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Getúlio Vargas teve como princípios políticos, em essencial, o Castilhismo, ou seja, a conduta adotada por Júlio de Castilhos. Este, por sua vez, inspirava-se no positivismo, princípio formado nas ideias de Augusto Comte29. Apesar da morte de Júlio de Castilhos, em 1903, o Castilhismo continuava preponderante na cultura política do Rio Grande do Sul, agora sob o comando de Borges de Medeiros30. Freitas (2003, p. 10) indagou Getúlio Vargas se lera muito Augusto Comte, e este lhe respondeu: “Nem tanto. Saint-Simon foi o meu filósofo. [...] Quem me influenciou foi Saint-Simon, não Augusto Comte. Os que conhecem estes filósofos sabem das diferenças marcantes entre eles”. Para o historiador Décio Freitas (2003, p. 11), o autoritarismo do ex-presidente não foi resultado da influência de Saint-Simon, “mas encontrou nele uma legitimação filosófica”. Segundo Freitas (2003), é “gritante a influência saint-simoniana31no governo de Getúlio Vargas”.

Em 1909, Getúlio Vargas é eleito Deputado Estadual no Rio Grande do Sul, e reeleito pelo mesmo Partido Republicano (PRR), no ano de 1913. No início deste ano, Borges de Medeiros retornou ao governo do Rio Grande do Sul, onde permaneceu por mais de 15 anos, alterando e manipulando resultados eleitorais, além de controlar as ações de seus políticos opositores. Ainda no ano de 1913, mais precisamente no dia 06 de outubro, por discordar das ações de Borges do Medeiros e por demais questões relacionadas ao seu partido, Getúlio Vargas sobe à tribuna e renuncia à cadeira de Deputado Estadual. A partir deste fato, cai em desagrado com o governo estadual e volta a São Borja para recolher-se em “exílio político voluntário”. Entre os anos 1914 e 1917, Getúlio Vargas dedicou-se à função de advogado,

29 Segundo Aurélio (2009, p. 14, grifo do autor), o positivismo trata-se de “princípios filosóficos, sociológicos, científicos e doutrinários preconizados pelo filósofo francês Augusto Comte, enunciados na sua Lei dos Três Estados (teológico, metafísico e, por fim, o positivo). A ciência positiva busca apreender fatos, relações sociais e políticas, etc. a partir da observação, experimentação e da finalidade prática. Um lema do positivismo está expresso na bandeira do Brasil: Ordem e Progresso”.

30 Ver MENDES, 1986, pp. 9-12.

31“Ao surgir o saint-simonismo na primeira metade do século XIX, a França ainda não fizera sua revolução industrial. Os primeiros conflitos sociais ingleses suscitavam uma questão: como promover a industrialização sem a sequela do conflito social? A questão se figurava crucial para Saint-Simon. Não havia então na Europa uma revolta dos governados, mas era fácil prever que esta calma não duraria muito. Podia-se perceber uma ‘fermentação geral’ e uma ‘ameaça de anarquia’. Findara o ‘tempo dos pobres resignados’. No processo de industrialização, impunha-se adotar ‘precauções necessárias’, expressão pela qual ficará conhecido entre os empresários franceses. Como a industrialização interessava tanto à burguesia como aos trabalhadores, Saint- Simon formulou o princípio da ‘identidade de interesses entre patrões e trabalhadores’. Para evitar o conflito social, havia que estabelecer a ‘associação capital-trabalho’, através de organizações do tipo corporativista. A industrialização devia fazer-se acompanhar de medidas para ‘melhorar o mais rapidamente possível a existência física e moral das classes pobres’. A paz social deveria ser assegurada a qualquer preço: ‘Os governos devem usar de todo o empenho em preservar a indústria de toda a espécie de perturbações e contrariedades’. [...] Saint- Simon é o precursor da intervenção do Estado na ordem econômica. Afirma a necessidade de que ‘alguém’, um legislador forte, regulamente os interesses a fim de tornar harmoniosos” (FREITAS, 2003, p. 11).

atuando no interior e limitando-se a breves saídas pela vizinhança, mas sempre a serviço, também realizava saídas para a Fazenda dos Santos Reis.

