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S EG MENTOS INDUSTRIAIS N ÚMERO

2.2.2 Implicações socioespaciais

As transformações econômicas e o perfil industrial paranaense, traduzidos em oportunidades de trabalho como se procurou enfatizar, são elementos explicativos dos desdobramentos demográficos que continuam a oscilar entre a concentração e o esvaziamento, tendo em vista a formação do pólo automotivo na Região M etropolitana de Curitiba (MOURA, 2003b, p. 589-591).

Se as mudanças na agricultura trouxeram ampla subtração demográfica por toda a região, sobretudo na década de 1970 e 1980, observa-se que na década de 1990 o processo não se esgotou e que o declínio demográfico continua. A explicação dessa pertinaz situação na região está articulada ao desenvolvimento industrial do Estado, tal como ele se apresenta, confirmando o modesto papel das cidades menores quanto às atividades industriais, em especial no que se refere à geração de empregos melhor remunerados.

Enquanto surgiam áreas de esvaziamento no interior paranaense, a Região M etropolitana de Curitiba apresentava surpreendente crescimento, como destacaram M oura e Ultramari (1994, p. 6-7) e M oura, Ultramari e Cardoso (1994, p. 23). Em 1950, a área a ela correspondente102 somava 317.442 habitantes. Em 1980, já eram 1.440.626 habitantes. Foi a Região M etropolitana brasileira com a maior taxa de crescimento na década de 1970, situação que persistiu durante a década seguinte, períodos que coincidem com as transformações agrícolas assinaladas anteriormente. De acordo com dados do último censo demográfico, esta Região M etropolitana permanece entre as que mais crescem no Brasil, mormente pelo incremento dos municípios periféricos, ao lado das Regiões M etropolitanas de Brasília, Fortaleza e Salvador. A Região M etropolitana de Curitiba soma 2.768.394 habitantes, com taxa média de crescimento anual, calculada entre 1991 e 2000, de 3,1%, significativamente superior a média metropolitana brasileira, que é de 2% para o mesmo período, e a média do país como um todo que é de 1,6% (MOURA et al., 2004).

No território paranaense, a Região M etropolitana igualmente se destaca como a área que mais cresce (Tabela 8), seguida das cidades consideradas oficialmente como de porte médio pelo IBGE (aquelas que possuem entre cem e quinhentos mil habitantes). M as os centros

sentido de ampliá-lo, misturas de 26% de álcool anidro na gasolina e 3% no diesel, medidas compensatórias para adoção do automóvel a álcool, isenções de Impostos sobre Produtos Industrializados (IPI) deste tipo de automóvel para taxistas e frotas de locadoras, entre outros tantos.

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Embora a Região Metropolitana de Curitiba tenha sido instituída com 13 municípios pelo governo federal apenas em 1973, por meio da Lei número 14/1973, juntamente com Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife, Salvador e Fortaleza (MOURA et al., 2004), os autores consideraram para a comparação entre os anos de 1950 e 1980 os 14 municípios que

a compunham no final desta última década: Almirante Tamandaré, Araucária, Balsa Nova, Bocaiúva do Sul, Campina Grande do Sul, Campo Largo, Colombo, Contenda, Curitiba, Mandirituba, Piraquara, Quatro Barras, Rio Branco do Sul e São José dos Pinhais.

urbanos que estão entre cinqüenta e cem mil habitantes também apresentaram um índice significativo de crescimento demográfico, o que uma vez mais mostra que os mesmos apresentam uma dinâmica semelhante às cidades de porte médio, ao menos nesta unidade da federação.

Tabela 8 - Estado do Paraná. Distribuição da população por classes de municípios, 1996-2000

Classes de Municípios 1996 2000 Taxa crescimento anual % RMC 2.431.804 2.725.505 3,3 100-500.000 hab. 1.752.356 1.902.197 2,02 50-100.000 hab. 886.828 953.638 1,83 20-50.000 hab. 1.421.853 1.465.647 0,83 Menos 20.000 hab. 2.510.963 2.511.139 0,06

Tabela elaborada com base em dados do IBGE/1996 e 2000.

É saliente como os percentuais de crescimento demográfico diminuem, conforme as classes de municípios103. Os municípios demograficamente menores no Paraná são os que, de modo geral, apresentam os menores indicadores. São pouco numerosos os municípios que podem ser considerados demograficamente grandes no Paraná, pois, tomando por base o recenseamento do ano 2000, são apenas 28 municípios com população acima de cinqüenta mil habitantes, das quais nove estão na Região M etropolitana de Curitiba, dois no aglomerado de Londrina e Cambé e outros dois no aglomerado de M aringá e Sarandi. Outros quinze são centros ou capitais regionais paranaenses.

