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A importância dos processos de interação na autoconstrução dos sujeitos indivíduos complexos

No documento Desenho, ensino e pesquisa (páginas 149-153)

“A incerteza também é uma dimensão que está presente na formação do sujeito. Esse é ao mesmo tempo tudo e nada.” Edgar Morin (2005b)

O pensamento complexo integra e agrega o sujeito em seus processos. Morin (2005b) apresenta três categorias de seres: seres de primeira ordem (seres unice- lulares), seres de segunda ordem (seres pluricelulares – aqui está o ser humano) e seres de terceira ordem (as sociedades dos seres pluricelulares). O ser humano é complexo por natureza, apresentando em sua ontogenia a onipresença genética, a onipresença dos acontecimentos do desenvolvimento individual e a onipresença cultural, o que vai lhe conferir uma tripla referência: a) a identidade genética: o genos – a hereditariedade, a manutenção das características da espécie; b) a iden- tidade particular: sua singularidade; c) a identidade subjetiva: a autoafirmação de si, percebendo-se singular e pertencendo a uma espécie. (MORIN, 2005b) No para- digma ecológico, o sujeito é concebido como um ser multidimensional, inserido em um ecossistema, onde “[...] emerge da auto (geno-feno-ego)-eco-re-organi- zação, não como epifenômeno tardio, mas como foco ecológico, organizacional,

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computante, práxico, etológico, existencial do ser fenomênico ou indivíduo”. (MORIN, 2005b, p. 303)

O agir consciente, ação e reflexão integram o fazer do sujeito que atua a partir do paradigma da complexidade, sendo o mesmo uma junção tríplice dos princípios de autos, de indivíduo e de sujeito. (MORIN, 2005b)

Para Morin, a autonomia é emergente e “autos” é a autonomia da autonomia viva, sempre com a ideia de anéis circulares. Dessa forma, apresenta a passagem do si (do físico, do pensamento simplificador) ao autos (pensamento complexo, bioló- gico): “O ‘si’ se converte em ‘autos’; – a existência se converte em vida; – o ser se con- verte em indivíduo; – o vivo se autogera a partir do vivo.”. (MORIN, 2005b, p. 132) A autonomia é uma característica desse indivíduo-sujeito, que não é soli- dário desde o princípio. A solidariedade e o comportamento de partilha surgirão a partir das trocas com os outros indivíduos-sujeitos, ou seja, das necessidades.

O autos é um autos egoísta. É na necessidade da existência de outro ser vivo que surge a solidariedade:

Isso, podemos começar a compreender a partir do momento em que um ser vivo se torna uma exigência existencial para outro; essa exigência cria de imediato uma solidariedade e uma comple- mentaridade de fato do outro em relação ao primeiro. (MORIN, 2005b, p. 63)

Piaget diz que a razão nasce nas interações que estabelecemos com os outros, na solidariedade. (PIAGET, 2009) Morin (2005b) concebe os seres vivos como auto-genofeno-eco-re-organização; pois se autodeterminam em relações que mantêm internamente (genótipo); externamente com o meio (fenótipo) em adaptações recursivas.

Como trazemos a memória de nossa espécie e as características de nosso meio em nossa bagagem biológica, em nossa corporeidade? Genos é, então, memória e programa, a dimensão informacional; enquanto fenos diz respeito à atualização das informações nas ações realizadas, é computação e comunicação. Não existem em separado, mas em dialogicidade em uma cultura. O que vai caracterizar o

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indivíduo-sujeito é sua capacidade de trabalhar com as informações internas e externas, capacidade que denominou de computo. (MORIN, 2005b)

A memória é construída biológica e culturalmente nas interações entre indi- víduos-sujeitos. A ação humana traz em si as marcas dessas memórias, proje- tando-se para um tempo futuro. Operando entre opostos, a organização dos sis- temas vivos é complexa. Solidariedade, cooperação e antagonismos acontecem ao mesmo tempo e de forma contrária também, pela necessidade dos sistemas. Existe uma interdependência entre essas características, o que leva a auto-orga- nização dos sistemas vivos.

Encontram-se, nos pensamentos de Morin, Maturana e Varela, pontos que a princípio podem parecer divergentes, no entanto, com abordagens diferen- ciadas, compreende-se que são convergentes. Maturana e Varela (2001) apre- sentam o ser vivo como um sistema fechado: o cérebro humano trabalha em uma “clausura operacional”.

Apresentam os conceitos de solipsismo e representação, para demonstrar as abordagens escolhidas pelas culturas ocidentais no lidar com o conhecimento. Utilizam a expressão “caminhar sobre uma navalha”, para não cairmos no erro de observarmos o mundo como se estivéssemos fora dele.

Para Morin (2005b), o ser humano é fechado e aberto, possuímos um inte- rior e um exterior. Tornamo-nos cegos diante de nosso interior, no sentido de que não conseguimos ter consciência do funcionamento de nosso organismo, o cérebro trabalha em um “fechamento operacional”, mas, ao mesmo tempo, temos consciência das leituras, interpretações do mundo. Assim, somos abertos e possuímos um exterior.

Ao mesmo tempo em que, a partir de nosso sistema nervoso, de nosso cérebro, construímos em nossa mente imagens, códigos que se referem ao mundo exte- rior, não temos consciência das operações e dos códigos utilizados internamente pela nossa massa encefálica.

O seu aparelho computante está numa câmara blindada, elaborando a tra- dução de mensagens de que nunca conhecerá a língua original “[...] O ser vivo não é apenas aberto porque traz consigo marca da eco-organização e porque extrai as

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suas energias do exterior. É aberto pela sua necessidade de informações objetivas quando é egoísta.” (MORIN, 2005b, p. 305)

Para Maturana e Varela (2001), é na linguagem e na emoção que o homem se torna humano. A cognição que proporciona o enraizamento das qualidades de indivíduo-sujeito que passa a ser indivíduo-sujeito atuante, vivo, em uma cul- tura, em uma sociedade, em uma história. (MORIN, 2005b)

Na Imagem 1, apresenta-se esquematicamente a concepção de sujeito-indi- víduo complexo, com base nos princípios do paradigma ecológico. Sob a ótica da biologia, as relações estabelecidas interna e externamente pelos seres de segunda ordem, os seres humanos, os caracterizam como seres em contínua autocons- trução, na compreensão explicação do mundo.

imagem 1 – O paradigma ecológico e o sujeito-indivíduo-complexo

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O indivíduo-sujeito se autoconstrói a partir das interrelações com os demais indivíduos-sujeitos, do meio em que está inserido e também de sua auto-obser- vação em um anel contínuo. (Imagem 1)

A linguagem é que nos dá a possibilidade de termos a reflexão e também a consciência de nossa identidade, “[...] existimos em nosso funcionamento na lin- guagem, e conservamos nossa adaptação no domínio de significados que isso faz surgir”. (MATURANA; VARELA, 2001, p. 233) É na linguagem que o sujeito se per- cebe enquanto indivíduo.

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