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Capítulo VII – O corpo docente e as suas visões sobre a escola e as práticas estudantis

7.4 A indisciplina na escola

Os casos de indisciplina na EBSRF quando comparados com a E.B 2’3 de Miragaia, são bem mais residuais, concentrando-se sobretudo no 2º ciclo, entre o 5º e o 6º ano, e muito mais raros no 9º e ensino secundário,

“(…) 5º e 6º ano, sim, claramente onde temos mais registo de indisciplina ao nível de saídas de sala de aula. No ensino secundário pode haver ali… Por exemplo, se me perguntares, 10º,11º ou 12º? 10º ano, sem dúvida, mas não são números significativos.” (Animador

Sociocultural, 31 anos)

“(…) aqui a escola Rodrigues de Freitas começa a sentir situações de indisciplina… E acontece muito numa turma em específico, que eu acompanho, e é outra das atividades que faço, que são as aulas de Educação para a Cidadania, consegue-se perceber conflitos entre alunos repetentes com os que não o são, (…)” (Animador Sociocultural, 31 anos)

“(…) numa turma de Miragaia de 20 alunos temos cerca de 18 identificados como problemáticos, (…)” (Animador Sociocultural, 31 anos)

Assim, Miragaia é onde o número de alunos identificados como problemáticos é maior, assim como o número de expulsões da sala de aula. Na opinião do animador sociocultural, a própria definição de indisciplina pode variar consoante o contexto a que nos referimos, o que explica as diferenças existentes entre os alunos da EBSRF e os de Miragaia, e assim, a indisciplina num contexto normal é a,

“infração de pequenas regras de comportamento, o saber sentar, o levantar o braço

para pedir a vez para falar, digamos que têm interferência no bom funcionamento da sala de aula, nas regras de sala de aula…”. (Animador Sociocultural, 31 anos)

A indisciplina na opinião do corpo docente entrevistado é influenciada sobretudo, pelo contexto familiar e social de origem dos seus alunos,

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“Antes de mais, o contexto familiar. O contexto social no seu todo, e o contexto familiar em particular. Há casos muito problemáticos, como deve imaginar, eles já vêm com essa herança de casa, ou os pais não foram grandes estudantes…” (Diretor de turma, 9º ano, 46

anos)

“base familiar que por vezes não existe e que depois se transporta para a sala de aula”

(Animador sociocultural, 31 anos)

que na opinião do animador por vezes dificulta mesmo o trabalho da escola no combate à indisciplina, pois muitos pais não concordam com algumas sanções que são aplicadas aos filhos, uma lógica que na sua ótica tem a ver com o facto de estes pais não terem outras formas de os compensar, como carinho, compensando-os desta forma.

A desmotivação associada às baixas condições económicas que lhes permita ir mais longe na sua vida académica, e a falta de objetivos são também fatores apontados na origem da indisciplina na escola,

“(…) é a falta de objetivos em relação ao futuro, é um dos fatores que pesa imenso. (…) Depois, se eles não têm condições socioeconómicas que lhes permitam entrar na faculdade então, ficam assim um bocadinho sem objetivos… (…) Pela desmotivação, exato, desmotivação” (Diretora de turma, 12º ano, 57 anos)

Bem como as próprias dificuldades de aprendizagem, o facto de não se identificarem com o projeto escolar, desinteressando-se, acabando por causar muitas das situações de indisciplina, ocorrendo conflitos entre esses alunos e os que querem aprender,

“(…) consegue-se perceber conflitos entre alunos repetentes com os que não o são, e isto que identifico são alunos repetentes, claramente, porque têm dificuldades de aprendizagem, e não se identificam com o projeto escolar, com a escola, e eu acho que esse é um grande ponto de desinteresse e causa de muitas situações de indisciplina, que é não estarem identificados com a escola, com este meio de ensino, e ao repetirem estão a ter mais do mesmo, e não estão motivados para. O que acontece, sente-se o conflito entre esses alunos e os que querem aprender, portanto começam a destabilizar, provocam confusão dentro da sala de aula (…)”

(Animador sociocultural, 31 anos)

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“Porque há professores que dão as aulas hoje como davam há 10 e 15 anos trás, ou seja, chegam e debitam. (…) O que é que isso motiva para a indisciplina? Então, os alunos estando motivados a probabilidade de a indisciplina acontecer é menor do que numa turma em que os alunos não estejam motivados, interessados… E aí eu acho que o professor tem uma boa parte de responsabilidade no que toca à motivação e interesse dos alunos na sala de aula.”

