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4.3 A aquisição da TV Brasília e de rádios

4.3.1 Influência na esfera de visibilidade pública

Tomando a perspectiva dos campos para observar e interpretar as investidas de PO sobre a propriedade de meios de comunicação, pode-se dizer que controlar uma empresa de comunicação, pertencente ao campo dos media, significa ter a possibilidade de influenciar em um lugar que representa a maior parte do contato, experiência e conhecimento que os indivíduos contemporâneos adquirem sobre o mundo. Significa ainda deter controle sobre o ambiente onde a disputa discursiva pela verdade se processa entre os demais campos, que tentam impor suas visões no campo dos media.

O controle político sobre a propriedade dos meios de comunicação representa, hoje, uma contracorrente ao movimento que vem sendo percorrido pelo campo dos media nos últimos anos: afastou-se do campo político – no Brasil, isso se consolidou com a redemocratização – ao mesmo tempo em que se aproximou do campo econômico. Ou seja, surgiram as grandes empresas de comunicação e as indústrias culturais em geral, que passaram a se sustentar com anúncios de outras empresas, não dependendo exclusivamente dos Estados para sobreviver.

Então, em uma sociedade na qual o campo dos media tende a estabelecer uma distância muito maior em relação ao campo político do que em relação ao campo econômico, PO é um exemplo de que essa tendência ainda deve ser relativizada. E parece estar longe de ser uma regra, embora essa distância do campo político expresse um valor simbólico de independência e credibilidade da instituição de comunicação. Esses valores são especialmente importantes para o subcampo do jornalismo, que os professa como justificativa para a sua relação de confiança com o espectadores, a sua razão de ser.

Exercer essa modalidade de domínio sobre um meio de comunicação – por meio da propriedade – representa ainda ter à disposição alguns dos recursos essenciais para o campo político na sociedade contemporânea. O campo dos media, por ser o ambiente responsável por construir discursos e estéticas sobre os diferentes domínios da realidade e sobre os diversos campos sociais, constrói publicamente a atividade política. É nas suas estruturas que os agentes políticos travam disputas pelo capital mediático, que é essencial na construção do capital político e das carreiras políticas.

125 Assim como qualquer político-dono-de-meios, PO tem nas mãos a competência técnica de influir na esfera de visibilidade pública – que é gerenciada pelo campo dos media – que a TV Brasília e as suas rádios representam uma pequena parcela institucional, reservadas ao âmbito regional. Ao acessar o campo por meio da aquisição da propriedade de meios, adquire a partir de então a capacidade de usar os recursos das instituições que controla de acordo com as suas motivações, tendo em mente que os agentes mediáticos tendem a ser uma força contrária à instrumentalização política dos meios, sobretudo os jornalistas.

Essa competência técnica de influir na esfera de visibilidade pública dá a ele a capacidade real, porém limitada e relativa, de influir na construção discursiva e estética da política. Isso significa a capacidade de construir o capital mediático, que tende a ser convertido em capital político propriamente dito. Deste último, derivam a capacidade de PO de influenciar no posicionamento dos agentes no campo político e na própria constituição das carreiras dos agentes políticos. Evidentemente, em todas essas capacidades, ele possui um determinado grau de influência e não um absurdo domínio completo.

E de onde vem o reconhecimento social dessas capacidades técnicas que um agente político como PO adquire ao controlar a propriedade de um meio de comunicação? Vem de instituições formais da democracia brasileira, do campo político e jurídico. O Legislativo e o Executivo outorgam novas concessões e renovam outras. O Legislativo, em especial, formula os dispositivos de regulação e as políticas públicas que visam organizar a estrutura dos meios de comunicação no país – inclusive os acordos como o que ocorreu entre PO e os diários associados no caso da TV Brasília.

O campo jurídico media essa relação. O Ministério Público, como já o fez, pode contestar na Justiça a legalidade e a constitucionalidade do fato de políticos controlarem emissoras de rádio e TV. Mas, até o momento, não conseguiu reunir forças suficientes para empreender esse movimento. E o campo político ainda mantém os seus agentes aptos a serem donos e sócios de empresas de comunicação, pois são os próprios agentes políticos que decidem sobre isso. Neste sentido, embora existam constrangimentos, trata-se de um dado da realidade brasileira.

PO não procura controlar rádios e uma televisão para acessar ou se posicionar bem no campo dos media. Ele não é um homem da comunicação, vale dizer, um apresentador, repórter, produtor ou jornalista, embora apresente um programa de entrevistas. Parece ser muito claro, tomando a sua trajetória como referência, que as ambições de PO não são econômicas nem tampouco comunicacionais, mas sim políticas. Na medida em que já se

126 consolidou como um dos maiores empresários de Brasília e apresenta um programa com conteúdo político muito presente, é o campo político que motiva essa sua investida.

No campo político, PO sonhou em ser governador do lugar que idolatra. O fato é que o jogo político em Brasília é constituído por agentes já bastante consolidados e em posições bem superiores a de PO. O principal deles é Joaquim Roriz (PSC), que governou a capital em quatro mandatos (1988-1990; 1991-1995; 1999-2002; 2003-2006) e cujo apoio é sempre disputado pelas lideranças intermediárias quando ele próprio não está concorrendo às eleições.

E, nos últimos anos, as eleições no Distrito Federal estiveram normalmente polarizadas entre candidaturas da Direita, principalmente o Roriz, e da esquerda, que só conseguiu chegar ao poder em 1995 com Cristovam Buarque, à época no Partido dos Trabalhadores (PT). A polarização era uma realidade, embora existissem as candidaturas chamadas de “terceira via”, como foi a de Arruda em 1998. Portanto, PO sempre teve dois caminhos: ser o escolhido de Roriz, o que não conseguiu em 2006 apesar de seus esforços, ou se aventurar em uma terceira via que fizesse frente à polarização.

Tendo fracassado nos dois caminhos com o seu objetivo de liderar uma chapa ao governo do DF, pode-se verificar o limitado capital político de PO no cenário local, com pouca capacidade de mobilizar apoios e costurar alianças. Assim, parece ser evidente que emissoras de rádio e televisão servem justamente a essa carência de capital político. Na medida em que é no campo dos media que são regidos e geridos os capitais mediáticos dos agentes políticos, o campo dos media é um espaço que também ajuda no processo de posicionamento dos agentes no campo político.

Portanto, controlar a propriedade de uma emissora traduz-se em um valor eminentemente político. Como os interesses e esforços de PO se concentram no cenário político local, ganha vantagem ao ser um dos sócios de uma emissora da própria cidade, com expressiva programação local e considerável audiência, a TV Brasília. Contudo, ele não pode prescindir das demais instituições de comunicação do campo dos media, especialmente as de alcance nacional e com expressiva audiência, pois é esse conjunto institucional e de agentes que produz e gerencia a esfera de visibilidade pública.

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