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3. O assédio moral na Administração Pública

3.6. Improbidade Administrativa

A Constituição Federal tratou do tema em seu art. 37, § 4º, e determina que “os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível”.

Os atos de improbidade administrativa são regulados pela Lei nº 8.429/92 - responsabilização civil dos agentes públicos, e, caracterizam-se por atos que importam em enriquecimento ilícito (art. 9º), dano ao erário (art. 10), decorrentes de concessão ou aplicação indevida de benefício financeiro ou tributário (art. 10-A) e violação aos princípios da Administração Pública (art. 11).

Nos termos da referida Lei, podem praticar atos de improbidade administrativa o agente público, considerado “todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de

investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função”. E ainda, os terceiros, aqueles “que, mesmo não sendo agente público, induzam ou concorram para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta”.

Podem ser sujeitos passivos da improbidade administrativa a Administração direta ou indireta dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios; a empresa incorporada ao patrimônio público ou entidade para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com mais de cinquenta por cento do patrimônio ou da receita anual; o patrimônio de entidade que receba subvenção, benefício ou incentivo, fiscal ou creditício, de órgão público e entidades para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com menos de cinquenta por cento do patrimônio ou da receita anual.

A Lei de Improbidade Administrativa não pune apenas o ato ilegal, o legislador buscou proteger o Estado, de modo a evitar sua depreciação, punindo a conduta ilegal e imoral do agente público e daqueles que com ele colaboram. Assim, o objetivo do combate à improbidade administrativa é impedir que os agentes públicos, no exercício indevido de suas funções, atuem em detrimento do Estado (MORAES, 2011, P. 384).

Neste tópico, o que mais nos interessa, é a previsão contida no art. 11, da Lei de Improbidade Administrativa, que indica os atos que atentam contra os princípios da Administração Pública.

Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições.

Alguns desses atos são definidos detalhadamente em sete incisos, no entanto, o entendimento que prevalece, é que conforme a redação do caput do referido artigo, qualquer ato que atente “contra os princípios da administração pública, qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições” caracteriza ato de improbidade.

Para Moraes (2011, p. 383), atos de improbidade administrativa:

(...) são aqueles que, possuindo natureza civil e devidamente tipificados em lei federal, ferem direta ou indiretamente os princípios constitucionais e legais da administração pública, independente de importarem enriquecimento ilícito ou de causarem prejuízo material ao erário pública.

Portanto, para caracterizar a improbidade administrativa não há necessidade de comprovar a ilegalidade do ato ou o enriquecimento ilícito ou ainda o prejuízo material ao erário, sendo suficiente demonstrar a lesão ao princípio da moralidade administrativa ou a qualquer outro princípio imposto à Administração Pública (DI PIETRO, 2012, p. 881).

Em relação à prática abusiva de assédio moral no serviço público, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é ampla, foram diversos os casos de assédios cometidos contra servidores públicos. Ademais, em 2013, a 2ª Turma do referido Tribunal, reconheceu o assédio moral como ato de improbidade administrativa.

ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ASSÉDIO MORAL. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. ART. 11 DA LEI 8.429⁄1992. ENQUADRAMENTO. CONDUTA QUE EXTRAPOLA MERA IRREGULARIDADE. ELEMENTO SUBJETIVO. DOLO GENÉRICO. 1. O ilícito previsto no art. 11 da Lei 8.249⁄1992 dispensa a prova de dano, segundo a jurisprudência do STJ. 2. Não se enquadra como ofensa aos princípios da administração pública (art. 11 da LIA) a mera irregularidade, não revestida do elemento subjetivo convincente (dolo genérico). 3. O assédio moral, mais do que provocações no local de trabalho – sarcasmo, crítica, zombaria e trote –, é campanha de terror psicológico pela rejeição. 4. A prática de assédio moral enquadra-se na conduta prevista no art. 11, caput, da Lei de Improbidade Administrativa, em razão do evidente abuso de poder, desvio de finalidade e malferimento à impessoalidade, ao agir deliberadamente em prejuízo de alguém. 5. A Lei 8.429⁄1992 objetiva coibir, punir e⁄ou afastar da atividade pública os agentes que demonstrem caráter incompatível com a natureza da atividade desenvolvida. 6. Esse tipo de ato, para configurar-se como ato de improbidade exige a demonstração do elemento subjetivo, a título de dolo lato sensu ou genérico, presente na hipótese. 7. Recurso especial provido. (STJ - REsp: 1286466 RS 2011/0058560-5, Relator: Ministra ELIANA CALMON, Data de Julgamento: 03/09/2013, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 18/09/2013)