A dinâmica demográfica da região Noroeste, mediante o contexto econômico assinalado, mostra que entre 1980 e 1991 (Cartograma 6) dos 132 municípios existentes na região naquele período, 95 perderam população. Houve uma persistência no declínio demográfico, embora menores em relação à década anterior, tanto no que se refere ao número de municípios, quanto nas taxas correspondentes, com exceção de alguns

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O mesmo se observa para o Brasil, como pode se conferir em Baeninger (2003, p. 285), onde, para a média nacional (1,63%), as Regiões Metropolitanas apresentam índices que vem decrescendo (1,99%), mas ainda assim maiores dos que os municípios demograficamente inferiores que apresentam o mais baixo percentual (1,02%), tomando por referência os anos de 1991-2000.

municípios que também estão em áreas com maiores dificuldades econômicas, tendo em vista suas características naturais, principalmente a qualidade de solo e o relevo. Há um expressivo crescimento ao longo do eixo das principais cidades da região, especialmente entre M aringá e Londrina, além de um maior crescimento dos municípios vizinhos a esses núcleos principais dos aglomerados urbanos de M aringá/Paiçandu/Sarandi e Londrina/Cambé/Ibiporã. No aglomerado urbano polarizado por M aringá, aparecem como indicadores mais expressivos os dos municípios de Paiçandu e M arialva, do qual se originou posteriormente o município de Sarandi, que neste período já era parte do processo de aglomeração urbana, a partir de M aringá. Esse processo acompanha a tendência geral de expansão territorial das cidades, seguidamente justificado pela diferença de custo da moradia.

A variação nas taxas de crescimento foi menor no sentido dos indicadores negativos e maior no sentido dos valores positivos, oscilando de - 5,15% a 14%. Os índices mais altos referem-se aos municípios envolvidos no mencionado processo de periferização.

Quanto ao último período analisado, de 1991 a 2000, reforça-se a tendência da década anterior, com maior crescimento ao longo do eixo rodoviário (Cartograma 7) que articula as cidades principais, dos municípios limítrofes a estas, bem como persistem perdas mais expressivas nas mesmas áreas do período anterior, especialmente ao sul e oeste da região (Cartograma 8).

Nesse último período, do total de 156 municípios, 91 tiveram declínio de população, e destes, 36 perderam inclusive população urbana, o número mais alto de todo o período analisado104. Dados indicam (Tabela 9) que existe a mesma tendência nas classes de municípios com até vinte mil habitantes, que possuem percentuais de declínio demográfico parecidos. M ais da metade dos municípios destas classes apresentam decréscimo. Com os municípios entre vinte e cinqüenta mil habitantes, o percentual é menor, embora o número de municípios desta categoria seja também reduzido, ou seja, são treze municípios, dos quais quatro perdem população. Os municípios que estão em faixas demográficas com mais de cinqüenta mil habitantes não apresentam indicadores de decréscimo populacional, pelo contrário indicam acréscimos demográficos, revelando o reverso do processo de esvaziamento, a concentração, absorvendo habitantes que saem dos municípios demograficamente menores.

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Conforme levantamento elaborado sobre diminuição de população urbana, foi a seguinte - entre 1960-1970: 13 municípios; 1970-1980: 14 municípios; 1980-1991: 13 municípios; 1991-2000: 36 municípios. Ao todo, dos 165 municípios, 64 tiveram redução de população urbana num dos períodos analisados.

Tabela 9 – Noroeste do Paraná. Número de municípios com declínio demográfico/Classes de municípios, 1991-2000

Classes de municípios Número de municípios existentes

Número de municípios com declínio demográfico

Até 5 mil habitantes 53 30 ( 56,6%)

De 5 mil a menos de 10 mil habitantes

55 36 (65,4%)

De 10 mil a menos de 20 mil habitantes

35 21 (60%)

De 20 mil a menos de 50 mil habitantes

13 4 (30,6%)

De 50 mil a menos de 100 mil habitantes

6 -

De 100 mil a menos de 500 mil habitantes

3 -

T otal 165 91 (55,1%)

Fonte: IBGE, Censo Demográfico, 2000.

