por MICHEA e citado por muitos autores.
Um jovem açougueiro, num acesso de mania, recitava páginas in teiras da “Fedra” de Racine. Curado de sua mania, por mais esforços que fizesse, não conseguia recordar-se de um verso sequer. Declarou ter ouvido uma só vez a leitura dessa tragédia, quando pequeno (6).
Poucas coisas são tão complexas quanto as línguas. O próximo capítulo intitula-se “ O inconsciente, a melhor esco la de línguas” . Ê por isso que não nos deteremos no tema da complexidade dos dados que pode arquivar o inconsciente.
A e x t e n s ã o q u a l i t a t i v a d a m e m ó r i a — Mede-se a me
mória não só pelo tempo durante o qual retém os dados aprendidos (extensão temporal, de que logo falaremos), nem tampouco só pela quantidade de dados que é capaz de arma
zenar (extensão quantitativa ou complexidade, à qual aca bamos de aludir e da qual todo o presente capítulo vem a ser um comentário); mede-se também pela minuciosidade dos detalhes que chega a conservar. Isto vem a ser a extensão qualitativa.
Em matéria de detalhes, isto é, no aspecto qualitativo, o inconsciente chega a limites insuspeitados.
(5 ) CHARCOT, J. M .: “Sur un cas d’amnésie rétroantérograde probablement d’orige hystérique”, em “Revue de Médicine”, 1892, X n , pág. 81.
(6 ) Citado, entre outros autores, por L A P P O N I, José: “Hipnotis mo e Espiritismo”, trad, da segunda ed. italiana por V IE IR A , Baptista Manoel, São Paulo, Falcone, 1907, pág. 227.
Desde BOTTLEY, são relativamente freqüentes na hip nose experiências como a seguinte:
“Coloca-se sob os olhos do sonâmbulo uma série de fôlhas de papel superpostas e ordena-se-lhe que escreva, à medida que se vai ditando. Após ter escrito algumas linhas sôbre a primeira fôlha, esta é retirada subitamente, e êle prossegue escrevendo sôbre a segunda, caso não tenha notado a falta da primeira, para o que se pode fazer alguma sugestão direta. Opera-se da mesma forma com a segunda, depois com a terceira e a quarta fôlha, ficando escritas sôbre cada uma delas ape nas algumas linhas. Em cada página, o sonâmbulo é capaz de retomar sempre o ponto em que havia parado na anterior. Finalmente, quando termina a quarta fôlha, coloca-se-lhe nas mãos a quinta, ordenando- lhe que releia em voz alta tudo o que escreveu e que coloque a pon tuação nos lugares necessários. Êle pode executar tudo isto com ex traordinária exatidão, não omitindo nenhuma palavra e fazendo as correções nos devidos lugares das quatro fôlhas retiradas” (7). Sôbre a fôlha em branco!
O fenômeno pode ser reproduzido aproveitando-se ou tros estados de inconsciência, diferentes da hipnose, como, p. ex., o sonambulismo espontâneo, durante o sono natural.
O Arcebispo de Bordeaux refere o seguinte caso: um jovem sacer dote, durante o sono, levantava-se, sonâmbulo, para escrever sermões e compor música. O Arcebispo acompanhou o sonâmbulo várias noites seguidas. Com precisão matemática, o jovem, de olhos fechados, apa nhava todo o material necessário. Quando compunha música, traçava primeiro as pautas com uma régua. A s notas e o texto eram perfeitos, e, se havia erros, ao “reler”, corrigia-os nos lugares correspondentes. Os sermões, lia-os em voz alta do comêço ao fim com os olhos fecha dos! Corrigia as passagens de que não gostava. O Arcebispo, suspei tando que o sonâmbulo talvez enxergasse através das pálpebras fecha das, interpôs obstáculos, como fôlhas de papelão diante do sonâmbulo, quando êste “lia”. O padre continuava lendo calmamente, impertur- bá.vel: Outras vêzes o Arcebispo substituía as fôlhas escritas por ou tras fôlhas de igual formato, pêso, etc., e o padre “lia” sôbre as fôlhas em branco o que estava traçado nas outras. Também corrigia
nas em branco os erros ou frases menos felizes, sôbre os lugares exatos correspondentes aos das outras fôlhas (8).
Como se vê por estas manifestações, a minuciosidade da memória do inconsciente é assombrosa.
O TEMPO N A M EM ÓR IA INCONSCIENTE — E ÍS OUtrO f a -
tor de grande importância. Três aspectos que na realidade se interpenetram, podem ser aqui considerados: até que ida de anterior podem retroceder nossas lembranças; até que idade avançada se arquivam no inconsciente; e por quanto tempo se conservam.
