Capítulo II – Estruturação do dispositivo metodológico do estudo
II. 2.2.3) Inquérito por questionário
Na orientação teórico-metodológica seguida, um dos instrumentos de investigação a que se recorreu na pesquisa foi o inquérito por questionário, destinado a conhecer os modos de trabalho pedagógicos, as estratégias de aprendizagem e os tipos de avaliação mais usados nas situações em estudo19. Este, além de permitir a recolha de dados, tem “a possibilidade de quantificar uma multiplicidade de dados e de proceder, por conseguinte, a numerosas análises de correlação” (Quivy e Campenhoudt, 1992: 191), sendo importante realçar que se deve ter em consideração que “não há questionários perfeitos […] pequenas alterações na ordem das perguntas e na sua formulação afetam significativamente as respostas dadas” (Ferreira, 1987: 188).
Desta forma, o inquérito por questionário é composto por um conjunto de perguntas sobre as representações que os inquiridos possuem sobre a realidade (Ferreira, 1987), ou seja, carateriza-se pelo facto de que “o mais simples e o mais antigo método para descobrir o que as pessoas sentem, pensam, fizeram ou pretendem fazer é perguntar-lhes” (Dafinoiu, 2003b: 100). Assim, este instrumento especificamente construído para esta investigação foi desenvolvido tendo em consideração dois objetivos: realizar uma “pesquisa
19 Ver anexo 7 – Inquéritos por questionário desenvolvidos para este estudo.
Unidade
Orgânica/Curso Ano Unidade Curricular
FEUP/MIEIC
1º Análise Matemática
Fundamentos de Programação 4º Sistemas de Informação
Laboratório de Desenvolvimento de Software
FPCEUP/MIP
1º Neurociências
Trabalhos Práticos de Observação do Desenvolvimento
4º Intervenção Clínica nas Perturbações Psicológicas e Psicossomáticas Consulta Psicológica de Orientação Vocacional
descritiva [que] determina e relata a forma como as coisas são, envolve a recolha de dados numéricos ou responder a perguntas sobre o estado atual do objeto de estudo” (Gay, Mills & Airasian, 2006: 11) – o que os atores dos processos ensino-aprendizagem-avaliação vivenciam; e concretizar um estudo qualitativo e interpretativo que “visa […] obter compreensões aprofundadas sobre a maneira como as coisas são, por que são assim, e como os participantes no contexto as percebem” (idem: 14) – o como vivenciam estas situações educativas e o que delas desejavam estes atores. Neste sentido, este instrumento de recolha de dados pode ser caraterizado em duas partes distintas, que a seguir se caraterizam:
A primeira parte do questionário, inserida numa vertente mais quantitativa deste estudo qualitativo, foi desenvolvida a partir da referida taxonomia e estruturada em três grupos de questões de escolha múltipla.
O primeiro grupo é relativo ao eixo Ensino, com 12 itens para responder, quatro para cada dimensão (MTP1-transmissivo, MTP2-incitativo, MTP3- apropriativo); o segundo diz respeito ao eixo Aprendizagem, o qual apresenta 16 itens para responder, sendo também considerados quatro para cada dimensão (comportamentalismo, cognitivismo, construtivismo, sócio- construtivismo); no terceiro considera-se o eixo da Avaliação, o qual também é composto por 16 itens, quatro para cada uma das dimensões em análise (sumativa, formativa, formativa e formadora, formativa alternativa e formadora), conforme apresentado no quadro nº 2.