As respostas obtidas, na aplicação de questionários, com a pergunta: “Conhece pessoas que se mudaram (parentes, amigos, conhecidos)? Para onde foram (principais destinos) e por que se mudaram?”105, ou seja, acerca da mobilidade geográfica de antigos moradores, indicam os destinos preferidos pelos mesmos e mostram M aringá e a Região M etropolitana de Curitiba como os destinos mais citados dentro do território paranaense, seguidos de Londrina ou de outras localidades com papéis regionais, como Cianorte, Paranavaí e Umuarama (Quadro 3).

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Questão que faz parte dos questionários aplicados nos municípios selecionados para estudo comparativo no terceiro capítulo: Colorado, Querência do Norte, Rondon e Terra Rica, conforme se explica no apêndice metodológico. As questões apresentadas neste capítulo são aquelas referentes à mobilidade espacial da população destas cidades e que reiteram questões levantadas neste capítulo, acerca da rede urbana. A ordem que os destinos são mencionados nos quadros obedece à quantidade de vezes que foram citados. Encontra-se em apêndice o modelo do questionário (Apêndice F).

Quadro 3 - Colorado, Querência do Norte, Rondon e Terra Rica. Principais destinos migrantes, 2003106

Município Destinos paranaenses Outros

Colorado Maringá, Curitiba e Londrina Mato Grosso, São Paulo capital e interior

Querência do Norte Curitiba, Maringá, Umuarama e Londrina Mato Grosso, São Paulo capital, Rondônia e Mato Grosso do Sul Rondon Curitiba, Maringá, Cianorte e Paranavaí São Paulo capital, Mato Grosso e interior paulista107

Terra Rica Maringá, Curitiba, Paranavaí e Londrina São Paulo capital, Mato Grosso e interior paulista

Fonte: Questionários aplicados, 2003.

Fora do Estado do Paraná os principais destinos mencionados foram o Estado de M ato Grosso, São Paulo (capital e interior) e Rondônia. Estas referências sintetizam os principais destinos assinalados dentro e fora do Paraná. Outras respostas merecem, ainda, ser comentadas.

Embora M inas Gerais não tenha aparecido entre os destinos mais citados, foi expressiva a menção ao mesmo, em especial por produtores ou trabalhadores que pretendiam continuar lidando com café. Também foram freqüentes menções a Rondônia e M ato Grosso do Sul. No caso de Querência do Norte, além desses locais, aparecem os Estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul, expressões da migração de retorno, além do Paraguai, onde alguns compraram terras e outros foram trabalhar. Em quase todas as cidades aparecem referências à emigração para países como Estados Unidos, Portugal, Japão, Espanha, Itália e Inglaterra, mostrando a participação das sociedades que vivem nestas pequenas cidades no recente processo de grandes deslocamentos imigratórios no âmbito internacional.

As manifestações acerca da questão “Para onde você iria no caso de sair da sua cidade?” sinalizam que a concretização das intenções de mobilidade demonstradas pelos atuais moradores reforçaria a tendência de migração para as principais cidades da região e para a capital do Estado e seu entorno metropolitano. As intenções de mobilidade para fora do Paraná mostram uma tendência menor de fluxo para o Estado de M ato Grosso e para a capital paulista, sendo mais freqüente as referências a cidades do interior paulista (Quadro 4).

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Quadro 4 - Colorado, Querência do Norte, Rondon e Terra Rica. Possíveis destinos dos moradores, 2003

Município Possíveis destinos

Colorado Maringá, Curitiba, Londrina e Mato Grosso

Querência do Norte Maringá, Curitiba, sem planos de mudança e Estados Unidos Rondon Maringá, sem planos de mudança, Cianorte e Curitiba Terra Rica Maringá, Curitiba, Mato Grosso e interior paulista

Fonte: Questionários aplicados, 2003.

Ao perderem alento os fluxos migratórios para fora do Paraná, notadamente para o Centro Oeste e Norte do país, aumentou a migração para a Região M etropolitana de Curitiba, impulsionada pelos novos ativos industriais, bem como para cidades médias e centros regionais paranaenses. Quanto a estes últimos, é conveniente observar que a dinâmica similar às cidades de porte médio mostra que fatores aparentemente insignificantes podem fazer a diferença no comportamento demográfico. Assim, cidades consideradas oficialmente como pequenas, mas demograficamente superiores à maioria delas, expressam uma dinâmica diferente, mediante o que se deve estar de acordo com Prenant (1986, p. 477) no que se refere ao fato de que o contingente herdado pesa sobre condições ulteriores de acolhimento.

