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Mapa 14 – Localização do Consórcio Público Regional de Resíduos

3 A ÁREA DAS POLÍTICAS PÚBLICAS, CONSÓRCIOS PÚBLICOS

3.1 INCURSÕES NO CAMPO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS

As Ciências Sociais, mais precisamente o campo das Ciências Políticas são a fonte dos primeiros pensamentos acerca das Políticas Públicas, a qual derivou-se enquanto uma disciplina acadêmica. Além de apresentar uma trajetória recente com relação a outras ciências, as Políticas Públicas exibem uma evolução de pensamento complexa, com sólidas bases teórico-metodológicas e conceituais (SOUZA, 2006).

Dentre as variadas fontes que tratam do surgimento da área de Políticas Públicas, sendo abordada como uma área específica recente, é de conhecimento que esta “nasceu nos Estados Unidos, enquanto disciplina acadêmica, sem estabelecer bases teóricas sobre o papel do Estado. Também podemos afirmar que nasceu como uma subárea da Ciência Política” (SOUZA, 2006, p. 21-22).

Vista como uma subárea, podemos afirmar que as Políticas Públicas ainda derivam das Ciências Sociais e são passíveis de estudos transdisciplinares, recebendo contribuições das mais variadas ciências, como a História, Estatística, Economia, Geografia, Direito, entre outras, o que culmina em um campo riquíssimo

____________________________________________________________________________________________________ de estudos. Ainda sobre o surgimento das Políticas Públicas, Souza (2006) enfatiza que esta

[...] é a soma das atividades dos governos, que agem diretamente ou através de delegação e que influenciam a vida do cidadão (apud PETERS, 1986). A definição mais conhecida continua sendo a de Laswell, ou seja, decisões e análises sobre política pública implicam responder às seguintes questões: quem ganha o quê, por quê e que diferença faz (2006, p. 24).

A autora coloca as Políticas Públicas como o governo em ação (SOUZA, 2007), isto é, a realização das ações concretas dos governos na resolução de problemáticas que acometem a sociedade e necessitam ser prevenidas ou mitigadas. Dessa maneira, “muitas definições enfatizam o papel da política pública na solução de problemas” (SOUZA, 2007, p. 68).

Deubel (2002) estabelece uma crítica quando afirma que as políticas públicas não serviriam apenas para resolver problemas. Quem resolveria estes seriam os atores sociais através da implementação (que é um conceito das Políticas Públicas) e gestão dessas, especialmente os gestores públicos e privados.

Dessa forma, Gelinski e Seibel (2008) classificam as políticas públicas em quatro tipos. As primeiras são as políticas distributivas que beneficiam um grande número de pessoas, em escala geográfica relativamente pequena. O segundo são as políticas redistributivas, que impõem restrições ou perdas a determinados grupos. Em seguida, temos as políticas regulatórias, sendo as que envolvem a burocracia, grupos de interesse na definição de ordens, proibições e regulamentações constitutivas. Por último, as políticas constitutivas ou estruturadoras que ditam as regras do jogo e definem as condições em que se aplicarão as políticas distributivas, redistributivas ou as regulatórias.

De acordo com as variadas classificações, a Política Pública seria apenas uma ferramenta nas mãos dos gestores para, assim, agirem em prol da resolução dos problemas, uma vez que caberia aos mesmos a implementação da Política Pública ou não. Novamente abordando o estudo de Gelinski e Seibel (2008), são vários os padrões de Políticas Públicas, totalizando sete modelos, estabelecendo o Tipo da Política Pública, a saber:

1) Incrementalismo: os recursos públicos a serem destinados a programas ou ações igualmente públicas não partem do zero, mas de "(...) decisões

____________________________________________________________________________________________________ marginais e incrementais que desconsideram mudanças políticas ou mudanças substantivas nos programas governamentais" (SOUZA, 2007, p. 73);

2) Ciclo da Política Pública (Policy Cicle): proposto por Frey (2000), sugere que a análise do ciclo público divida-se em cinco fases (percepção e definição de problemas; agenda setting; elaboração de programas e decisão; implementação de políticas; a avaliação de políticas;

3) Modelo "lata de lixo" (Garbage Can) e Múltiplos Fluxos (Multiple Streams): considera como se as alternativas estivessem numa lata de lixo, com vários problemas e poucas soluções, sendo desenvolvido por Cohen et al. (1972); 4) Coalizão de defesa (Advocacy Coalition): para os autores deste modelo,

Sabatier (1997), as crenças, os valores e as ideias são elementos importantes e ignorados pelos modelos anteriores para entender os processos de formulação das políticas públicas;

5) Arenas sociais (Policy Networks): podem ser formadas por uma comunidade de especialistas, quanto por pessoas com determinadas demandas. Essas pessoas "são cruciais para a sobrevivência e o sucesso de urna ideia, ou para colocar o problema na agenda pública" (CAPELLA, 2007, p. 76);

6) "Equilíbrio interrompido" ou "pontuado" (Punctuated Equilibrium): modelo desenvolvido por Baumgartner e Jones (1999), no qual a política pública se caracteriza "(...) por longos períodos de estabilidade, interrompidos por períodos de instabilidade, que geram mudanças nas políticas anteriores" (SOUZA, 2007, p. 77);

7) Modelos influenciados pelo "gerencialismo público": políticas de caráter participativo que enfatizam questões como a eficiência e a racionalidade das políticas públicas por via da desregulamentação, privatização e reformas no sistema social.

