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O termo indigenismo, cujos significados foram cunhados a partir da

Revolução Mexicana de 1910, possui, atualmente, um leque grande de

sentidos, o que dificulta bastante sua utilidade em termos analíticos.

Foi com a instauração do chamado “Indigenismo Interamericano”, a partir do I Congresso Indigenista Interamericano, ocorrido em Patzcuaro, cidade mexicana situada às margens do lago de mesmo nome, em 1940, que tal termo ganhou notoriedade no continente.

Dietz (1995), sobre o conceito de indigenismo resume:

“(...) todas aquellas acciones que el Estado nacional despliega especificamente frente a la parte de su población calificada como ‘indígena’, con el objetivo – explicito o implícito – de inducir a través de políticas de desarrollo cambios de diversa índole.”13

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“Lo comun de todas estas políticas indigenistas es su origen ‘exógeno’ (...), puesto que son mestizos – en México, el Estado es mestizo por deficición – los que elaborán y llevan a cabo los programas de desarrollo y cambio inducido” (DIETZ, 1995, 19).

Lima (1995), ao pensar no indigenismo enquanto discurso, distingue três termos distintos: “indigenismo”, “política indigenista” e “ação indigenista”.14

Este autor, ao analisar o caso brasileiro, dá especial ênfase à categoria “poder tutelar”.

“Com a categoria poder tutelar pretendo, pois, descrever uma forma de ação sobre as ações dos povos indígenas e sobre seus territórios, oriunda e guardando continuidades implícitas com as conquistas portuguesas e sua administração por aparelhos de poder que visavam assegurar a soberania do monarca lusitano sobre terras dispostas em variados continentes. Modalidade de poder de um Estado que se imagina nacional, ou melhor, de uma comunidade política dotada de um Exército profissional, comunidade esta entendida aqui como um conjunto de redes sociais estatizadas, com pretensões a abarcar e submeter a multiplicidade de comunidades étnicas diferenciadas e dispostas num território cuja predefinição face a outras comunidades políticas igualmente heteróclitas é relativa e instável.”15 Mas nem todos os autores conceituam o indigenismo desta forma, preferindo vê-lo sob o prisma da política social. Este é o caso de Bazán. Para esta autora:

“El indigenismo, entendido como la política social dirigida hacia la población indígena, tuvo su origen en la consolidación _ institucionalización del Estado mexicano post-revolucionario. Esta se fue transformando de acuerdo con los requerimientos de los procesos de acumulación y de socialización de la mano de obra indígena, pero también a partir de las demandas de sus comunidades y organizaciones (Bazan, 1999,57).”

Segundo esta autora, o indigenismo, definido como a política social voltada aos povos indígenas, orientou-se, no caso mexicano, num primeiro

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“É possível formular uma definição provisória de cunho operativo, a se manter a diferenciação entre os três termos (Lima, 1990: 81). Assim, pode-se considerar indigenismo o conjunto de idéias (...) relativas à inserção de povos indígenas em sociedades subsumidas a Estados nacionais, com ênfase especial na formulação de métodos para o tratamento das populações nativas, operados, em especial, segundo uma definição do que seja índio. A expressão política indigenista designaria as medidas práticas formuladas por distintos poderes estatizados, direta ou indiretamente incidentes sobre os povos indígenas. Isto exclui outros aparelhos de poder da esfera da definição, implicando em não se falar em uma política indigenista eclesiástica, nem tampouco condicionar a idéia de atos oficiais afetando populações autóctones à existência de uma racionalidade onde as ações práticas correspondem a um planejamento implícito e, sobretudo, explícito. De modo mais claro: não há uma correspondência necessária entre os planos para os índios e as ações face a eles” (Lima, 1995, 14 e 15).

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“O poder tutelar pode ser pensado como integrando tanto elementos das sociedades de soberania quanto das disciplinares. Mas é antes de tudo um poder estatizado num aparelho de pretensa abrangência nacional, cuja função, a um tempo, é estratégica e tática, no qual a matriz militar da guerra de conquista é sempre presente” (Lima, 1995, 74).

momento, para a homogeneização da população, por meio da alfabetização e castelhanização, ou, então, da fusão de raças e culturas. Isso foi feito porque a diversidade étnica e cultural era percebida como um obstáculo à unidade nacional. Entretanto, no período de 1934 a 1976, tal orientação teria se modificado. A política social, além de buscar socializá-los com o auxílio da educação, procurou incorporá-los ao modelo econômico baseado no modelo de substituição de importações como trabalhadores, produtores agropecuários, consumidores de novas tecnologias e produtos industrializados. A partir de 1989, o discurso governamental deu ênfase ao respeito às distintas culturas, assim como à natureza pluricultural da nação, o que levou, inclusive, à reforma do artigo 4º da Constituição.

Na América Latina, o indigenismo consolida-se como uma corrente de opinião favorável aos índios. Esta corrente de opinião tinha por fundamento a elaboração de um discurso que buscava a um só tempo proteger e defender as populações indígenas. O indigenismo se estabelece, então, como movimento literário e artístico cujos primórdios podem ser identificados na segunda metade do século XIX, momento em que os países da América Latina tentavam se firmar como nações. O apogeu do movimento indigenista ocorre entre os anos 1920 e 1970, quando se converteu em ideologia oficial do Estado intervencionista e assistencialista.16

A política indigenista é definida por Favre como a ação sistemática empreendida pelo Estado por meio de um aparato administrativo especializado e que tem por finalidade corroer as disparidades culturais, sociais e econômicas entre os índios e os não índios (Cf. Favre, 1998). Para tanto, esta política indigenista se utiliza dos seguintes mecanismos: legislação, educação17, desenvolvimento comunitário e engenharia social18.

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“El movimiento indigenista no es la manifestación de um pensamiento indígena, sino uma reflexión criolla y mestiza sobre el indio. (...) Esto no impide que tome decisiones acerca de su destino en sus propios lugares, según los intereses superiores de la nación tal y como son concebidos por los indigenistas. Eso es precisamente lo que le reprocha el indianismo, desarrollado a partir del decênio de 1970, el cual pretende ser la expresión de aspiraciones y reivindicaciones autenticamente índias. Por el eco que tiene actualmente em el conjunto de la sociedad, la critica radical a la que el indigenismo es sometido por las organizaciones indianistas manifiesta el derrumbamiento de la coyuntura en la que aquél se expandió” (Favre, 1998, 11).

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“La legislación indigenista no apunta a dotar al índio de una categoria personal, y de ninguna manera infringe el principio de igualdad en que descansa el régimen republicano. Lejos de resucitar el sistema al mismo tempo protecionista y discriminatório de las leyes de Índias, pretende por el contrario hacer efectivos los derechos de ciudadanía que la población índia adquirió con la independencia y que nunca há

Darcy Ribeiro assinala que o indigenismo brasileiro prega medidas que “preparem [o índio] para interagir em igualdade de condições com os demais brasileiros” (Ribeiro, 1979, 195).

O indigenismo é entendido por Ramos (1990) como

“elemento que, na prática interétnica, opera como integrador dessa tríade [etnicidade, cidadania e universalismo], atribuindo a cada uma das noções um significado próprio que é contextualizado pelo embate entre a sociedade brasileira e os povos indígenas do país” (1990, 1).

Para fins deste trabalho, adotarei concepção semelhante a conceituada por Bazán, ou seja, o indigenismo como ideologia e prática voltada, por um lado, para integrar o índio e mantê-lo subordinado ao Estado-nação e, por outro, como política orientada à socialização e reprodução da força de trabalho, assim como à proletarização da mão-de-obra indígena (Cf. Bazan, 1999, 58).