Quadro nº2:
Itens dos inquéritos por questionário Grupos Dimensões Itens
EN
SI
N
O
MTP1
1.3- O professor transmite aos estudantes conhecimentos/informações e atribui-lhes exercícios ou situações para concretizar
1.6- A matéria em estudo é apresentada e explicada, sendo principalmente o professor a falar na sala de aula
1.9- A reprodução do conhecimento já existente é o aspeto mais privilegiado em termos de ensino 1.12- O professor fornece aos estudantes conhecimento preciso e os estudantes não são envolvidos na descoberta
MTP2
1.2- O professor incita o debate e promove atividades práticas para os estudantes
1.5- A planificação do ensino é revista em função dos resultados das aprendizagens dos estudantes 1.8- O professor incentiva os estudantes a pensarem por si próprios nas respostas às questões que coloca
1.11- O professor cria condições para a que os estudantes apresentem as suas dificuldades e organiza o ensino em função delas
MTP3
1.1- Nas aulas é encorajada a procura de soluções alternativas que desafiem as ideias do professor e dos colegas
1.7- O foco do ensino é ajudar os estudantes a construir conhecimento a partir das suas experiências de aprendizagem
1.10- Promove-se a compreensão das complexidades do trabalho no mundo “real”
A PR EN D IZ A GE M Comportamentalismo
2.4- Os erros de aprendizagem são imediatamente corrigidos pelo professor não havendo momentos em que os estudantes os verifiquem por si próprios
2.8- Os estudantes são orientados a trabalhar sobretudo para se prepararem para os testes e exames 2.12- É promovida a aquisição de conhecimentos através de exercícios de repetição e de memorização 2.15- Os estudantes são estimulados a seguirem apenas as instruções dadas pelo professor
Cognitivismo
2.3- O aumento dos conhecimentos é realizado com o auxílio do professor, melhorando o processamento da informação
2.7- Os estudantes são estimulados a refletir sobre os conceitos-chave da unidade curricular 2.11- Os estudantes são encorajados a discutir os conteúdos da unidade curricular 2.13- Os estudantes verificam por si próprios os erros de aprendizagem, refletindo sobre eles
Construtivismo
2.2- Os estudantes são incentivados a participar e a intervir, promovendo-se o envolvimento pessoal na construção do saber
2.6- Os estudantes têm condições para desenvolver continuamente o seu conhecimento, numa lógica de aprender a aprender (aprendizagem contínua)
2.10- Os estudantes têm amplas oportunidades para analisar, discutir e expressar as suas ideias, sendo encorajados a pensarem nas respostas por si próprios
2.14- Existem oportunidades para relacionar os conteúdos com a prática em situações concretas
Sócio-construtivismo
2.1- Existem condições para relacionar os conteúdos com as mudanças do conhecimento e da sociedade
2.5- A aprendizagem é facilitada através da utilização de meios que proporcionam a colaboração e a partilha de conhecimentos e experiências
2.9- O envolvimento dos estudantes é estimulado através de estratégias que favorecem a sua autonomia e responsabilidade (sistemas de auto-aprendizagem)
2.16- Recorre-se à análise crítica de situações (reais) em trabalhos de grupo com tutorias coletivas para proporcionar o desenvolvimento de competências individuais e sociais (estimula-se a crítica
construtiva/pensamento crítico) A VA LI A Ç Ã O Sumativa
3.1- As classificações são atribuídas com base apenas em testes ou exames após a conclusão de um conjunto de conteúdos ou do período letivo (semestre)
3.5- O tipo de avaliação que se pratica destina-se a reunir os elementos para classificar (selecionar) os estudantes no final do percurso de formação (ensino)
3.9- Recorre-se a perguntas que medem, essencialmente, o conhecimento adquirido ao nível da memorização (definições, descrições de factos transmitidos, fórmulas, perguntas verdadeiro ou falso, …) 3.13- Pratica-se um controlo quantitativo e os conhecimentos são aferidos apenas pelo professor
Formativa
3.2-A avaliação tem por função fornecer informações, aos docentes, sobre os efeitos dos processos de ensino-aprendizagem e, aos estudantes, sobre a aprendizagem que estão a realizar e eventuais problemas com que se estejam a confrontar