“A té que idade anterior podem retroceder nossas lem branças?” . Já apontamos alguns casos de memória de fa tos sucedidos antes do uso da razão e inclusive na primei ra infância. Tais casos são relativamente freqüentes.
Mais ainda: um tipo de experiência é apresentado sob o aspecto e denominação de “ regressão” na idade. O hipno tizado é levado pela fôrça da sugestão a anos passados, re produzindo então critérios, gestos, linguagem, ocupações ou jogos próprios da idade sugerida.
Alguns autores que não têm considerado suficientemen te o assunto defendem a “ regressão” a um estágio uterino anterior à mielinização, ou, inclusive, pré-uterino. Os me lhores especialistas evidentemente contestam êsse fato. Tais “ regressões” são puramente fictícias. O paciente, subme tido a sugestão, é bem capaz de criar magníficas fantasias. Ê verdade que, em alguns casos, o inconsciente poderá re velar fatos ocultos, e que depois se comprova corresponde rem a épocas de pré-mielinização ou pré-uterinas sugeridas. Não se trataria nestes casos de autêntica lembrança do inconsciente, mas apenas, em última análise, de conheci mento atual paranormal. Geralmente será mera projeção ao passado de conhecimentos atuais conscientes ou incons cientes.
Está claro que, na “ regressão” hipnótica, não se trata da verdadeira regressão do tempo e que, portanto, não se pode esperar uma acomodação total da personalidade à ida de sugerida como esperavam alguns hipnólogos menos avi sados. O inconsciente toma do seu arquivo inúmeras lem branças, para fingir a “ regressão” que se lhe impõe, mas nem por isso se desprende da personalidade adulta presente.
Há pessoas que “ regridem” a idades infantis, e, subme tidas ao teste de RORSCHACH, procedem aparentemente com psicologia infantil, o que demonstra a memória do incons ciente. Mas um psicólogo experimentado descobrirá logo deta lhe de madureza, o que prova que a regressão é só aparente.
U m homem desenhou uma árvore com traços e ingenuidades pró prias da idade sugerida de seis anos, mas não omitiu as raízes, detalhe que, aos seis anos de idade autêntica, teria omitido. Outro indivíduo, depois de aceitar a sugestão de que tinha quatro anos, perguntado re pentinamente sôbre que horas eram, não conseguiu reprimir um gesto de consultar o relógio de pulso.
Êsses e outros exemplos, mostram que se trata de me mória e imaginação...
Outros autores, como BUTLER (9), querem ver no ins tinto, animal ou humano, uma memória inconsciente her dada. Mas será que os primeiros animais e os primeiros homens não tinham instintos? Em todo o caso, o instinto, reflexos incondicionados, fatores hereditários do caráter e outros, só num sentido muito lato poderão ser chamados “ memória” , uma espécie de memória inconsciente de épocas passadas, transmitidas de pais a filhos.
“ Até que idade avançada se arquivam as lembranças?”
Parece que até a morte. Mais ainda; como é sabido, é preci samente nos moribundos que o inconsciente parece aflorar mais, surgindo lembranças “ até dos primeiros anos de vida” .
(9 ) B U T L E R , Samuel: “Unconscious Memory”, 1910 ( l . a ed., 1880).
Os velhos, com freqüência, lembram até conscientemen te os seus primeiros anos, a sua infância, a sua juventude, e continuamente falam dêles.
São muitos os casos em que pessoas muito velhas mani festam de repente por qualquer associação de imagens, lem branças do inconsciente, lembranças tão antigas, tão esque cidas pelo consciente, que ninguém as reconhece como< tais dando origem a interpretações às vêzes supersticiosas. Tor nou-se clássico em Psicologia Experimental o seguinte caso:
U m a anciã, ao passar por um lugar “no qual nunca estivera”, “adivinhou” de repente que naquele local tinha havido plantações de violetas. Fato surpreendente, porque aquêle local, edificado e central, não poderia sugerir absolutamente tais plantas anteriores. Mas a se nhora, sem poder explicar o motivo, estava convencida do que afir mava. Fizeram-se averiguações e comprovou-se que de fato, mais de trinta anos antes, naquele local se tinha derrubado um edifício, tendo ficado acertado que, até nova construção, o terreno serviria para plan tações de um famoso jardineiro. A senhora, porém, ignorava absolu tamente esta circunstância.
