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A influência da mídia nas alterações da lei penal e processual penal

3 A MÍDIA E SUA INFLUÊNCIA COM O LEGISLADOR NA PRODUÇÃO DE

3.2 A influência da mídia nas alterações da lei penal e processual penal

O pânico social gerado pela veiculação demasiada de crimes violentos, abriu uma importante porta para a mídia que, juntamente com a narrativa do crime, difunde para a população a necessidade de medidas urgentes, para a reversão do quadro de criminalidade vivenciado.

Esse exagero da mídia convence a sociedade de que é preciso uma resposta legal por parte do legislador, como se leis mais severas, fossem a melhor alternativa para amenizar os índices da criminalidade.

Curioso é analisar, que os crimes explorados pela mídia para, disfarçada de opinião pública, influenciar o legislador a elaborar ou alterar leis, são aqueles que normalmente envolvem pessoas influentes, conhecidas da sociedade ou àqueles que pela forma como foram praticados, acarreta uma repercussão social negativa, gerando um clamor público, por vezes desmedido e de prejulgamento. Exemplos disso são os crimes envolvendo o empresário Abílio Diniz e o publicitário Roberto Medina, a atriz Daniela Perez, a chacina da candelária, a tortura em Diadema e a morte da menina Isabela Nardoni.

Certamente, a mídia usa esses crimes por atraírem a atenção dos espectadores dos meios de comunicação, conseguindo dessa forma, atingir os objetivos esperados com a veiculação desses fatos, quais sejam instalar o pânico geral e a sensação de insegurança na população, “vender” a notícia e obter os lucros esperados.

Essa pressão da mídia sobre a sociedade e sua consequente influência com o legislador, pode ser observada ao longo da história. O início da Sociedade Democrática de Direito no Brasil, foi marcada por uma série de crimes que amedrontaram a população, como relatado. Muitas foram as vítimas dos sequestros

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que visavam à obtenção de dinheiro, mas a mídia, problematizou o assunto somente quando duas pessoas influentes da época, foram alvos dos crimes.

O sequestro do empresário Abílio Diniz e do publicitário Roberto Medina no ano de 1990 teve repercussão na mídia, que pregava a necessidade de uma atitude por parte do governo para solucionar o problema.

A Constituição de 1988 previu em seu texto a elaboração de uma lei para tipificar os crimes hediondos, mas a referida lei só foi publicada no ano de 1990, após a veiculação do sequestro dos empresários. O crime de extorsão mediante sequestro integrou o rol dos crimes hediondos, como uma resposta para a sociedade que, diante da onda de crimes sentia-se desprotegida.

Mais tarde, no ano de 1994 a Lei nº 8.072, a Lei dos Crimes Hediondos foi alterada pela Lei nº 8.930/94, dessa vez motivada por outros dois crimes, o assassinato da Atriz Daniela Perez no ano de 1992 e pela Chacina da Candelária no ano de 1993.

A redação original da Lei nº 8.072 não previa, como crime hediondo, o homicídio, mas, em razão dessas mortes, que foram amplamente divulgadas pela mídia, aliado a um sensacionalismo desmedido, o legislador se viu obrigado a responder para a sociedade, momento em que aprovou a Lei nº 8.930/94, incluindo no rol dos crimes hediondos o homicídio qualificado, em todas as suas formas, e o homicídio simples, quando praticado por grupo de extermínio.

O incentivo popular para a elaboração da Lei nº 8.930/94 e a ausência de iniciativa do legislativo também é verificada nos apontamentos seguintes:

Atende, sobretudo, a anseios populares, já que o projeto de lei que deu origem à Lei n. 8.930, de 6 de setembro de 1994, foi incentivado por mais de um milhão de assinaturas, campanha liderada pela escritora Glória Perez, mãe da atriz Daniella Perez, assassinada de forma brutal no dia 28 de dezembro de 1992 [...]. (MONTEIRO, 1997, p. 17).

Devido ao aclame público e midiático para a elaboração da Lei nº 8.930/94, o legislador se preocupou em dar uma resposta rápida para a sociedade sem, no

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entanto, preocupar-se com a qualidade do que aprovava. Este descuido do legislador fica evidente no comentário de Franco (2002, p. 1175):

Não obstante, a Lei 8.930/94 contém um pecado capital: excluiu o delito do art. 270 do Código Penal do rol dos delitos hediondos, mas se esqueceu de repor as margens penais existentes antes da Lei 8.072/90. Destarte, sem o expresso restabelecimento do preceito sancionatório do referido tipo, permanece intocável a exacerbação punitiva provocada pelo art. 6.º da Lei 8.072/90. O autor do delito do art. 270, do Código Penal, embora não realize crime hediondo, continuará a ser punido com pena reclusiva variável entre dez e quinze anos. A carência de técnica legislativa, a desatenção e o despreparo do legislador penal brasileiro, ficam a nu nesse episódio.

Outro crime que resultou na elaboração de uma lei foi o que ocorreu na Favela Naval em Diadema no ano de 1997, em que policiais militares do Estado de São Paulo extorquiram dinheiro, humilharam, espancaram e executaram pessoas em uma blitz.

Essa tardia e densa manifestação da sociedade permitiu – embora não se saiba durante quanto tempo os meios de comunicação de massa serão direcionados para tal objetivo – um processo de revaloração dos direitos fundamentais da pessoa humana e serviu de poderosa alavanca para a movimentação do Congresso Nacional. (FRANCO, 2002, p. 3099).

A divulgação desse crime pela mídia resultou na publicação da Lei nº 9.455 de 7 de abril de 1997, que tipificou o crime de tortura, até então não existente no ordenamento jurídico brasileiro. A lei foi publicada apenas um mês depois da prática do crime.

A morte da menina Isabela Nardoni foi outro crime, que por envolver uma criança foi explorado pela mídia. Até seu assassinato, um procedimento para o tribunal do júri poderia levar anos, mais de uma década até ser encerrado com a Sessão de Julgamento em Plenário.

Curiosamente, poucos meses depois do crime que chocou a sociedade brasileira, e das reiteradas manifestações dos meios de comunicação, sobre o absurdo que seria os acusados, o pai e a madrasta da menina, que na época estavam apenas sendo investigados sobre o crime, ficarem anos livres até o seu

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julgamento, fazendo com que o assunto caísse no esquecimento, uma lei limitando o tempo entre o início do procedimento até seu julgamento em plenário, foi publicada.

Sobre a aceleração do procedimento, Giacomolli, (2008, p.60) aponta:

O direcionamento único da ritualística na aceleração do tempo, com marcos temporais lançados no curso do processo, desvinculados da realidade dinâmica temporal própria do processo penal (tempo do processo, diferente do tempo social e do tempo subjetivo), precipita atos processuais e garantias constitucionais.

A lei que instituiu o limite de tempo para a realização do julgamento foi a Lei nº 11.719/08. Ela determinou que a primeira fase do julgamento dos crimes dolosos contra a vida, fosse realizada no prazo máximo de noventa dias, e a segunda fase, após o trânsito em julgado da sentença de pronúncia, não deveria ultrapassar seis meses, ou seja, um procedimento que podia levar até mais de uma década para ser concluído, com o advento da lei não pode levar mais que um ano.

3.3 Consequências das alterações feitas pelo legislador sob a influência da