(Animador sociocultural, 31 anos)

Por outro lado, os fracos desempenhos escolares são explicados, novamente, por sentimentos de desmotivação por parte dos alunos, desta vez provocados pela própria crise económica que o país atravessa, observando-se situações de desempregados diplomados,

“(…) eu acho que tem muito a ver com a nossa sociedade atual… Porque eles veem que até outras pessoas que têm cursos e estão desempregados, veem os pais desempregados… Uma parte é isso, é a nossa crise económica…” (Diretora de turma, 12º ano, 52 anos)

E, mais uma vez, pelo contexto familiar, mais concretamente, no que respeita à participação da família na vida escolar dos filhos,

“Outra coisa também, eu acho que a nível de família, as famílias hoje em dia também são diferentes… (…) Porque não há muito aquele interesse pelos pais de acompanharem o percurso escolar dos filhos… As escolas é para eles passarem o tempo, para eles estarem aqui, aprenderem, agora saber o que é que se passa, “Ora então e o que é que se passa?”, “E quantas negativas tiraste?”, “E olha, tens de estudar!”, isso que eu fazia às minhas filhas e que os meus pais me faziam a mim, eu acho que falta hoje nas famílias, acho que é o maior problema a nível das famílias atuais, é o desinteresse por parte das famílias do percurso escolar dos alunos e daí o insucesso.” (Diretora de turma, 12º ano, 52 anos)

Quanto ao papel da escola no combate à indisciplina as medidas mais comumente aplicadas é a expulsão de sala de aula nos casos em que isso se aplique, o trabalho comunitário, onde os alunos ajudam em tarefas dentro da escola, o Educação para a Cidadania, onde há uma monotorização de turmas com a colaboração de um técnico e do próprio diretor de turma, em turmas que são sinalizadas com índices de indisciplina mais altos, e o Gabinete de Mediação de Conflitos que exerce uma função importante na intervenção em casos que geralmente ocorrem em sala de aula, neste sentido,

“Numa primeira fase ouvíamos o aluno, situação que seria posteriormente apresentada ao professor e diretor de turma, porque não podemos ficar com a versão só do aluno… Inicialmente era só isto, mas depois incutimos a tal tarefa de sala de aula, relativa à matéria

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que o professor está a lecionar para dar continuidade e assim não perdem totalmente a aula, e não vão para o Gabinete só para dar duas de conversa, que muitas das vezes era assim que eles interpretavam…” (Animador Sociocultural, 31 anos)

No entanto, há quem considere que as medidas levadas a cabo não resolvem a questão de fundo, sentindo-se alguma revolta nestes discursos,

“(…) a lei acaba por ser um bocado permissiva, os alunos podem fazer um bocado o que lhes apetecer, (…) O aluno portando-se muito bem, ou portando-se mais ou menos bem é igual. Se se portar bem não há problema nenhum, mas se se portar mal ou muitíssimo mal há várias etapas que podem ser seguidas, que podem ser checadas, só que no final, se ele se continuar na mesma a portar mal, se aquilo não tiver um efeito pedagógico no aluno, aquilo vai desembocar tudo ao mesmo. O que é que é? O aluno mantem-se na escola até ao final do ano. Está a entender? (…) Passamos para o passo seguinte, vai suspenso dois dias, pronto está bem, ao terceiro dia já está cá, e continua-se a portar mal, e nós temos de ter cá o aluno até ao final do ano.” (Diretor de turma, 9º ano, 46 anos)

Acrescentando ainda que devia existir uma forma de “pelo menos para os tirar daqui,

para não perturbarem.” (Diretor de turma, 9º ano, 46 anos)

Por outro lado, são sentidas algumas dificuldades por parte da escola em aplicar determinado tipo de medidas no combate à indisciplina, como o trabalho comunitário, muito em parte por causa dos pais dos alunos,

“(…) se a escola toma uma medida em que vai haver um reforço de horas de estudo para tentar recuperar matérias perdida, para fazer T.PC’s, trabalho comunitário dentro da escola, para compensar entre aspas a indisciplina na escola, muitas das vezes encontramos uma barreira que é a família. E é “o meu filho fez isso mas não vai andar aí a limpar… ah não…”, e eu acho que há aí um desajuste muita das vezes da base familiar. (…) não têm outras formas de compensar, como carinho e tudo mais, e então compensam-nos desta forma “não o vou deixar andar aí a limpar entre outras coisas…”(…) pensando que o estão a proteger, e não estão, porque não o protegem no se desenvolvimento, porque vai ser ser sempre um protegido e continuar a fazer coisas erradas, não aprende, é contínuo…” (Animador sociocultural, 31 anos)