No caso em tela, uma servidora pública municipal denunciou a existência de

dívida do município com o Fundo de Aposentadoria dos Servidores Públicos ao Ministério

Público do Estado e foi perseguida pelo prefeito da cidade. Conforme consta no relatório do Recurso Especial nº 1.286.466 – RS, “o prefeito teria colocado a servidora “de castigo” em uma sala de reuniões por quatro dias, teria ainda ameaçado colocá-la em disponibilidade, além de ter concedido férias forçadas de 30 dias”.

Conforme o relatório, “também restou comprovado os motivos determinantes

de sua conduta: sentimento de vingança”, em razão de a referida servidora tê-lo denunciado ao Ministério Público.

O assédio moral, mais do que apenas provocações no local de trabalho – sarcasmo, crítica, zombaria e trote –, é uma campanha de terror psicológico, com o objetivo de fazer da vítima uma pessoa rejeitada. O indivíduo-alvo é submetido à difamação, abuso verbal, comportamento agressivo e tratamento frio e impessoal. Esses elementos, se não todos, estão presentes na hipótese.

Seguindo o voto da relatora, a Turma reformou a decisão de segundo grau, que não reconheceu o assédio como ato de improbidade, e restabeleceu integralmente a sentença que havia condenado o prefeito à perda dos direitos políticos e multa equivalente a cinco anos de remuneração mensal à época dos fatos.

A principal questão discutida no caso em estudo foi se a aplicação do art. 11, da Lei de Improbidade Administrativa, caberia em uma conduta de assédio moral. Para a

relatora, tendo a referida Lei por objetivo “coibir, punir e⁄ou afastar da atividade pública

todos os agentes que demonstrem pouco apreço pelo princípio da juridicidade, denotando uma degeneração de caráter incompatível com a natureza da atividade desenvolvida”, não há motivos para que não seja aplicada ao caso.

Destacou, ainda, que a evidência do “abuso de poder, do desvio de finalidade e do malferimento à impessoalidade”, na conduta do prefeito prejudicando uma servidora, enquadra-se perfeitamente em "atos atentatórios aos princípios da administração pública", quais sejam a honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições. Assim, o dano causado à servidora “não afasta o prejuízo público, este sim protegido pela Lei de Improbidade Administrativa”.

Percebemos, neste caso, que muitas vezes a dignidade e a saúde do servidor público ficam destruídas pela violência e arbitrariedade cometida por alguns gestores.

Com o intuito de coibir essa prática, o Senado Federal enviou à Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 121, de 2009, que altera a Lei nº 8429/92, tipificando o assédio moral na Administração Pública, caracterizando-o como ato de improbidade administrativa. Tal Projeto de Lei acrescenta o inciso VIII, ao art. 11, da Lei, que passaria a ficar com a seguinte redação:

“Art. 11. (...) (...)

VIII. coagir moralmente subordinado, por meio de atos ou expressões reiteradas que tenham por objetivo atingir a sua dignidade ou criar condições de trabalho humilhantes ou abusando da autoridade conferida pela posição hierárquica.”

Desta forma, o assédio moral seria uma modalidade expressa de conduta contrária aos princípios do serviço público. Uma vez que o gestor público, superior hierárquico, que se vale do cargo que ocupa para importunar a vida de seus subordinados, ofende de forma evidente a moralidade administrativa, tal inovação legal se faz necessária e imediata, considerando que o Estado é o empregador e a finalidade é sempre o bem comum.

Até a presente data, o Projeto de Lei se encontra em trâmite na Câmara dos Deputados, já foi aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania e, aguarda a próxima fase.

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