O tempo encarregou-se de elucidar a questão. O marido da se nhora, intrigado também, pensou muitas vêzes no assunto. Um dia, quase de repente, lembrou-se de que, pouco antes de ser vendida a propriedade, êle mesmo comprara lá um ramalhete de violetas para sua espôsa, então convalescente de uma doença. Então a espôsa se lembrou de que seu marido, ao dar-lhe as flôres, lhe dissera onde as comprara (10).
Ambos haviam se esquecido, mas o inconsciente “ não esquece nada” . Ao passarem por aquêle lugar, trinta anos após, efetuou-se a associação das idéias e brotou a miste riosa lembrança.
“P o r quanto tempo o inconsciente conserva as lembran ças?” Implicitamente esta questão está já respondida nos itens anteriores: desde a infância até a velhice parece que o tempo não afeta a memória do inconsciente.
(10) “Enciclopédia Ilustrada Europeo-Americana”, Madrid-Bar celona, Espasa-Calpe, no artigo “Vaticínio”, pág. 382.
A c o r r e n t e d a m e m ó r i a — Para sabermos até que ponto chega a memória é importante mais um dado. Já temos visto como' as coisas sucedidas em estado conscien te arquivam-se no inconsciente. Arquivam-se também no inconsciente as coisas sucedidas durante os mesmos esta dos de inconsciência. E a passagem de um estado a outro de inconsciência não está fechada para a memória do in consciente. Por exemplo, o sucedido durante a inconsciên cia de uma crise histérica surge na hipnose. O sucedido na hipnose surge à tona, por exemplo, no desdobramen to da escrita automática. O sucedido durante o sonho é lembrado, por exemplo, na alucinação quando se fixam os olhos numa bola de cristal, etc. Tudo parece indicar, pois, que a memória do inconsciente forma “ uma trama con tínua, ininterrupta” , segundo a frase de CHARCOT já citada. Eis um caso de lembrança, no sonho natural, de algo realizado na inconsciência da sugestão pós-hipnótica.
O Dr. V O IS IN hipnotiza um homem. Feito isto, sugere-lhe que ao acordar, em vigília, deverá assassinar uma mulher que então estava deitada num leito próximo, e sugere também que deve esquecer tudo. Acordado do sono hipnótico, sem saber porque o indivíduo dirige-se à cama que estava perto e sem hesitar apunhala um manequim de mu lher, perfeitamente dissimulado. Os magistrados, diante dos quais se realizava a experiência, não conseguiram do suposto assassino nem a confissão do crime nem a descrição do ato, nem o nome do cúmplice que o sugerira. E ra uma ação em vigília mas imediatamente esque cida por efeito da sugestão pós-hipnótica. Três dias depois, o homem volta à Salpêtrière. Sua fisionomia mostra as marcas do sofrimento moral intenso e de insônia pertinaz. Queixa-se de ver tôdas as noites, assim que adormece, uma mulher que o acusa de tê-la assassinado com uma faca. Acorda sempre excitadíssimo. Rejeita o sonho como absurdo, mas conciliando novamente o sono, surge o mesmo sonho da trágica aparição. Os médicos tiveram então de explicar-lhe tudo para que o pobre homem não ficasse louco (n ).
(11) V O IS IN , Auguste: “Les suggestions criminelles posthyp notiques”, em “Revue de l’hypnotisme”, 1891, V, pâg. 382.
BERNHEIM, depois de fazer muitas experiências corro borando o fenômeno de que pelo hipnotismo se podem re lembrar fatos que pareciam totalmente esquecidos ou nunca percebidos, passou nas suas experiências ao fenômeno de que agora tratamos. Demonstrou à sociedade como, duran
te a hipnose, podem ser lembrados todos os fatos que em anteriores hipnoses haviam realizado, mas com a sugestão pós-hipnótica (eficaz, portanto, só para o consciente) de que depois fossem esquecidas (12>. Pede-se a um hipnotizado' que descreva o que se lhe mandou esquecer e é curioso' compro var quão perfeitamente se lembra de tudo o que, quando consciente, se chega pensar que não viu, nem sentiu.
A “ corrente” da memória fôra já amplamente confir mada por JANET <12 bis>.
A l g u m a s c o n c l u s õ e s p r á t i c a s — A sugestão pós-hipnó tica para o esquecimento não é eficaz no inconsciente. Suges tões pós-hipnóticas de esquecimento, por exemplo, de trau mas para cura de psiconeurose, muitas vêzes não corres ponderão ao método mais indicado, pois, passado algum tem po, por efeito de associações ou certas contradições espon tâneas, o trauma “ esquecido” pode surgir de nôvo à tona. Não se deve pensar, outrossim, que certas sugestões, até ridículas, não são perigosas pelo simples fato de que depois se dão sugestões pós-hipnóticas de esquecimento; o esquecimento não é total e algum dia poderia influir no com portamento do paciente. É êste um dos perigos da hipnose de palco.
