros atos de violência contra a mulher, bem como em comportamentos que aumentam o risco de contrair o vírus HIV. Dentre estes se destacam sexo como parceiros múltiplos e/ou simultâneos; níveis mais baixos de uso

de preservativos; aumento de uso de substâncias e de sexo em estado de intoxicação; e aumento de sexo transacional e prática da troca de sexo por dinheiro.

Atos sexualmente violentos também podem ocorrer durante a gravidez. Nestes casos, a violência sexual também é associada a eventos adversos de gravidez como abortos espontâneos, bebês prematuros e natimortos (AHMED, KOENIG, STEPHENSON, 2006; ASLING-- MONEMI, TABASSUM, PERSSON, 2008; BOY, SALIHU, 2004; CAMPBELL, 2002; CAMPBELL et al., 2008; DUNKLE et al., 2004; PLICHTA, FALIK, 2001; VOS et al., 2006).

Além das complicações expostas, as agressões sexuais podem levar a outras complicações ginecológicas como hemorragias, infecções vaginais, fibromas, redução do apetite sexual, irritação da região genital, dor durante o ato sexual, dores crônicas na pelve, infecções das vias urinárias e infecções sexualmente transmissíveis (OPAS, 2003).

A violência sexual também está associada com inúmeros problemas de saúde mental e de comportamentos na adolescência e na vida adulta. Vítimas de agressão sexual correm maior risco de sofrer depressão e transtorno pós-traumático. O transtorno pós-traumático é mais observado em situações em que a agressão sexual produziu lesões ou se existe antecedente de depressão ou abuso de álcool pela vítima. Outros problemas associados à violência sexual são a dificuldade de dormir, doenças somáticas, consumo de tabaco e problemas comportamentais como condutas agressivas, roubo e evasão escolar. Além disso, as vítimas de violência sexual são mais vulneráveis a cometer suicídios ou tentar suicidar-se (OPAS, 2003). Andrews et al. (2004) e Brown et al. (2009) relatam que o abuso sexual de crianças contribui significativamente para depressão, uso abusivo de álcool e drogas, síndrome do pânico, síndrome do estresse pós-traumático e tentativas de suicídio.

Assim como as mulheres, outros grupos são afetados pelas sequelas da violência sexual. Os homens vítimas de agressões sexuais relatam uma série de consequências em sua saúde mental. Dentre os problemas destacam-se o sentimento de culpa, agressividade, uso de drogas, absenteísmo escolar, ansiedade, depressão, estresse pós-traumático, disfunções sexuais, condições somáticas, alterações do sono, afastamento do seu/sua parceiro(a) íntimo e tentativa de suicídio. A OPAS (2003) também aponta sinais de maus-tratos sexuais de pessoas idosas como mudanças na conduta sexual dos idosos que não coincide com seu comportamento habitual e sua personalidade; agressividade, isolamento e automutilação; dores abdominais, hemorragias vaginal ou anal; infecções genitais recorrentes ou hematomas ao redor das mamas e na região genital.

Desta forma, a OMS resume as consequências da violência sexual à saúde:

Além de serem violações de direitos humanos, causam danos profundos no bem-estar físico, sexual, reprodutivo, emocional, mental e social do indivíduo e da família. Os desfechos imediatos e a longo prazo na saúde que foram associados a esses tipos de violência incluem traumatismos físicos, gravidez indesejada, aborto, complicações ginecológicas, infecções sexualmente transmissíveis (incluindo HIV/Aids), transtorno de estresse pós-traumático, entre outros. Há também uma série de complicações relacionadas com a gravidez, como aborto espontâneo, trabalho de parto prematuro e baixo peso ao nascer associados com a violência durante a gravidez. Além disso, comportamentos de alto risco, como tabagismo, uso nocivo de álcool e drogas e sexo não seguro são significativamente mais frequentes entre as vítimas de violência sexual e aquela praticada pelo parceiro íntimo (OMS, 2012, p.3).

Quanto à violência sexual praticada por parceiro íntimo, observa-se que esta afeta não somente as mulheres envolvidas, mas também provocam danos na saúde e no bem-estar das crianças da família. Pesquisadores apontam que mães vítimas de violência sexual no ambiente doméstico possuem maiores taxas de depressão e estresse traumático o que afeta a qualidade de sua capacidade de afeto e maternidade, o que consequentemente poderia se desdobrar em maus- tratos as crianças desta família (HOLT, BUCKLEY, WHELAN, 2008). Estudos mostraram que as crianças de mães que sofreram abusos têm taxas mais baixas de imunidade, taxas mais altas de doenças diarreicas e são mais propensas a falecer antes dos cincos anos de idade devido à falta de cuidados de sua mãe (ASLING-MONEMI, TABASSUM, PERSSON, 2008; SILVERMAN et al., 2009).

Ainda é importante ressaltar a questão cultural que envolve as consequências da violência sexual. Em algumas culturas as mulheres violentadas sexualmente são obrigadas a casar-se com seu violentador, serem expulsas de sua comunidade ou serem assassinadas para garantir a honra da família; e homens podem abandonar sua esposa violentada (OPAS, 2003). Este fato gera um grande desconforto social para as mulheres.