Em 1917, Getúlio Vargas se reconcilia com Borges de Medeiros, retornando a Porto Alegre e à política do Sul, atuando como Deputado Estadual até o ano de 192232. Neste mesmo ano, Getúlio Vargas elege-se Deputado Federal após a morte de Rafael Cabeda, ocupando o seu lugar na Câmara dos Deputados33. Também é nomeado “Presidente da Comissão de Verificação de Poderes da Assembleia Estadual”, proclamando no dia 17 de janeiro de 1923, a quinta eleição de Borges de Medeiros para a Presidência do estado do Rio Grande do Sul, em meio a acusações de fraudes, ocasionando, assim, uma guerra civil que teve seu início no dia 25 de janeiro deste ano (D’ARAUJO, 2011, p. 23).

Getúlio Vargas reelege-se Deputado Federal em maio de 1924, tornando-se “líder da bancada de seu estado” (LEVINE, 2001, p. 37). E assim, começa a consolidar-se em uma posição de liderança, sendo nomeado Ministro da Fazenda no governo de Washington Luís, assumindo o ministério em 1926. Mas Getúlio Vargas não perdura neste cargo, pois Borges de Medeiros, no final do ano de 1927, lhe escolhe como seu sucessor, “com a doce ilusão de, assim, continuar de fato exercendo o poder”. Getúlio Vargas é eleito Presidente do Rio Grande do Sul. No início do ano de 1928, iniciaram as articulações para as eleições presidenciais marcadas para o dia 1º de março de 1930. Em 1929, forma-se a Aliança Liberal.

2.2 A Revolução de 1930

Um novo, claro Brasil surge, indeciso, da pólvora. Meu Deus, tomai conta de nós.

Carlos Drummond de Andrade

Washington Luís atuava de forma coerente com o pensamento da oligarquia agrária ao qual representava, considerando a questão social como “caso de polícia” e tomando esta posição durante seu governo. No entanto, quando precisou indicar um sucessor para seu cargo, não seguiu a tendência política que até então imperava no Brasil, ou seja, a política do café-com-leite, onde mineiros e paulistas alternavam o domínio do poder político no país. Contrariando o “direito” dos mineiros de indicar um representante para a Presidência da República, Washington Luís indica o paulista Júlio Prestes, então governador de São Paulo,

32 Ver AURÉLIO, 2009, p. 28. 33 Ver SILVA, 1980, p. 35.

para ser seu sucessor. Deste modo, causou um desentendimento entre as oligarquias mineiras e paulistas, além de deixar muita gente perplexa, já que Júlio Prestes “era considerado um político da máquina, ‘um político do antigo regime tão representativo quanto qualquer outro’” (LEVINE, 2001, pp. 39-40).

A postura autoritária de Washington Luís também agravou a crise, pois este seguia a conduta da Velha República, isto é, realizar a “escolha do supremo magistrado pelo consenso dos próceres políticos” (SILVA, 1980, p. 39). Tais fatos proporcionaram condições favoráveis para o êxito da Aliança Liberal e seus revolucionários, uma aliança que uniu gaúchos e mineiros em articulação mútua, objetivando a ascensão de Getúlio Vargas como Presidente da República, nas eleições de 193034.

Num domingo de carnaval, no dia 1º de março de 1930, é declarada a derrota da Aliança Liberal35. Júlio Prestes vence a eleição, porém, sob acusações de ter cometido fraudes para tais fins. Em 30 de maio, Getúlio Vargas lança um manifesto denunciando tais fraudes, argumentando que as mesas eleitorais as cometiam por meio de “truques e ardis”. Neste manifesto, o então candidato derrotado afirmou que “ainda acreditava que as modificações necessárias nos ‘nossos hábitos e costumes políticos’”, poderiam ter lugar “dentro da ordem e do regime” (SKIDMORE, 1982, p. 22).

A revolução necessitava de uma justificativa plausível e um incentivo à organização revolucionária para acontecer. A justificativa e o incentivo advêm, então, do fator disparador da revolução, que aconteceu no dia 26 de julho de 1930. Nesta data, o candidato à vice- presidente pela Aliança Liberal, o paraibano João Pessoa, é morto a tiros por João Duarte Dantas, no momento em que tomava um chá na confeitaria Glória, na cidade de Recife. O assassinato de João Pessoa tumultuou o país, catalisou forças e proporcionou a justificativa propícia para o início da revolução, pois o crime provocou a indignação geral. O episódio atingiu a imagem do então Presidente Washington Luís, pois este “havia apoiado o grupo político ao qual estava ligado o assassino”, fato que agravou a tensão política que o Brasil enfrentava em tal período (SKIDMORE, 1982, p. 23).