P a n t o m n é s i a ou HiPEREM NÉsiA ? — Se somos pantom-
nésicos (do grego “ mnésis” = memória, e “ pantom” = de tôdas as coisas) lembramos tudo, absolutamente tudo. Se
(12) B E R N H E IM , H .: “Hypnotisme, suggestion, psychotèrapie”, Paris, 1891, págs. 133 ss.
(12 bis) JA N E T , Pierre: “L ’automatisme psychologique, essai de psychologie experimentale sur les formes inférieures de l’activité men tale”, Paris, AJcan, 1889, págs. 336 ss.
somos hipermnésicos (do grego “ hiper” = sôbre, extraor dinária; e “mnésis” = memória) então nossa memória in consciente seria, sim, admirável, superaria tudo o que ge ralmente se pensa, mas não seria precisamente memória de tudo.
O dilema é antigo. Foi RICHET que propôs o têrmo “ pantomnésia” : “ Para indicar — escreve — que a memória não esquece nada e que tudo o que impressiona nossos sen tidos (acrescentamos nós: ou nossa inteligência, vontade, imaginação...) permanece fixado no cérebro inconsciente, eu proporia a palavra 'pantomnésia. Pela sua etimologia, significa que nenhum vestígio do nosso passado cognoscitivo se apaga” (13>.
Não é possível provar experimentalmente que não se esquece absolutamente nada.
Mas a pantomnésia parece lógica. O que se poderia es quecer mais facilmente? Os casos espontâneos e experiên cias qae se têm logrado realizar e que fomos expondo até aqui, mostram precisamente que as coisas que mais fàcil- mente se esqueceriam, também se guardam no inconsciente; são os fatos captados na época infantil antes do uso da ra zão, e os fatos não captados, por serem insignificantes ou por distração, inclusive em pessoas que padecem de amnésia (falta de memória) total, no consciente. As coisas mais complexas, ou mais detalhadas e minuciosas e em pasmosa quantidade, são arquivadas imediatamente. O passar do tem po não parece influir na memória do inconsciente, nem pa rece haver barreiras que impeçam a passagem da vida cons ciente ao arquivo do inconsciente, nem que separem os diversos estados de inconsciência. Forma-se assim uma tra ma do “ eu” único perfeitamente unido e ininterrupto que nada pode esquecer.
(13) RICH ET, Charles: “Traité de Métapsychique”, 2.a ed., P a ris, Alcan, 1923, pág. 59.
Não temos falado diretamente nos dados recebidos por vias paranormais, pois teríamos antes de explicar o para- normal difícil de ser compreendido aqui. Mas também as percepções paranormais são arquivadas.
Os casos observados e as experiências feitas autorizam- -nos a deduzir que nada se esquece no nosso inconsciente. Já no início da investigação metapsíquica, numerosos autores, tais como JANET, FLOURNOY, RICHET e outros, defen
diam a pantomnésia contra a hipermnésia.
Não nos detemos muito nas provas dêste capítulo por que grande parte do próximo capítulo servirá para provar ou confirmar a memória do inconsciente.
Em todo caso, embora houvéssemos de conceder que talvez possa se apagar alguma coisa da nossa memória in consciente, o fato indiscutível é que o inconsciente arquiva muito mais do que ordinariamente se poderia suspeitar.
E na Parapsicologia, se algum fenômeno pode explicar- -se por memória inconsciente, é evidente que não devemos recorrer a outras explicações mais “ misteriosas” como os fenômenos paranormais, e muito menos a explicações ultra- terrenas ou reencarnacionismo, como já RICHET formulou no lugar que acabamos de citar: “ Provavelmente, todos so mos pantomnésicos. Em todo caso, na apreciação dos fenô menos metapsíquicos, devemos admitir que não esquecemos absolutamente nada” .
A p a n t o m n é s i a n a v id a q u o t i d i a n a — A memória é como um dêsses enormes blocos de gêlo que os inglêses chamam de “ iceberg” . Só uma pequena parte aparece sôbre a superfície do mar, a memória consciente, a memória atual, se é que podemos empregar essa expressão. Mas da superfície pode-se ver também uma pequena parte do “ iceberg” , contanto que queiramos olhar para baixo: é a memória preconsciente. São tôdas essas lembranças que temos arquivadas e às quais agora, por exemplo, quando estamos lendo estas linhas, não prestamos atenção. Mas
basta que queiramos e nos lembraremos como é o nosso nome e o dos nossos parentes, e onde moramos, em que oca sião fizemos uma viagem de avião pela última vez, etc. Basta olharmos para baixo, sob a superfície do mar, ao precons- ciente.
