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5. A construção das características do campo jornalístico contemporâneo

5.2. As influências entre os campos

59Ou no computador.

60Primeiro parágrafo de uma reportagem que deve responder as seguintes perguntas: O que? Quem? Quando? Como? Onde? e Porque?.

61Conforme Mick (2013), no final de 2012, 91,7% dos jornalistas possuíam graduação no curso de Jornalismo

Uma especificidade muito marcante do jornalismo enquanto campo é a de que ele sofre influências e, ao mesmo tempo, exerce influência, na sua relação com múltiplos outros campos. Mais do que isso, conforme Ferreira (2005), o campo do jornalismo é subordinado e constituído de acordo com as estratégias do campo da economia, o que torna, conforme o autor, um espaço social de autonomia relativa.

Sobre a questão econômica, devemos perceber que a maioria dos jornais – aqueles que não são públicos, sejam concessões públicas ou não, seja impresso, rádio, TV, ou web – são empresas. Como empresas – situadas em um país de economia capitalista – visam o lucro. No meio jornalístico, quanto mais ouvintes, telespectadores ou leitores se têm, maior também é a probabilidade de atrair os patrocinadores ou anunciantes – que são uma das principais fontes de rendimentos, ou mesmo a principal. Para alcançar as pessoas que irão consumir o material produzido, muitas vezes se recorre a uma série de técnicas, constituindo o que muitos autores vem chamando de “jornalismo de mercado”. Essa denominação se refere tanto a essa necessidade de lucro quanto às práticas que se exercem para chegar a esse fim. Conforme Neveu (2004), uma delas refere-se à importância dada a editorias que tenham uma maior probabilidade de maximizar os públicos. Através do resultado de pesquisas, se opta, por exemplo, por priorizar notícias referentes a serviços enquanto ocorre um declínio das informações sobre o exterior – as quais podem ser menos rentáveis. Além disso, tendem a se priorizar informações com forte conteúdo emocional – o sensacionalismo62

- e a velocidade de cobertura (o furo jornalístico) (NEVEU, 2004, p. 158). Cabe destacar, que, devido às características citadas, tende a acontecer a perda de autonomia das redações frente aos departamentos de gestão.

Neveu (2004) aponta que a busca por rentabilidade acaba influenciando, inclusive, as relações de trabalho. É comum nas grandes empresas jornalísticas a existência de um grande número de estagiários (sejam eles pagos ou não) e de freelancers. Conforme Neveu (2004, p.159) “estágios gratuitos, freelances, contratações por tempo determinado seguem em períodos cada vez mais longos antes de uma contratação estável”. Além disso, o autor considera que existe uma espécie de rejeição

62Refere-se à busca pelo sensacional, pelo choque, à relação com as emoções. Uma prática bastante comum no jornalismo é o foco em pessoas chorando ou em cenas nas quais as pessoas apareçam feridas, inclusive aparecendo sangue dos envolvidos, a fim de causar este efeito.

àqueles jornalistas que possuem uma hiperespecialização, e que, logo, teriam um salário mais alto. Dá-se prioridade, assim, para o financeiro em detrimento da qualidade da produção jornalística.

Outra prática comum, que acaba por influenciar no material produzido pelos jornais, a qual também tem relação direta com os patrocinadores e anunciantes, diz respeito às políticas de “boa vizinhança”, ou a política de “uma mão lava a outra”. Para que seja mantida uma relação saudável entre jornal (empresa) e patrocinador/anunciante, múltiplos acontecimentos que envolvem patrocinadores não são divulgados ou sua importância é minimizada – mesmo que sejam de interesse público. Essa relação expressa a influência do campo econômico sobre o campo jornalístico.

Quanto à influência exercida, podemos citar também a ligação entre política e jornalismo. O campo jornalístico não só pode ser influenciado, como no caso anterior. Também pode influenciar a dinâmica do jogo em outros espaços sociais, como é o caso do campo político. Os jornais são, muitas vezes, influenciadores dos votos de diferentes classes sociais. Podemos citar aqui o caso da eleição brasileira de 1989, onde disputavam o segundo turno Fernando Collor de Melo (antigo PRN) e Luiz Inácio Lula da Silva, Lula, (PT). Nessa ocasião, a Rede Globo de Televisão veiculou um resumo dos melhores momentos do último debate entre os presidenciáveis, o qual mostraria a performance positiva de Collor e traria apenas os momentos negativos de apresentação de Lula63. Por fim, Collor acabou vencendo a disputa presidencial, beneficiado, entre

outros fatores, pela influência do campo jornalístico.

Na entrevista de Felipe64, por exemplo, o jornalista, que trabalha em uma grande

empresa de mídia do Rio Grande do Sul, conta que foi escolhido, em um dos seus antigos trabalhos, para fazer uma série de matérias favoráveis à Reforma Trabalhista: “Foi bem ridículo porque eles simplesmente me escolheram pra fazer boletins elogiando a Reforma Trabalhista. ‘Liga para o [político], pega uma entrevista dele e com isso tu fazes matérias falando bem’”, relata o jornalista. No entanto, em contraposição, conta

63Ver “GOULART, Alexander. A mais polêmica edição do Jornal Nacional. Observatório da Imprensa” nas referências.

que também já fez matérias com um posicionamento contrário a um tema semelhante (a reforma da previdência), devido ao pagamento por matérias:

Mas pensando por esse lado, também teve uma vez que eu tive que fazer uma pauta falando mal da reforma da previdência. [A Reforma da Previdência] é uma coisa que eu não concordo, mas no meu trabalho normalmente a gente busca ser o mais isento possível. Aí eu tive que ir na Centra Sindical fazer uma matéria positiva porque eles pagaram e eu tava lá falando.

Podemos deduzir que esses boletins favoráveis à reforma trabalhista, bem como a matéria desfavorável à reforma da previdência podem influenciar a opinião pública e, logo, o campo político em favor de um ou de outro grupo.