Em 03 de outubro de 1930, a Aliança Liberal proclama sua revolução36. Os revolucionários levaram vinte e um dias para chegar ao Rio de Janeiro37, tendo como o

34

Ver MENDES, 1986, p. 21. 35

Ver LEVINE, 2001, p. 42.

36 Silva (2010b) conta-nos praticamente todas as tramas, armações, conversas, traições, decepções e acordos que fizeram com que o dia 03 de outubro de 1930, fosse marcado como data histórica para os brasileiros. Conta-nos também, em paralelo com a história da revolução, a relação de amor e ódio que existiu entre Getúlio Vargas e João Neves, antes seu aliado, depois, seu opositor, que até chegou a escrever um livro, contendo suas acusações ao então ditador, chamado "Acuso". Ao qual, Getúlio Vargas tinha dedicado leitura. Silva (2010b) relata-nos

cérebro do movimento, Oswaldo Aranha; como estrategista, Góis Monteiro; como articulador, João Neves; e como “líder sereno”, Getúlio Vargas38

. Washington Luís via seu poder político enfraquecer, à medida que as tropas revolucionárias vindo do Rio Grande do Sul, da Paraíba e de Minas Gerais, marchavam rumo ao Rio de Janeiro, o que fez o então Presidente perder o “comando militar de seu governo” (SKIDMORE, 1982, p. 24).

Somente após a intervenção do Cardeal Leme, Washington Luís convenceu-se que estava derrotado, e no dia 20 de novembro de 1930 é conduzido ao Forte de Copacabana, entregando o controle do país. Através da revolução, o então Presidente foi destituído pelos militares, e estes ocuparam a direção do governo por dez dias, aguardando a posse de Getúlio Vargas. Como Getúlio Vargas era o líder do movimento, assumiu a “Presidência da República, com a missão de organizar um novo governo para o país” (PILETTI, 2003, p. 55). Desde 1889, era a primeira vez que não chegava à Presidência do país, um candidato do governo39.

A revolução de 1930 modificou o comando político do país, mas também “pôs fim à estrutura republicana criada na década de 1890”, ou seja, o fim da República Velha estava decretado. Após o sucesso da revolução, Getúlio Vargas registra em seu diário: “Eu venci! Vencemos todos, triunfou a revolução! [...] Dizem que o destino é cego. Deve haver alguém que o guie pela mão” (SILVA, 2010b, p. 78). Estava concretizado o “maior movimento cívico da história do Brasil” (ARANHA apud SILVA, 2010b, p. 125). Estava concretizada a Presidência de Getúlio Vargas.

também a história de Gabriel, um soldado que participou da revolução de 30, de 32 e de tantas outras, e aos 98 anos, ainda possui lembranças vivas e sagacidade para relatá-las à Silva. O subtítulo do livro é "águas da revolução" porque durante o mês de outubro, choveu uma grande quantidade, perto do que antes chovia, principalmente no Paraná. A chuva tanto dificultava a ação dos revolucionários, quanto chateava Getúlio Vargas, que se perguntava: "por que chove tanto?". O livro é classificado como um romance, mas como o próprio Silva (2010b, p. 106) argumenta: “história e literatura confundem-se”.

37

Ver ESCOREL, DVD 1. 38 Ver SILVA, 2004a, p. 62. 39 Ver SKIDMORE, 1982, p. 21.

2.3 A Era Vargas

O Brasil de Norte a Sul Tem grande admiração A esse grande estadista Que hoje dirige a Nação O chefe do Estado Novo Conquistou a alma do povo, Do litoral ao sertão

Orígenes Lessa

O período de quinze anos, entre 1930 e 1945, compreende o primeiro governo de Getúlio Vargas como Presidente da República, período este conhecido historicamente como “A Era Vargas”, que se dá desde a Revolução de 1930 até a queda de Getúlio Vargas, em 1945. A Era Vargas constituiu-se de três governos: o Governo Provisório (1930 - 1934); o Governo Constitucional (1934 - 1937) e o Governo Ditatorial/Estado Novo (1937 - 1945).