Há outra zona do “ iceberg” que não vemos nem mesmo se olharmos para ela. Mas se o “ iceberg” se inclinar um pouco, essas lembranças irão emergir. Isto acontece porque as circunstâncias (associação de idéias inconscientes) pro curaram ou reclamaram tal lembrança.
Muitas das chamadas “ intuições” ou “inspirações do mo mento” são, no todo ou em parte, lembranças do que ouvi mos, lemos, pensamos em ocasiões anteriores. Mas passam quase sempre despercebidas no seu aspecto de lembranças.
Podemos fomentar a associação de imagens e excitar o inconsciente, fazendo, assim, trabalhar o arquivador.
Conta-se na biografia do sábio espanhol A M O R RUEBAL que sua prodigiosa memória consciente (pré-consciente) permitia-lhe encontrar sem fichário o que precisava na sua confusa biblioteca pessoal. Um dia, porém, a memória consciente falhou e apesar de empregar várias horas não encontrou um folheto raro sóbre o Código HAMMURAJBI.
Encarregou alguns auxiliares de vasculharem livro por livro, de pendência por dependência, pasta por pasta, para encontrar o folheto. Inútil. Profundamente contrariado e preocupado, pois precisava com urgência do folheto, deitou-se aquela noite e em sonhos viu o folheto em determinado lugar inesperado. Acordou cedo. Ràpidamente foi ao lugar para constatar se era verdade. . . L á estava o folheto ex traviado (14).
O inconsciente, aguçado pelo desespêro da situação, “trabalhou no seu arquivo” toda a noite, até encontrar a lembrança desejada.
Às vêzes é bem longo o tempo empregado pelo arqui vador, até encontrar a lembrança que procura.
(14) GOMES LEDO, A .: “Am or Ruibal o la sabiduría con sen- cillez”, Madrid, 1949, pág. 40.
ção. Procurava-o em vão. Conscientemente decidiu não pensar mais no assunto. Mas o inconsciente ficou alerta. Certa noite, seis meses mais tarde, o inconsciente conseguiu encontrar a lembrança arquivada. B R O C K E L B A N K sonhou então que usava umas calças velhas, há muito tempo abandonadas, e que lá se encontrava o canivete. Por que sonhou isto? Intrigado, quis ver se era verdade e foi em busca das calças. N o bôlso com o qual sonhara estava o canivete (15).
A1AURY, esforçava-se por lembrar determinada coisa interessante antes de deitar-se à noite. E assim muitas noites ia “provocando” o arquivador. Em sonhos, com al guma freqüência, vinham lembranças e mais lembranças.
Método quase idêntico, embora admita melhor técnica, é o da hipnose. Pela hipnose, em alguns casos, podemos obter excelente ajuda para a vida prática, sob a direção de algum médico técnico em hipnotismo, com o que reduziremos ao mínimo o perigo de fomentar o automatismo e outras decorrências perigosas.
Um conhecido especialista em hipnose refere-nos o se guinte caso.
“A Srta. W . procurava encontrar uma carta comercial muito im portante, que perdera um ano antes da nossa entrevista... Em estado hipnótico, e em resposta a perguntas específicas, disse, primeiro, quan do recebera a carta; depois, em que oportunidade a utilizara; e por último, quando a vira pela última vez. Foi no quarto para hóspedes, de sua tia, em Boston, enquanto preparava a mala para viajar.
— “Não a colocou na mala?” — “N ão ”.
— “Desde então não a viu mais?” — “N ão”.
Acordando-a, informei-a de que deixara a carta no quarto para hóspedes em Boston. (E m vigília ela afirmara que a última vez que tinha visto a carta fôra num escritório de N ew Y o rk ). E la não acre ditava ser isso possível, mas disse que o comprovaria escrevendo para sua tia. Algum as semanas mais tarde, fui informado de que a inves
(15) M YE R S, Frederic W . H., tradução francesa de J A N K E - L E V T C H : “L a personalité humaine. Le survivance, ses manifesta tions supra-normales”, Paris, Alcan, 1919.
encontrada em Boston. Felizmente, sua tia a tinha guardado” (16).
Por meio da hipnose ou associações, testes, drogas, etc., o psiquiatra poderá obter algumas vêzes do inconsciente, lem branças que o auxiliem na recuperação do paciente. O advo gado poderá obter dados preciosos para a reconstituição dos