Com base nesses modelos, escolhemos o Ciclo das Políticas Públicas (Policy Cycle), pois acreditamos que o mesmo é capaz de explicar o processo de formulação da PNRS. Inclusive, o seu debate na arena decisória sofreu influências de vários agentes internos e externos aos formuladores, alterando a sua estruturação. Com base no pensamento de Souza (2006, p. 29), a mesma enxerga

____________________________________________________________________________________________________ [...] a política pública como um ciclo deliberativo, formado por vários estágios e constituindo um processo dinâmico e de aprendizado. O ciclo da política pública é constituído dos seguintes estágios: definição de agenda, identificação de alternativas, avaliação das opções, seleção das opções, implementação e avaliação.

No entanto, este ciclo dividido em cinco estágios, que apresenta uma sequência linear na qual as Políticas Públicas seguiriam um caminho uniforme, é alvo de críticas, pois na arena de discussões podem ocorrer intervenções externas de cenários (DEUBEL, 2002) e atores, quer sejam visíveis ou invisíveis (SOUZA, 2006), alterando o resultado final conforme a magnitude das interferências tornando a política pública tendenciosa.

Segundo a concepção do modelo de “policy cycle”, o processo de resolução de um problema político consiste de uma sequência de passos. Mas, na prática, os atores político-administrativos dificilmente se atêm a essa sequência [...]. Vale assinalar que o modelo heurístico do “policy cycle” é um “tipo puro” idealizador do processo político, na prática dificilmente este se dá de pleno acordo com o modelo (FREY, 2000, p. 229).

O ciclo aparece como uma ferramenta na arena de discussões das mais variadas problemáticas e necessidades enxergadas pelos gestores e almejadas pela sociedade. Cabe ao gestor escolher qual demanda entrará na agenda para ser elaborada a Política Pública. A partir desse ponto, as soluções são elencadas e as melhores escolhidas com o intuito de serem implementadas, o que corresponde a política pública sendo efetivada. Por fim, o estágio de avaliação surge como um instrumento de valiosa observância, pois irá identificar os pontos positivos e negativos acerca da aplicabilidade da política.

Todavia, o ciclo como um processo contínuo e uniforme pode ser passível de alterações, podendo romper com a sequência do processo, tendo em vista que “uma Política Pública pode perfeitamente iniciar em qualquer uma dessas fases, ignorar umas, ou investir nas etapas” (DEUBEL, 2002, p. 51). De acordo com o autor, percebe-se que o Ciclo das Políticas Públicas não é uma estrutura rígida e fechada, podendo ou não ser utilizado em sua totalidade, mas a necessidade é quem vai direcionar as ações.

Observando outra interpretação do Ciclo, encontramos o modelo de Frey (2000), o qual compilamos no Quadro 2, descrito abaixo.

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Quadro 2 – Modelo do Policy Cycle, segundo Klaus Frey (2000)

Fases Características

Percepção e Definição de Problemas

O que interessa ao analista de políticas públicas é a questão como em um número infinito de possíveis campos de ação política, alguns “policy issues” vêm se mostrando apropriados para um tratamento político e consequentemente acabam gerando um “policy cycle”.

Agenda Setting

Decide-se se um tema que efetivamente vem sendo inserido na pauta política atual ou se o tema deve ser excluído ou adiado para uma data posterior, e isso não obstante a sua relevância de ação.

Elaboração de Programas e de

Decisão

É preciso escolher a mais apropriada entre as várias alternativas de ação. Normalmente precedem ao ato de decisão propriamente dito processos de conflito e de acordo envolvendo pelo menos os atores mais influentes na política e na administração.

Implementação de Políticas

Pode ser considerada aquela fase do “policy cycle”, cuja encomenda de ação é estipulada na fase precedente à formulação das políticas e a qual, por sua vez, produz do mesmo modo determinados resultados e impactos de “policy”.

Avaliação de Políticas e da Correção de Ação (“evaluation”)

Apreciam-se os programas já implementados no tocante a seus impactos efetivos. Trata-se de indagar os déficits de impacto e os efeitos colaterais indesejados para poder deduzir consequências para ações e programas futuros.

Fonte: Adaptado de Frey, 2000.

Frey aponta que o “policy cycle” nos fornece o quadro de referência para a análise processual. Ao atribuir funções específicas às diversas fases do processo político-administrativo, “obtemos pontos de referência que nos fornecem pistas às possíveis causas dos déficits do processo de resolução de problema” (FREY, 2000, p. 229).

De maneira geral, as políticas públicas, enquanto uma área transdisciplinar do conhecimento científico podem ser aplicadas em objetos de estudo plurais, que necessitam olhares igualmente variados, exigindo do pesquisador uma formação transdisciplinar – aí inclui-se a problemática dos resíduos sólidos enquanto uma questão abordada por vários estudiosos.

Com relação às políticas de cunho ambiental, entendemos que a PNRS pode ser analisada à luz do Ciclo das Políticas Públicas, pois a gama de conflitos que estiveram por traz da sua formulação são elementos que fomentam um debate interessante.

____________________________________________________________________________________________________ Assim, na próxima seção analisaremos como o conceito de formulação contribui para o entendimento da elaboração da Política Nacional de Resíduos Sólidos do Brasil.