Estas informações confirmam a propensão que tem se revelado nos últimos anos de migrações de curtas distâncias, para cidades maiores e próximas do município de origem. Assim, explica-se que os moradores de Colorado indiquem tanto M aringá quanto Londrina, já que a posição daquele município torna essas cidades relativamente próximas. Essa mesma explicação serve para o caso de Rondon em relação a Cianorte e Paranavaí, sendo esta última destino também de emigrantes saídos de Terra Rica. Esse mesmo processo foi detectado por Bacelar (2003, p. 36) no Triângulo M ineiro, onde o “[...] sonho das pessoas é se mudar para os centros regionais” e Prenant (1986, p. 495), analisando o caso argeliano (parte do considerado mundo árabe), igualmente sublinha os fluxos constituídos por ‘migrantes de proximidade’. Estas referências mostram que esta tendência não é exclusiva da região analisada.

M uitos respondentes manifestaram não terem nenhuma intenção de se mudar, o que foi uma das respostas mais freqüentes para os moradores de Querência do Norte e Rondon, mas também presente nos outros municípios.

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Algumas pessoas preferiram não mencionar uma cidade específica, referiam-se ao tamanho da cidade. Convergiram respostas sobre a intenção de se mudar para uma cidade maior. Por outro lado, alguns afirmaram que só se mudariam para outra cidade pequena. Essas manifestações sobre a mudança, concretizada ou intencional, para outras cidades pequenas da região apareceram, com freqüência, mas como são muitas as pequenas cidades, isso não faz de nenhuma delas, especificamente, um ponto comum de destino, mas convém mencionar que no conjunto foram expressivas essas referências, em geral motivadas por vínculos já estabelecidos: são locais de nascimento ou de moradia anterior, ou ainda, locais onde vivem parentes e amigos.

A motivação principal para a mobilidade, como já se conhece no âmbito científico, é a busca da sobrevivência por meio do trabalho (emprego ou outras atividades que resultem na geração de ganhos) tanto em segmentos formais como informais. M as, é possível perceber que diferentes destinos possuem, de modo geral, motivações diferentes. Enquanto para São Paulo e Curitiba, por exemplo, foram predominantemente trabalhadores a procura de emprego, para os Estados de M ato Grosso e Rondônia foram investidores agrícolas, além de comerciantes e prestadores de serviços. Assim, fluxos humanos de natureza diferente podem apresentar uma variação quanto ao volume e orientação, como também constatou Prenant (1986, p.543).

Embora a migração tenha envolvido significativa parte da população que ficou sem opção de sobrevivência na região, ela não esteve baseada exclusivamente nesse contingente, ou seja, muitos se foram porque as pequenas cidades não atendiam mais os seus anseios financeiros ou profissionais. Foram freqüentes as mudanças de famílias inteiras ou de jovens tendo como motivação os estudos. Nesse caso, os destinos mais freqüentes foram M aringá e Curitiba. Por esses motivos, nos fluxos atuais, são predominantes os movimentos migratórios urbano-urbano, freqüentemente motivados pela falta de oportunidades nas cidades menores108. Esses foram os principais motivos, indicados pelos respondentes, para justificar os fluxos e as inclinações de mobilidade espacial nos municípios da região. Por fim, pouquíssimos indicaram locais que gostariam de morar tendo em vista a aprazibilidade dos mesmos, como áreas do litoral.

Para entender as dinâmicas observadas nos cartogramas, especialmente nos últimos, é necessário um olhar amplo, pois tal como aludira Santos (1984), a urbanização não pode ser compreendida como uma realidade ‘autocontida’, mas como parte da totalidade espacial, dependente,

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ela própria, da totalidade social109. Então, para apreender o processo de mobilidade espacial é necessário estar atento, tanto aos espaços de saída quanto aos espaços de destino da população, tal como enfatizara Brunhes (1988, p. 260): “En todo movimiento de migración o de emigración, cuántos fenómenos sociales en el punto de partida, cuántos fenómenos sociales en el punto de llegada!”.

O redirecionamento agrícola na região, como parte do processo geral de modernização no Brasil, e os efeitos socioespaciais dele decorrentes somam-se aos efeitos da concentração de investimentos e empregos na área metropolitana de Curitiba, especialmente impulsionados pela formação do novo perfil industrial do Estado, comandado pelo ramo automotivo.

Estes fatores explicam as mutações socioespaciais, ainda em curso, no Noroeste paranaense, especificamente no conjunto de pequenas cidades, que expressam, em grande parte, a mobilidade da população na insistente busca de oportunidades e de sobrevivência.