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linguagem e emoção no ato de conhecer o mundo

No documento Desenho, ensino e pesquisa (páginas 156-160)

A criação do conhecimento sob a perspectiva do pensamento complexo per- cebe o mundo a partir da biologia, como apresentado anteriormente. A com- preensão dos fenômenos, a partir das relações sistêmicas ordem/desordem/ integração encaminha o olhar do observador para outra via de compreensão da realidade que aqui será trabalhada a partir da Biologia do Conhecimento de Maturana (2001). A Biologia do Conhecimento é o corpo teórico do pensa- mento de Maturana, anteriormente denominada de teoria da autopoiese. É cor- roborada pelas abordagens do pensamento complexo de Morin (2000, 2005b) e da cognição atuante de Varela, Thompson e Rosch (2003).

Maturana apresenta seu pensamento, contrapondo duas visões de mundo: O Domínio das Ontologias Transcendentais, onde se tem uma abordagem denominada de “objetividade sem parênteses”, e o Domínio das Ontologias Constitutivas, onde se tem a abordagem denominada de “objetividade entre parênteses”. (MATURANA, 2001)

Nessa abordagem, a realidade é construída pelos indivíduos-sujeitos, não ficando restrita a uma visão apenas, constituindo-se como um multiverso (e não um uni- verso). Os fenômenos, eventos, objetos constituem-se na distinção. (MATURANA, 2001, 2002) O ato de explicar os fenômenos passa a ser trabalhado através da acei- tação e do consenso de um grupo de indivíduos-sujeitos. Na visão da objetividade sem parênteses, a realidade é percebida como já existente, sendo pré-determinada. Por isso, tem-se uma explicação única para os fenômenos, buscando-se sempre uma verdade. É a abordagem utilizada pela ciência moderna e que ainda hoje é utilizada. As questões sociais, ambientais, econômicas colocadas pelo momento contempo- râneo têm solicitado uma outra abordagem, para explicar o mundo e os fenômenos,

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como apresentado anteriormente. Através da biologia, Maturana (2001) sistema- tizou a abordagem por ele denominada de objetividade entre parênteses, utilizada no Domínio das Ontologias Constitutivas.

Para Maturana, o ser humano conhece o mundo na linguagem, na emoção e na experiência, a partir da aceitação de uma formulação de explicação para determinado fenômeno. A explicação dialógica implica em experiência reflexiva e compartilhada na aceitação de ouvir o outro e acolhê-lo. “[...] a simbolização, o símbolo, surge sempre com uma reflexão sobre o fluir das coordenações de ação na linguagem.” (MATURANA, 2001, p. 120)

A linguagem e a emoção são os dois elementos que proporcionam aos indi- víduos sujeitos a criação de significados, em autodeterminações e interações mútuas. As emoções são fundantes de modos de ver e perceber a realidade. (MATURANA, 2001) Na abordagem da objetividade entre parênteses, a apren- dizagem ocorre na aceitação e incorporação de explicações, em convivência, de forma autônoma.

Linguagem, para Maturana, refere-se a todas as formas expressivas e comu- nicativas em que o ser humano realiza “coordenações consensuais de con- duta”, utilizando-se da fala, da visão, do olfato, da audição, da sinestesia, como também dos códigos criados culturalmente. Essas ações acontecem então em uma convergência entre a linguagem e a emoção, experiencialmente, em uma vivência corporalizada. A emoção primordial e que move o ser humano é o amor. (MATURANA, 2001, 2002; MATURANA; VERDEN-ZOLLER, 2004) Amor pre- sente na solidariedade, nos atos de compartilhamento, de saber ouvir o outro, de empatia com o outro.

[...] o princípio da associação está no coração de toda organização viva [...] no seio do Plurianel eco-organizador o antagonismo e a destruição trabalham, de fato, mais para a solidariedade do todo que para a sua desintegração. (MORIN, 2005b, p. 50)

Todo o pensamento de Maturana e Varela (2001), Maturana (2001, 2002), Maturana e Verden-Zoller (2004), Varela, Thompson e Rosch (2003), assim como

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o de Morin (2002, 2005a, 2005b) evidenciam a trajetória da vida como conheci- mento. Os seres vivos são caracterizados como organizações autopoiéticas, crian- do-se e recriando-se continuamente em meio aos antagonismos vida-morte-vida, onde a sobrevivência da espécie é a meta principal.