3.6- Utilizam-se testes e outros instrumentos (provas orais, …) de avaliação muito estruturados que permitem apenas um tipo de resposta (perguntas de ordenamento de frases, escolha múltipla, verdadeiro ou falso, resposta curta, …)
3.10- A avaliação é distribuída ao longo do semestre letivo e utilizada para regular o processo ensino- aprendizagem
3.14- Efetua-se um controlo qualitativo e recorre-se à auto-avaliação segundo critérios que são definidos pelo professor
Formativa e formadora
3.3- Os conteúdos e meios interativos disponibilizados promovem a auto-avaliação
3.7- Os procedimentos de avaliação criam condições para os docentes melhorarem os métodos de ensino e para os estudantes auto-regularem as suas aprendizagens
3.12- Existem momentos de avaliação em grande grupo onde cada um pode refletir sobre os modos como foi construindo as suas próprias aprendizagens
3.15- Utilizam-se instrumentos e procedimentos vários que permitem respostas originais e mobilizadoras dos conhecimentos adquiridos e das competências desenvolvidas
Formativa alternativa e formadora
3.4- O processo de avaliação é partilhado, contribuindo de forma contínua para o aumento da autonomia e da responsabilidade dos estudantes pela sua própria aprendizagem
3.8- Recorre-se a diferentes modos de avaliar que permitem gerar verdadeiras oportunidades de aprendizagem
3.11- Os procedimentos de avaliação respeitam os diferentes estilos e ritmos de aprendizagem, possibilitando que os estudantes escolham os momentos de avaliação
3.16- A avaliação é co-participada, integrada no processo ensino-aprendizagem, orientada para melhorar as aprendizagens e focada nos processos sem ignorar os conteúdos
Neste sentido, dentro de cada um destes três eixos, ensino- aprendizagem-avaliação, os itens foram aleatoriamente misturados e assim respetivamente distribuídos para serem dessa forma apresentados no inquérito por questionário. Acresce referir que, para construir estes itens foram estudados previamente muitos exemplos, através de uma pesquisa que permitiu analisar diversos questionários sobre os processos de ensino- aprendizagem-avaliação utilizados no ES, tendo-se finalmente recorrido à sua validação por especialistas. A escala de resposta utilizada para estes itens foi do tipo Likert com 7 níveis, considerando-se que o valor 1 representa "Nunca", o valor 4 representa "Algumas vezes" e o valor 7 representa "Sempre", no sentido de “registar o grau de concordância ou discordância com determinada afirmação sobre uma atitude, uma crença ou um juízo de valor” (Tuckman, 2002: 280).
Por seu turno, a segunda parte deste questionário incluiu três questões abertas que apelam a uma resposta curta sobre os aspetos positivos, as áreas a melhorar e as mudanças ainda necessárias para o envolvimento ativo dos estudantes, relativamente aos processos ensino-aprendizagem-avaliação das respetivas UC. Ou seja, “a resposta não-estruturada, vulgarmente designada, por questão de final aberto […], permitindo que o sujeito dê a sua própria resposta, qualquer que seja a forma escolhida” (Tuckman, 2002: 311), adquirindo assim informações qualitativas que permitam a interpretação das representações e perceções dos professores e estudantes envolvidos no estudo sobre os processos de ensino-aprendizagem-avaliação.
Foi então realizado um pré-teste cuja aplicação a voluntários testou se os itens a utilizar eram claros e compreensíveis assim como permitiu verificar o tempo necessário para o preenchimento deste inquérito por questionário, em termos de duração média adequada. Posteriormente, este inquérito por questionário foi a aplicado via on-line a todos os professores e estudantes das UC selecionadas, para se proceder à necessária recolha de dados. Contudo, como o número de respostas então recebidas foi muito reduzido, foi necessário realizar uma segunda fase de aplicação, já de tipo presencial, para obter um número de respostas adequado. Em seguida, procedeu-se à integração dos
resultados obtidos com a aplicação deste instrumento numa base de dados em Excel para posterior tratamento estatístico dos mesmos.
Conforme se pode aferir, a aplicação dos inquéritos por questionário subentendeu a recolha de dados tanto quantitativos como qualitativos, exigindo, assim, respetivamente, a realização de uma análise de dados estatística e de uma análise conteúdo.