Aliam experiência e ação conscientes e efetivas, em que “todo fazer é um conhecer e todo conhecer é um fazer” (MATURANA; VARELA, 2001, p. 32), em que todo ato de conhecer é a criação de um mundo, por um observador inserido nesse mundo. O indivíduo-sujeito é parte da natureza viva, integrando um processo sócio histórico-cultural, como a mola propulsora para a produção de um conhe- cimento sobre os outros sujeitos, sobre si mesmo, sobre a vida e sobre o próprio conhecimento. Pode-se dizer que a aprendizagem está presente em todo o ciclo de vida dos seres vivos, potencialmente de forma consciente nos seres humanos.

Nesse embate em prol da “sobrevivência”, os indivíduos-sujeitos constroem estratégias, formas para solucionar questões, caminhos que se configuram a partir de suas formas de ver e compreender o mundo. Conhecimento é inteli- gência e é estratégia (MORIN, 2005b), é a correlação entre estratégia da cognição e estratégia da ação.

Essa visão aproxima o conhecimento do cotidiano, retirando da ciência a supremacia sobre o saber e, de certa forma, faz com que se volte o olhar para o universo das Artes, da Filosofia, das Ciências Humanas, percebendo a intrínseca relação entre as áreas do conhecimento.

Para Vygotsky (1998a, 1998b), o aprendizado não ocorre somente em subor- dinação ao desenvolvimento biológico, apresentando a importância do meio e da colaboração para que o mesmo ocorra. Evidencia a importância da imitação como impulsionadora da aquisição de novos conhecimentos por parte dos indivíduos-sujeitos.

Nas teorias de Vygotsky, a linguagem, os conceitos, a escrita, os trabalhos de arte são sistemas simbólicos que, quando internalizados,7 provocam transformações

na relação do homem com a natureza. (COLE; SCRIBNER apud EFLAND, 2002)

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Os instrumentos, as ferramentas criadas pelo homem, cultura e socialmente são mediadores da aprendizagem. “Para Vygotsky as formas mentais superiores somente são possíveis a partir da internalização das influências culturais. Particularmente, é a aquisição da linguagem que torna possível a consciência mental.”8 (EFLAND,

2002, p. 33, grifo do autor, tradução nossa)

Somente os seres humanos podem, a partir de uma imitação, alcançar novos conhecimentos. (VYGOTSKY, 1998b)

Para Vygotsky, a noção de idade mental não é suficiente para descrever as etapas do desenvolvimento cognitivo, criando assim o conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal. Esta é “a discrepância entre a idade mental real de uma criança e o nível que ela atinge ao resolver problemas com o auxílio de outra pessoa [...]”. (VYGOTSKY, 1998a, p. 128-129)

Assim, a interação social e cultural assumem papel fundamental no desenvol- vimento do aprendizado para as crianças em fase escolar, principalmente no que se refere às atividades que exigem consciência e controle deliberado. Vygotsky (1998, p. 126) afirma que:

[...] o aprendizado geralmente precede o desenvolvimento. A criança adquire certos hábitos e habilidades numa área específica, antes de aprender a aplicá-la consciente e deliberadamente. Nunca há um paralelismo completo entre o curso do aprendizado e o desenvolvi- mento das funções correspondentes.

Para Varela; Thompson e Rosh (2003), a cognição é um processo de “atuação”, em um mundo vivenciado e experienciado, de forma consciente, não exis- tindo uma separação entre o sujeito cognoscente e o objeto do conhecimento, como apresentado anteriormente. A ação trabalhada de forma consciente pelos sujeitos é característica dessa abordagem que valoriza as experiências do coti- diano, corroborando a abordagem da Biologia do Conhecimento. “O conheci- mento não preexiste em qualquer lugar ou sob qualquer forma, mas é atuado

8 “For Vygotsky, higher forms of mental life begin only when culture influences are internalized! In particular, it is language acquisition that makes conscious mental life possible.”

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em situações particulares – quando um conto popular é contado ou um peixe é nomeado”. (VARELA; THOMPSON; ROSCH, 2003, p. 182)

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